A agroecologia ocupa um lugar central na agenda global para transformar a agricultura e os sistemas alimentares

https://www.iatp.org/agroecology-takes-center-stage-global-agenda-transforming-agriculture-and-food-systems

Shiny Varghese

16 de junho de 2022

O que é agroecologia e como ela pode fornecer soluções para crises que assolam nossos sistemas alimentares e criam democracias alimentares?

Introdução 

Fundado em meio à crise da agricultura familiar de meados da década de 1980, o Instituto de Política Agrícola e Comercial (IATP/Institute for Agriculture & Trade Policy) tem uma história de 35 anos de trabalho em soluções que beneficiam agricultores familiares, comunidades rurais e nosso planeta. Em busca de realizar a visão do IATP quanto agricultura, comércio e sistemas alimentares que são bons para todas as pessoas envolvidas em sistemas alimentares (especialmente agricultores e trabalhadores do sistema alimentar), ecossistemas e justiça ambiental globalmente, buscamos soluções de ponta por meio de pesquisa e ação em coalizão com organizações parceiras.  

Aplicamos uma abordagem sistêmica para analisarmos e abordarmos os problemas inoportunos e interconectados dos sistemas alimentares industrializados, sendo aqui que entra a agroecologia.

A agroecologia, com suas raízes no conhecimento tradicional das comunidades produtoras de alimentos, surgiu como um conjunto de práticas baseadas em princípios que orientam como produzir alimentos de forma sustentável, bem como como gerenciar as relações sociais que regem a produção, processamento, troca e gestão de resíduos de alimentos de forma justa.  

Desde 2020, os preços dos alimentos aumentaram após interrupções na cadeia de suprimentos relacionadas ao COVID-19, bem como desastres climáticos, como seca, geada, incêndios e inundações em vários países, entre outros fatores. No início de 2022, a guerra na Ucrânia resultou em um aumento sem precedentes nos preços dos alimentos. De fato, o índice global de preços de alimentos da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO/Food and Agriculture Organization)  atingiu seu nível mais alto em março. Essas sucessivas crises demonstram que nossos sistemas alimentares e agrícolas são extremamente vulneráveis ​​a choques: daí devermos investir na construção de sua resiliência. Assim, diversidade de conhecimento, recursos genéticos e sistemas alimentares que promovam os direitos humanos são necessários para construção dessa resiliência.

Nesta sessão de perguntas e respostas, nos aprofundamos na definição de agroecologia, examinando seus princípios e elementos, bem como sua história e seu desenvolvimento de como a conhecemos hoje. Comparamos e contrastamos modelos de agricultura industrial, regenerativa e orgânica com a agroecologia. Além disso, analisamos como e onde a agroecologia está florescendo em todo o mundo e os mercados, acordos comerciais e investimentos que devem ser implementados para promoverem transformações agroecológicas para ajudar a construir resiliência em nossos sistemas alimentares e agrícolas.

Visão geral da agroecologia

1. O que é agroecologia?

Como abordagem, a agroecologia é fundamentalmente diferente de outras abordagens para a agricultura e o desenvolvimento de sistemas alimentares e representa um paradigma alternativo em contraste direto com as abordagens agrícolas industriais . A agroecologia integra o conhecimento transdisciplinar, as práticas dos produtores e consumidores de alimentos, bem como as prioridades dos movimentos sociais, reconhecendo sua mútua dependência. Enquanto o atual sistema industrializado é extrativista e explorador, a agroecologia reconhece a interdependência dos sistemas vivos e honra os princípios de equilíbrio, diversidade, harmonia e respeito. A agroecologia permite criativamente que os envolvidos nos sistemas alimentares se conectem e resolvam problemas específicos de suas situações únicas. 

Esta visão transformadora é necessária para realizar transições de sistemas alimentares justos e sustentáveis ​​1  – da produção ao consumo e à gestão de resíduos – para garantir a segurança alimentar local e regional em todo o mundo, ao mesmo tempo em que constrói resiliência ecológica, social e econômica enraizada no respeito mútuo para várias tradições alimentares culturais de membros da comunidade local.

2. Por que o IATP trabalha e defende a agroecologia?  

O IATP apoia a agroecologia na medida em que as comunidades produtoras de alimentos combinam seletivamente práticas tradicionais e modernas para abordarem aspectos relevantes sobre equidade, paridade, diversificação agrícola, produtividade e segurança alimentar para construírem a resiliência ecológica, social e econômica das comunidades. Com uma longa história de trabalho em comércio internacional e políticas relacionadas a investimentos no contexto da agricultura, o IATP está posicionado de forma única para integrar nossa análise comercial à defesa da agroecológica, com foco no fortalecimento de mercados territoriais e sistemas alimentares regionais.

A agroecologia nos oferece o caminho mais eficaz para transformar os sistemas alimentares convencionais (intensivos de capital) e tradicionais a se tornarem mais saudáveis, diversificados, resilientes e governados democraticamente em todos os níveis – local, regional, nacional e internacional – ao mesmo tempo em que somos responsáveis ​​e responsivos às necessidades daqueles ativamente engajados no sistema, incluindo consumidores de alimentos, trabalhadores do sistema alimentar e produtores de alimentos.

Nota: O gráfico mostra as múltiplas trajetórias dos ecossistemas naturais aos sistemas de produção tradicional, desde os sistemas agrícolas predominantemente convencionais (em grande parte monocultural) até os sistemas inovadores fortemente sustentáveis. As linhas pontilhadas em torno dos nódulos indica variabilidade no status de tipos diferentes de sistemas e as setas pontilhadas indicam vias variáveis e múltiplas de transição entre os estados. As setas cinzas indicam transições predominantes.

Fonte: HLPE. 2019. Agroecológica e outras abordagens inovadoras: Um relatório do Painel de Alto Nível de Especialistas em Segurança Alimentar e Nutricional, Roma. https://www.fao.org/3/ca5602en/ca5602en.pdf . Reproduzido com permissão.

3. A história da agroecologia 2

As ideias, práticas e o pensamento sistêmico que informam a agroecologia remontam às culturas originárias em todo o mundo. No entanto, o termo agroecologia foi usado pela primeira vez na academia em 1928 pelo Dr. Basil M. Bensin (um agrônomo russo que recebeu sua educação em ciências agrícolas na Universidade de Minnesota, graduando-se com mestrado em 1912), inicialmente em referência à aplicação de métodos ecológicos à pesquisa de cultivos.  

O que hoje conhecemos como agroecologia começou a se desenvolver há cerca de 100 anos ao longo de dois caminhos separados, mas paralelos: em um, cientistas biológicos, como o Dr. Bensin, começaram a estudar a aplicação da ecologia na agricultura. No outro, as comunidades produtoras de alimentos buscaram alternativas – tanto recuperando sistemas perdidos quanto construindo sistemas antigos com conhecimento adquirido por meio de novas experiências – à agricultura química que estava afetando a biodiversidade local, a saúde do solo e a qualidade dos alimentos. Esses conjuntos alternativos de práticas agrícolas tinham nomes diferentes em diferentes regiões, mas todos se baseavam no princípio de convivência com a natureza. 

Em 1965, talvez em um dos primeiros livros sobre o tema, “Agroecology” [“Agrarökologie”], o ecologista e zoólogo alemão Wolfgang Tischler usou o termo ao combinar ecologia (interações entre componentes biológicos no nível de campo ou agroecossistema) com agronomia (integração de práticas de gestão agrícola) para analisar os vários compartimentos do sistema agrícola (o solo, as plantas, etc.), as suas interações e o impacto da gestão humana das atividades agrícolas em cada um desses compartimentos.

Frederick H. Buttel descreveu essas vertentes anteriores da agroecologia como uma disciplina científica, respectivamente, como agroecologia de ecossistema (predominante entre os ecologistas) e agroecologia agronômica. Segundo Buttel, um terceiro tipo de agroecologia surgiu no período posterior à década de 1970. Baseou-se na crítica política econômica dos sistemas agrícolas modernos e foi muitas vezes chamada de economia política agroecológica. As bases dessa terceira vertente poderiam ter sido lançadas pelo trabalho de acadêmicos como o professor Efraim Hernandez X. que definiu agroecossistemas como a interação entre fatores ecológicos, tecnológicos e socioeconômicos. Com base em sua pesquisa sobre o conhecimento dos sistemas indígenas no México, ele propôs que, com o foco exclusivo na produtividade (ou seja, uma abordagem produtivista), os sistemas agrícolas modernos perderam sua base ecológica. Nas décadas seguintes, pesquisadores como Steve Gliessman e Miguel Altieri propuseram a agroecologia como a aplicação de princípios ecológicos ao projeto e manejo de agroecossistemas sustentáveis. Nesse período, o aumento da conscientização sobre os impactos ambientais e a poluição causados ​​pela agricultura industrial preparou o terreno para muitos agricultores migrarem para práticas agrícolas mais sustentáveis. 

No final da década de 1990, a escrita acadêmica sobre agroecologia começou a se ampliar para incluir todos os aspectos dos sistemas alimentares, incluindo produção, processamento e distribuição de alimentos. A ecologia política tornou-se uma influência importante, levando a uma compreensão mais abrangente do estudo da agroecologia. Enquanto isso, enquanto corporações e instituições globais tomavam decisões orientadas pelo lucro, as comunidades produtoras de alimentos buscavam alternativas aos sistemas alimentares globalizados. As comunidades começaram a defender a soberania alimentar, 3  a ideia de que as pessoas envolvidas na produção, processamento, distribuição e consumo de alimentos deveriam ter controle sobre as instituições e políticas relacionadas a todos os aspectos dos sistemas alimentares, da produção ao consumo. O Comitê Internacional  de Planejamento para  A Soberania Alimentar (IPC) liderada pela Via Campesina e outros movimentos sociais desempenharam um papel de liderança nesta advocacia a partir da Cúpula Mundial da Alimentação de novembro de 1996. Nas últimas duas décadas, os apelos à soberania alimentar, agroecologia e campanhas relacionadas foram levados em consideração em todo o mundo, não apenas por organizações de base, mas também por redes regionais, como a Associação de Agricultores Asiáticos, a Aliança para a Soberania Alimentar na África, a Aliança de Soberania Alimentar dos EUA e muitas outras.

A convergência do trabalho dos cientistas e as iniciativas das comunidades produtoras de alimentos se unindo e explorando soluções para os problemas ecológicos, socioeconômicos e políticos dos atuais sistemas alimentares, resultou em uma compreensão abrangente da agroecologia como “a ecologia dos sistemas alimentares”4, com foco na soberania alimentar.  

Esses avanços também levaram a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) a desenvolver um conjunto de princípios agroecológicos em 2018 conhecidos como o 10º elemento de agroecologia da FAO5. Além disso, em resposta a uma solicitação do Comitê de Segurança Alimentar da ONU (CFS/Committee on World Food Security), o Painel de Especialistas de Alto Nível (HLPE/High Level Panel of Experts on Food Security and Nutrition) do CFS/Committee on World Food Security, desenvolveu um conjunto de recomendações sobre os melhores caminhos possíveis para transformações justas e sustentáveis ​​do sistema alimentar com base em 13 princípios agroecológicos que foram desenvolvidos, delineados e acordados pelos especialistas internacionais do HLPE. (Os 10 elementos da FAO e os 13 princípios do HLPE são discutidos em detalhes abaixo)6.

relatório do HLPE, apresentado ao CFS em outubro de 2019, foi a base para amplas negociações em 2020 e início de 2021, às quais o IATP aderiu junto com outras organizações da sociedade civil e movimentos sociais. O CFS adotou o resultado negociado multilateralmente, as Recomendações de Política do CFS, em junho de 2021. No entanto, a sociedade civil se absteve de adotar porque vários elementos-chave estavam faltando7. Com essas recomendações, a agroecologia ganhou mais visibilidade e apoio. 

Definições, princípios e elementos da agroecologia

4. Quais são os 13 princípios do HLPE e como eles são diferentes ou semelhantes aos 10 elementos da FAO?

Os 13 princípios agroecológicos estão alinhados e complementares aos 10 elementos da agroecologia da FAO. Ambos adotam uma abordagem holística ao considerar as transformações em direção a sistemas alimentares sustentáveis, e ambos se baseiam nos três elementos constitutivos da agroecologia: um conjunto de práticas, uma ciência e um movimento. Embora os 13 princípios agroecológicos do HLPE e os 10 elementos da FAO estejam estreitamente alinhados, eles são resultados de dois processos distintos. Os 10 elementos de agroecologia da FAO surgiram de consultas regionais em todo o mundo e são projetados para ajudar a estruturar o trabalho da agência com os países membros e com outras agências internacionais e da ONU. Os 13 princípios fundamentais foram desenvolvidos pelo HLPE por meio de uma extensa revisão da literatura dos conceitos, definições e princípios da agroecologia como base científica para um conjunto de recomendações de políticas para o CFS. (Veja o relatórioAgroecological e outras abordagens inovadoras para agricultura sustentável e sistemas alimentares que melhoram a segurança alimentar e nutricional.)

Embora ambos levem em conta os principais princípios ecológicos e técno-produtivos, eles também incorporam considerações socioculturais e político-econômicas, bem como preocupações de governança da escala local à global. Na melhor das hipóteses, os praticantes da agroecologia se concentram em uma abordagem holística de acordo com todos os 13 princípios agroecológicos descritos pelo HLPE para garantirem simultaneamente vários benefícios para todos os atores do sistema alimentar, comunidades locais e ecologia. O foco não está apenas na fazenda e no design dos agro ecossistemas, mas também nas necessidades das pessoas nas comunidades produtoras de alimentos, trabalhadores do sistema alimentar, consumidores e especialmente mulheres. Defender esses princípios é crucial para o desenvolvimento de alternativas à agricultura industrial por meio da construção do movimento.    

5. O que significa dizer que a agroecologia é uma ciência, uma prática e um movimento? 8

Como ciência, a agroecologia é: 1) o estudo integrador da ecologia de todo o sistema alimentar, abrangendo as dimensões ecológica, econômica, social e política; 2) a aplicação de conceitos e princípios ecológicos à concepção e gestão de sistemas alimentares sustentáveis; e 3) a integração de pesquisa, educação, ação e mudança que traga sustentabilidade aos aspectos ecológicos, econômicos e sociais dos sistemas alimentares.      

Como um conjunto de práticas agrícolas, a agroecologia busca maneiras de melhorar os sistemas agrícolas, aproveitando os processos ecológicos naturais e as funções dos ecossistemas; criar interações biológicas benéficas e sinergias entre os componentes dos agro ecossistemas; minimizar insumos externos sintéticos e tóxicos, bem como a produção de resíduos; maximizar a biodiversidade funcional; e fortalecimento da regulação biológica em agro ecossistemas. As práticas são projetadas para conciliar de forma sustentável os desafios sociais, econômicos e ambientais ao desenvolvimento agrícola da comunidade.

Como movimento, a agroecologia busca transformar a agricultura para construir sistemas alimentares localmente relevantes, resilientes e sustentáveis ​​que fortaleçam a viabilidade econômica das áreas rurais com base em cadeias curtas de comercialização, equidade e produção de alimentos justa e segura. Isso envolve o apoio a diversas formas de produção de alimentos por pequenos agricultores e agricultura familiar, incluindo agricultores, pastores, pescadores e coletores. Objetivos específicos do movimento incluem soberania alimentar, respeito e preservação do conhecimento local, justiça social, manutenção da identidade e cultura local e direitos às sementes e raças locais e indígenas .

Na agroecologia, esses três aspectos estão intimamente relacionados. O movimento agroecológico baseia-se na ciência e no conhecimento agroecológico para a promoção e prática da abordagem agrícola. Por causa das interligações e coevolução entre esses três aspectos, a agroecologia é uma abordagem holística, orientada para a transformação do sistema alimentar para sistemas alimentares mais justos e sustentáveis. Ele busca construir democracias alimentares resilientes sobre as bases sólidas de sistemas de conhecimento indígenas baseados no local, experienciais. Suas práticas são aprimoradas por meio de interações interculturais mutuamente respeitosas e construção de movimento entre produtores de alimentos, trabalhadores do sistema alimentar, consumidores, com atenção especial às mulheres, bem como através da cocriação de conhecimento em colaboração com cientistas .  

6. Por que a definição de agroecologia é importante? Como a definição se cruza com a política?   

A agroecologia tem agora um papel central na agenda de transformação da agricultura nos debates multilaterais de segurança alimentar. Tem havido uma proliferação de definições de agroecologia, à medida que diferentes organizações e países a definem de maneiras que refletem suas preocupações e prioridades . Para o IATP, a definição holística de agroecologia destaca uma abordagem multifacetada baseada em um conjunto de princípios para orientar as transformações do sistema alimentar em direção à soberania alimentar, garantindo democracia alimentar, sustentabilidade, viabilidade e resiliência da comunidade.

O conjunto de princípios não é um plano prescritivo, mas fornece uma estrutura holística para enfrentar vários desafios nos sistemas alimentares, incluindo: impactos do clima na agricultura e redução de emissõesdiversidade nutricional e segurança alimentar; a conservação da biodiversidade e da água; e redução das pegadas ecológicas. Também oferece uma estrutura para abordar as desigualdades sociais e econômicas no sistema alimentar e reduzindo o desperdício de alimentos. O uso dessa estrutura requer o reconhecimento de que as necessidades e circunstâncias de cada comunidade e dos atores do sistema alimentar são diferentes e impactadas não apenas por processos de feedback biofísico e interações entre humanos interdependentes, mas também por decisões de governança nos níveis local, nacional e internacional.

Apesar de sua utilidade, e apesar de avaliações baseadas em evidências que demonstram a agroecologia como o caminho mais eficaz para lidar com múltiplas crises ecológicas e socioeconômicas simultaneamente, a agroecologia está ausente em muitos espaços políticos ou está presente apenas em versões diluídas. Assim, as organizações da sociedade civil defendem a integração da agroecologia em cargos oficiais de formuladores de políticas nacionais e locais, incluindo ministérios e departamentos de alimentação, agricultura, meio ambiente, água, florestas, zonas úmidas e desenvolvimento rural, bem como planejamento urbano e regional para acesso a alimentação saudável e desenvolvimento do mercado. Além disso, a advocacia é necessária nos níveis local, nacional e internacional para aumentar as políticas, pesquisa, extensão, finanças públicas, regras e legislação específicas da agroecologia. 

A maioria dos aspectos da agroecologia – como estender um ambiente de apoio onde a ciência se cruza com as práticas locais em sua diversidade – pode ser abordada em políticas públicas. Mas um elemento constitutivo chave da agroecologia é o envolvimento e a liderança dos movimentos sociais e a responsabilidade mútua. Esse elemento só pode ser viabilizado garantindo espaço para o engajamento democrático. Assim, movimentos sociais com foco central na justiça, equidade e democracia alimentar tornam-se fundamentais para a real disseminação de transições agroecológicas significativas e holísticas. A natureza transdisciplinar da agroecologia – que abrange não apenas múltiplas disciplinas científicas, mas também práticas do sistema alimentar, bem como movimentos sociais e a aplicação dessa abordagem transdisciplinar a todo o sistema alimentar e agrícola – é fundamental para as transformações do sistema alimentar.

O IATP está trabalhando com parceiros local e globalmente para promover transformações do sistema alimentar enraizadas nesses princípios agroecológicos e promovendo democracias alimentares.

7. Quais são os objetivos e benefícios da agroecologia?   

Estamos à beira de uma crise agrária: ecológica, socioeconômica e política. Embora a agroecologia possa melhorar as colheitas e os rendimentos dos agricultores, seu verdadeiro valor vai muito além disso. As transformações agroecológicas, da produção ao consumo e ao gerenciamento de resíduos, nos oferecem um caminho para enfrentarmos essas múltiplas crises, por meio de uma abordagem que reconhece a interdependência dos sistemas vivos (de microrganismos a plantas, de animais a humanos) e honra os princípios de equilíbrio, diversidade, harmonia e respeito. Essas transformações implicam uma mudança cultural e uma visão de mundo distinta da exploração e extração implícita na agricultura industrializada.

Essas transições de sistemas alimentares justos são necessárias para se construir democracias alimentares; para se garantir que os consumidores possam comprar alimentos saudáveis, culturalmente apropriados e nutritivos; para se assegurar a viabilidade econômica para produtores de alimentos e trabalhadores em sistemas alimentares; e para se revitalizar as áreas rurais, permitindo um comércio justo de commodities agrícolas e outras culturas. Uma transição justa requer a construção de estruturas locais de governança democrática e a reconstrução da base de recursos naturais, permitindo a resiliência climática. 

O papel da tecnologia na agroecologia

8. Como a agroecologia difere de outras práticas agrícolas tradicionais? Como se assemelha a essas práticas ?

Ao contrário de outras práticas agrícolas tradicionais, a dimensão ecológica e tecnoprodutiva da agroecologia concentra-se no desenho da fazenda e dos agro ecossistemas com base em princípios ecológicos fundamentais e adaptando-os ao ambiente local. Miguel Altieri9 descreve-os como:

1. Melhorar a reciclagem de biomassa e otimizar a disponibilidade de nutrientes e equilibrar o fluxo de nutrientes; 2. Assegurar condições de solo favoráveis ​​ao crescimento das plantas, principalmente através da gestão da matéria orgânica e do aumento da atividade biótica do solo; 3. Minimizar as perdas devido aos fluxos de radiação solar, ar e água por meio do manejo microclimático, captação de água e manejo do solo por meio do aumento da cobertura do solo; 4. Espécies e diversificação genética do agro ecossistema no tempo e no espaço; 5. Aumentar as interações biológicas benéficas e os sinergismos entre os componentes da agro-biodiversidade, resultando na promoção de processos e serviços ecológicos chave; e um sexto princípio foi adicionado mais tarde: Fortalecer o “sistema imunológico” dos sistemas agrícolas através do aumento da biodiversidade funcional – inimigos naturais, antagonistas, etc., criando habitats apropriados.

Embora muitos sistemas agrícolas indígenas continuem a se basear em alguns ou todos esses princípios, a maioria das comunidades não consegue continuar com essas práticas. Políticas relacionadas a alimentos, agricultura, sementes, água e insumos agroquímicos têm incentivado a mudança de tais práticas do sistema alimentar para práticas que se concentram exclusivamente na produtividade de algumas culturas ou animais selecionados.

9. A agroecologia é um retorno à “tradição”, rejeitando todo tipo de tecnologia, insumos para a agricultura e informações sobre inovação?    

Não, a agroecologia não é uma rejeição de toda tecnologia. O uso da tecnologia é considerado conforme o contexto local o justifica. Algumas tecnologias, como modificação genética ou edição de genes,10  são consideradas incompatíveis com os princípios agroecológicos. Para ajudar a decidir quais tecnologias – sejam de conhecimentos e práticas tradicionais ou inovações científicas – fazem sentido e quais não fazem em um contexto específico, praticantes e cientistas da agroecologia se envolvem em conversas mutuamente respeitosas (ou diálogos de saberes, ou seja, diálogos entre diferentes tipos de conhecimento ou métodos de consulta),11 entre si e entre todos. Eles estão constantemente inovando com base em condições locais específicas, incluindo dimensões sociais e culturais, para construir o conhecimento ancestral e experiencial dos produtores de alimentos e comunidades locais, por um lado, e o conhecimento dos cientistas agroecológicos, por outro.

Agroecologia e intensificação sustentável , agricultura regenerativa e orgânica

10. Como a agroecologia difere da agricultura regenerativa ou orgânica? 12

Nas últimas décadas, a agroecologia evoluiu para se tornar uma abordagem holística das transformações dos sistemas alimentares, com forte fundamento ecológico. Busca promover a justiça intra e intercomunitária, a resiliência econômica e ecológica e, mais importante, a resistência contra a corporatização da agricultura e dos sistemas alimentares. Enquanto a agroecologia começa com o redesenho das práticas de produção no agro ecossistema para serem mais diversificadas, ela vai além do desenvolvimento de economias compartilhadas e condições de trabalho justas que honrem a dignidade das pessoas envolvidas no sistema alimentar. As transformações não tratam apenas de abordar as preocupações ecológicas do agro ecossistema específico ou garantir o acesso a alimentos produzidos organicamente, mas também de abordar simultaneamente as preocupações fundamentais dos produtores de alimentos, trabalhadores do sistema alimentar e consumidores em torno da paridade, equidade e justiça intergeracional entre e dentro dos países.  

Os princípios básicos da agricultura orgânica – não uso de organismos geneticamente modificados (OGMs) ou produtos químicos sintéticos nocivos (agrotóxicos e fertilizantes solúveis), encorajando a construção de solos saudáveis ​​e agro ecossistemas diversificados e criatórios de ruminantes à base de pastagens naturais – são consistentes com o que foi inicialmente promovido como agricultura regenerativa. Tanto a agricultura orgânica quanto a regenerativa podem compartilhar muitos aspectos da agroecologia quando se trata de práticas de produção enraizadas na resiliência ecológica. Isso não é surpreendente, pois a agricultura orgânica compartilha uma história com a agroecologia, pois ambas evoluíram como alternativas à agricultura química entre as comunidades agrícolas. A agricultura orgânica tem padrões claros estabelecidos por órgãos governamentais nacionais, como o Conselho Nacional de Padrões Orgânicos do Departamento de Agricultura dos EUA (NOSB/National Organic Standards Board), por organizações de produtores de alimentos, como no caso do Real Organic Project, ou normas claras, como no caso da Federação Internacional de Movimentos de Agricultura Orgânica/International Federation of Organic Agriculture Movements (IFOAM-Organics International).

De fato, nos EUA, a indústria orgânica tomou a iniciativa de pedir ao governo federal que a regulasse para padronização, consistência e fiscalização, como o IATP apontou em sua série Revisiting Crisis by DesignA rotulagem visa assegurar aos consumidores que o que comem é produzido de acordo com rigorosos padrões orgânicos; isso ajudou a garantir acesso competitivo a mercados premium, incluindo mercados globais. O aumento dramático da produção orgânica e o crescimento geral do setor também foram acompanhados por um aumento de concentração corporativa na indústria orgânica. Infelizmente, com o aumento da participação das empresas da cadeia de valor alimentar neste setor em crescimento, os esforços de lobby para expandir e enfraquecer a definição do que se pode chamar de orgânico estão sempre presentes. Como resultado, os padrões NOSB continuam sendo rebaixados13 Por exemplo, operações concentradas de alimentação animal (CAFOs/Concentrated Animal Feeding Operations) (nt.: no Brasil tratamos essa técnico de confinamento, onde os animais ficam aprisionados e não se alimentam de forma natural. Nunca poderá ser orgânico!podem fazer parte do setor “orgânico”, assim como sistemas hidropônicos (nt.: é um sistema de produção onde as plantas vivem como em uma UTI, ou seja, elas não entram em contato com o solo. Recebem sua ‘nutrição’ via um ‘soro’ com os nutrientes. Nunca que isso poderia ser orgânico!), apesar da oposição de muitas organizações de agricultores orgânicos.  

Ao contrário da agroecologia , a agricultura regenerativa não possui um conjunto claro de princípios ou elementos-chave que tenham sido acordados por um órgão multilateral, nem existem regras e regulamentos em nível nacional que governem a agricultura regenerativa, como os padrões orgânicos do USDA. Além disso, há muita ambiguidade em torno da forma como o termo é usado. Uma revisão das definições acadêmicas e práticas de agricultura regenerativa mostra como essa ambiguidade adiciona “confusão ao entendimento do que o termo ‘agricultura regenerativa’ está sendo usado para significar em qualquer contexto específico”. As definições de agricultura regenerativa variam de uma abordagem que busca melhorar a saúde do solo e do ecossistema até objetivos muito mais restritos, como sequestro de carbono agrícola como estratégia de mitigação climática com a promessa de monetização do carbono armazenado no solo, também chamado de cultivo de carbono.

Em suma, embora ambas as abordagens possam fazer parte de transformações agroecológicas, a agricultura orgânica e a agricultura regenerativa são mais passíveis de cooptação ou manipulação pelo setor empresarial, em comparação com a agroecologia que enfatiza a economia circular e solidária. A agroecologia coloca valores humanos e sociais, como dignidade, equidade, inclusão e justiça, em seu centro, além de sua ênfase na conservação dos recursos biológicos por meio da diversidade, sinergiaseficiênciaresiliência e reciclagem.

Nos EUA, em resposta a tal cooptação e manipulação, agricultores orgânicos estão se unindo para desenvolver o Real Organic Project, com seus próprios padrões que vão muito além dos padrões NOSB do USDA. Uma iniciativa um tanto paralela daqueles focados na agricultura regenerativa, bem como em melhores operações da cadeia de suprimentos, é a Regenerative Organic Alliance (ROA), que define a agricultura regenerativa como tendo três pilares principais – saúde do solo por meio do plantio direto orgânico, justiça social e bem estar animal. A Certificação Orgânica Regenerativa (ROC/Regenerative Organic Certified™) começa com a Padrões NOSB e não apenas reúne outras certificações de terceiros existentes, mas também fornece diretrizes específicas da ROC para cada um de seus três pilares. Embora o Real Organic Seals esteja disponível apenas para produtores membros, a certificação Regenerative Organic Certified™ está disponível para operações de produtores e atores da cadeia de suprimentos para os mercados dos EUA e internacionais. 

Tanto a abordagem do Real Organic Project orientada para o agricultor quanto a agricultura regenerativa aspiracional focada na cadeia de valor são esforços nos EUA para ir além dos padrões orgânicos do NOSB, e ambas as abordagens abrangem diferentes aspectos dos 10 elementos da agroecologia da FAO. Uma iniciativa internacional paralela é o Organics 3.0 da IFOAM.14

Abraçar verdadeiramente os princípios agroecológicos no contexto dos EUA exigiria não apenas combinar o melhor do Projeto Orgânico Real e da Certificação Orgânica Regenerativa, mas também abordar as preocupações raciais, de gênero e justiça alimentar como base para construir sistemas alimentares mais resilientes e justos por meio da liderança inclusiva dos movimentos sociais.

11. O que é intensificação sustentável? Qual é a diferença da agroecologia?

A intensificação sustentável (SI/sustainable intensification) concentra-se em melhorar a produtividade por unidade de terra, ao mesmo tempo em que tenta explicar algumas das externalidades ambientais do modelo atual de agricultura industrial. É uma resposta dominante e (muitas vezes) corporativa à crise ecológica dos sistemas alimentares. Seu foco principal continua sendo produtivista, buscando melhorar a produção planta por planta ou animal por animal e utilizando intervenções tecnológicas para melhorar a eficiência do uso de recursos de insumos específicos, como água, mão de obra ou agrotóxicos. O SI não é holístico e não leva em consideração os possíveis impactos negativos das intervenções técnicas no sistema agrícola, incluindo o equilíbrio ecológico dos agro ecossistemas. Por exemplo, nas práticas de SI, o plantio direto é frequentemente acompanhado pelo uso de herbicidas; o plantio direto ajuda no sequestro de carbono, especialmente se for combinado com outras práticas, como o plantio de plantas de cobertura, e o uso de herbicidas pode ajudar a melhorar a eficiência do uso da mão de obra da fazenda. No entanto, neste exemplo, o impacto ecológico líquido15 do plantio direto é negativo , pois o uso de herbicidas pode impactar a biodiversidade, a qualidade da água, o equilíbrio ecológico dos agro ecossistemas e até a saúde das pessoas. Mais importante ainda, os praticantes de SI não desafiam a problemática concentração corporativa nos sistemas alimentares.

Embora haja uma tentativa de retratar essas iniciativas fragmentadas como agroecológicas, o relatório do CFS-HLPE sobre agroecologia e outras abordagens inovadoras esclarece como SI e agroecologia são diferentes. O relatório agrupa várias abordagens inovadoras em duas categorias principais: 1) intensificação sustentável de sistemas de produção e abordagens relacionadas (incluindo agricultura inteligente para o clima, agricultura sensível à nutrição e cadeias de valor alimentar sustentáveis) que geralmente envolvem transições incrementais para sistemas alimentares sustentáveis; e 2) abordagens agroecológicas e afins (incluindo agricultura orgânica, agrossilvicultura e permacultura) que algumas partes interessadas consideram mais transformadoras.

Enquanto a intensificação sustentável parte da premissa de que enfrentar os futuros desafios relacionados à segurança alimentar requer um aumento na produtividade por unidade de terra de maneira sustentável, a agroecologia enfatiza a redução de insumos e a promoção da diversidade ao lado da transformação social e política. Está focado em melhorar a saúde ecológica e humana e abordar questões de equidade e governança. 

Agroecologia e “alimentar o mundo”

12. Argumenta-se que a agroecologia não pode alimentar o mundo. Qual é a resposta do IATP?

A insegurança alimentar tem atormentado populações em todo o mundo há séculos. Durante meados do século 20, a Revolução Verde foi introduzida para aliviar a fome mundial como parte dos esforços internacionais de desenvolvimento agrícola. A Revolução Verde concentrou-se no aumento da produtividade agrícola por meio da criação e uso de insumos, como fertilizantes sintéticos e agrotóxicos em culturas selecionadas passíveis de monocultura, e infraestruturas para apoiar tais práticas. Isso ajudou a aumentar a produção de grãos de alimentos. Enquanto isso, as políticas governamentais nos EUA levaram a monoculturas em grande escala fortemente dependentes de agroquímicos e sementes comerciais, criando um sistema alimentar industrial que se espalhou para outras partes das Américas e, agora, para o resto do mundo. Agricultores familiares foram obrigados a “ficarem grande ou sairem”, frase atribuída a ex-Ministro de Agricultura dos EUA Earl Butz. Nas últimas cinco décadas, passamos a experimentar os efeitos nocivos socioeconômicos e ambientais desses sistemas alimentares industriais e da concentração corporativa, com o aumento da distância entre produtores e consumidores de alimentos.

A ideia de precisar produzir mais para “alimentar o mundo” é um mito iniciado e promovido pelo agronegócio e pelos arquitetos da agricultura industrial. Nos EUA, os agricultores são instruídos a produzirem mais para alimentar o mundo, mas por trás desse apelo há uma falsa premissa de que não há comida suficiente no mundo. O volume de produção agrícola necessário é função da forma como é utilizado (para alimentação, ração ou combustível), tanto quanto o número de consumidores e sua capacidade de acesso a alimentos saudáveis. A abordagem “alimentar o mundo” ignora questões fundamentais de distribuição e equidade. Esta associação simplista entre produção agrícola e segurança alimentar não tem base em fatos e ignora as razões fundamentais da fome no mundo: A fome está enraizada em desigualdades estruturais: experiências coloniais que privaram as pessoas de seu acesso à terra, água e outros recursos, ainda mais exacerbados por políticas de investimento internacionais e nacionais. Tais desigualdades estruturais são muitas vezes possibilitadas por regimes autoritários ou neoliberais.    

Uma análise mais profunda revela duas coisas sobre o sistema alimentar industrial dominante de hoje. Primeiro, está esgotando e degradando a base de recursos naturais – solo, água e biodiversidade – e ajudando a intensificar a perturbação climática. Em segundo lugar, apesar de produzir alimentos suficientes para 9,7 bilhões de pessoas (projetado para ser o pico da população mundial em 2050), não conseguiu lidar com a fome no mundo. Garantir a segurança alimentar e nutricional para as pessoas em todo o mundo requer proteger a base de recursos ecológicos que é essencial para a produção de alimentos agora e no futuro. Isso deve acontecer junto com a abordagem dos desequilíbrios de poder no sistema alimentar, nutrindo as democracias alimentares e trabalhando para implementar o direito à alimentação. 

Como observa o relatório da FOE/Friends of the Earth sobre agroecologia (2016), “quatro décadas de evidências científicas mostram que a agricultura agroecológica, incluindo a agricultura orgânica diversificada, é a resposta agrícola mais eficaz aos desafios ambientais que ameaçam nossa segurança alimentar futura, como mudanças climáticas, erosão, escassez de água e perda de biodiversidade”. Além disso, “como uma abordagem baseada em sistemas para alimentação e agricultura, a agroecologia aborda os fatores sociais e econômicos da fome crônica sofrida por quase 800 milhões de pessoas em todo o mundo”. O relatório conclui: “Ao fazer a transição de alimentos e sistemas agrícolas industriais para orgânicos e agroecológicos diversificados, podemos produzir alimentos suficientes para alimentar o mundo, reduzir a pobreza e restaurar recursos naturais essenciais para alimentar o planeta por gerações”. 

13. Como os esforços para garantir uma dieta nutritiva para todos foram desviados pela meta de calorias suficientes? 16

A atual oferta global de calorias é mais do que suficiente para a população mundial. Em muitos países, o volume de alimentos disponíveis não é o principal problema; em vez disso, o problema é a acessibilidade, distribuição e acessibilidade de alimentos culturalmente apropriados e ricos em nutrientes. Como as culturas são usadas também importa. Grande parte do grão cultivado em todo o mundo é usado para ração animal ou matérias-primas para combustível. Se usado para consumo humano direto, muitas vezes passa por um processamento extensivo que retira a maioria dos nutrientes ou o converte em produtos menos nutritivos (por exemplo, transformando milho do campo em xarope de milho com alto teor de frutose). De acordo com a FAO, quase um terço dos alimentos produzidos para consumo humano – aproximadamente 1,3 bilhão de toneladas por ano – é perdido ou desperdiçado globalmente.

A ênfase no fornecimento de calorias é uma ressaca de uma abordagem mais antiga para medir a segurança alimentar. Um suprimento global de calorias suficiente foi o principal objetivo do desenvolvimento agrícola do século 20, que se concentrou no aumento da produção de grãos por meio de tecnologias da Revolução Verde, aumentadas por políticas de ajuda e comércio. Essa abordagem “produtivista” buscava aumentar a produção agrícola concentrando-se na melhoria da produtividade de uma planta ou animal específico. O objetivo era atender à segurança alimentar a nível nacional (em termos calóricos) e aumentar as exportações agrícolas para ajuda ou comércio .

Essa abordagem informou as políticas de alimentação, agricultura, comércio e investimento na agricultura e setores afins, e foi um fracasso lamentável. Em todo o mundo, a desnutrição continua alta, a obesidade está aumentando e perto de um bilhão de pessoas passam fome. Também afetou negativamente as comunidades agrícolas, com muitos mudando de práticas agrícolas diversificadas para monoculturas de culturas de rendimento, como soja ou cana-de-açúcar. Às vezes, eles foram totalmente expulsos da agricultura devido ao dumping agrícola. As famílias de agricultores que continuam a cultivar muitas vezes acabam sofrendo com a pobreza e a fome.

Em contraste, a agroecologia inclui o objetivo de garantir uma dieta nutritiva e culturalmente apropriada para todos. Na maioria das comunidades agrícolas, os agro ecossistemas têm funcionado como fonte de diversos alimentos, bem como outros recursos necessários para a sobrevivência das comunidades – combustível, fibras, medicamentos, cosméticos, necessidades de limpeza, cercas e materiais de construção, polinização e controle de pragas, fertilizantes, forragem e ração para animais da própria fazendas. Enquanto a abordagem produtivista se concentra apenas na produção de grãos, alimentos e rações, a agroecologia enfatiza a multifuncionalidade dos agro ecossistemas enquanto conserva a base de recursos naturais. Uma dieta nutritiva e culturalmente adequada para todos requer um sistema alimentar diversificado e acessível a todos, o que é central para a agroecologia.    

Agroecologia na prática

14. Quais países adaptaram e adotaram a agroecologia?   

Transições agroecológicas estão ocorrendo em muitos países em desenvolvimento e alguns países desenvolvidos. FrançaAlemanha e Suíça promovem alguma versão da agroecologia como parte de sua ajuda bilateral. Embora existam várias iniciativas parciais do governo em nível estadual ou regional, nenhum país promoveu a agroecologia em nível nacional. O Butão, com seu Quadro Nacional para Agricultura Orgânica e planos para se tornar 100% orgânico, tem potencial para transições agroecológicas em todo o país, mas exigirá apoio adicional e um ambiente propício para se tornar uma economia para a soberania alimentar e a agricultura orgânica.

A agroecologia também está avançando em alguns países selecionados por meio de um plano de ação que a FAO desenvolveu em colaboração com parceiros, conhecido como scaling up agroecology initiative (SUAI), uma plataforma para catalisar a cooperação em agroecologia dentro do sistema da ONU17. O envolvimento do Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (IFAD/International Fund for Agricultural Development) com a SUAI resultou em um relatório de avaliação sobre agroecologia nas operações do IFAD, analisando todos os 207 projetos apoiados pelo IFAD nos países das cinco regiões do IFAD.

Uma das atividades da SUAI é o apoio técnico aos países no desenvolvimento de processos políticos, inclusive por meio da Cooperação Sul-Sul em alguns estados e regiões de países como Índia, Senegal e México18. Na Índia, a iniciativa apoia o programa do governo de Andhra Pradesh para Agricultura Natural de Orçamento Zero (ZBNF/Zero Budget Natural Farming), por meio do Programa de Agricultura Natural Gerenciada pela Comunidade de Andhra Pradesh (APCNF/Andhra Pradesh Community Managed Natural Farming Programme)19. No Senegal, a convite do governo, apoiou-se o Comitê Nacional “Dinâmica para Transições Agroecológicas no Senegal” (DyATES/Dynamic for Agroecological Transitions in Senegal)20. Outras iniciativas SUAI incluem um Programa Regional de 10 Anos para Agroecologia na África Ocidental em resposta a um pedido da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (ECOWAS/Economic Community of the West African States) e o Desenvolvimento de um Quadro de Política Regional sobre Agroecologia em resposta a um pedido da Frente Parlamentar da América Latina e Caribe (PARLATINO).

15. A agroecologia foi adotada nos Estados Unidos?   

A agroecologia, conforme definida nesta seção de perguntas e respostas, ainda não foi adotada como parte das políticas estaduais ou federais nos EUA. No entanto, existem muitos agricultores e organizações da sociedade civil nos EUA que têm defendido a adoção da agroecologia. Alguns desses agricultores praticam a agricultura regenerativa e orgânica no seu melhor. A US Food Sovereignty Alliance (USFSA) é uma rede de organizações e aliados da linha de frente (incluindo o IATP) que defendem a agroecologia. A aliança continua a moldar a conversa sobre agroecologia nos EUA e, no final do ano passado, mais de 80 organizações de alimentos e justiça agrícola dos EUA se juntaram a ela para pedir ao governo Biden que apoiasse a agroecologia.

16. O que a agroecologia tem a ver com os compromissos climáticos globais e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU? E quanto à Cúpula de Sistemas Alimentares da ONU ou sua AIM for Climate Coalition?

Apenas transições agroecológicas são a abordagem mais eficaz para abordar simultaneamente os compromissos climáticos globais e a maioria dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Uma transição justa nos sistemas alimentares significa reconhecer que a crise climática afeta as pessoas; que os produtores de alimentos e os trabalhadores do sistema alimentar são os primeiros a sofrerem o impacto; e que a agroecologia é uma solução chave, tanto em termos de mitigação quanto de adaptação, para construir meios de subsistência e sistemas alimentares resilientes ao clima. Agroecologia é sobre produzir e processar com o mínimo de poluição e emissões. Envolve práticas e sistemas agrícolas diversificados e integrados que aumentam a resiliência de várias maneiras, inclusive por meio de mais biodiversidade e diversidade nutricional, melhor saúde do solo e capacidade de retenção de água dos solos. Tudo isso ajuda a melhorar as capacidades adaptativas da comunidade. Com sua ênfase no processamento e comercialização com foco local e regional, os alimentos e rações não precisam viajar tão longe, reduzindo substancialmente a pegada climática.

As transformações agroecológicas podem ajudar os países a cumprir seus compromissos de mitigação climática de várias maneiras, ao mesmo tempo em que desenvolvem suas capacidades de adaptação. Os potenciais de adaptação e mitigação fornecem a justificativa para desviar o financiamento climático agrícola em apoio à agroecologia. Mais importante ainda, com suas raízes na soberania alimentar, as transformações agroecológicas podem ajudar as comunidades com desafios climáticos a abordar as preocupações socioeconômicas, ecológicas, políticas e culturais da comunidade de maneira equilibrada, ajudando a comunidade a se tornar resiliente e segura alimentar e ajudando as nações a cumprir seus SDG2030 objetivos.

A Cúpula de Sistemas Alimentares da ONU, apesar de altamente controversa21, incorporou o conceito de sistemas alimentares – a ideia de que precisamos olhar de forma holística para a produção, processamento, comercialização e comércio de alimentos e agricultura para lidar com as múltiplas crises socioeconômicas, ecológicas e energéticas. As transições agroecológicas buscam transformações holísticas nos sistemas alimentares, ao contrário das abordagens produtivistas que foram promovidas ao longo do século XX e até recentemente.

Apesar da retórica, a maioria das coalizões que saíram da Cúpula de Sistemas Alimentares continuaram a promover a mesma visão produtivista, embora com foco na melhoria da eficiência do uso de insumos em termos de mão de obra ou agroquímicos. Isso é claramente visível em duas das quatro iniciativas  destacadas pelos EUA na Cúpula de Sistemas Alimentares da ONU: A Missão de Inovação Agrícola para o Clima (AIM for Climate) e a Coalizão de Crescimento de Produtividade Sustentável. Em 2021, a Cúpula de Sistemas Alimentares tornou-se um espaço onde múltiplas “soluções” e coalizões foram promovidas indiscriminadamente e marginalizaram preocupações de direitos humanos. A cúpula foi percebida como um esforço corporativo para mudar a tomada de decisões de um dos espaços multilaterais de governança alimentar mais inclusivos, o CFS da ONU, bem como uma oportunidade perdida de abordar os impactos devastadores do COVID-19 e as causas subjacentes e a governança problemas nos sistemas alimentares.

AIM for Climate é uma iniciativa anunciada pelos EUA em colaboração com os Emirados Árabes Unidos bem antes da Cúpula de Sistemas Alimentares, mas promovida durante a cúpula para acelerar a inovação global, pesquisa e desenvolvimento (P&D) em sistemas alimentares em apoio à ação climática. Como disse o secretário de Agricultura dos EUA, Tom Vilsack , essa coalizão promoverá “abordagens climáticas voluntárias, baseadas no mercado e orientadas pela ciência” como uma alternativa à Estratégia Farm to Fork da Europa, que busca transformar seus sistemas alimentares, inclusive reduzindo o uso de agrotóxicos em 50 % até 2030.

Outra iniciativa relevante é a Coalizão para a Transformação de Sistemas Alimentares pela Agroecologia.  De acordo com os membros atuais, busca promover os 13 princípios agroecológicos do HLPE, de acordo com uma chamada iniciada pelo IPES-Food, que o IATP endossou. A Coalizão Agroecológica tem suas origens na controversa Cúpula de Sistemas Alimentares da ONU. É importante notar que a Coalizão de Agroecologia tem membros com uma ampla variedade de posições sobre as transformações do sistema alimentar. Por um lado, inclui membros como o governo da França, com seus 4 Pour 1000, que defende a substituição de insumos e o sequestro de carbono. Por outro lado, tem membros como a rede de pesquisa IPES-Food, focada na transformação holística do sistema alimentar enraizada em sistemas agroecológicos diversificados. Comunidades de linha de frente e organizações aliadas que avançaram com sucesso a agroecologia em espaços de políticas internacionais, como a FAO e o CFS, hesitam em abraçar a Agroecology Coalition ou apoiam cautelosamente. 

17. Há preocupações de que algumas instituições e nações estejam usando o termo agroecologia para significar coisas diferentes. A cooptação da agroecologia é um problema crescente? Existem casos em que empresas/corporações estão usando explicitamente a linguagem da agroecologia quando não a estão realmente praticando?

A cooptação da agroecologia é um problema crescente. 22 Agora que ela passou a assumir um papel central na agenda para transformar a agricultura nos debates multilaterais de segurança alimentar, vemos muitas tentativas de corporações, governos e grupos de lobby agroquímicos para definirem agroecologia de maneira que reflita suas preocupações e prioridades. 23  Aqueles que inicialmente tentaram descartar a agroecologia como “um beco sem saída” agora sugerem que “a agroecologia e a biotecnologia podem trabalhar de mãos dadas”. 24

Outros, embora não usem o termo agroecologia, tentam incorporar práticas agrícolas naturais selecionadas, como o uso de culturas de cobertura ou a minimização do cultivo de lavoura e a retenção de resíduos de culturas nos solos, que são passíveis de monoculturas industriais, deixando de fora outras práticas que são parte integrante da agricultura. agricultura natural (como a eliminação do uso de agrotóxicos e fertilizantes inorgânicos)(nt.: nesse aspecto de eliminação do que aqui está colocado como ‘fertilizantes inorgânicos’, em nossa visão, discordamos porque pó de rocha é inorgânico e é um belo incremento para a vida do solo que poderá vir ou não potencializado com fermentações prévias. Pensamos que o mais correto, por ser assim que a agricultura industrial e corporativa atua, é eliminarmos os fertilizantes solúveis e feitos artificialmente em laboratórios), mas antitética às abordagens produtivistas. Essas práticas selecionadas, conhecidas como agricultura de conservação e agricultura de plantio direto, são promovidas como parte de abordagens como Intensificação Sustentável (SI), Agricultura Inteligente para o Clima (CSA) ou mesmo agricultura regenerativa. Na verdade, existem algumas iniciativas corporativas em torno da agricultura regenerativa. Alguns exemplos incluem iniciativas como a versão de agricultura regenerativa da NestléRegenerating Nature da Unilever e a iniciativa de transformar a pecuária leiteira em agricultura regenerativa por uma aliança global das principais empresas AgriFoodTech, como Yara e Danone, chamada Farming for Generations25 É nesse contexto que uma das principais iniciativas da sociedade civil em agricultura regenerativa, a Regenerative Organic Alliance, com sede nos EUA, começou a insistir em uma certificação orgânica regenerativa  (Regenerative Organic Certified™). 

Quando as corporações incorporam mudanças mínimas nas operações agrícolas para atender às obrigações de mitigação climática, para capturar uma participação nos mercados de carbono ou para outros benefícios financeiros, essas mudanças não podem ser descritas como contribuindo para transformações agroecológicas. Tais tentativas, sem a intenção de mitigar os impactos negativos de suas operações, tendem a ser extrativistas em relação às comunidades locais e ao meio ambiente, enquanto a agroecologia ajuda a criar recursos para e dentro de uma comunidade. 

Transformações agroecológicas

18. Qual a importância do componente da agroecologia que aborda o poder político ou a transformação das estruturas de poder na sociedade?

Essa questão vai ao cerne do que é a agroecologia.

Muitas vezes se pergunta se é possível praticar a agroecologia sem o componente de soberania alimentar e simplesmente trabalhar com os processos da natureza, ou seja, minimizando insumos. As transformações agroecológicas não são simplesmente sobre os processos da natureza que ocorrem no vácuo, mas sim sobre o reconhecimento de que os praticantes da agroecologia estão inseridos em locais socioeconômicos, culturais e políticos específicos à medida que se envolvem em práticas alimentares e agrícolas. As transformações agroecológicas também significam ter clareza sobre o que você está mudando – alimentos justos, saudáveis ​​e sustentáveis, sistemas agrícolas e comerciais que ajudam a construir comunidades rurais revitalizadas, pessoas saudáveis ​​e o planeta – e como essa mudança é realizada. É tanto sobre o resultado quanto sobre o processo: essas transformações envolvem mudanças nas relações de poder entre produtores e mercados,  consumidores e empresas, trabalhadores do sistema alimentar e seus empregadores, para se construir democracias alimentares. 

Minimizar os insumos é um passo desejável para os agricultores que buscam reduzir os custos dos insumos ou reduzir sua pegada ambiental, mas esses passos por si só não fazem uma transição agroecológica. Para iniciar uma transição agroecológica, essas etapas precisam ser combinadas com salários justos para os trabalhadores rurais e preços justos para os agricultores no mínimo, o que poderia contribuir para uma economia mais justa. Políticas e outros apoios dos governos ajudariam nessas mudanças, mas tais transições implicam mobilização política e têm um componente de soberania alimentar.

19. Que tipos de mercados, acordos comerciais e investimentos permitem o florescimento das transformações agroecológicas?   

Os atuais acordos de comércio e investimento foram concebidos para maximizar os fluxos de bens e serviços através das fronteiras, não para promover o desenvolvimento sustentável. Eles são orientados para o mercado, não para a segurança alimentar, saúde pública, paridade ou sustentabilidade. O atual regime acaba muitas vezes por minar estes, direta ou indiretamente. Os atuais sistemas de comércio apoiam os mitos de “alimentar o mundo” e os agricultores dos EUA serem capazes de exportar seu caminho para a prosperidade. Em muitos países, as abordagens da Revolução Verde foram promovidas em nome da segurança alimentar nacional, enquanto na verdade se concentravam em estratégias agrícolas orientadas para a exportação, externalizando custos ecológicos e socioeconômicos.   

O caso do México é um exemplo de como os acordos comerciais podem ser usados ​​para minar o potencial de transformações agroecológicas. Em 2021, o governo mexicano anunciou seus planos para eliminar o uso de glifosato e as importações de milho e algodão transgênicos até 2024 como parte de seu programa mais amplo de autossuficiência alimentar. A afirmação da soberania nacional poderia melhorar a biodiversidade e a saúde humana. Dependendo de como for implementado, também pode ser um passo na transição para a agroecologia. No entanto, o agronegócio dos EUA afirmou falsamente que as novas regras violam as disposições do USMCA/United States, Mexico and Canada Agreement, um acordo de livre comércio entre os EUA, México e Canadá. O resumo de política do IATP analisa as disposições de biotecnologia agrícola do USMCA para entender o que eles podem exigir das partes do acordo e sugere que esse argumento não é válido. Ainda assim, futuros compromissos comerciais baseados nessa linguagem podem criar novas ferramentas para o agronegócio desafiar as ações governamentais em torno de agrotóxicos, OGMs ou transgênicos, melhor informação para os consumidores e outros passos em direção à agroecologia.

As transformações agroecológicas exigem um repensar dos sistemas de comércio global. Organizações camponesas internacionais, como a Via Campesina, há muito exigem que a agricultura seja excluída de todos os acordos comerciais. No entanto, isso pode deixar um ambiente padrão que não é justo para vários atores do sistema alimentar, uma vez que indivíduos e nações são interdependentes para acessar nossos alimentos. Dado que as transformações agroecológicas de nossos sistemas alimentares são necessárias, as regras comerciais precisam ser projetadas para abrigar sistemas alimentares agroecológicos de inundações de importações baratas produzidas de forma insustentável, e promover (em vez de restringir) o compartilhamento e a cooperação de sementes. Isso significaria reformar os acordos comerciais para que priorizem políticas públicas que promovam a agroecologia, a ação climática e os direitos humanos sobre os fluxos comerciais de bens, serviços e investimentos.


Notas finais 

1. Sistemas alimentares sustentáveis ​​são sistemas alimentares que são: produtivos e prósperos (para garantir a disponibilidade de alimentos suficientes); equitativo e inclusivo (para garantir o acesso de todas as pessoas à alimentação e aos meios de subsistência dentro desse sistema); empoderador e respeitoso (para garantir agência para todas as pessoas e grupos, incluindo aqueles que são mais vulneráveis ​​e marginalizados para fazer escolhas e exercer voz na formação desse sistema); resiliente (para garantir estabilidade diante de choques e crises); regenerativa (para garantir a sustentabilidade em todas as suas dimensões); e saudável e nutritivo (para garantir a absorção e utilização de nutrientes). Fonte: HLPE. 2020. Segurança alimentar e nutrição: construindo uma narrativa global para 2030. Um relatório do Painel de Alto Nível de Especialistas em Segurança Alimentar e Nutricional do Comitê de Segurança Alimentar Mundial, Roma.

2. Para uma revisão abrangente, História e correntes do pensamento agroecológico, ver capítulo 2, pp:41-67 de Agroecology: Science and Politics.

3. A soberania alimentar é o direito dos povos a alimentos saudáveis ​​e culturalmente apropriados, produzidos por métodos ecologicamente corretos e sustentáveis, e seu direito de definir seus próprios sistemas alimentares e agrícolas. Coloca as aspirações e necessidades daqueles que produzem, distribuem e consomem alimentos no centro dos sistemas e políticas alimentares, e não nas demandas dos mercados e corporações. Fonte: Declaração de Nyéléni , o primeiro fórum global sobre soberania alimentar, Mali, 2007; Para uma discussão sobre a Soberania Alimentar, ver Pimbert, Michel Towards Food Sovereignty: Reclaiming Autonomous Food Systems, IIED, 2009.

4. Veja A paisagem em evolução da pesquisa agroecológica, uma ciência em rede e avaliação baseada em bibliometria demonstrando que a agroecologia de fato evoluiu para possuir muitas das características de uma “ecologia de [todo] sistema alimentar”.

5. Ver seção sobre Métodos e processos para definir princípios, em Princípios e elementos agroecológicos e suas implicações para a transição para sistemas alimentares sustentáveis. Uma revisão, em https://link.springer.com/article/10.1007/s13593-020-00646-z .

6. O Painel de Alto Nível de Especialistas em Segurança Alimentar e Nutricional do UNCFS foi encarregado de avaliar “Abordagens agroecológicas e outras inovações” quanto à sua adequação para ajudar a agricultura sustentável e as transformações dos sistemas alimentares que melhorem a segurança alimentar e a nutrição. Veja o relatório aqui: https://www.fao.org/3/ca5602en/ca5602en.pdf .

7. Veja aqui nossas reflexões sobre as negociações .

8. A Declaração Nyéléni organizada pelo Comitê Internacional de Planejamento sobre Soberania Alimentar define a agroecologia como um movimento e prática liderados por pessoas; diz que esses processos precisam ser respeitados e apoiados, em vez de liderados, pela ciência e pela política (e pede que eles parem de apoiar “forças que destroem”). Veja aqui mais sobre o processo Nyeleni .

9.  Altieri, MA (2000) Agroecologia: Princípios e Estratégias para o Projeto de Sistemas Agrícolas Sustentáveis. Hayworth Press, Nova York. Fonte: Faculdade de Recursos Naturais: Universidade da Califórnia, Berkeley.

10. Veja um exame detalhado desta questão sobre tecnologia e agroecologia no contexto do CRISPR aqui A agroecologia e o CRISPR podem se misturar? A política de complementaridade e o avanço para a soberania tecnológica.

11. Para uma ampla discussão sobre o papel do diálogo de saberes na construção e elaboração do
paradigma da soberania alimentar da LVC e na construção coletiva de quadros mobilizadores de resistência e de promoção da agroecologia, ver https://www.fao.org /agricultura familiar/detalhe/pt/c/386215/ .

12. Veja uma discussão sobre agricultura orgânica, agroecológica e regenerativa no contexto da série Revisiting Crisis By Design do IATP.

13. Para uma crítica detalhada sobre a diluição dos padrões NSOB e os desenvolvimentos nas respostas nos Estados Unidos, consulte: https://www.cornucopia.org/2018/04/will-additional-labels-on-organic-food-clarify -ou-confundir/ .

14. A IFOAM descreve o Organic 3.0 como uma compreensão revisada do papel do movimento orgânico, para ajudar a desenvolver sistemas agrícolas e mercados verdadeiramente sustentáveis ​​baseados em princípios orgânicos. O conceito é baseado em resultados e continuamente adaptável aos contextos locais, mas ainda fundamentado em requisitos mínimos claramente definidos, e posiciona o orgânico como um sistema agrícola moderno e inovador que integra holisticamente os contextos locais e regionais. O núcleo do Organic 3.0 é a relação viva entre consumidores, produtores e nosso meio ambiente.

15. O conceito de pegada ecológica é especialmente útil no contexto de diferenciação de abordagens agroecológicas de outras abordagens. Veja aqui mais sobre a pegada ecológica, proposta pelo relatório HLPE sobre agroecologia como 4º princípio operacional (além dos três princípios tradicionais: melhorar a eficiência dos recursos; fortalecer a resiliência; e garantir a equidade/responsabilidade social) para ajudar a avaliar se um sistema alimentar é sustentável ou não .

16. Veja o Relatório HLPE #12 para uma discussão extensa: https://www.fao.org/3/i7846e/i7846e.pdf .

17. Para uma atualização em 2020 da Iniciativa Scaling up Agroecology com três áreas de trabalho inter-relacionadas: 1) Cocriação de conhecimento e inovação; 2) processos políticos, inclusive por meio da alavancagem dos processos políticos existentes e do fornecimento de suporte técnico; 3) Construindo conexões e redes de suporte) veja: https://www.fao.org/3/nd420en/ND420EN.pdf.

18. Leia: https://www.fao.org/agroecology/database/detail/en/c/1506272/.

19. As práticas do ZBNF podem ser agroecológicas ou não, dependendo dos detalhes. Para um exemplo de ZBNF como prática agroecológica, veja este estudo de caso de Tamil Nādu.

20. Veja aqui mais sobre o trabalho por meio de Dynamique pour une Transition Agroécologique au Sénégal (DyTAES), uma estrutura institucional construída para apoiar debates políticos sobre transições agroecológicas e tem agricultores, organizações de consumidores, ONGs, autoridades locais, pesquisadores e empresas privadas como seus membros.

21. Para uma discussão detalhada, veja: Desmantelando a Democracia e Redefinindo o Controle Corporativo dos Sistemas Alimentares.

22. Veja uma discussão detalhada: A agroecologia está sendo cooptada pela Big Ag? 

23. Veja aqui, https://croplife.org/news/what-is-agroecology/ da CropLife International. A CropLife é uma associação da indústria agrícola que faz lobby em nome de seus membros, agrotóxicos e empresas de biotecnologia vegetal, como Monsanto, DuPont, Syngenta e outras. 

24. A Alliance for Sciencefinanciada principalmente pela Fundação Bill & Melinda Gates, parece liderar o esforço de relações públicas para minar a defesa da agroecologia de organizações africanas por meio de mensagens como a agroecologia é um beco sem saída para a África e “a agroecologia e a biotecnologia podem funcionar de mãos dadas”.

25. De acordo com a Civil Eats “Nos últimos anos, empresas como General Mills, Danone,  CargillMcDonald’s, Target e Land O’Lakes anunciaram planos para avançar na agricultura regenerativa em milhões de acres de terras agrícolas norte-americanas”.

Tradução livre, parcial, de Luiz Jacques Saldanha, agosto de 2022.