Pecuária certificada: a quebra de um paradigma.

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Uma certificada e sustentável? Algo inimaginável há muito pouco tempo começou a tomar forma, pelo menos com um exemplo que poderá dar nova fisionomia a um dos setores mais conservadores e refratários a inovações sustentáveis.

 

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por Reinaldo Canto*

gado 300x214 Pecuária certificada: a quebra de um paradigma
Criação de gado extensivo no Mato Grosso: setor é um dos mais criticados pelos ambientalistas. Foto: Roosewelt Pinheiro/Abr

 

Afinal, se existe uma atividade econômica rotulada como pouco afeita a adotar critérios de em seu negócios, principalmente aqui pelas terras de Pindorama, é sem dúvida a pecuária. No caudaloso cipoal de acusações consta a de contribuir na categoria para: desmatamento da , degradação do solo, do ar e da água, a responsabilidade por ocasionar perdas consideráveis à e ao agravamento do e das .

A , órgão das Nações Unidas para a e a Alimentação, já classificou a atividade como uma das maiores contribuintes para o acirramento dos problemas ambientais. Para complicar ainda mais a má fama dos boizinhos e vaquinhas que compõem o enorme rebanho brasileiro, com mais de 200 milhões de cabeças (2º maior do mundo atrás apenas dos Estdos Unidos e 2º maior exportador de carne do planeta depois da Austrália), estudos indicam que em um hectare utilizado pela pecuária são produzidos apenas 34 quilos de carne. No mesmo espaço é possível produzir quase quatro toneladas de feijão e 6,5 toneladas de milho, por exemplo. O consumo de água também é cinco vezes maior na pecuária do que na produção de cereais, de acordo com a FAO.

São argumentos poderosos para os que defendem dietas vegetarianas, ou a redução significativa do consumo de carne. As justificativas utilizadas até agora pelos conservadores pecuaristas integrantes desse poderoso setor econômico sempre foram baseadas nos dividendos obtidos pelas exportações. Afinal, o dinheiro pode tudo, ou não?

Pois há quem discorde dessa afirmação e busque ensaiar uma positiva mudança na cadeia produtiva da carne brasileira.

A Fazenda São Marcelo, pertencente ao grupo JD e localizada no Mato Grosso, acaba de conquistar a primeira certificação da Rede de Agricultura Sustentável no mundo para a pecuária, concedida pelo Imaflora (certificadora oficial da Rainforest Alliance no ).

Para fazer jus ao selo, a São Marcelo atendeu a 136 critérios diferentes ligados a práticas socioambientais e sustentáveis de produção, entre elas, o rastreamento integral de todo o gado da fazenda, cuidados específicos em relação ao bem-estar animal, recuperação de áreas degradadas, e o apoio ao aperfeiçoamento e dos funcionários. A fazenda possui duas reservas particulares de patrimônio natural e, por meio de um termo de cooperação técnica com o matogrossense, realiza um trabalho de recuperação e soltura de animais apreendidos.

Diferencial competitivo

Mas o que leva uma fazenda de gado a buscar uma certificação como essa, praticamente, indo na contramão das práticas de suas congêneres?

Proprietário da São Marcelo, o empresário e pecuarista Arnaldo Eijsink , fornecedor da Brasil Foods e do Frigorífico Marfrig, explica que existem inúmeras vantagens em receber um selo de qualidade como o do Imaflora, conferindo ao seu produto um diferencial competitivo. Para quem exporta, esta é, sem dúvida, uma grande diferença. De olho nas exigências cada vez maiores do mercado internacional, Arnaldo acredita no aumento de vendas para novos compradores que procuram adquirir uma carne de origem comprovada e certificada.

Outros ganhos estão agregados ao sistema de gestão socioambiental e que levam em conta o devido respeito aos ciclos naturais e a preservação da biodiversidade local. “Observamos uma infestação menor de pragas e doenças e a redução nos gastos com produtos químicos”, afirma Arnaldo. Ele destaca ainda, que a rotatividade de mão de obra, muito comum no setor, é pequena na São Marcelo, em virtude da satisfação dos funcionários.

Será que essa primeira fazenda certificada vai efetivamente influenciar para que ocorram mudanças consistentes na pecuária brasileira?

“Em primeiro lugar é preciso entender que é um setor heterogêneo”, afirma Luis Fernando Guedes Pinto, gerente de certificação do Imaflora, “portanto é possível obter avanços”, conclui com otimismo. Isto não significa que o desafio não seja enorme.

O próprio Luis Fernando lembra que a pecuária, de modo geral, é um dos setores mais atrasados. Daqueles que fazem baixo uso de tecnologia, possuem visão de curto prazo e em geral terminam por não agregar valor a seus produtos.

Exatamente para que a carne da São Marcelo alcance o almejado valor agregado, e seja reconhecida pelo consumidor final por suas vantagens e méritos, é que o objetivo agora é buscar frigoríficos, supermercados e até mesmo restaurantes que apoiem e garantam visibilidade a essa iniciativa.

Mesmo que esse grande avanço chegue a mais propriedades e até mesmo reduza significativamente o enorme impacto causado pela atividade, boa parte dela ilegal, ainda teremos um longo caminho para alcançar algo que se possa chamar de sustentável.

A nós consumidores resta a tarefa de adquirir produtos certificados ou de origem legal, mas também a de fazer mudanças importantes em nossa dieta alimentar. Um consumo menor ou mesmo livre de carne traria enormes benefícios ao nosso meio ambiente.

Enquanto as grandes transformações alimentares dos humanos não se tornam realidade, resta-nos aplaudir alguns avanços e esperar que passos importantes sejam dados rumo a uma e um mundo menos insustentável para o bem geral, das pessoas, mas também dos boizinhos, das vaquinhas e de outros seres que por aqui habitam.

* Reinaldo Canto é jornalista, consultor e palestrante. Foi diretor de Comunicação do Greenpeace e coordenador de Comunicação do Instituto Akatu. É colunista da revista Carta Capital, colaborador da Envolverde e professor de Gestão Ambiental na Fappes.

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