Vale a pena o esclarecimento no momento atual sobre alguns fatos quanto à realidade das embalagens como um todo. Estamos atolados nelas em todos os níveis. Lembremos as ilhas de plástico nos oceanos. Já a lata, por exemplo, tomou conta de tudo: do refrigerante ao suco ‘natural’. Mas será que alguém se deu conta de que todas as latas, conforme a pesquisa científica vem mostrando, tem uma película interna com o insidioso BPA (bisfenol A) em sua composição? Lembram-se das mamadeiras do plástico policarbonato que foram proibidas porque dela lixiviava o BPA que surgiu da reação química desta molécula com a arma química fosgênio? Pois a lata tem esta resina ou a epóxi que também vem do BPA. Mas alguém se pergunta se ao consumir qualquer produto em lata que esta substância pode estar se liberando dela e se misturando naquilo que vai se dar a seu filho?
– Será o CELOFANE uma solução? –
Texto de Luiz Jacques Saldanha, dezembro de 2013.
E quanto aos produtos que contém gordura, presunto, carne, pão, queijo etc., alguém já se apercebeu para ver com o que o supermercado está embalando? Que nada mais é do que o filme de PVC que envolve o produto numa bandejinha de estiropor (nome comercial – ‘isopor’) e consta serem os dois imitadores de hormônios femininos, os disruptores endócrinos?
E mais, será que alguém percebeu que existe outro material que foi substituído pelo PVC e tem grande potencial, entre nós, para ser empregado como embalagem? E que este produto se caracteriza por ser uma folha fina, transparente e com baixa permeabilidade e originário de uma matéria prima natural, a celulose?
Originalmente foi denominado como ”cellophane”, palavra originária da junção das palavras francesas ‘cellulose‘ e ‘diaphane‘ (transparente). E sendo de celulose, pode ser feito de qualquer material rico dela como a madeira, casca de coco ou de outras fontes de celulose, gerando um produto que mesmo que tenha sido criado artificialmente pelo homem, é completamente biodegradável.
Contextualizando, o celofane foi inventado e gerado em laboratório. Por isso é importante sabermos que mesmo sendo sintetizado e produzido pelas mãos e inteligência humanas ainda pode ser naturalmente absorvido pelos ciclos da vida. Mesmo não sendo originário de processos de transformação industrial com matéria prima que já existia originalmente na natureza e por isso degradável por meios físicos, químicos e principalmente biológicos, este material também tem esta mesma característica. Tem um comportamento em seu tempo de vida e de eliminação, de total e completa reintegração ao ambiente.
E qual a importância desta informação?
Primeiro porque mostra que a humanidade, se quiser, pode gerar produtos que, mesmo que sejam originários de moléculas sintetizadas em laboratório, ainda podem ser ‘digeridos’, ‘metabolizados’ pela vida da Terra. E em segundo porque sendo assimiláveis pela natureza, podem ser até desperdiçados e lançados no ambiente (lixão ou não) que serão reintegrados nos ciclos da vida sem perturbação.
Mas será que alguém está a par que mesmo assim ainda existe a possibilidade de que, nesta embalagem, ao ser levada para o mercado ser mesclada em sua formulação final, um aditivo artificial que compromete sua digestão pelos organismos terrestres? E ocorrer o mesmo que os produtos artificiais que não conseguem ser assimilados pela vida planetária? Pois, isso existe. É quando agregam como um ‘avanço’, uma camada com a molécula de PVdC (policloreto vinildieno, ou seja, da mesma família do problemático PVC). E sabem para quê? Simplesmente para usar o atributo das resinas plásticas de se colarem quando aquecidas, dando condições de serem seladas, o que não acontece com o celofane. Como ele não é um composto plástico e sim um polímero natural, as seladoras não conseguem fazer isso, dai ter sido o celofane envernizado com esta molécula clorada.
Este emprego foi largamente utilizado desde 1953. Nos EUA leva o nome comum de ‘Saran Wrap’, mas a partir de 2004 foi substituído pelo polietileno de baixa densidade (PEBD ou LDPE em inglês) devido a preocupações ambientais já que o PVdC contem cloro.
E aqui está a chave da questão quanto a todas as embalagens de filmes utilizados em alimentos no Brasil e em outros países – contém cloro!
E é por isso que destacamos no início do texto a importância dos consumidores saberem disso. Principalmente dos produtos que se arvoram ser ecológicos, naturais ou orgânicos, quanto ao material que embalam os alimentos.
Assim, pode houver o ressurgimento do uso privilegiado do celofane original, sem aditivos, se os consumidores se posicionarem. Há urgência em se trocar do que está hoje disponível no mercado, a resina plástica que imita o celofane original, o que será um grande passo a frente quanto a embalagens.
Revisitando as razões do por que atualmente no chamado ‘papel celofane’ houve a mudança em sua matéria prima, de natural para sintética, está provavelmente um interesse puramente comercial da indústria petroquímica. Deve ter sido somente baseada em vantagens industriais. Na época era, sem dúvida, inimaginável aquilo que estamos vivendo, tanto em termos ambientais como de saúde pública, pela invasão global de todos os tipos de resinas plásticas.
No entanto não é a indústria, no final da cadeia de consumo, o grande dispersor das embalagens no meio ambiente. Passou o ser o consumidor. E é via os alimentos sejam sólidos ou líquidos, a grande fonte da contribuição na disseminação desta tragédia global. Se examinarmos nos supermercados, veremos que quase a totalidade destas embalagens poderá, imediatamente, ser substituída por celofane original, feita de celulose sem nenhum tipo de aditivos. Atualmente todas, absolutamente todas, as embalagens são feitas de plástico. E pior, a maioria de PVC que, como o PVdC, também é constituída por cloro (até 57% de seu peso), elemento extremamente problemático por sua relação estreita e determinante com as dioxinas e furanos (materiais que formavam a arma química do Vietnam, o Agente Laranja).
Assim as indústrias, por disporem de toda a cadeia de produção em suas mãos, já que detinham o poder sobre o petróleo, abundante, barato e não questionado quanto aos seus efeitos que hoje conhecemos e sofremos, as imensas transnacionais petroquímicas, simplesmente, trocaram as matérias primas de todas as embalagens para suas moléculas sintetizadas e patenteadas. E como consequência, a cadeia de comercialização de alimentos passou, através dos grandes atacados e varejos, a utilizar aquilo que a indústria lhe fornecia. E como não houve e não há, nenhuma contestação, e a ausência de uma ação do consumidor é absoluta bem como das organizações que lidam com a produção, distribuição e venda de produtos alimentícios, incluindo os orgânicos, tudo fica como está!
Outro aspecto que também nos interessa é sabermos como tudo isso se deu e vem se dando desde o final do século XIX e definido no século XX. Praticamente todos os produtos que originalmente eram de matérias primas naturais, foram oriundas das ex-colônias europeias, hoje chamadas ‘terceiro mundo’ ou de países ‘em desenvolvimento’. Com a ‘libertação’ destas colônias, as matérias primas foram sendo trocadas por moléculas artificiais originárias do petróleo, que passam a imitar suas qualidades e seus atributos. Vale frisar que o mundo vem financiando, desde esta época, todas as experimentações e pesquisas para este tipo de enganação: a da busca de imitar as matérias primas naturais e ausentes dos países colonizadores.
Temos, atualmente, que reconhecer, pelos produtos resultantes, que às vezes a imitação é feita com perfeição e, inquestionavelmente, em muitas ocasiões até com melhores resultados de mercado. Assim não tendo quem as defendesse, as matérias primas naturais e originais foram todas descartadas como a celulose do papel celofane. E mais trágico é os países que têm estas matérias primas em seus próprios territórios, sendo, portanto, seus guardiões, terem feito esta troca que as empresas transnacionais impuseram ao mundo, sem pestanejar.
Historicamente quem inventou esta molécula do celofane foi um químico e engenheiro suíço chamado Jacques E. Brandenberger, em 1908. Tudo teria se originado porque desde o início do século ele pretendia desenvolver um material que cobrisse as toalhas e assim impedissem de serem manchadas com gotas de vinho por exemplo, como foi o caso que o levou a esta busca. Depois de alguns procedimentos químicos, finalmente chegou a um polímero de glicose, este filme, que pode ser colocado sobre a toalha e assim impede que seja manchada. Ele patenteou não só este material como o processo como se manufaturava o filme.
Em 1917 cede sua patente para a firma francesa La Cellophane Societé Anonyme, quando se junta a ela.
Nos Estados Unidos a indústria de guloseimas Whitman’s passa a importar o filme da França para embrulhar seus produtos, como chocolates e balas. Em 1924 a empresa química e grande precursora de produtos sintéticos, a norte-americana DuPont começa a manufaturar e vender o celofane o que favoreceu de que o produto fosse amplamente disseminado na América do Norte. Isso aconteceu porque um ano antes, as empresas norte-americana e francesa haviam firmado um acordo onde a DuPont recebia licença para acessar os processos secretos da indústria francesa bem como comercializar exclusivamente nas Américas do Norte e Central enquanto à francesa, no resto do mundo. Além desse esquartejar do comércio global, o ganho da cessão de sua patente, dava à empresa da França acesso integral a todos os possíveis avanços que por um acaso a norte-americana conseguisse nos processos de fabricação e desenvolvimento do celofane. E foi o que realmente aconteceu. Em 1927, é patenteado o processo que um pesquisador da DuPont desenvolveu em que tornava o celofane à prova de umidade. Ou seja, a partir deste avanço, este material poderia servir para embalar produtos como alimentos úmidos.
A trajetória do celofane foi ampla até o final dos anos trinta quando as moléculas originárias da petroquímica começam a tomar conta de todas as fontes naturais de matérias primas, substituindo-as praticamente todas. Só não teve completo sucesso quando o produto artificial não conseguia pelo menos se igualar, à qualidade do natural.
Nos dias atuais seu uso é meio na penumbra, em alguns produtos. A empresa que mantém sua patente é inglesa, Innovia Films Group, e está sediada em Wigton. Mas seu declínio vem sendo inexorável. E de tal forma que um produto descoberto pela ICI, na Inglaterra, em 1966, o BOPP (biaxially oriented polypropylene) vem ocupado seus derradeiros espaços no mercado, inclusive nesta mesma indústria. É um material sintético, a resina plástica polipropileno, e já vemos nos espaços de mercado muitos produtos ‘orgânicos’ sendo embalados com este material.
No entanto, como nos EUA a palavra celofane ficou como uma expressão genérica, quaisquer produtos passaram a ser considerados como ‘papel celofane’ se imitarem os atributos originais de transparência e utilização para embalagem. Mesmo que a matéria prima seja resina plástica. E é assim que estamos no Brasil.
Porém para os interessados, há uma maneira de se reconhecer se um produto é de origem natural ou petroquímica. Todos eles, do ‘papel celofane’ ao poliéster, acrílico, lã, poliamida, algodão e outros. Basta pegar um pedacinho e queimá-lo. Mas, cuidado! Não toque antes de saber se é natural ou sintético. Se sintético e tocar no material imediatamente após a queima, a queimadura será terrível, já que o fica é uma bolinha indestrutível. Diferente acontece se for natural, logo vira cinza!
Para este reconhecimento abaixo colocamos duas fotos que mostram este processo de queima de dois ‘papéis celofane’, um natural e outro artificial.
Produto final feito de celulose. Folha de Celofane original. Ao queimar, vira cinza
Produto final feito com resina plástica. Folha Imitação Celofane. Ao queimar, enruga e ao final fica uma bolinha indestrutível!