A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), órgão máximo da Igreja Católica no país, diz estar mais do que decepcionada e irritada com um gesto entendido como censura do governo da presidente Dilma Rousseff à denúncia que seria feita ontem, ao papa Francisco, sobre a situação dos povos indígenas brasileiros.
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A reportagem é de Fábio Brandt, publicada pelo jornal Valor, 25-04-2014.
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), braço da CNBB dedicado à questão indígena, acusa o governo de ter usado a Polícia Federal para prender e, assim, impedir a ida de um cacique Tupinambá à missa que o Vaticano fez, na tarde de ontem, em homenagem à canonização do Padre José de Anchieta. Ontem mesmo, dias após ter sua prisão pedida, o cacique se entregou em Brasília e está preso, segundo confirmou a PF.
Na missa, afirma o Cimi por meio de sua assessoria de imprensa, o cacique Rosivaldo Ferreira dos Santos, conhecido como Babau Tupinambá, entregaria ao papa Francisco um documento com denúncias sobre violação dos direitos dos povos indígenas pelo governo da presidente Dilma Rousseff. O documento, diz o Cimi, inclui relatos sobre violações provocadas pelas obras da usina de Belo Monte e das hidrelétricas do rio Madeira.
A cúpula da CNBB, diferentemente do Cimi, evita acusar diretamente o governo Dilma de aparelhar a PF e censurar o índio. Mas não poupa críticas à situação. “Todo mundo sabe onde ele [o cacique Babau Tupinambá] mora, sabe onde ele vive. Ele tinha tirado passaporte e, de repente, chega a ordem”, diz Dom Leonardo Steiner, secretário-geral da CNBB. “O fato está criado e com repercussão. Não é assim que uma pessoa é impedida de viajar”, afirma.
Dom Leonardo diz ainda que “não é pelo fato de ele [o cacique] não viajar, que não vai ser entregue [o documento com as denúncias para o papa]”. Ele afirma que o presidente da CNBB, Dom Raymundo Damasceno, entregará o papel ao pontífice “numa próxima viagem” e “se Dom Raymundo não puder entregar, a própria presidência da CNBB entregará”.
A Presidência da República não comentou. Já a PF informou que a prisão do cacique deve-se a um “mandado de prisão temporária expedido pelo Juiz da Vara Criminal da Comarca de Una/BA, datado de 20/2/2014”. O mandado, de acordo com a PF, foi emitido a partir de representação da delegacia de Polícia Civil da cidade de Una pelo crime de homicídio qualificado.
“Ninguém vai me calar”, diz cacique Babau
“Eu não vou me intimidar, ninguém vai me calar. Sei que eles estão fazendo a minha prisão porque querem fazer um ataque a minha aldeia”, disse o cacique Babau Tupinambá nessa quinta-feira (24) durante audiência conjunta da Comissão de Direitos Humanos da Câmara e do Senado. O cacique, alvo de um inquérito no qual não teve a chance de prestar depoimento, teve a solenidade como única chance de se defender publicamente das acusações infundadas que sustentam o inquérito, antes de se entregar à Polícia Federal em Brasília.
A reportagem é de Carolina Fasolo e publicada pelo portal do Cimi, 25-04-2014.
“Não admito que me acusem de assassinato. Nós, indígenas Tupinambá da Serra do Padeiro, nunca assassinamos ninguém. Muito pelo contrário, devolvemos a vida à região. Nós damos a vida, não a morte. Morte é o que fazem com a gente o tempo todo. Esses que nos acusam sim, esses matam. Esses trucidam”, disse aos presentes.
O cacique está sob custódia da Polícia Federal em Brasília, mas a intenção da Justiça é que seja transferido para o município de Ilhéus, o que representa grande risco à vida de Babau, que é perseguido na região e já sofreu diversas ameaças, inclusive de forças policiais que ocupavam a região da Serra do Padeiro, parte da Terra Indígena (TI) Tupinambá de Olivença.
“O Exército estava nos ameaçando de morte o tempo todo lá na aldeia, e foi por isso que eu soltei aquela nota pública (Veja aqui). O Exército e a Força Nacional pegando os pequenos produtores e ameaçando, dizendo que queriam me fuzilar na hora que me encontrassem, fuzilar meus irmãos… A situação ficou tão tensa que eu soltei aquela nota denunciando diretamente a situação e aí, como os senhores estão vendo, recebi um convite da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) para visitar o Papa”.
Após o convite da entidade, no entanto, o mandado de prisão – que estava expedido há mais de dois meses pela Justiça de Una (BA) – veio à tona, impedindo Babau de embarcar para Roma e apresentar ao Papa Francisco uma série de documentos e denúncias sobre a violação dos direitos indígenas no país.
Babau disse que sua prisão é uma estratégia governamental para travar o processo demarcatório da TI Tupinambá de Olivença, que é reconhecida desde 2009 como de ocupação tradicional, mas ainda aguarda a assinatura da Portaria Declaratória pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.
“Tudo isso pra não dar a nossa terra, pra não devolver a nossa terra, que nós temos e que nunca saímos de lá! Nós nunca saímos. Nós vivemos lá. Agora, o que a gente encontra com essa ocupação militar feita pelo governo, pra intimidar nós Tupinambá é uma violência extrema, uma criminalização montada, forjada, pra acabar com a gente mesmo. E o caciqueBabau se tornou vítima direta, porque sou uma pessoa que vocês estão vendo. Sou claro. Mas não vou temer, e não vou temer nunca! Sou Tupinambá!”. Depois da audiência, o cacique encaminhou-se à Polícia Federal, onde foi detido.
A defesa de Babau entrou com um habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e aguarda a decisão do ministro Sebastião Alves dos Reis Junior. Pedimos a sua ajuda. Envie a mensagem abaixo ao ministro do STJ e peça ‘Liberdade pra Babau!’. Acreditamos que a sensibilização do ministro, diante das falhas do inquérito e do equívoco do mandado de prisão, possa restabelecer a justiça.