Glifosato e a alimentação orgânica

Postado em 11 de agosto de 2020 – 4:19 pm por Sustainable Pulse

Um estudo revisado por pares publicado no início deste mês de agosto de 2020, na revista  Environmental Research, descobriu que os níveis do glifosato, nos corpos dos participantes, caíram em média 70% após seis dias com uma dieta orgânica. O estudo é um dos primeiros a examinar  como uma dieta orgânica  afeta a exposição ao glifosato, o ingrediente ativo do herbicida Roundup da Bayer/Monsanto, o agrotóxico mais usado em todo o mundo. Também indica que, para a população em geral, os alimentos que consomem são a principal forma de exposição a esse veneno.

O estudo,  Organic Diet Intervention Significantly Reduces Urinary Glyphosate Levels in US Children and Adultos, reafirma pesquisas anteriores e, junto com um estudo complementar de 2019, representa a análise científica mais abrangente mostrando que uma dieta orgânica reduz rápida e drasticamente a exposição a agrotóxicos tóxicos , incluindo glifosato, organofosforados, piretroides, neonicotinoides e 2,4-D

A orgânica proíbe o uso desses e de mais de 900 outros agrotóxicos tóxicos permitidos na agricultura não orgânica (nt.: provavelmente no Brasil o número destes venenos tóxicos seja semelhante, mesmo que não sejam classificados como tal, e usados na agricultura convencional, artificializada ou tecnificada, ícones do movimento da ‘revolução verde‘ ou da ‘modernização da agricultura‘ do pós II Guerra Mundial).

“É impressionante que os níveis desse agrotóxico caíram tão drasticamente depois de menos de uma semana. Dados nossos resultados e estudos relacionados sobre como uma dieta orgânica reduz rapidamente a exposição a venenos agrícolas, podemos esperar reduções semelhantes nos níveis de glifosato na maioria dos norte americanos se eles mudarem para uma dieta orgânica”, disse a coautora do estudo, Kendra Klein, PhD, cientista da equipe sênior da ong Friends of the Earth. “Essa é a boa notícia. A má notícia é que a maioria de nós está comendo alimentos carregados de glifosato, continuamente, resultando em doses diárias deste químico do café da manhã ao jantar. ”


Glyphosate Box (nt.: informações para os EUA)

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Embora a amostra do estudo seja pequena, os resultados são estatisticamente significativos e oferecem novos dados importantes que indicam uma exposição mais ampla ao glifosato do que os estudos anteriores. Os pesquisadores encontraram glifosato em 100% dos participantes, incluindo crianças de quatro anos, e descobriram que o nível médio de glifosato em crianças era aproximadamente cinco vezes maior do que em adultos.

Os participantes eram quatro famílias racialmente diversas de Minneapolis, Minnesota; Atlanta, Geórgia; Baltimore, Maryland; e Oakland, Califórnia. Amostras de urina foram coletadas de pais e crianças comendo sua dieta típica de alimentos convencionais por seis dias, e novamente durante uma dieta controlada de todos os alimentos orgânicos por seis dias. Além das reduções do glifosato, o estudo constatou uma redução de 77% no principal metabólito da degradação natural desse produto químico em que esse veneno se decompõe no ambiente e em nossos corpos, o AMPA/aminomethylphosphonic acid (ácido aminometilfosfônico).

O uso de glifosato disparou depois da criação dos transgênicos, com as sementes de milho, soja, canola e algodão geneticamente modificadas, chamadas de Roundup Ready®, para serem tolerantes ao herbicida glifosato, introduzidas a partir da década de 1990. O mercado é dominado pela Monsanto, adquirida pela Bayer em 2018. O glifosato também é amplamente usado em pátios de escolas, paisagismo, parques, jardins e em quintais das residências.

Embora este estudo não tenha analisado os impactos do glifosato na saúde, a pesquisa relacionou o produto químico e formulações como o produto comercial Roundup® a uma série de problemas de saúde. O glifosato é classificado como um provável carcinógeno humano pela Organização Mundial da Saúde e tem sido associado a altas taxas de doenças renais  em comunidades agrícolas e ao encurtamento da gravidez em uma coorte de mulheres no meio-oeste. Outra pesquisa ligou o glifosato e suas formulações como um disruptor endócrino, a danos ao DNA,  diminuição da função do esperma, desordem do microbioma intestinal e doença do fígado gorduroso (nt.: esteatose hepática). No meio ambiente, o glifosato tem sido associado à dizimação das populações de borboletas monarca e ao declínio das abelhas.

Uma série de processos judiciais, em 2019, vinculou o linfoma não-Hodgkin dos demandantes ao uso de Roundup, resultando em mais de US $ 180 milhões em danos punitivos para a Bayer/Monsanto. Neste ano, a Bayer negociou um valor de 10,9 bilhões de dólares como forma de acordo relacionados a um adicional de 95.000 casos, enquanto 30.000 mais ainda estão pendentes.

Desde a década de 1990, a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (nt.: US EPA/Environmental Protection Agency) tem facilitado o aumento da exposição ao glifosato na dieta,  aumentando o limite legal  de resíduos de glifosato em até 300 vezes os níveis anteriores para certos alimentos. O produto químico também está sendo cada vez mais usado em alimentos como trigo, aveia e feijão, pouco antes da colheita, para dessecar uniformemente as safras, um uso que pode levar a altos níveis de resíduos de  glifosato nos alimentos .

“Todos nós temos direito a uma alimentação livre de agrotóxicos venenosos”, disse Kendra Klein, “mas nosso sistema regulatório federal está quebrado e não está nos protegendo. Precisamos urgentemente que nossos líderes eleitos aprovem políticas para tornarem os alimentos orgânicos saudáveis para todos, apoiando os agricultores a mudarem da agricultura intensiva convencional, com agrotóxicos, para uma agricultura orgânica”.

“Durante a pandemia de coronavírus, as injustiças de nosso sistema alimentar tornaram-se cada vez mais claras”, disse Sharyle Patton, diretora do Commonweal Biomonitoring Resources Center e coautora do estudo. “A pesquisa mostra que as comunidades negras correm maior risco de complicações graves e morte por coronavírus, como resultado de já sofrerem de taxas mais altas de doenças relacionadas à dieta. Agora, mais do que nunca, precisamos de políticas públicas que garantam que todas as comunidades tenham acesso a alimentos orgânicos saudáveis”.

Tradução livre, parcial, de Luiz Jacques Saldanha, agosto de 2020.