A mineração está colocando em risco várias terras indígenas em São Paulo, segundo estudo divulgado ontem (17) pela Comissão Pró-Índio de São Paulo. A partir de uma amostra de nove terras indígenas, a pesquisa traça um panorama das principais formas de pressão exercidas sobre os territórios tradicionais no estado, que tem 29 terras indígenas com algum tipo de reconhecimento governamental. A comissão é uma organização não governamental fundada em 1978 por antropólogos, estudantes e profissionais liberais para defender os interesses indígenas.
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As áreas estudadas totalizam 38,5 mil hectares e abrigam 2,2 mil índios. Além da extração de recursos minerais, ameaçam essas comunidades as obras de infraestrutura, a expansão do turismo e a especulação imobiliária. “Claro que o estudo não dá conta de todos os empreendimentos. Mas o objetivo é chamar a atenção para essa população, que também tem direitos e está sofrendo ameaças”, disse a coordenadora da comissão, Lúcia Andrade.
Em sete das nove terras estudadas existem atividade de mineração em diferentes estágios, alguns em pesquisa inicial, em outros em atuação há algum tempo. Na Terra Indígena Piaçaguera, em Peruíbe, litoral sul, foi concedida uma licença de lavra que abrange 66% da dimensão total da área. Parte do território foi desmatada para extração de areia. Os danos levaram o Ministério Público Federal (MPF) a ajuizar uma ação exigindo a recuperação ambiental da área.
A Piaçaguera abrange duas aldeias com 55 famílias. É um território de 2,8 mil hectares que foi retomado em 1999 e aguarda a demarcação física. “Tem os invasores ainda. Estamos esperando a demarcação física para a gente realmente tomar conta das nossas terras, zelarmos e proibir que cortem árvores, essas coisas”, declarou Catarina dos Santos, umas das lideranças locais.
Catarina explica que o local tem grande valor espiritual para a etnia Tupi-Guarani e foi durante muitos anos um ponto de encontro dos caciques de todo o litoral. “Onde se encontravam os indígenas para conversar, para saber como estavam as comunidades. Era um lugar de discussão”, disse. Além disso, o território vai permitir o contato da comunidade com o mar, que tem um papel importante na religião dos índios. “Dizem que o mar não tem limite. Mas tem um lugar reservado após o mar, que é para aqueles que o cultuam”, completou.
A duplicação da Ferroban, ferrovia sob concessão da ALL América Latina Logística, também é apontada como um dos fatores de pressão sobre as terras indígenas. A via férrea transporta safras de soja e açúcar desde Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo para exportação pelo Porto de Santos. A ferrovia corta a Terra Indígena Tenondé Porã, sul da capital paulista, por 23 quilômetros e passa ao lado da Terra Indígena Rio Branco, em Itanhaém.
Como grande parte dos territórios indígenas está em municípios litorâneos, a construção de condomínios, hotéis e outros empreendimentos ligados ao turismo exercem uma pressão crescente. “Tem várias dessas terras que estão no litoral, então tem a questão do turismo, dos empreendimentos imobiliários. As imagens do satélite mostram claramente as terras indígenas como áreas verdes cercadas de desmatamento”, ressaltou Lúcia Andrade. “Quando a gente vê que as terras ainda estão muito preservadas, isso também é fruto da resistência dos povos indígenas”, acrescentou.
Apesar da importância dessas áreas para preservação da Mata Atlântica, Lúcia destaca que várias estão sendo ameaçadas pelos impactos conjuntos de empreendimentos diversos. “Na Tenondé Porã tem a ferrovia, tem o Rodoanel, e ela é cortada também pelo gaseoduto”, disse. Por isso, ela defende que essas comunidades recebam apoio para manter o modo de vida tradicional nessas áreas. Essa é a expectativa dos índios que vivem na Terra Indígena Piaçaguera . “A gente espera que alguém ajude a gente a replantar novamente. Não vai voltar como antigamente, mas pelo menos vamos conservar o verde”, cobrou Catarina dos Santos.
Edição: Aécio Amado
Reportagem de Daniel Mello, da Agência Brasil.