No final de 2013 a revista científica Interdisciplinary Toxicology (do Instituto de Farmacologia Experimental da Academia Eslovaca de Ciências) publicou um artigo que coloca em questão a verdadeira origem da chamada doença celíaca – uma doença autoimune, cujos efeitos são precipitados pelo consumo de alimentos contendo glúten. O glúten é uma proteína encontrada em cereais como trigo, cevada, centeio e aveia, e os portadores da doença celíaca devem suprimir da dieta todos os alimentos contendo, sobretudo, trigo e seus derivados (por exemplo, massas em geral).
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POR UM BRASIL ECOLÓGICO,
LIVRE DE TRANSGÊNICOS & AGROTÓXICOS
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Número 668 – 28 de março de 2014
Car@s Amig@s,
Segundo os autores do artigo, intitulado “Glifosato, caminhos para doenças modernas II: doença celíaca e intolerância ao glúten” (traduzido do inglês), a intolerância ao glúten tem crescido de forma epidêmica nos EUA e, a cada vez mais, também no mundo. Estima-se que atualmente cerca de 5% da população dos EUA e da Europa sofram desse mal.
Os sintomas da doença incluem náusea, diarreia, erupções cutâneas, anemia macrocítica e depressão. Trata-se de uma doença multifatorial associada a diversas deficiências nutricionais. Está também relacionada a problemas reprodutivos e ao aumento do risco de desenvolvimento de doenças da tireoide, insuficiência renal e câncer.
Os pesquisadores sugerem que o glifosato, o ingrediente ativo do herbicida Roundup, pode ser o principal fator causador dessa epidemia.
Um estudo recente relatado no artigo demonstrou que peixes expostos ao glifosato desenvolvem problemas digestivos semelhantes à doença celíaca. Segundo os autores, a doença celíaca está associada a desequilíbrios em bactérias do intestino que podem ser completamente explicadas pelos efeitos conhecidos do glifosato sobre as bactérias do intestino.
Características da doença celíaca incluem a diminuição de muitas enzimas citocromo P450, que atuam na desintoxicação de toxinas ambientais, na ativação da vitamina D3, na catabolização da vitamina A e na manutenção da produção dos ácidos biliares e de fontes de sulfato para o intestino.
E, segundo apontam os autores do estudo, o glifosato é conhecido por inibir as enzimas citocromo P450. Também as deficiências em ferro, cobalto, molibdênio, cobre e outros metais raros associadas à doença celíaca podem ser atribuídas à forte habilidade do glifosato de quelar esses elementos. Da mesma forma, deficiências em triptofano, tirosina, metionina e selenometionina associadas à doença celíaca correspondem à conhecida capacidade do glifosato de esgotar esses aminoácidos.
Os pesquisadores ressaltam ainda que portadores da doença celíaca têm maior risco de desenvolver Linfoma Não Hodgkin, doença que também tem sido associada à exposição ao glifosato. Além disso, argumentam, problemas reprodutivos associados à doença celíaca, tais como infertilidade, abortos e o nascimento de bebês com malformações, podem ser explicados pelo glifosato.
Os pesquisadores relatam então que resíduos de glifosato no trigo e em outras culturas tem crescido significativamente nos últimos anos devido à prática da dessecação das lavouras com o veneno para facilitar a colheita, o que tem aumentado a exposição da população ao veneno através da alimentação. Chamam ainda a atenção para o fato de que, desde 2001, o uso do glifosato na agricultura aumentou exponencialmente em função da difusão das lavouras transgênicas Roundup Ready, tolerantes à aplicação do produto. O veneno é hoje o herbicida mais utilizado no mundo, sobretudo em função de sua suposta baixa toxicidade e do preço que se tornou baixo depois que a patente do produto expirou e marcas genéricas passaram a ser comercializadas.
Em suma, os autores do artigo desenvolvem e fundamentam o argumento de que o alarmante aumento da incidência da doença celíaca nos EUA e no resto do mundo nos anos recentes é devido ao aumento no uso de herbicidas na agricultura e, em especial, ao aumento da exposição da população ao glifosato através dos resíduos presentes nos alimentos.
Eles concluem com um apelo aos governos para que revejam suas políticas com relação à segurança dos resíduos de glifosato nos alimentos.
Leia o artigo na íntegra, em inglês:
SAMSEL, Anthony., SENEFF, Stephanie. Glyphosate, pathways to modern diseases II: Celiac sprue and gluten intolerance. Interdisciplinary Toxicology. Interdiscip Toxicol. 2013; Vol. 6(4): 159–184.
GLIFOSATO E SUA PRESENÇA NO MUNDO
1. Ministério Público quer proibir uso do glifosato
Ministério Público no Distrito Federal (MPF/DF) acionou a Justiça pedindo a suspensão do uso do glifosato – o herbicida mais utilizado no Brasil. Além dele, a procuradoria quer impugnar ainda o 2,4-D e os princípios ativos: parationa metílica, lactofem, forato, carbofurano, abamectina, tiram e paraquate.
São duas ações protocoladas. “A primeira medida visa obrigar a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a reavaliar a toxidade de oito ingredientes ativos suspeitos de causar danos à saúde humana e ao meio ambiente. Em outra frente, o órgão questiona o registro de agrotóxicos que contenham o herbicida 2,4-D, aplicado para combater ervas daninhas de folha larga”, explica o MP em seu site.
Nas duas ações é solicitada a antecipação de tutela. A procuradoria pede a concessão de liminar para que o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) suspenda o registro dos produtos até a conclusão definitiva sobre sua toxidade pela Anvisa.
Na ação civil que contesta o registro do herbicida 2,4-D, o MP pede que a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) seja proibida de liberar a comercialização de sementes transgênicas resistentes à substância até um posicionamento definitivo por parte da Anvisa.
“Se for mantida a mesma proporção de resultado das avaliações anteriores, presumivelmente, cerca de dois terços (dos ingredientes impugnados na ação do MPF) também serão banidos do país por demonstrarem alto risco e grau de toxidade”, justifica o órgão na ação civil.
Agrolink, 25/03/2014.
2. Sri Lanka proíbe glifosato após publicação de estudo relacionando o veneno ao desenvolvimento de doença renal fatal
O governo do Sri Lanka proibiu a comercialização e o uso do glifosato, ingrediente ativo do Roundup, da Monsanto, o herbicida mais vendido no mundo. A decisão foi tomada algumas semanas após a publicação de novo estudo que sugere que o produto é o principal responsável pela disseminação de uma doença renal que já matou dezenas de milhares de trabalhadores rurais na América Central, no Sri Lanka e na Índia.
Embora não se baseie em experimentos, o estudo desenvolve e detalha a teoria de que o uso de glifosato em áreas onde existem metais pesados na água utilizada para o consumo humano é o que está causando a doença crônica.
Channa Jayasumana, o autor do estudo, afirma que o glifosato, que forma fortes ligações químicas com metais pesados, entra em compostos que persistem na água potável até se quebrarem nos rins das pessoas. Segundo ele, essa combinação de metais pesados e Roundup ou outros herbicidas a base de glifosato está colocando a população em risco.
Jayasumana afirma que a Monsanto falhou em sua obrigação de alertar o público quanto aos riscos do glifosato quando utilizado em áreas com “água pesada”. “O glifosato foi originalmente patenteado como um agente quelante – uma substância útil por sua capacidade de formar fortes ligações químicas com metais –, então a Monsanto estava ciente dessa propriedade do produto”, disse.
Outras evidências
Estudos oficiais no Sri Lanka encontraram metais pesados e agrotóxicos, incluindo o glifosato, nas áreas afetadas pela doença, e também em amostras de urina dos pacientes. Um estudo publicado em agosto último por funcionários do Ministério da Saúde do país em parceria com a Organização Mundial de Saúde mostrou que amostras de urina de pacientes doentes tinham elevados níveis de cádmio, e que 65% das amostras de urina desses pacientes tinham também traços de glifosato.
Em El Salvador traços de metais pesados também foram identificados em comunidades afetadas pela doença, e o glifosato é largamente utilizado no país. Carlos Orantes, diretor do programa nacional de pesquisa de El Salvador sobre a epidemia, declarou que sua equipe está trabalhando no desenvolvimento de um mapa das áreas com “água pesada” dentro das fronteiras do país. “Nosso princípio básico é o de proteger vidas humanas”, disse Orantes, que propõe o banimento de agrotóxicos em El Salvador, incluindo o glifosato.
A decisão deste mês foi a medida mais drástica tomada até agora pelo governo do Sri Lanka para combater a doença. Em setembro último o parlamento de El Salvador aprovou a proibição de dezenas de agrotóxicos, incluindo o glifosato, mas o projeto ainda não foi convertido em lei.
Extraído e adaptado de: Sri Lanka bans Monsanto herbicide citing potential link to deadly kidney disease –The Center for Public Integrity, 19/03/2014.