O sol ainda estava escondido na serra da Floresta Nacional do Tapajós (PA), quando o seringueiro Donildo Lopes dos Santos, de 52 anos, saiu para colher o látex que seria usado na primeira apresentação do Tecido Emborrachado da Amazônia – TEA.
http://www.ecodebate.com.br/2014/08/06/pa-ribeirinhos-recebem-treinamento-para-produzir-tecido-emborrachado/
Equipe do Laboratório de Tecnologia Química da UnB apresenta nova técnica de emborrar tecido aos artesãos de Jamaraquá, no oeste do Pará.
Dido, como é conhecido na comunidade de Jamaraquá, a 70 quilômetros de Santarém, contava as horas para conhecer a nova técnica de emborrachar tecidos desenvolvida pelo Laboratório de Tecnologia Química, da Universidade de Brasília (Lateq/UnB). “Estamos ansiosos e entusiasmados para ver como vai funcionar”, afirmou.
Há dez anos, o seringueiro participou do primeiro projeto do laboratório na região e, juntamente com outros artesãos locais, mantém até hoje a fabricação da Folha Semi-Artefato (FSA), uma manta de látex usada para fazer biojoias, capas de cadernos, entre outros utensílios.
Nesta segunda experiência, que aconteceu entre os dias 21 e 25 de julho, uma equipe de quatro pesquisadores do Lateq, coordenada pelo professor Floriano Pastore Júnior, lançou o novo método de emborrachar tecidos e treinou dezessete comunitários.
A técnica permitirá maior produtividade e pode reduzir riscos à saúde se comparada a alguns métodos já utilizados, pois elimina a secagem por defumação. “Primeiro, no laboratório, tentamos mergulhar o tecido em látex, mas substituímos pela pulverização, que garante cobertura mais homogênea e menos espessa. Isso torna mais versátil, pois facilita a costura e o manuseio. A vulcanização acontece por meio da mistura química e não mais por defumação”, explica pesquisador Douglas Ochoa.
Helen Lopes/UnB Agência |
Látex é aplicado com a ajuda de um pulverizador |
No processo de fabricação do TEA, os tecidos são estendidos em uma espécie de moldura e fixados nas pontas. Esses quadros recebem uma mistura de látex, vulcanizante e pigmento. São usadas duas estufas: uma para pintura, e outra para secagem. “A cabine de secagem foi confeccionada de cor escura para facilitar a absorção dos raios solares e assim elevar a temperatura interna sem precisar de uma fonte de energia não renovável ou de difícil acesso”, conta Ochoa, ao lembrar que a produção pode chegar a oito m² de tecido emborrachado por dia.
CRIATIVIDADE – Além de ensinar a fazer o TEA, os pesquisadores levaram moldes de bolsas, pastas e porta-tablet. Logo nos primeiros dias de treinamento, os artesãos também propuseram novas utilidades para o tecido, como porta-passaportes e nécessaires. “Não temos a pretensão de impor um processo acabado. Trazemos uma ideia, vocês irão adaptá-la à realidade local”, afirmou o coordenador do projeto, Floriano Pastore.
“As possibilidades são infinitas. Na última etapa da pulverização, quando o tecido ainda estiver com a propriedade adesiva, podemos colocar sementes ou mesmo texturas e desenhos”, completou o pesquisador João Peres. Também participaram do projeto as alunas de Química Thaís Lino e Daniele Araújo.
IMPACTO LOCAL – Ao todo, 28 famílias moram na comunidade Jamaraquá, dentro da Flona Tapajós. Como a média de integrantes de cada família é de cinco pessoas, o TEA pode representar uma fonte complementar de renda para mais de 140 ribeirinhos. “Queremos agregar os jovens ao grupo de artesãos, pois é o futuro deles”, ressaltou Iranice Rodrigues, líder da associação de moradores de Jamaraquá.
Aos 35 anos e mãe de sete filhos, Nice ajuda a manter os filhos com o artesanato da borracha e há dois anos voltou a estudar. “Eu tinha vergonha de ir à escola. Foi muito difícil, mas quero continuar. Não vou desistir”, afirma.
Helen Lopes/UnB Agência |
Modelo de bolsa para computador apresentado aos artesãos |
Para a diretora do Instituto de Estudos Integrados Cidadão da Amazônia (INEA), Rosenilda Rodrigues, a nova técnica tem um valor agregado maior do que os outros produtos fabricados com a manta de látex.
“Espero que eles dominem e gostem do novo método. Assim, poderemos oferecer no mercado, respeitando o tempo de apropriação de cada um. O desenvolvimento da Amazônia é possível, mas a partir do ritmo de vida de cada morador”, registou Rosenilda, responsável pela assistência técnica e administrativa aos artesãos.
SISTEMA PRODUTIVO – No dia 17 de julho, com a presença do ministro da Embaixada da Suíça, Jean-Pierre Reymond, o sistema produtivo, composto por duas estufas e um pulverizador, foi doado à comunidade. Financiado pela Embaixada da Suíça, o projeto também contou com o apoio da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), responsável pelo manejo das seringueiras. Participaram ainda o Instituto de Estudos Integrados Cidadão da Amazônia (INEA), que fornece assistência técnica à comunidade, e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), administrador da Flona Tapajós.
Por Helen Lopes, da UnB Agência.