Costa Rica poderia inspirar Brasil no setor ambiental.

Enquanto o governo se gaba das credenciais ambientais do Brasil para sediar a conferência Rio +20, o czar da das Nações Unidas, o paulista Bráulio Dias, propõe humildade: o país deveria se inspirar na Costa Rica para resolver as contradições entre ambiente e desenvolvimentismo.

 

http://www.ihu.unisinos.br/noticias/507670-costaricapoderiainspirarbrasilnosetorambiental

 

A entrevista é de Cláudio Angelo e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 20-03-2012.

Dias deixou em fevereiro o posto de secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente para assumir a secretaria-executiva da Convenção da Diversidade Biológica da ONU, em Montreal.

Segundo ele, a Costa Rica conseguiu triplicar o seu PIB e dobrar sua área de florestas mudando suas políticas. “Falta ao Brasil conseguir fazer essa virada.”

Embora tenha evitado criticar diretamente políticas ambientais do governo Dilma, como a Medida Provisória que reduz sete parques na Amazônia para acomodar , Dias afirma que “o fato de ser energia renovável não quer dizer que esteja sendo feito da maneira mais sustentável possível”.

Segundo ele, o país tem condições de gerar energia sem mexer em suas florestas.

Eis a entrevista.

A Rio+20 não vai tratar de biodiversidade. É uma oportunidade perdida?

Houve uma decisão, que eu entendo consciente, de que aqueles grandes temas ambientais que já têm fórum próprio, como a Convenção da Diversidade Biológica, não necessitariam de atenção especial nessa conferência. A convenção vem de um resultado bem-sucedido na última conferência, a COP-10 [em Nagoya, Japão, em 2010], em que foi aprovado um plano estratégico para 2011-2020 com 20 metas globais.

A agenda internacional de biodiversidade está dada. E conseguimos fechar o Protocolo de Nagoya sobre recursos genéticos, resultado do mandato da conferência de Johannesburgo, em 2002. É um exemplo de como uma conferência de caráter mais geral pode ter impacto numa agenda temática específica.

Qual é a previsão de entrada em vigor do protocolo?

Ele precisa de 50 ratificações. Hoje já temos três ratificações e 90 e poucos países que assinaram cartas de compromisso, o Brasil foi um dos primeiros. Mas os países precisam remeter isso a seus Congressos nacionais, o que pode demorar alguns anos.

A ideia é usar a Rio +20 para impulsionar a ratificação?

Isso, é uma chamada, uma pressão política.

De que jeito?

Através de declarações dos países e de uma menção no texto da conferência da necessidade de uma renovação do compromisso dos países pela ratificação do protocolo. E isso vários países estão colocando, o que é muito bom.

A COP-11, este ano, na Índia, vai tratar majoritariamente de dinheiro. Existe um risco de a discussão naufragar?

Existe, e essa é uma das minhas maiores preocupações como secretário-executivo. Em Nagoya, a discussão foi muito difícil, as delegações chegaram com muitas desconfianças, os europeus queriam garantir a necessidade de envolver o setor privado, aí os países da Alba [aliança liderada pela Venezuela] reagiram e houve um impasse.

Como o Brasil está nessa questão de dinheiro em relação a outros países do seu porte?

Gasta-se cerca de meio bilhão de reais por ano no Brasil em unidades de conservação em todos os níveis – União, Estados, municípios – e estima-se que, para implementar eficazmente todas as unidades, seria necessário pelo menos o dobro. O Brasil ainda não definiu seu nível de compromisso porque estamos no meio da discussão da revisão da estratégia nacional de biodiversidade.

De que jeito a discussão do Código Florestal pode atrapalhar esse debate?

Há conflitos de interesse reais, que dificultam você chegar a uma estratégia nacional. Ouvimos setores desenvolvimentistas, lideranças mais dispostas a conversar, sabendo que a médio e longo prazo é preciso caminhar nessa direção, até mesmo para o sucesso do setor desenvolvimentista: você pode criar barreiras para a exportação dos produtos que degradem a natureza.

O sr., como brasileiro que agora dirige um organismo internacional, tem sentido pressões em relação ao Código Florestal?

Há preocupações em toda parte lá fora. O Brasil é vitrine nessa área. Se nos anos 1980 o Brasil só era olhado como vilão, mais recentemente é visto também como modelo para alcançar um desenvolvimento mais sustentável. Está todo mundo de olho para ver se não vai haver retrocessos.

O Brasil, no primeiro ano de governo Dilma, não criou nenhuma área protegida e baixou uma Medida Provisória determinando a redução de sete áreas na Amazônia para acomodar hidrelétricas. Como o sr. enxerga isso?

Não me cabe ficar comentando política interna de país nenhum. Obviamente nos preocupa toda essa dificuldade, esses embates no mundo inteiro entre interesses desenvolvimentistas de curto prazo e objetivos de .

Existem alguns países que conseguiram fazer uma virada. A Costa Rica é um deles. Aconteceram avanços lá porque foram tomadas medidas não só na esfera ambiental mas num âmbito de políticas públicas em geral, especialmente em instrumentos econômicos. E a Costa Rica conseguiu praticamente dobrar sua área florestal. Ao mesmo tempo, a renda per capita do país triplicou.

O sr. está dizendo que o Brasil tem condições de gerar energia sem mexer em floresta?

Eu acredito que sim, que o Brasil tem condição de ampliar o fornecimento de energia, ampliar os esforços de desenvolvimento e ao mesmo tempo conseguir conservar o que ele tem de patrimônio natural. O que falta talvez ao Brasil é conseguir fazer essa virada, como na Costa Rica.

Do ponto de vista das metas de Nagoya, é inconsistente o Brasil reduzir áreas protegidas para fazer hidrelétricas?

Cada país tem de tomar suas decisões sobre matriz energética. O Brasil é tido como um dos países com matriz energética mais renovável entre as grandes economias porque usa mais hidrelétricas, lenha, biocombustível. Agora, o fato de ser energia renovável não quer dizer que esteja sendo feito da maneira mais sustentável possível.

1 comentário

  1. Só podia ser obra do querido jaques Isso.

    Maravilha gente pensando dessa forma.

    Abraço