“Se as práticas agroecológicas emergem é precisamente como resposta a um modelo de agricultura que contamina a terra e os nossos corpos.” A reflexão é de Esther Vivas em artigo publicado no jornal espanhol Público, 07-07-2014. A tradução é de André Langer.
http://www.ihu.unisinos.br/noticias/533123-quem-tem-medo-da-agricultura-ecologica
Eis o artigo.
A agricultura ecológica deixa alguns bem nervosos. É o que se constata, ultimamente, na multiplicação de artigos, entrevistas, livros que tem apenas o objetivo de desprestigiar seu trabalho, desinformar sobre sua prática e desacreditar seus princípios. Trata-se de discursos cheios de falsidades que, vestidos de uma suposta independência científica para se legitimar, contam-nos as “maldades” de um modelo de agricultura e alimentação que ganha progressivamente mais apoios. No entanto, por que tanto esforço para desautorizar esta prática? Quem tem medo da agricultura ecológica?
Quando uma alternativa é bem aceita socialmente, são duas as estratégias para neutralizá-la: a cooptação e a estigmatização. A agricultura ecológica é torpedeada por ambas. Por um lado, cada vez são mais as grandes empresas e os supermercados que produzem e comercializam estes produtos para atender a um florescente nicho de mercado e “limpar” a imagem, mesmo que suas práticas não tenham nada a ver com o que este modelo defende. Seu objetivo é cooptar, comprar, subsumir e integrar esta alternativa ao modelo agroindustrial dominante, esvaziando-a de conteúdo real. Por outro lado, a estratégia do “medo” é estigmatizar, mentir e desinformar sobre a mesma, confundir a opinião pública, para assim desautorizar este modelo alternativo.
E se alguém levanta a voz em sua defesa? Sofre insultos e desqualificações. Se um cientista se posiciona contra a agricultura industrial e transgênica, é tachado de “ideológico”. Como se defender este tipo de agricultura não respondesse a uma determinada ideologia, a daqueles que se situam na órbita das multinacionais agroalimentares e biotecnológicas e que muitas vezes cobram das mesmas. Se um “não cientista” a critica, então, seu problema é que não sabe, que é um ignorante. De acordo com estes, parece que só os cientistas e, em particular, aqueles que defendem seus próprios postulados, podem ter uma posição válida a respeito. Uma atitude muito respeitosa com a diferença. Outra prática habitual é qualificar quem critica de “magufo”, sinônimo depreciativo, segundo a gíria desta “elite científica”, de anticientífico. Vê-se que defender uma ciência a serviço do público e do coletivo implica em ser contra ela. Uma argumentação de loucos.
Vejamos, na sequência, algumas das afirmações mais repetidas para desqualificar e desinformar sobre a agricultura ecológica, e que ampliaremos em artigos subsequentes. Porque há quem acredita que repetir mentiras serve para construir uma “verdade”. Contra a calúnia, dados e informação.
O perigo dos agrotóxicos
“A agricultura ecológica não é mais saudável nem melhor para o meio ambiente”, dizem. Querem nos fazer acreditar que uma agricultura industrial, intensiva, que usa sistematicamente produtos químicos de síntese em sua produção, é igual a uma agricultura ecológica que prescinde dos mesmos. Incrível. Se as práticas agroecológicas emergem é precisamente como resposta a um modelo de agricultura que contamina a terra e os nossos corpos.
Há anos, a retirada e proibição de fitossanitários, agrotóxicos, utilizados na agricultura convencional foram uma constante, após se demonstrar seu impacto negativo sobre a saúde do campesinato e dos consumidores e no meio ambiente. Talvez o caso mais conhecido seja o do DDT, um inseticida utilizado para o controle de pragas desde os anos 1940 e que, devido à sua alta toxicidade ambiental e humana e pouca ou nula biodegradabiidade, foi proibido em muitos países. Em 1972, aAgência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos vetou seu uso ao considerá-lo um “potencial cancerígeno para as pessoas”. Outras agências internacionais, como o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer, entre outras, denunciaram também estes efeitos. Mesmo assim, quem mantém a afirmação inicial – aqui rebatida – mostra-se ainda, e mesmo que possa surpreender, partidário do DDT e o segue defendendo, apesar de todas as evidências.
No entanto, o DDT não é um caso isolado. Cada ano, produtos químicos de síntese utilizados na agricultura industrial são retirados do mercado pela Comissão Europeia. Sem ir mais longe, em 2012, o Tribunal de Grande Instância de Lyonconcluiu que a intoxicação do camponês Paul François e as consequentes sequelas em sua saúde foram devidas ao uso e manipulação do herbicida Lasso, da Monsanto, que não informava nem sobre a correta utilização do produto nem sobre seus riscos sanitários. A própria Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) sentenciava no artigo Control of water pollutiom from agriculture, em 1996, que o uso de pesticidas na agricultura tinha efeitos negativos em vários níveis: 1) Nos sistemas aquáticos, já que sua alta toxicidade e a persistência de químicos degradava as águas. 2) Na saúde humana, pois a inalação, a ingestão e o contato com a pele destes produtos químicos incidia no número de casos de câncer, deformidades congênitas, deficiências no sistema imunológico, mortalidade pulmonar. 3) No meio ambiente, com a morte de organismos, geração de cânceres, tumores e lesões em animais, através da inibição reprodutiva, e a disrupção endócrina, entre outros. Que fitossanitários serão proibidos amanhã? Impossível saber. Até quando permitiremos continuar sendo cobaias?
Brincando com a saúde dos países do Sul
Capítulo à parte mereceria a análise do impacto destes agrotóxicos sobre a saúde das comunidades próximas às plantações onde são aplicados. Inúmeros foram os casos documentados, especialmente em países do Sul, onde seu uso é mais permissivo. Na Argentina, temos o conhecidíssimo caso das Mães de Ituzaingó, em Córdoba, em pé de guerra contra as fumigações nas plantações de soja ao redor da sua comunidade, e responsáveis pelo alto número de casos de câncer, malformações em recém nascidos, anemia hemolítica… que afetam a sua população. Em 2012, a Câmara I do Crime de Córdoba deu-lhes ganho de causa ao sentenciar que a fumigação com agrotóxicos era crime e seus autores foram condenados por contaminação dolosa.
Em vários países centro-americanos, o uso sistemático do Dibromo Cloropropano (DBCP) em plantações das Standard Fruit Company, Dole Food Corporation Inc., Chiquita Brands International foi o responsável por centenas de mortes, cânceres, deficiências mentais, malformações genéticas, esterilidade e dores por todo o corpo entre seus trabalhadores. Mesmo que, em 1975, a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos considerasse a DBCP um possível agente cancerígeno, as multinacionais bananeiras continuaram a usá-lo. A lista poderia continuar com casos de comunidades afetadas pelo uso de agrotóxicos na Índia, Tailândia, Paraguai e muitos outros países. A agricultura industrial produz doenças e mortes, como demonstram os dados. Quem o negar, mente.
Se falamos de alimentação e saúde é necessário referir-se também ao impacto negativo de alguns aditivos alimentares (aromatizantes, colorantes, conservantes, antioxidantes, adoçantes, adensadores, realçadores de sabor, emulsionantes…) em nosso organismo. Está claro que desde as origens da alimentação existem métodos para conservá-la, e é fundamental que assim seja, caso contrário, o que comeríamos? Entretanto, o desenvolvimento da indústria alimentar generalizou o uso de aditivos químicos de síntese para adaptar a alimentação às características de um mercado quilométrico (onde os alimentos viajam grandes distâncias do campo ao prato), consumista (realçando desnecessariamente a cor, o sabor e o aroma dos produtos para torná-los mais apetecíveis) e que adoça artificialmente a alimentação, com produtos que deixam muito a desejar.
Do aspartame e do glutamato monossódico
Não se trata de colocar todos os aditivos no mesmo saco, mas assinalar o impacto que alguns podem ter em nosso organismo, especialmente os aditivos sintéticos, em comparação com os naturais. O livro Os aditivos alimentares. Perigo, de Corinne Gouget, assinala especialmente dois: o aspartame, codificado na Europa com o número E951, e o glutamato monossódico, com o E621.
O aspartame é um adoçante não calórico empregado em refrigerantes e comida “light”. Alguns estudos apontaram as consequências negativas que pode ter em nossa saúde. A Fundação Ramazzini de Oncologia e Ciências Ambientais, com sede na Itália, publicou, em 2005, na revista Environmental Health Perspectives os resultados de um exaustivo trabalho onde, a partir da experimentação com ratos, assinalava os possíveis efeitos cancerígenos do aspartame para o consumo humano. O informe concluía que o aspartame é um potencial agente cancerígeno, inclusive com uma dose diária de 20 miligramas por quilo, muito abaixo dos 40 miligramas por quilo de ingestão diária aceitos pelas autoridades sanitárias europeias. A Fundação Ramazzini concluía que era necessário revisar as diretrizes sobre sua utilização e consumo. No entanto, a Agência Europeia de Segurança Alimentar (EFSA, em sua sigla em inglês) omitiu estas conclusões e, seguindo a pauta habitual com os trabalhos científicos críticos, desautorizou o trabalho. Não esqueçamos os laços estreitos da EFSA com a indústria alimentar e biotecnológica e como, por exemplo, sua presidenta na Agência Espanhola de Segurança Alimentar é Ángela López de Sá Fernández, ex-diretora da Coca-Cola.
O glutamato monossódico, por sua vez, é um aditivo realçador de sabor muito utilizado em frios, hambúrgueres, misturas de condimentos, sopas, molhos, batatas fritas, guloseimas. Estes últimos, muito consumidos pelas crianças. Em 2005, o professor de fisiologia e endocrinologia experimental da Universidade Complutense de Madri, Jesús Fernández-Tresguerres, um dos 35 membros da Real Academia Nacional de Medicina, publicou nos Anais da Real Academia Nacional de Medicina os resultados de um longo trabalho onde analisava os efeitos da ingestão de glutamato monossódico no controle do apetite. As conclusões foram demolidoras: sua ingestão aumentava a fome e a voracidade em 40% e impedia o bom funcionamento dos mecanismos inibidores do apetite, o que contribuía para o aumento da obesidade e, a partir de certas quantidades, se considerava que poderia ter efeitos tóxicos sobre o organismo. Alguns chegaram a denunciar, informalmente, esta substância como “a nicotina dos alimentos”.
Além do aspartame e do glutamato monossódico, outros aditivos também se mostraram prejudiciais à saúde humana, e acabaram sendo retirados do mercado. Em 2007, a Comissão Europeia proibiu o uso do colorante vermelho 2G (E128), utilizado mormente em linguiças e hambúrgueres, ao considerar, depois de uma reavaliação da EFSA, que este poderia ter “efeitos genotóxicos e cancerígenos” para as pessoas. A avaliação toxicológica anterior foi realizada 25 anos atrás. Outros estudos assinalaram como a mistura de alguns colorantes, muitas vezes utilizados em refrigerantes e “guloseimas”, combinados com a ingestão de outros aditivos presentes por sua vez nestes produtos provocaria hiperatividade infantil. Assim concluía um estudo sobre aditivos alimentares publicado na revista The Lancet, em 2007: “As cores artificiais ou o conservante benzoato de sódio (ou ambos) na dieta provocam um aumento da hiperatividade em crianças de três anos e em crianças entre oito e nove anos”. O maravilhoso e duro documentário francês Nossos filhos nos acusarão, nos recorda, como assinala o seu título, a responsabilidade que temos.
A agricultura ecológica, ao contrário, prescinde destes aditivos químicos de síntese, colocando no centro da produção de alimentos a saúde das pessoas e do planeta. Quem pode considerar, visto o que foi visto aqui, que a agricultura e a alimentação industrial, intensiva e transgênica é mais respeitosa com as pessoas e o meio ambiente que a ecológica? Vocês decidem.
Quem tem medo da agricultura ecológica? Parte II
http://www.ihu.unisinos.br/noticias/533285-quem-tem-medo-da-agricultura-ecologica-parte-ii
“A agricultura ecológica, no meu entender, só tem sentido a partir de uma perspectiva social, local e camponesa, como sempre defendeu a maioria de seus impulsionadores”, defende a jornalista e ativista social Esther Vivas, em artigo publicado no jornal espanhol Público, 14-07-2014. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
A agricultura ecológica despertou, nos últimos tempos, as mais variadas “iras”, sendo objeto de todos os tipos de calúnias. Seu êxito e múltiplos apoios foram proporcionais às críticas recebidas. No entanto, quem tem medo da agricultura ecológica? Por que tanto esforço em desautorizá-la?
Todas estas perguntas foram formuladas em um artigo anterior, onde analisávamos as mentiras por trás de afirmações como “a agricultura ecológica não é mais saudável, nem melhor para o meio ambiente do que a agricultura industrial e transgênica”. Hoje, abordaremos outras questões em relação à sua eficiência, o preço e a falsa alternativa que significa uma “agricultura ecológica” a serviço das grandes empresas. Como dizíamos então: diante da calúnia, dados e informação.
Da eficiência e o preço
“A agricultura ecológica é pouco eficiente e cara”, dizem seus detratores. Aqueles que realizam esta afirmação, esquecem-se que é exatamente o atual modelo de agricultura industrial o que desperdiça anualmente um terço dos alimentos produzidos para consumo humano, em escala mundial, 1,3 bilhão de toneladas de comida, segundo dados daOrganização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). Trata-se de uma agricultura de “usar e jogar”. Consequentemente, quem é o ineficiente, aqui? Mesmo sem estes números, é óbvio que o atual modelo de agricultura industrial, intensiva e transgênica não satisfaz as necessidades alimentares básicas das pessoas. A fome, em um mundo onde se produz mais comida do nunca, é o melhor exemplo, tanto nos países do Sul, como aqui.
De sua parte, a agricultura ecológica e de proximidade demonstrou que garante melhor a segurança alimentar às pessoas do que a agricultura industrial e que permite uma maior produção de comida, especialmente em lugares desfavoráveis, segundo as palavras do relator especial das Nações Unidas para o direito à alimentação, Olivier de Schutter, apoiando-se em seu relatório ‘A agroecologia e o direito à alimentação‘. A partir dos dados expostos neste trabalho, a reconversão de terras em países do Sul para o cultivo ecológico aumentava sua produtividade em até 79%, na África, em especial, a reconversão permitia um aumento de 116% das colheitas. Os números falam por si.
Caso falemos do preço, sobretudo, fazendo a sua comparação com a qualidade, mais uma vez a agricultura ecológica sai em melhor posição. Talvez não pareça em um primeiro momento, pois há um discurso único, que se repete e se repete e se repete, que nos diz que o ecológico é sempre mais caro. No entanto, não é assim. Muitas vezes, depende de onde e do que compramos. Não é o mesmo comprar em um supermercado ecológico ou em um comércio ‘gourmet’ do que comprar diretamente dos camponeses, no mercado ou por meio de um grupo ou cooperativa de consumo agroecológico, nos primeiros os preços costumam ser muito mais caros do que nos segundos, onde seu custo pode ser igual ou, inclusive, inferior ao comércio tradicional em se tratando de um produto da mesma qualidade.
Além disso, teríamos que nos perguntar como pode ser que determinados produtos ou alimentos no supermercado sejam tão baratos. Estamos pagando seu preço real? Qual é a sua qualidade? Em que condições foram elaborados? Quantos quilômetros percorreram do campo à mesa? Muitas vezes, um preço muito baixo esconde uma série de custos invisíveis: condições de trabalho precárias na origem e destino, má qualidade do produto, impacto ambiental, etc. Trata-se de uma série de gastos ocultos que acabamos socializando entre todos, porque se a comida percorre longas distâncias e aumenta a mudança climática, com a emissão de gases de efeito estufa, quem paga por isso? Se comemos alimentos de baixa qualidade, que tem um impacto negativo em nossa saúde, quem os custeia? Em definitivo, como diz o refrão: Pão para hoje e fome para amanhã.
E não só isso, quando entramos no ‘super’, o que compramos? Calcula-se que entre 25% e 55% da compra no supermercado é compulsiva, fruto de estímulos externos que nos instam a comprar, sem qualquer raciocínio. Quantas vezes fomos ao supermercado para comprar quatro coisas e saímos com o carrinho cheio? O supermercado é uma máquina de vender, não resta a menor dúvida, é um dos espaços mais estudados de nossa vida cotidiana, para que nossa compra nunca seja aleatória.
Outra afirmação mil vezes repetida é a que diz que “a agricultura ecológica é apenas para os ricos”, ou quando quem fala busca o insulto, algo frequente entre o setor “antiecológico”, dirá que “a agricultura ecológica é apenas para mauricinhos”. Tanto em um caso como em outro, aos que afirmam estas palavras, asseguro que nunca colocarm o pé em um grupo ou cooperativa de consumo agroecológico, porque seus membros, em geral, podem ser qualificados com muitos adjetivos, mas de “ricos” e “mauricinhos” têm muito pouco. São pessoas que apostam em outro modelo de agricultura e alimentação, buscando se informar, tomar consciência, buscar dados contrastados sobre os impactos daquilo que comemos em nossa saúde, no meio ambiente, entre o campesinato.
Nesta vida, “instruem-nos” para pensar que “gastamos” dinheiro em comida, mas se trata de “gastar” ou “investir”? A educação é chave. Daí, que é fundamental fazer chegar os princípios e as verdades da agricultura ecológica ao conjunto da população. Comer bem, e ter direito a comer bem, são para todos.
Uma “agricultura ecológica” a serviço do capital
“A agricultura ecológica não tem fins sociais e aumenta a pegada de carbono”, dizem seus detratores. Aqui, a pergunta chave é: de que agricultura ecológica nós estamos falando? Como dizíamos no artigo anterior, uma das ameaças à agricultura ecológica é justamente sua cooptação, a assimilação de sua prática por parte da indústria alimentar. Cada vez são mais as empresas do ‘agribusiness’ e os supermercados que apostam neste modelo de agricultura livre de pesticidas e aditivos químicos, mas esvaziando-a de qualquer olhar para a mudança social. Seu objetivo é claro: neutralizar a proposta. Trata-se de uma “agricultura ecológica” a serviço do capital, com alimentos quilométricos, escassos direitos trabalhistas na produção e na comercialização. Esta não é a alternativa na qual nós apostamos por uma mudança no modelo agroalimentar. A agricultura ecológica, no meu entender, só tem sentido a partir de uma perspectiva social, local e camponesa, como sempre defendeu a maioria de seus impulsionadores.
Por outro lado, surpreende-me que os detratores da agricultura ecológica se preocupem tanto com a pegada de carbono e o impacto dos gases de efeito estufa no meio ambiente, quando sua aposta por uma agricultura industrial é precisamente uma das principais responsáveis dos mesmos. Segundo o relatório ‘Alimentos e mudança climática: o elo esquecido’, daGRAIN, entre 44% e 55% dos gases de efeito estufa são provocados justamente pelo conjunto do sistema agroalimentar global, como consequência da soma das emissões provocadas pela mudança no uso do solo e o desmatamento; a produção agrícola; o processamento, o transporte e o empacotamento dos alimentos; e os desperdícios gerados. Se aos críticos da agroecologia a mudança climática tanto lhes inquieta, sugiro que apostem em uma agricultura ecológica, local e camponesa.
Quem impõe o quê?
“Impõem-nos a agricultura ecológica. Eu quero comer transgênicos, e não me deixam”, dizem alguns, embora pareça uma brincadeira. No entanto, quem impõe o quê? A agricultura industrial, sim, foi resultado de uma imposição, a da Revolução Verde, promovida a partir dos anos 1940, e em décadas posteriores, por governos como o dos Estados Unidos e fundações como as da Ford e Rockefeller, e que implicou na progressiva substituição de um modelo de agricultura tradicional, onde os camponeses tinham a capacidade de decidir sobre o que e como cultivavam, por uma agricultura industrial “adicta ao petróleo e aos fitossanitários, que levou à privatização dos bens comuns, e em particular das sementes. Muitos camponeses não tiveram escolha. Hoje, vemos as consequências deste modelo agrário: fome, saída dos camponeses, patentes sobre as sementes, monopólio de terras, etc.
Além disso, a principal imposição agrária foi, sem dúvidas, a do cultivo transgênico, e a impossível coexistência entre agricultura transgênica e agricultura convencional e ecológica é o melhor exemplo. As plantações transgênicas, por meio do ar e a polinização, contaminam outras. É dessa forma que funciona o que poderíamos chamar “a ditadura transgênica”. Em Aragão e na Catalunha, nas áreas onde mais se cultiva transgênico, concretamente a variedade de milho MON 810 daMonsanto, a produção de milho ecológico praticamente desapareceu em razão dos múltiplos casos de contaminações sofridas. As evidências são irrefutáveis, e quem diz o contrário mente.
A enumeração de frases com o único propósito de desautorizar a agricultura ecológica poderia continuar. São tantas as falsidades vertidas que este artigo poderia ter três, quatro e até cinco partes, mas paro aqui. Espero que as informações e os dados levantados possam ser de utilidade para aqueles que frente a verdades únicas perguntam e questionam a realidade que nos é imposta.
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