Dezenas de milhares de zapatistas ocupam pacificamente e em ensurdecedor silêncio cinco cidades chiapenecas.

No dia 17 de novembro de 2012, o sítio Enlace Zapatista anunciava o pronunciamento próximo da comandância geral, da comissão sexta e da zezta internacional do Exército Zapatista de Libertação Nacional. Esperava-se algum comunicado, mas poucos imaginavam o que realmente aconteceu.

 

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A reportagem está publicada no sítio mexicano DesInformémonos, 23-12-2012. A tradução é do Cepat.

Em uma ação massiva, disciplinada e simultânea, não vista desde os dias do levantamento insurgente de 1994, dezenas de milhares de zapatistas ocuparam pacificamente e num silêncio ensurdecedor cinco cidades chiapanecas. Horas mais tarde, leram um breve comunicado.

Dezenas de milhares de bases de apoio do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) ocuparam, em emblemático silêncio, as ruas de cinco municípios de Chiapas, na primeira manifestação pública que os zapatistas fazem desde o dia 07 de maio de 2011, quando se uniram à convocatória do Movimento pela Paz com e Dignidade. Esta ação simultânea e massiva, a maior de toda a sua história, foi precedida pelo anúncio de que a organização indígena daria sua palavra, publicada horas depois da mobilização.

“A quem possa interessar. Ouviram? É o estrondo de seu mundo caindo. É o nosso ressurgindo. O dia que foi o dia, era noite. E noite será o dia que será o dia”, foi a mensagem assinada pelo Subcomandante Marcos e divulgado horas depois através do sítio Enlace Zapatista.

Em cada uma das cidades ocupadas (Ocosingo, Las Margaritas, Palenque, Altamirano e San Cristóbal), os tzeltales, tzotziles, ch’oles, tojolabales, zoques, mames e mestiços marcharam com seus tradicionais lenços e passa-montanhas, em filas e em estrito silêncio. Homens e mulheres, jovens em sua maioria, passaram sobre um templete em cada cidade e levantaram o punho. Essa foi a expressão mais simbólica de toda a mobilização.

Força, disciplina, extraordinária ordem, dignidade, inteireza, coesão. Não é pouco. São 19 anos nos quais uma infinidade de vezes foram dados como mortos, divididos e isolados. Uma e outra vez saem para dizer “aqui estamos”. Hoje, com 40.000 zapatistas nas ruas, novamente silenciaram, de uma só vez, os boatos infundados.

Em San Cristóbal de las Casas, cidade onde tradicionalmente são feitas as manifestações do EZLN fora de seu território, mais de 20.000 homens e mulheres zapatistas procedentes do caracol de Oventik, onde se concentraram desde o dia anterior, desfilaram sob uma chuva que começou na madrugada. A marcha de 28 destacamentos (de acordo com a numeração que os grupos traziam em seus passa-montanhas) iniciou nos arredores da cidade, aproximadamente às 8h30, e às 12h a retaguarda ainda estava muito longe do centro. A praça foi muito pequena para receber a todos eles.

Moradores e turistas lançaram gritos de apoio e cantaram o hino zapatista em alguns trechos da passeata. O comércio, como de costume, fechou as portas, pois novamente os índios o surpreenderam. O templete se situou à frente da catedral, enquanto que os ordenados blocos de zapatistas se situaram ao redor da zona central da cidade.

Em Palenque, antiga cidade ch’ol e um dos centros turísticos mais importantes do Estado, os indígenas zapatistas entraram pela avenida principal do povoado e realizaram o gesto do punho ao alto sobre o templete colocado no centro da cidade, em frente à igreja. Posteriormente, saíram pela rua Chiapas para retornar às suas comunidades.

Em Las Margaritas, os zapatistas repetiram a dinâmica com 7.000 bases de apoio, enquanto que em Ocosingo – povoado também tomado pelos insurgentes em 1º de janeiro de 1994, onde aconteceu o massacre de civis por parte do exército federal nos primeiros dias da guerra – mais de 6.000 bases de apoio desenvolveram a ação a partir das 6h da manhã; acontece que outros cerca de 8.000 zapatistas permaneceram no caracol de La Garrucha por falta de transporte. Não se haviam concentrado tantos zapatistas nesta localidade desde os sangrentos combates do levantamento indígena.

Os símbolos são muitos, pois escolheram o último dia do ciclo maia, que para muitos seria “o fim do mundo” e para outros o início de uma nova era, a mudança de pele, a renovação. Durante estes 19 anos o percurso da luta zapatista esteve cheio de simbolismos e profecias, e nessa ocasião não seria diferente.

Desde o anúncio de que proximamente a comandância geral do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) daria sua palavra, a expectativa em relação ao conteúdo de sua mensagem foi crescendo. Na sexta-feira, no entanto, o que se ouviu foram seus passos, seu caminhar silencioso percorrendo cinco praças, seu andar digno e rebelde pelas ruas e seu punho ao alto.

A última vez que o Subcomandante Marcos, chefe militar e porta-voz zapatista, falou foi no intercâmbio epistolar com o filósofo Luis Villoro, no dia 7 de dezembro de 2011. E a iniciativa política mais recente foi o Festival da Digna Raiva, para o qual convocaram as lutas e os movimentos do México e do mundo, em dezembro de 2008.

Nessa sexta-feira, não se apresentaram os membros do Comitê Clandestino Revolucionário Indígena, como em maio de 2011, que foi a última vez em que foram vistos Tacho, Zebedeo, Esther, Hortencia, David e o resto da comandância geral, com exceção do Subcomandante Marcos, que se manteve afastado da cena pública.