Tempos de fartura, passados.
Analysis by Dr. Joseph Mercola
November 20, 2019
RESUMO DA HISTÓRIA
- Dados de pesquisa mostram uma associação entre os 90% de redução da pesca no Lago Shinji, Japão, e a aplicação de neonicotinoides aos campos de arroz adjacentes;
- Os pesquisadores citaram a mesma previsão feita pela bióloga norte americana Rachel Carson, em seu livro de 1962, “Silent Spring” (nt.: Primavera Silenciosa, quando o veneno tratado era o laureado e ‘deslumbrante’ DDT);
- Os neonicotinoides reduziram drasticamente a população de insetos, sendo que esta perda trará um efeito cascata nos ecossistemas alimentícios, cujas ramificações não devem ser vistas de forma superficial;
- Os neonicotinoides apresentam alto risco, sendo seu retorno pequeno como as evidências demonstram de que nas monoculturas que os empregam, há maior presença de insetos que danificam as culturas quando comparadas às propriedades que praticam agricultura regenerativa.
A pesca é um meio organizado de capturar peixes em áreas abertas, sendo uma atividade também conhecida como pescaria. É diferente dos criatórios confinados nas fazendas de peixes, também conhecidos como aquacultura. Nas fazendas de confinamento (nota do website: reforçamos fortemente que se acesse a este link para se conhecer como são os criatórios de peixes, no mundo), os peixes são criados em espaços confinados para receberem alimentação, enquanto a pesca artesanal ou industrial é feita em pescarias organizadas para capturar os animais selvagens.
Os peixes de criatórios são uns dos alimentos mais tóxicos; isto é especialmente verdade para os salmões confinados (nt.: o vídeo acima demonstra claramente isso), de acordo com uma pesquisa. Pesquisadores detectaram que estes salmões confinados analisados eram cinco vezes mais tóxicos dos que os outros produtos alimentícios. Estes salmões (farmed salmon) continham metade do ômega-3 dos salmões selvagens e são muitas vezes alimentados com dietas geneticamente modificadas (nt.: caso do uso de soja brasileira, toda transgênica). Muitos recebem antibióticos, são expostos a agrotóxicos e outros venenos para compensar as condições insalubres nas quais eles vivem.
Embora os peixes de criatórios estejam expostos a agrotóxicos aplicados propositadamente, a pescaria no Japão sofreu um declínio significativo nas populações de peixes e enguias, após a pulverização de neonicotinoides nos cultivos próximos. Também conhecidos como ‘neonics‘, são um tipo relativamente novo de inseticida (insecticide), sendo solúvel em água e atuando sistemicamente.
Ou seja, as plantas que recebem o veneno absorvem e passa a fazer parte de seu sistema fisiológico. O agrotóxico, ‘neonics‘, opera no sistema nervoso central dos insetos, causando a morte ou debilitando a capacidade de coleta dos polinizadores. A ideia era criar um mecanismo de defesa para as plantas assim que os insetos fossem se alimentar delas podendo morrer antes deles prejudicarem significativamente as culturas.
Os Peixes Ficam na Inanição Quando Suas Fontes de Alimentos São Afetadas pelos ‘Neonics’
Este emprego amplo deste tipo de agrotóxico vem sendo associado agora com o declínio na pesca do Lago Shinji no Japão. Uma vez uma atividade próspera, os pesquisadores observaram que a captura anual do eperlano (nt.: peixe tipo salmão) declinou 90% nos últimos dez anos, após a introdução do agrotóxico nos campos que circundam o lago.1
A pesquisa,2 publicada no periódico Science, mostrou ter havido um imediato declínio no número de insetos e plâncton no lago após o uso de ‘neonics‘ nos cultivos de arroz das proximidades. Rapidamente se seguiu um colapso nas populações tanto de eperlano como de enguias que dependem de insetos e plâncton como fontes de alimento.
As populações tanto de eperlano como de enguias vinham estáveis por muitas décadas e enquanto a análise mostra uma forte correlação, a pesquisa não foi projetada para provar esta conexão causal.
Os danos aos polinizadores pelos ‘neonics‘ já está bem documentado. O extermínio de espécies de peixes de água doce vem sendo estudado mais fortemente na Europa onde os dados conectaram este veneno ao colapso na população de libélulas, caracóis e efemérides associado com o declínio nas populações de pássaros que se alimentam destes insetos.
Outros grupos estavam averiguando e registrando o teor de sal e poluição no lago, mas os cientistas não acreditavam que a redução na população de peixes estivesse coincidindo com estes resultados. Masumi Yamamuro é o cientista do Serviço Geológico do Japão e principal autor do estudo que investigou a causa da dizimação da população de peixes.3
Os pesquisadores notaram que uma população de peixes não havia declinado e determinaram que a espécie tinha uma dieta mais diversificada e poderia sobreviver com as algas, não sendo afetada pelos inseticidas. À medida que as fontes de alimento para o eperlano e a enguia estavam desaparecendo, os peixes também foram morrendo.
Um Químico Tem um Complicado Efeito no Ecossistema
O ecologista da Purdue University, Jason Hoverman, que não participou do estudo, comentou sobre a inter-relação dos ecossistemas frequentemente negligenciada pelas empresas agroquímicas e pelos grandes negócios. Disse ao repórter da rede midiática NPR, Dan Charles:4
“Quando nós pensamos sobre as substâncias químicas, muitas vezes vamos exatamente diretos à sua toxicologia, não levando em conta as implicações da cadeia alimentar; no alimento do peixe e no impacto desta substância sobre este alimento.”
Em 1962, Rachel Carson previu o declínio da população de insetos, bem como de que isso afetaria todos os ecossistemas vivos da Terra. Foi uma célebre bióloga, ecóloga e escritora que, já pedia naquela época, ações responsáveis para o manejo dos recursos da Terra.
Advertiu o governo federal de que era parte do problema e que poderia acarretar um problema ambiental (environmental failure). Eventos previstos em seu livro vem acontecendo nas últimas décadas. Pesquisadores japoneses citaram o livro de Carson, “Silent Spring”:5
“Escreveu ela: ‘Estas aplicações na forma de pulverizações, pós ou em aerosóis são agora quase que generalizadas em fazendas, jardins, hortas, florestas e nos domicílios — com substâncias químicas não seletivas que têm o poder de matar quaisquer insetos, sejam os considerados ‘bons’ e os ‘ruins’, para silenciar o canto dos pássaros e o pular dos peixes nas corredeiras.’ Os impactos ecológico e econômico dos neonicotinoides sobre os mananciais interiores do Japão confirmam a profecia de Rachel Carson.”
Matt Shardlow6 é um conservacionista, autor e CEO of Buglife, a única organização na Europa dedicada a proteger invertebrados. A organização trabalha na preservação dos habitats de insetos da destruição e incrementa os ecossistemas de mananciais hídricos. Seu líder assim comenta para o periódico The Gardian sobre o resultado desta pesquisa:7
“O Japão teve uma trágica experiência com inseticidas que são agentes sobre o sistema nervoso. Nos arrozais, onde o ar vibrava com o ruído das asas de bilhões de libélulas, este inseticidas impuseram praticamente o silêncio. A aniquilação de simples moscas e o golpe sobre a vida dos peixes serve como mais uma testemunha da loucura mortífera dos neonicotinoides.
Também é extremamente preocupante que os níveis de neonicotinoides nos rios do leste da Inglaterra, como recentemente reportou a Buglife, são muitíssimo similares aos reportados nesta pesquisa. Infelizmente, embora esteja claro os danos que foram causados na saúde dos rios do UK, o exato impacto dos neonicotinoides não foi ainda quantificado.”
O Desaparecimento de Populações de Inseto Afeta os Suprimentos Alimentar dos Seres Humanos
Em uma entrevista com o website NPR, o ecologista da Universidade de Pardue, Jason Hoverman, levantou questões mais específicas sobre a causa destes problemas:8
“Estes químicos podem terminar definitivamente nos mananciais hídricos. Eles são aplicados sobre os campos e solos, mas não é aí que eles permanecem. E aqui forma uma questão: estão em níveis altos suficientes para causarem problemas?”
Outros cientistas estudando os efeitos, reconheceram como estes matadores químicos têm danificado o ambiente, tanto imediatamente após sua aplicação como anos depois. O cientista japonês Yamamuro escreve neste estudo,9 “Esta disfunção provavelmente também ocorre em outros lugares, já que os neonicotinoides são, atualmente, a classe de inseticidas mais empregados, globalmente.”
Se pudermos nos lembrar quando viajávamos em criança pelas estadas do interior, provavelmente iremos ter a lembrança dos insetos (bugs) sendo esmagados pelos limpa para-brisas. Se pensarmos sobre isso por uma minuto, poderemos perceber que já faz algum tempo que nosso limpa para-brisa esteve coberto de insetos. Isso vem sendo denominado pelo entomologistas de “fenômeno do para-brisa” e é uma advertência sinistra do declínio nas espécies de insetos.
Em um estudo que avaliou a biomassa total de insetos voadores ao longo de 27 anos em 63 áreas protegidas na Alemanha, os pesquisadores descobriram que houve um declínio de 76%. Estas reduções ocorreram independentemente do tipo de habitat e não foram explicadas apenas por mudanças no clima, uso da terra ou características do habitat.
Os pesquisadores alertaram que a perda de diversidade e abundância pode provocar um efeito cascata nos ecossistemas alimentares, e as ramificações não devem ser levadas levianamente. Especialistas estimam que 80% das plantas selvagens dependem de insetos para a polinização, 60% das aves dependem delas para o forro alimentar e dos ecossistemas, sendo que nos EUA estimam seu valor em 57 bilhões de dólares, anualmente.
Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Nevada acompanhou 67 espécies de borboletas ao longo de 20 anos em quatro locais. Eles descobriram uma redução significativa nas suas populações e estava fortemente ligada ao aumento do uso de neonicotinoides.
‘Neonics’ Têm Alto Risco e abaixo Retorno
Um estudo detectou de que os solos agrícolas, nos Estados Unidos, estão agora 48 vezes mais tóxicos do que no breve período de 25 anos. Os pesquisadores perceberam que os agrotóxicos sintéticos organofosforados (nt.: eram os agrotóxicos usados nos anos 60, 70 até há pouco, entre eles o clorpirifós) por uma mistura de neonicotinoides e piretroides (nt.: as indústrias de agrotóxicos são criminosas ao denominarem suas substâncias com palavras que confundem os consumidores como estas que parecem ser originárias de produtos da natureza como a nicotina e o piretro. Mas são honestas porque colocam a terminação ‘oide’ que, em grego, também significa que ‘parece com’). O número de culturas agrícolas em que se aplica os neonicotinoides aumentou vertiginosamente e o fornecedores de sementes duplicaram a quantidade de inseticida aplicado a cada semente individualmente.
Nos anos 90, somente 35% do milho norte americano e 5% dos cultivos de soja eram pulverizados com neonicotinoides. Neste nível e aplicação, a população de insetos não causam danos suficientes para gerarem prejuízo econômico, sugerindo que tratar centenas de milhares de hectares não seja necessário.
Apesar de anos de evidências de que os ‘neonics‘ têm efeitos danosos sobre o ambiente com reflexos prejudiciais a longo prazo sobre a humanidade, o uso deste tipo de inseticida continua. Para agravar o problema, os plantadores não estão experimentando grandes benefícios nesta prática.
Investigadores de um estudo compararam os resultados de agricultores usando práticas regenerativas (farmers using regenerative practices) àquelas que estão sendo empregadas nos métodos atuais de monoculturas. Descobriram que os cultivos regenerativos tinham 29% menos produção, mas 78% maiores lucros. Na sua revisão sobre manejo dos insetos, descobriram que os campos de milho tratados com inseticidas tinham 10 vezes mais insetos dos que aqueles das fazendas regenerativas (regenerative farms).
Reduzir o Uso de Agrotóxicos e Apoiar os Cultivos Orgânicos
Uma chave para reduzir os danos ambientais, à vida selvagem e, finalmente, à saúde humana, é reduzir o uso de agrotóxicos. Embora a aplicação seja tão comum que possa parecer necessária, os pesquisadores demonstraram que eles podem ser eliminados sem prejuízos aos rendimentos.
Os resultados de alguns estudos sugerem que a redução do uso de agrotóxicos pode reduzir as perdas das culturas, uma vez que as sementes revestidas com ‘neonics‘ eliminam insetos úteis que ajudam a controlar outros, naturalmente. As práticas agrícolas ecológicas ajudam a eliminar os pulgões da soja, levando os agricultores a terem melhor poupança em quatro estados dos EUA, de perdas de centenas de milhões de dólares, a cada ano.
Apesar dessas descobertas, os agricultores são inundados com sementes tratadas com ‘neonics‘ e têm capacidade limitada para evitá-las. A agricultura regenerativa melhora a biodiversidade do solo. Não agride o meio ambiente e, finalmente, aumenta o lucro líquido dos agricultores, permitindo que continuem fornecendo alimentos para o mundo e apoiando suas famílias.
As práticas regenerativas reconstroem o solo superficial, protegem as fontes de água, as populações de insetos e oferecem uma nutrição ideal. Se não se conseguir cultivar a própria comida, escolher produtos frescos e orgânicos de produtores locais, procurando agricultores que forneçam carne de animais que se alimentaram com pastagem orgânica (grass fed beef), bem como com as aves e os laticínios.
As certificações indicam que os agricultores estão usando princípios orgânicos, incluindo a certificação biodinâmica Demeter e a certificação nos EUA é feita pela American Grassfed Association/AGA (nt.: no Brasil, temos o selo Orgânico) .
Fontes e Referências
- 1 The Guardian, October 31, 2019, Para 2,3,4,10
- 2 Science, November 1, 2019;366(6465):620
- 3 NPR, November 2, 2019, Para 4
- 4, 8 NPR, November 2, 2019, Para 13
- 5 The Guardian, October 31, 2019, Para 5
- 6 The Nature of Cities, Matt Shardlow
- 7 The Guardian, October 31, 2019, Para Last 2
- 9 The Guardian, October 31, 2019, Para 6
Tradução livre de Luiz Jacques Saldanha, dezembro de 2019.