Suprema Corte do México ratifica proibição de cultivo de milho transgênico

Por unanimidade, a Suprema Corte de Justiça da Nação negou um recurso de grandes transnacionais de biotecnologia para anular a sentença que proibia o plantio comercial de milho transgênico no México. Foto: Kau Sirenio / Footer

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Por Alejandro Ruiz

14 De Outubro De 2021

MÉXICO – A primeira Câmara do Supremo Tribunal de Justiça da Nação (SCJN) negou por unanimidade nesta quarta-feira, 13, a tutela de revisão promovida em 2016 pelas empresas Bayer-Monsanto, Syngenta, PHI México e outras, para suspender a Medida Cautelar que definitivamente proíbe no México o plantio comercial de milho geneticamente modificado.

No projeto de resolução, elaborado pela ministra (juíza) Norma Lucía Piña Hernández, fica estabelecido que em nenhum momento a decisão de 2016 contrariou os princípios da segurança jurídica e da discrição, argumentos que as empresas invocaram para levantar a Medida Cautelar.

Os integrantes da Coletividade Reclamante em Defesa do Milho destacaram em comunicado que a resolução permite aos juízes ditar as medidas cabíveis para a proteção dos direitos e interesses de uma Coletividade e ressaltaram que o Tribunal rejeitou 130 argumentos classificados como “vazios e falaciosos”.

E acrescentaram: «Esta decisão é transcendental para a preservação do milho e dos campos de milho nativos, mas também para o setor apícola e para as próprias abelhas, como parte da biodiversidade, que tem sido gravemente afetada pela entrada de transgênicos como a soja e milho, além do uso de agrotóxicos como o glifosato”.

A decisão da mais alta corte do país significa que o cultivo comercial de milho transgênico continuará proibido no México, enquanto o cultivo experimental é permitido sob certas condições, como notificação prévia a um juiz.

Embora a ratificação do SCJN implique um avanço nas restrições que, desde 2002, grupos e organizações de defesa do milho têm promovido para proibir o cultivo de organismos geneticamente modificados no México, ainda há pendências na agenda para cumprir essa tarefa no o país.

Uma longa luta inacabada 

Em 1988 o governo mexicano autorizou, pela primeira vez, a realização dos primeiros testes em campos de tomate geneticamente modificado ou transgênico. Foto: Kau Sirenio / Footer

Esse fato começou a abrir as portas para que esse tipo de teste passasse a ser aplicado com outras culturas como milho, soja e algodão.

Os efeitos sobre a contaminação das plantações foram evidentes, principalmente nas de milho, onde a introdução acelerada de transgênicos desde a assinatura em 1994 do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA) afetou as variedades nativas de milho., Assim como os solos e outras culturas associadas ao milharal, como a abóbora.

Isso levou a recém-formada Comissão Nacional de Biossegurança Agrícola (CNBA), em 1998, a estabelecer uma moratória ao plantio de milho geneticamente modificado em todo o país, já que, como em outras regiões da Mesoamérica, o México é considerado um centro de origem da cultura.

Apesar disso, e embora o México seja reconhecido como o centro de origem da cultura, as relações comerciais derivadas do NAFTA foram introduzindo sementes de milho transgênico no campo nacional, levando a que até 2004, segundo a  Revista Biodiversidade, Sustento e Cultura, o país importará um terço do milho que consome dos Estados Unidos.

Da mesma forma, o desaparecimento do Conasupo, sistema de distribuição e compra que incentivava a produção nacional e os preços regulados no país, fazia com que, no início do século XXI, a presença de transgênicos colocasse em risco centenas de milhares de famílias camponesas e indígenas que por séculos viveram do cultivo de milho.

Os beneficiários desta nova modalidade comercial foram as empresas transnacionais que, desde 2008, controlam mais de 80% do mercado comercial de sementes através de patentes.

Essas empresas incluem gigantes globais de biotecnologia, como Bayer-Monsanto, Syngenta, DuPont, Bayer; todos com negócios em campos mexicanos e atualmente membros do conselho de diretores da Mexican Association of Seedbeds.

Em estudo realizado em 2001 por Ignacio Chapela e David Quist, publicado na revista  Nature, os altos níveis de contaminação do milho nativo nas regiões de Oaxaca e Puebla foram revelados com a introdução de lavouras transgênicas.

Isso fez com que, em 2002, centenas de comunidades camponesas e indígenas, bem como organizações ambientalistas e da sociedade civil, formassem a Rede em Defesa do Milho, que se comprometeu a realizar amostragens em outras regiões do país, bem como a promoção de ações jurídicas, políticas e sociais em defesa do milho nativo.

Os fóruns e encontros realizados pela Rede desde 2002 têm enfatizado a importância de entender o milho como eixo norteador da vida comum de milhares de camponeses e indígenas e comunidades mexicanas, já que os usos dessa cultura não só acompanham a alimentação, mas implicam toda uma relação cultural, orgânica e política dos territórios.

O Estado mexicano, entretanto, não deu ouvidos às demandas e ao eco internacional das demandas da Rede em Defesa do Milho, e em 2004, sob o mandato de Vicente Fox, foi aprovada a mais conhecida Lei de Biossegurança e Organismos Geneticamente Modificados como “Lei de Monsanto”.

Para 2009, já no período de Felipe Calderón, foi eliminada a moratória estabelecida desde 1998 para impedir o plantio de milho transgênico em território mexicano e autorizado o plantio experimental de milho transgênico operado pelas empresas Bayer-Monsanto, Syngenta, PH México. (uma fusão entre DuPont e Pioneer) e Dow.

Com base nisso, e após uma série de ações e liminares internacionais contra outras culturas, como a soja transgênica, em 2013 a Fundação Semillas de Vida, em conjunto com a Coletividade Reclamante em defesa do Milho Nativo, ganhou uma ação em que Comercialização de plantio de milho transgênico foi proibido no México e o cultivo experimental foi regulamentado.

Essa decisão, que implica um avanço em relação às décadas e legislações anteriores, foi ratificada hoje pelo SCJN.

No entanto, ainda está pendente a modificação do regime jurídico para garantir realmente a proteção do milho nativo das lavouras transgênicas e, nesse caso, o acesso à reparação dos danos por parte das empresas que desde os anos oitenta atentam contra a vida no interior do México. .

Este artigo foi publicado originalmente na Pie de Página , da rede mexicana Periodistas de A Pie.

Tradução livre, parcial, de Luiz Jacques Saldanha, outubro de 2021.