Chegou a hora: saiu o novo relatório do IPCC! Após anos de trabalho por mais de 800 cientistas ao redor do mundo, e depois de dias de extensa discussão no plenário da reunião do IPCC em Estocolmo, o Summary for Policymakers foi formalmente recebido às 5 da manhã, hoje. Parabéns a todos os colegas que lá estiveram e trabalharam em turnos noite adentro. O texto completo do relatório estará disponível online no início da próxima semana. O Realclimate resume aqui as principais conclusões e mostra os gráficos mais interessantes.
http://www.ecodebate.com.br/2013/10/04/o-novo-relatorio-climatico-do-ipcc-do-site-realclimate-org-traducao-alexandre-lacerda/
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Aquecimento global
Figura 1: A curva temperatura global medida, segundo
vários conjuntos de dados. Em cima: valores anuais.
Embaixo: valores médios por década.
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Observando-se estes dados dá para ver imediatamente quão enganosa é a grande atenção da mídia às pequenas variações de curto prazo ao final da curva. Estas variações sempre ocorreram, e sempre ocorrerão. Elas são quase aleatórias, imprevisíveis (ao menos até agora), e o IPCC nunca disse ser capaz de fazer predições para períodos curtos de 10 a 15 anos, precisamente porque elas são dominadas por este tipo de variação natural.
Os últimos 30 anos foram provavelmente os mais quentes dos últimos 1.400 anos. Esta informação é resultado de melhores dados de testemunhos climáticos. No 3º relatório do IPCC podia-se apenas afirmar isso a respeito dos últimos 1.000 anos, e no 4º a respeito dos últimos 1.300 anos.
O aquecimento futuro em 2100 – considerando-se os mesmos cenários de emissões – são aproximadamente os mesmos que no relatório anterior. Para o cenário de maior aquecimento, a melhor estimativa para 2100 ainda é 4 ºC (gráfico abaixo).
Figura 2: A evolução da temperatura futura no cenário de maiores emissões (vermelho) e num cenário em que se con- segue implantar com sucesso medidas de mitigação (azul) – o “mundo 4 graus mais quente” e o “mundo 2 graus mais quente”. |
O que é novo aqui é que o IPCC também estudou os cenários de mitigação. O cenário RCP2.6 em azul representa forte redução de emissões. Com este cenário o aquecimento global pode ser detido abaixo dos 2 ºC.
Grande parte do aquecimento será irreversível: do ponto em que emissões seriam diminuídas a zero, as temperaturas globais permaneceriam quase constantes neste nível mais elevado ainda por séculos. (é por isso que o problema do clima é um caso clássico do princípio da precaução)
Aumento do nível do mar
Figura 3: aumento do nível do mar até o ano de 2100, dependendo do cenário de emissões. |
Esta é, talvez, a maior mudança em relação ao 4º relatório do IPCC: agora se projeta um aumento do nível do mar muito mais rápido (28 a 98 cm até 2100). Isso é mais que 50% maior que as projeções anteriores (19 a 59 cm) quando comparados os mesmos períodos e cenários de emissões.
No caso de emissões não-mitigadas (e não apenas para o cenário mais grave), o IPCC estima que no ano de 2300 o nível do mar teria subido em 1 a 3 metros.
Nós já estamos observando um provável aumento de frequência nas marés de tempestade (provável no sentido adotado pelo IPCC, com segurança maior que 66%). No futuro, isso se tornará muito provável (>90%).
Gelo continental e oceânico
O manto de gelo da Groenlândia é menos estável do que era esperado no relatório anterior. No período interglacial Riss-Würm (aquele há 120.000 anos, anterior ao interglacial atual, quando as temperaturas globais estiveram de 1 a 2 ºC mais altas que hoje) o nível do mar estava de 5 a 10 m mais alto do que o atual (no 4º relatório do IPCC, estimava-se que fosse apenas 4 a 6 m). Devido aos dados melhores agora disponíveis, há alto nível de certeza nesta informação. Uma vez que o derretimento total do manto da Groenlândia corresponde a 7 m de elevação no nível do mar, isso pode indicar perda de gelo antártico no período Riss-Würm.
No novo relatório do IPCC, o limite crítico de temperatura no qual haveria o completo derretimento do manto da Groenlândia é estimado entre 1 e 4 ºC acima dos níveis pré-industriais. No relatório anterior, este número ainda era 1,9 a 4,6 ºC – e esta foi uma das razões para se buscar políticas de mitigação que limitassem o aquecimento abaixo de 2 ºC.
Figura 4: cobertura de gelo no oceano antártico no mundo de |
Precipitação
Oceanos
Figura 5: concentração medida de CO2 e pH da
água do mar. Baixo pH indica maior acidez.
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Por último, mas não menos importante, nossas emissões de CO2 não apenas causam mudanças climáticas, mas também aumentam a concentração de CO2 na água do mar, acidificando os oceanos devido ao ácido carbônico que se forma. Isso é mostrado pelas medições plotadas no gráfico abaixo.
Conclusão
Na verdade, é o oposto. Muitas medidas são consideradas agora mais urgentes do que no 4º relatório, publicado em 2007. O fato de que o IPCC com frequência precisa se corrigir atualizando os dados “para cima” é uma mostra de que eles tendem a fazer afirmações extremamente cautelosas e conservadoras, devido à sua estrutura de consenso – o texto do IPCC é uma espécie de mínimo denominador comum, com o qual a maioria dos pesquisadores pode concordar. O New York Times deu alguns exemplos do IPCC “recuando para ser cientificamente conservador”. Apesar (ou talvez por causa) desse conservadorismo, os relatórios do IPCC são de extrema valia – pelo menos na medida em que o público e os governos tomem conhecimento dele.
Publicado originalmente no blogue ‘O que você faria se soubesse o que eu sei?‘, de Alexandre Costa (Ph.D. em Ciências Atmosféricas, Professor Titular da Universidade Estadual do Ceará).