‘Perturbador’: ingrediente herbicida ligado ao câncer encontrado em 80% das amostras de urina dos EUA

O CDC só recentemente começou a examinar a extensão da exposição humana ao glifosato nos EUA. Fotografia: Benoît Tessier/Reuters

https://www.theguardian.com/us-news/2022/jul/09/weedkiller-glyphosate-cdc-study-urine-samples

Carey Gillam

09 de julho de 2022

Estudo do CDC encontra glifosato, ingrediente controverso encontrado em herbicidas, incluindo a popular marca Roundup, presente em amostras.

Mais de 80% das amostras de urina coletadas de crianças e adultos em um estudo de saúde nos EUA continham um produto químico para matar ervas daninhas ligado ao câncer, uma descoberta que os cientistas chamaram de “perturbadora” e “preocupante”.

O relatório de uma unidade dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) descobriu que de 2.310 amostras de urina, colhidas de um grupo de americanos que pretendiam ser representativos da população dos EUA, 1.885 apresentavam traços detectáveis ​​de glifosato. Este é o ingrediente ativo em herbicidas vendidos em todo o mundo, incluindo a marca Roundup amplamente utilizada. Quase um terço dos participantes eram crianças de seis a 18 anos.

Acadêmicos e pesquisadores privados vêm notando altos níveis do herbicida glifosato em análises de amostras de urina humana há anos. Mas o CDC só recentemente começou a examinar a extensão da exposição humana ao glifosato nos EUA, e seu trabalho ocorre em um momento de crescentes preocupações e controvérsias sobre como os agrotóxicos em alimentos e água, afetam a saúde humana e ambiental.

“Espero que a percepção de que a maioria de nós tem glifosato em nossa urina seja perturbadora para muitas pessoas”, disse Lianne Sheppard, professora do departamento de ciências ambientais e de saúde ocupacional da Universidade de Washington. Graças à nova pesquisa, “sabemos que uma grande fração da população o tem na urina. Muitas pessoas estarão pensando se isso as inclui.”

Sheppard foi coautora de uma análise de 2019 que descobriu que a exposição ao glifosato aumenta o risco de linfoma não-Hodgkin e também foi coautora de um artigo científico de 2019 que revisou 19 estudos documentando o glifosato na urina humana.

Tanto a quantidade quanto a prevalência de glifosato encontrado na urina humana têm aumentado constantemente desde a década de 1990, quando a Monsanto Co. introduziu culturas geneticamente modificadas projetadas para serem pulverizadas diretamente com Roundup, de acordo com pesquisa publicada em 2017 por pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade da Califórnia em San Diego.

Paul Mills, o principal pesquisador desse estudo, disse na época que havia “uma necessidade urgente” de um exame minucioso do impacto na saúde humana do glifosato nos alimentos que as pessoas normalmente consomem.

Mais de 100 mil toneladas de glifosato são usados ​​anualmente pelos agricultores dos EUA em seus campos. O herbicida é pulverizado diretamente sobre culturas geneticamente modificadas, como milho e soja, e também sobre culturas não geneticamente modificadas, como trigo e aveia, como dessecante para secar as culturas antes da colheita. Muitos agricultores também o usam nos campos antes da estação de crescimento, incluindo produtores de espinafre e produtores de amêndoa. É considerado o herbicida mais utilizado na história.

Resíduos de glifosato foram documentados em uma série de alimentos populares feitos com culturas pulverizadas com glifosato, incluindo comida para bebês. A principal via de exposição para crianças é através da alimentação industrializada.

A Monsanto e a empresa que a comprou em 2018, a Bayer, sustentam que os produtos com glifosato e sua marca comercial patenteada, Roundup, são seguros e que resíduos em alimentos e na urina humana não são um risco à saúde.

Eles estão em desacordo com muitos pesquisadores e com a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer, uma unidade da Organização Mundial da Saúde, que classificou o glifosato como um provável carcinógeno humano em 2015.

A Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA) tomou a posição oposta, classificando o glifosato como pouco provável de ser cancerígeno. Mas no mês passado um tribunal federal de apelações emitiu um parecer anulando a determinação de segurança da agência e ordenando que a agência dê “mais consideração” às evidências aos riscos do glifosato.

“Pessoas de todas as idades devem se preocupar, mas estou particularmente preocupado com as crianças”, disse Phil Landrigan, que trabalhou por anos no CDC e na EPA e agora dirige o Programa de Saúde Pública Global e o Bem Comum no Boston College.

“As crianças estão mais expostas aos agrotóxicos do que os adultos porque quilo por quilo eles bebem mais água, comem mais comida e respiram mais ar”, disse Landrigan. “Além disso, as crianças têm muitos anos de vida futura em que podem desenvolver doenças com longos períodos de incubação, como o câncer. Esta é particularmente uma preocupação com o herbicida glifosato.”

Os novos dados do CDC foram divulgados como parte do National Health and Nutrition Examination Survey (NHANES), pesquisa que normalmente é altamente valorizada pelos cientistas.

Cynthia Curl, professora assistente de saúde comunitária e ambiental da Boise State University, disse que é “obviamente preocupante” que uma grande porcentagem da população dos EUA esteja exposta ao glifosato, mas disse que ainda não está claro como isso se traduz na saúde humana (nt.: quem quiser ter uma noção mais clara sobre os efeitos, não aparentes nos organismos humanos, ler essa entrevista no webiste, ou acessar as buscas nas publicações aí contidas).

  • Esta história é co-publicada com The New Lede , um projeto de jornalismo do Environmental Working Group/EWG

CDC – CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION

Tradução livre, parcial, de Luiz Jacques Saldanha, julho de 2022.