
Imagem do satélite NASA Landsat mostrando a região amazônica onde ocorreu a atividade, segundo o IBAMA.
19 de janeiro de 2022
- Produtos químicos criados para matar ‘pragas agrícolas’ (nt.: ressalva da tradução – já que, pelos estudos ecológicos atuais, há comprovação de que não há pragas, mas alimento -PANCs- ou bioindicadores, assim expressão parece estar equivocada) estão sendo pulverizados por aeronaves em áreas de floresta nativa.
- O glifosato e o 2,4-D, entre outros, fazem com que as árvores se desfolhem e acabem enfraquecidas ou mortas em um processo que leva meses. Os próximos criminosos removem as árvores restantes com mais facilidade e jogam sementes de capim de avião, consolidando o desmatamento.
- A agência ambiental do Brasil, IBAMA, descobriu que, além dos grileiros, os pecuaristas usam o método para contornar os esforços de monitoramento florestal.
Agrotóxicos são lançados de aviões e até helicópteros com o objetivo de fugir do IBAMA, a agência ambiental brasileira, há anos, como um método para limpar áreas remotas e de difícil acesso da floresta amazônica. Essa prática – usada com mais frequência desde 2018 – leva mais tempo do que o desmatamento raso (a remoção de toda a vegetação existente usando maquinário pesado). Por outro lado, o uso de agrotóxicos não pode ser detectado por meio de imagens de satélite em tempo real.
Segundo o IBAMA, alguns agrotóxicos funcionam como desfolhantes. A dispersão desses produtos químicos sobre a mata nativa é o estágio inicial do desmatamento, causando a morte das folhas – e de boa parte das árvores. O material é queimado e as árvores sobreviventes são removidas com motosserras e tratores.
“Embora a degradação florestal induzida pelo homem leve alguns anos para acontecer, o processo é vantajoso para os criminosos porque as chances de ser pego são muito baixas. Só podemos ver os danos quando a clareira já está formada”, observa um funcionário do IBAMA que falou com a Mongabay sob condição de anonimato. “Uma floresta morta é mais fácil de remover do que uma viva. Certos (nem todos) agrotóxicos praticamente deixam apenas grandes árvores em pé.”

Agente do IBAMA ao lado de vasos vazios encontrados no solo da fazenda. Além do uso criminoso de agrotóxicos pulverizados na mata nativa, a má gestão desses recipientes representa um risco ao meio ambiente e aos seres vivos. Imagem cortesia do IBAMA.

Os recipientes eram do herbicida Planador XT, aplicado de helicóptero para matar a vegetação. Quando a floresta está morta, as folhas caem e o desmatamento fica mais fácil de ser feito por trator ou motosserra. Imagem cortesia do IBAMA.
Na etapa seguinte, os infratores lançam sementes de capim de avião. “Esta é a grande moeda de troca para a grilagem de terras. Para que a terra ilegal seja vendida como ‘fazenda em formação’, o solo deve ser coberto com grama”, acrescentou o agente.
Glifosato, carbosulfan (proibido na pulverização aérea) e 2,4-D (componente do Agente Laranja, usado massivamente na Guerra do Vietnã e que ainda resulta em casos de defeitos congênitos no país) foram alguns dos agrotóxicos encontrados pelos ambientalistas em clareiras no Arco do Desmatamento (área da Amazônia Legal onde a fronteira agrícola avança em direção à floresta), segundo levantamento da Repórter Brasil e da Agência Pública.
“Provocar a degradação florestal por meio de agrotóxicos é uma grande agressão ao meio ambiente. O herbicida 2,4-D, por exemplo, é capaz de matar grandes árvores, e o inseticida carbosulfan é altamente tóxico. Os animais comem folhas e frutos envenenados da floresta [enquanto a vegetação morre]. E é muito perigoso para quem está por perto quando os venenos são jogados”, disse Eduardo Malta, biólogo da ONG Instituto Socioambiental (ISA), em entrevista à Mongabay.
Em um vídeo do IBAMA enviado à Mongabay, dois fiscais mostram uma propriedade rural na qual detectaram, durante um sobrevoo, uma área de cerca de dois hectares com vegetação seca e acastanhada. Ao desembarcar no local, encontraram dezenas de galões vazios do herbicida Planador XT – que havia sido despejado na área de helicóptero a mando do proprietário.
“Apesar de esse produto estar autorizado a ser aplicado por aeronaves agrícolas, seu uso é proibido em matas nativas”, afirma um dos agentes do Ibama no vídeo. “Além disso, os recipientes [jogados no solo] não foram lavados ou descartados adequadamente, e as chuvas podem acabar transportando os resíduos. Adultos, filhos [de trabalhadores rurais] e animais vivem no local. Todo mundo tem sua saúde colocada em risco.”
L
Um vídeo sobrevoado do IBAMA mostra a diferença entre a vegetação queimada por agrotóxicos e o restante da mata nativa. A propriedade está localizada na Landá Indígena Apyterewa.
Vídeo cortesia do IBAMA
Fazendas de gado comprando agrotóxicos – para quê?
Como mostra o vídeo do IBAMA, não só os grileiros liberam agrotóxicos para desmatar, mas os agricultores também o fazem em suas próprias propriedades. Diante do aumento do número de casos, o IBAMA passou a mapear essas áreas por meio do sistema de alerta de degradação florestal do INPE (Agência Espacial Brasileira). Ao cruzar os dados, o órgão ambiental constatou que muitas das clareiras estavam localizadas em fazendas que compravam agrotóxicos, principalmente no estado de Mato Grosso.
Tais propriedades, no entanto, eram fazendas de gado e não agrícolas, então não fazia sentido comprar esses produtos.
“Os criminosos perceberam que a degradação florestal não era nossa prioridade porque só chegamos a esses locais muito mais tarde, quando as clareiras já estavam formadas. Então eles começaram a praticar mais desses”, disse o representante do IBAMA à Mongabay. “A verdade é que estávamos mais focados no combate ao desmatamento raso devido ao aumento das taxas nos últimos anos. Foi um aprendizado para nós.”
O número reduzido de agentes de campo para cobrir todos os seis biomas brasileiros, e não apenas na área de desmatamento, é um grande problema. Em 2019 eram apenas 591, o que é 55% menor que em 2010 (quando era 1.311).
2010 foi o último ano em que o IBAMA abriu novas vagas para agentes de fiscalização.
“É lamentável a irresponsabilidade dessas pessoas com a vida humana e com o meio ambiente. Os agrotóxicos não foram feitos para esse fim, não há estudos científicos sobre as consequências do despejo desses produtos na mata nativa e os efeitos sobre os seres vivos, a água e o solo”, disse o agente. “Além do IBAMA, a Embrapa [empresa pública de pesquisa agropecuária vinculada ao Ministério da Agricultura] e o Ministério do Meio Ambiente, entre outros, devem participar do esforço de conscientização e educação dos produtores rurais e da população. A agência sozinha nesta batalha é uma luta inglória.”
[NOTA DO WEBSITE: agregamos essas imagens abaixo para se ter mais uma noção do que representa o uso totalmente equivocado das regiões da Amazônia e do Cerrado com a derrubada e o desprezo pela vegetação e a biodiversidade originárias.]

Pode-se ver na imagem, a tropa de animais, todos brancos, provavelmente da raça zebuína Nelore. Pode-se ver já a erosão do arroio que corta o pasto, bem como da degradação pela pata dos animais, com o início de formação de vossoroca pela erosão, na região à direita acima na imagem. Lastimável!

E ainda tem autoridade que diz que sendo uma floresta úmida, ‘ela não queima’. Esses pontos vermelhos e essa fumaceira, seriam o quê?
Tradução livre, parcial, de Luiz Jacques Saldanha, janeiro de 2022.