Estudo sugere presença de microplásticos em placentas humanas

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Embrião

https://portugues.medscape.com/verartigo/6505862

Heidi Splete

20 de janeiro de 2021

Pesquisadores italianos identificaram fragmentos de microplásticos em quatro placentas humanas doadas para pesquisa após o parto.

“A presença de microplásticos no tecido placentário exige a reconsideração do mecanismo imunológico de autotolerância”, segundo Dr. Antonio Ragusa, médico do Ospedale San Giovanni Calibita Fatebenefratelli, na Itália, e colaboradores. “A placenta representa a interface entre o feto e o ambiente.”

Em um estudo piloto observacional publicado no periódico Environment International , os pesquisadores utilizaram a microespectroscopia Raman para analisar placentas de seis mulheres em busca da presença de microplásticos. Microplásticos foram definidos como partículas < 5 mm resultantes da degradação do plástico no ambiente, tais como objetos de plástico, revestimentos, adesivos, tintas e produtos de cuidados pessoais. Dados de estudos anteriores mostraram que os microplásticos podem se mover para organismos vivos, mas este estudo é o primeiro a identificar microplásticos em placentas humanas, disseram os pesquisadores.

Polipropileno e pigmentos foram identificados

Um total de 12 fragmentos de microplásticos foram identificados no tecido das placentas de quatro mulheres: cinco na face fetal, quatro na face materna e três nas membranas corioamnióticas, o que sugere que os microplásticos podem alcançar todos os níveis do tecido placentário, disseram os pesquisadores. A maioria dos microplásticos media aproximadamente 10 milhões de m3, mas dois tinham por volta de 5 milhões de m3.

Todos os 12 microplásticos eram pigmentados; sendo que três foram identificados como tendo coloração de polipropileno e os outros nove continham pigmentos usados em uma variedade de itens, como revestimentos, tintas, adesivos, gesso, esmalte de unha, polímeros, cosméticos e produtos de cuidados pessoais. Os pesquisadores utilizaram um software para analisar os pigmentos e compará-los com informações da European Chemical Agency para identificar o nome comercial, a fórmula química, a nomenclatura atribuida pela International Union of Pure and Applied Chemistry e o Color Index Constitution Number (CICN) .

O mecanismo pelo qual os microplásticos podem entrar na corrente sanguínea e acessar a placenta permanece um mistério, disseram os pesquisadores. “A rota mais provável para os microplásticos é um mecanismo de internalização e transporte de partículas, já descrito como presente no trato gastrointestinal. Uma vez que os microplásticos chegam à superfície materna da placenta, assim como outros materiais exógenos, eles podem invadir o tecido em sua profundidade por meio de diversos mecanismos de transporte, tanto ativos como passivos, que ainda não são bem compreendidos.”

A variação de localização e as características das partículas encontradas no estudo sugerem que a passagem dos microplásticos pela placenta pode ser afetada por condições fisiológicas e genéticas, assim como pelos hábitos alimentares e estilo de vida das pacientes, disseram os pesquisadores.

Os achados do estudo foram limitados por vários fatores, como o pequeno tamanho da amostra e o desenho observacional do estudo.

No entanto, a presença dos microplásticos na placenta pode impactar a gestação de várias formas, inclusive em termos de imunidade, sinalização por fatores de crescimento, comunicação materno-fetal e tráfego de vários tipos e macrófagos, escreveram os pesquisadores. Além disso, os microplásticos podem ter um efeito transgeracional no metabolismo e na reprodução.

“Mais estudos precisam ser realizados para avaliar se a presença de microplásticos na placenta humana pode desencadear respostas imunológicas ou levar à liberação de contaminantes tóxicos, resultando em um perigo para a gestação”, concluíram.

Há motivo para preocupação, mas ainda existem lacunas

“Os microplásticos são onipresentes no ambiente, sendo detectáveis em tecidos de humanos e animais selvagens”, disse a Dra. Andrea C. Gore, Ph.D., da University of Texas, nos Estados Unidos, em uma entrevista. “Até onde sei, isso nunca havia sido demonstrado na placenta.”

“Existem duas razões pelas quais a detecção de microplásticos na placenta seria preocupante”, explicou a Dra. Andrea. “Primeiro, os microplásticos podem ser químicos (DEQs) ou podem conter outros químicos que sejam DEQs. Segundo, o desenvolvimento do feto é particularmente sensível a hormônios naturais, e a disrupção causada pelos DEQs poderia levar a problemas de saúde tanto imediatos como latentes.

“Os médicos devem se preocupar com a presença de matéria particulada na placenta, embora o número de partículas seja muito pequeno”, disse a Dra. Andrea. “De seis mulheres, quatro tinham partículas em suas placentas (total de 12), das quais uma foi confirmada como sendo um plástico (polipropileno). Em relação às outras 11 partículas, apenas os pigmentos puderam ser identificados, então mais estudos são necessários para confirmar se eram plásticos.”

“Se eu fosse um médico discutindo esse artigo com minhas pacientes, eu apontaria que, embora seja preocupante que micropartículas estejam presentes na placenta, poucas foram encontradas, e não se sabe se algum químico é liberado das partículas e se realmente chega à circulação fetal”, disse a Dra. Andrea. “Eu usaria isso como um ponto inicial para uma discussão sobre estilo de vida durante a gestação, encorajando as gestantes a evitarem alimentos armazenados e/ou preparados em recipientes plásticos.”

As limitações do estudo não se resumem apenas o pequeno tamanho da amostra, há também o fato de “os tipos de químicos nos microplásticos serem, em sua maioria, desconhecidos, tornando difícil avaliar quais – se é que algum – podem ser um disruptor endócrino químico”, enfatizou a Dra. Andrea. Além disso, “o estilo de vida e a alimentação podem afetar muito a exposição a produtos químicos, então isso precisa ser cuidadosamente considerado na análise”. Também, “a maioria das partículas detectadas são pigmentos, são as conexões com os plásticos (outras além da única partícula de polipropileno) precisam ser fortalecidas”, explicou.

“As vias pelas quais os microplásticos podem infiltrar os tecidos ainda são um tanto especulativas, e os mecanismos propostos pelos autores (endocitose, difusão paracelular, entrada por vias aéreas) precisam ser demonstrados”, concluiu a Dra. Andrea.

O estudo não recebeu financiamento externo. Tanto a Dra. Andrea como os pesquisadores informaram não ter conflitos de interesses.

FONTE: Ragusa A et al. Environ Int. Publicado em 02 de dezembro de 2020. doi: 10.1016/j.envint.2020.106274.

Esse conteúdo foi originalmente publicado em MDedge  Medscape Professional Network.

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2 Comentários

  1. Bom dia equipe nosso futuro roubado. sou seguidor deste site e tempos.
    Sobre esta matéria gostaria de receber maiores detalhes se possível. Sou Farmacêutico e sempre tive muita preocupação com utilização dos polietilenos e demais polis usados como condutor de medicamentos, refiro-me aos aplicadores de gel vaginal muito comum nos medicamentos ginecológicos, essa matéria vem de encontro a forma de contaminação por esta via. se tiverem algum estudo respeito e se possível gostaria de ter acesso. obrigado.

    1. Bom dia, Diogenes. Como deves ter visto este é um material da página Medscape de onde tiramos alguns textos que estão na nossa agenda. Para teres mais dados sobre o trabalho, sugerimos que procures aprofundar acessando os links destacados no texto para poderes ter o que queres. Grato pela parceria e ficamos felizes por estar contribuindo com outras pessoas na busca de um planeta mais saudável para todos os seres. Felicidades, Luiz Jacques.