“Decreto de Bolsonaro tem o DNA do pacote do veneno”, dizem pesquisadores

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Agrotoxico Idec

https://deolhonosruralistas.com.br/2021/10/28/decreto-de-bolsonaro-tem-o-dna-do-pacote-do-veneno-dizem-pesquisadores/

Mariana Franco Ramos

28/10/2021

Alterada sem a participação do Congresso, regulamentação sobre uso e registro de agrotóxicos cancerígenos atende a reivindicações históricas da bancada ruralista; texto se assemelha ao proposto por Blairo Maggi e Tereza Cristina

Decreto Presidencial 10.833/2021, que flexibiliza ainda mais a aprovação de agrotóxicos no país, “incorporou o que há de mais crítico do pacote do veneno”. A conclusão é de 135 pesquisadores e mais de 100 organizações e coletivos da sociedade civil, que assinam uma nota técnica conjunta. Eles destacam, em dezesseis pontos, os graves impactos à saúde humana, ao ambiente e à . Assinado por Jair Bolsonaro no dia 08, sem consulta ao Congresso, o decreto altera a Lei de Agrotóxicos, de 1989, e autoriza substâncias já proibidas nos Estados Unidos e na Europa.

De acordo com Alan Tygel, membro da coordenação nacional da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, o tópico mais nocivo diz respeito ao fim dos critérios proibitivos para registro das substâncias no . “A partir desse decreto, fica autorizado o registro de produtos cancerígenos, que causam má formação fetal, mutação genética e desregulação hormonal”, exemplifica. “Abre-se a possibilidade de aceitar um risco para esses tipos de doença, gravíssimas, e na maior parte das vezes irreversíveis”.

Tygel menciona a falta de transparência e a possibilidade de revalidação de pesticidas vencidos, mediante alteração da data de validade. “A gente vive um governo obscurantista e esse decreto é mais uma demonstração”, opina. Isso porque, lembra, a publicação de várias informações hoje divulgadas em Diário Oficial passará a ser facultativa.

Quais os efeitos dos pesticidas liberados pelo governo? (Foto: Divulgação)

“Algo que não está claro no decreto, mas está nos releases do Ministério da Agricultura, é a possibilidade de produção no Brasil de agrotóxicos não registrados para exportação”, afirma o pesquisador. “A gente poderia, por exemplo, fabricar DDT, que já foi proibido e que pode ainda ser usado em alguns lugares no mundo, e ter fábricas aqui que colocam trabalhadores e comunidades no entorno em risco”.

Na nota técnica, os signatários lembram que o governo vai na contramão do que os mercados consumidores internacionais preocupados com a crise climática têm exigido, que é a busca, cada vez mais, de fornecedores de alimentos livres de agrotóxicos e da destruição de .

PAUTA VOLTOU A SER PRIORIDADE NA GESTÃO DE ARTHUR LIRA

Nos últimos anos, pautas como a liberação de agrotóxicos e a manutenção de isenções para insumos agrícolas avançaram estritamente nos poderes Executivo e Judiciário. A flexibilização no registro e a aprovação dessas substâncias têm batido recordes na gestão da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, ex-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), o braço institucional mais conhecido da bancada ruralista.

Foi ela quem presidiu a Comissão Especial da Câmara que analisou e aprovou, em 2018, o chamado pacote do veneno, de autoria do sojeiro e ex-senador Blairo Maggi (nt.: aqui tem algo muito forte. O Maggi é o maior exportador de para a Noruega. Dele é mais de 80%. Mas ela só aceita certificada e não transgênica. Como pode exportar 300 mil toneladas ‘limpas' para Noruega e por que é tão ‘flexível' para o restante?).

O relator foi Luiz Nishimori (PL-PR), que vendeu durante anos pesticidas no noroeste do Paraná, por meio da empresa Mariagro Agrícola Ltda, hoje em nome de sua mulher, Akemi Nishimori.

Deputado e a mulher Akemi controlam empresa Mariagro. (Foto: Reprodução)

“Eu usei DDT, Parathion e BHC“, recordou-se, durante uma das audiências na comissão, em maio de 2016. “Eu sou dessa época, eu usava. Antigamente, passavam BCH para matar piolho!” Embora esteja juridicamente ativa, a Mariagro não opera mais. Sua sede é usada como escritório político do próprio deputado e já serviu de base regional do PR, antigo partido de Nishimori, como mostrou reportagem do observatório.

A matéria 6299/2002 também já passou pelo Senado. Na época, diversas organizações públicas se posicionaram contra a proposta e quase 2 milhões de pessoas assinaram um manifesto a favor da Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA), prevista por outro PL, o 6.670/2016.

O pacote voltou a ser prioridade da bancada após o governista Arthur Lira (PP-AL) assumir a presidência da Câmara e o deputado Sérgio Souza (MDB-PR) assumir o comando da FPA. “A legislação atual não atrapalha tanto assim, porque a gente está vendo uma enxurrada de registros de agrotóxicos, principalmente a partir do governo Bolsonaro, mas eles precisam de mais facilidades ainda”, diz Alan Tygel.

Segundo ele, alterações referentes aos prazos para registro, gestão da fila de análise e facilidade para alteração de marca de produto formulado, entre outras, possuem o DNA do pacote do veneno. “Vários são os mecanismos para facilitar o trabalho das que produzem agrotóxicos no mundo, especialmente nos países do centro do , que exportam esses produtos para cá”, conta. “Muitos deles são proibidos nesses próprios países onde são fabricados”.

Na avaliação dele, o decreto talvez seja um balão de ensaio, “um teste para ver como a sociedade reage e saber se os ruralistas estão com os caminhos abertos para aprovar o pacote do veneno e destruir de uma vez por todas o marco regulatório no Brasil”.

FPA CHAMA PROPOSTA DE “LEI DO ALIMENTO MAIS SEGURO”

Uma das maiores interessadas na liberação de agrotóxicos e no decreto presidencial em particular, a FPA se manifestou por meio de suas redes sociais. Em resposta a um vídeo do De Olho nos Ruralistas sobre o boletim De Olho na Comida, a frente chamou a flexibilização de “Lei do Mais Seguro”. No post original no Twitter, o observatório lembrava que no prato de todos nós tem veneno. E que a bancada ruralista quer que tenha mais.

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