Agronegócio já avançou sobre 60% de Terra Indígena no Paraná, mostra estudo

É cada vez mais escandalosa a violência com que a ganância do supremacismo branco eurocêntrico, dramaticamente presente na doutrina da colonialidade, grassa pelos estados do sul do Brasil, fortemente no oeste gaúcho, catarinense e paranaense.

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ClimaInfo, 28 de abril de 2023.

Cercado por grandes plantações de soja e de milho – algumas delas a apenas dois metros de suas casas –, o Povo Avá-Guarani, da Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá, no oeste do Paraná, não consegue desenvolver suas atividades tradicionais de subsistência. Os animais que criam são mortos pelos agrotóxicos aplicados nesses cultivos. Sem ter o que comer, muitas famílias indígenas só conseguem sobreviver dos restos de alimentos que recolhem em um lixão da cidade de Guaíra.

A trágica cena ilustra um efeito da falta de demarcação de territórios indígenas. Sem esse direito garantido, os Avá-Guarani estão vendo 60% da terra que reivindicam ser dominada pelo . É o que mostra um estudo realizado pela Comissão Guarani Yvyrupa, que reúne comunidades Guarani de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, relata a colunista Mônica Bergamo, da Folha.

Segundo o levantamento, os indígenas dispõem de apenas 1,13% da TI Tekoha Guasu Guavirá. Com 24 mil hectares nos municípios de Guaíra, Terra Roxa e Altônia, o território foi reconhecido em 2018 pela FUNAI, mas o processo foi anulado sob o governo do inominável. Na última semana, a FUNAI reverteu a anulação, mas o processo de demarcação segue suspenso por decisões liminares da Justiça Federal.

“São frequentes os momentos em que famílias Avá-Guarani passam fome ou estão na iminência de situações de fome”, diz o estudo. “Importa perguntar, afinal, por que há famílias passando fome em uma região onde predomina o moderno agronegócio, este que promete alimentar o mundo”, segue.

Não bastasse a soja e o milho, a TI Tekoha Guasu Guavirá agora é ameaçada por outro cultivo: o eucalipto. A monocultura estaria ocupando 680 hectares do território. É um avanço considerado expressivo em relação a 2010, quando esse tipo de plantação ainda não havia adentrado os limites do território de forma significativa, informa o Valor.

Se a demarcação é uma necessidade do presente – e urgente –, é preciso também prestar contas com o passado. Assim, indígenas defendem a criação da Comissão Nacional Indígena da Verdade, conta a Agência Pública, para expor o que sofreram durante a ditadura. Em 2014, analisando apenas dez povos, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) apontou que ao menos 8.350 indígenas foram mortos no período, e sugeriu que essas violações fossem melhor apuradas por uma nova comissão. No ano passado, o Ministério Público Federal (MPF) expediu nota técnica defendendo a instauração dessa nova instância.

“Nós, indígenas, conhecemos o nosso passado justamente para saber aonde a gente quer chegar. Mas muitas vezes os fatos são tão invisibilizados, não é que são invisíveis, mas são invisibilizados propositalmente para que a gente não consiga requerer no futuro o que a Comissão [Nacional da Verdade] recomenda. Tanto o reconhecimento histórico dessa violação de direitos mas também o que mais as pessoas temem, que é a reparação, inclusive com indenizações”, afirmou a presidenta da FUNAI, Joênia Wapichana.

Em tempo: Indígenas do Povo Xokleng são alvo de ameaças de morte, agressões físicas e verbais e racismo em Rio do Oeste, cidade na região sudeste de Santa Catarina. E as ameaças são inflamadas pela prefeitura e outras autoridades do município, mostram documentos do Ministério Público Federal (MPF) e da FUNAI aos quais a Agência Pública teve acesso. Desde 22 de fevereiro, os indígenas estavam acampados no Parque Municipal Gruta do Tigre, área de menos de 1 hectare de remanescente de Mata Atlântica nos arredores da cidade com sítios arqueológicos onde foram encontradas ossadas do povo Xokleng. Eles contestam a exposição das ossadas de seus ancestrais como ponto turístico e reivindicam a criação de uma aldeia no local. O acampamento, porém, foi encerrado na terça (25/4) com a determinação de reintegração de posse pela 1ª Vara da Justiça Federal de Rio do Sul em favor da prefeitura de Rio do Oeste. A operação foi realizada pelas polícias Federal e Militar, acompanhadas pela FUNAI, que pediu a suspensão da reintegração de posse. Segundo o recurso da FUNAI à Justiça, a comunidade indígena viveu um “clima de terror” durante os dois meses em que os cerca de 25 indígenas passaram acampados.