Nova ‘face’ das Gorduras ‘Trans’: as chamadas ‘Interesterificadas’.

A indústria está substituindo as gorduras trans por gorduras interesterificadas. O que é isso? Será que agora nossa saúde não corre mais riscos?

 

http://www.melnex.net/semtrans.pdf

 

INTERESTERIFICAÇÃO

Por Mary G. Enig, PhD
Tradução: Odi Melo
www.melnex.net

Todo o mundo já conhece os perigos das gorduras trans e, com a nova legislação exigindo a sua menção nos rótulos, os processadores de alimentos estão batalhando para encontrar alternativas “livres de trans“. Os óleos vegetais líquidos sem trans queimam a uma temperatura muito baixa, são instáveis demais para uso em frituras e não são suficientemente sólidos para serem usados como gordura nos bolos e produtos de panificação. Os óleos poliinsaturados são líquidos porque as moléculas de gordura (chamadas de ácidos graxos) contêm uma dobra onde estiver faltando átomo de hidrogênio, na altura das ligações duplas. Por isso elas não se encaixam facilmente e portanto ficam no estado líquido, mesmo quando resfriadas. Já nas gorduras saturadas, não há falta de nenhum átomo de hidrogênio. Elas são moléculas retilíneas, que se encaixam facilmente. Portanto, ficam no estado sólido à temperatura ambiente. Os ácidos graxos monoinsaturados, nos quais há falta de apenas dois átomos de hidrogênio na altura de uma única ligação dupla, ficam em estado líquido à
temperatura ambiente, mas passam para o estado sólido quando resfriados.
O processo de hidrogenização parcial gera gorduras trans, retificando as moléculas insaturadas através de um reajuste dos átomos de hidrogênio na altura da ligação dupla. Essas gorduras alteradas são sólidas à temperatura ambiente e, portanto, podem ser utilizadas em bolos, produtos de panificação e frituras. Porém, os ácidos graxos trans têm sido acusados de contribuir para o câncer, doenças cardíacas, doenças auto-imunes, degeneração de tendões e ossos, além de problemas com fertilidade e crescimento. Os ácidos graxos trans dos óleos vegetais parcialmente hidrogenados são a principal causa do diabetes tipo 2, caracterizado por elevados índices de insulina e de glicose no sangue, pois eles inibem os receptores de insulina nas células.
A solução óbvia para a indústria de alimentos seria utilizar gorduras saturadas naturais, como gordura de coco, gordura de palma e sebo (de ruminantes como vacas e ovelhas) nas frituras e nos produtos de panificação, como se fazia antigamente. No entanto, isso implicaria admitir que a demonização das gorduras saturadas, que vem ocorrendo durante os últimos 50 anos, é totalmente não científica. E um retorno à sábia prática de utilizar gorduras naturais e tradicionais derrubaria a gigantesca e poderosa indústria dos óleos de sementes, que é a espinha dorsal do sistema de “commodities” agrícolas dos EUA.

A “SOLUÇÃO”
A solução encontrada pela indústria de alimentos é um processo altamente industrializado chamado interesterificação, o qual reconfigura os ácidos graxos nos triglicerídeos. Na natureza, os ácidos graxos não normalmente configurados como triglicerídeos, com três ácidos graxos ligados a uma molécula de glicerol (glicerina). A interesterificação reposiciona esses ácidos graxos, e a gordura interesterificada então fica com qualidades diferentes de fusão (derretimento) e de cozimento.
A interesterificação foi inicialmente aplicada em gorduras naturais, como óleo de palma e banha de porco. Na banha natural, por exemplo, cerca de 2 por cento dos triglicerídeos apresentam três ácidos graxos saturados e uns 24 por cento têm três ácidos graxos insaturados. Os triglicerídeos restantes são uma combinação de ácidos graxos insaturados e saturados. Após a interesterificação, o número de triglicerídeos com três saturados e três insaturados aumenta, enquanto o número de triglicerídeos com combinações de ácidos graxos saturados e insaturados diminui. O resultado é uma temperatura de fusão (derretimento) mais elevada e qualidades “melhoradas” de cozimento, como o volume dos bolos.2
A interesterificação do óleo de palmiste (da semente do dendê) gera gorduras com propriedades muito específicas de fusão (derretimento) para balas, bombons e confeitos, como as gorduras que “derretem na sua boca, e não na sua mão”.
Para produzir margarinas e gorduras de fritura com “baixo conteúdo de trans” ou “livre de trans”, os fabricantes agora interesterificam uma mistura de óleo líquido com óleo totalmente hidrogenado. O óleo que é totalmente hidrogenado, ao contrário do parcialmente hidrogenado, contém ácidos graxos 100% saturados, porque os ácidos graxos insaturados no óleo líquido foram totalmente saturados com hidrogênio. Os ácidos graxos resultantes são principalmente ácidos esteáricos de 18 carbonos, as mesmas abominadas gorduras encontradas na carne de gado e na manteiga! Um óleo totalmente hidrogenado fica bem sólido, portanto apenas uma pequena quantidade – em torno de 10 por cento – é necessária para misturar e interesterificar com o óleo líquido para produzir uma gordura que possa ser espalhada, ou passada sobre um alimento. Recentemente, fabricantes canadenses desenvolveram uma mistura interesterificada de azeite de dendê e/ou óleo de palmiste com óleo de canola.

PRODUÇÃO
Existem dois métodos básicos para produzir misturas de óleos interesterificadas. O método mais comum utiliza um catalisador químico, como o metóxido de sódio ou o etóxido de sódio (solventes industriais perigosos e altamente tóxicos), ou então os perigosos sódio metálico ou liga sódio-potássio. Os três primeiros demandam temperaturas entre 80 e 120 graus centígrados para produzir ácidos graxos interesterificados. O produto precisa então ser neutralizado (para remover o catalisador cáustico), alvejado (para livrar-se da cor marrom-escuro resultante) e desodorizado (um processo que pode, na verdade, introduzir ácidos graxos trans na mistura).
Um outro método utiliza enzimas para produzir gorduras interesterificadas. Ele é mais caro, mas resulta em menor perda de óleo pela formação de sabões, ésteres, mono e diglicerídeos.
Qualquer que seja o método utilizado, fique certo de que se trata de um processo altamente industrializado e com aquecimento, que começa com óleos que já foram também submetidos a processos altamente industrializados. O produto resultante pode até ser “livre de trans”, porém ele ainda vai conter resíduos de produtos químicos, hexanos e muitos produtos decompostos perigosos, repletos de radicais livres.

EFEITOS SOBRE A SAÚDE
Naturalmente, o setor espera que essas novas misturas interesterificadas não tenham os efeitos negativos das gorduras trans sobre a saúde. Mas um estudo recente, publicado no Nutrition and Metabolism (2007, 4:3), dá forte motivo para preocupação. Os pesquisadores compararam gorduras ricas em trans e gorduras interesterificadas com gorduras saturadas quanto a seu impacto sobre os lipídios do sangue e sobre a glicose do plasma. Trinta voluntários humanos participaram do estudo, o qual controlou rigorosamente a gordura total e a composição dos ácidos graxos no regime alimentar de cada participante. Cada indivíduo consumiu todos os ingredientes das três dietas alimentares com uma rotação aleatória, durante as quatro semanas dos períodos da dieta.
O colesterol HDL teve uma pequena queda, tanto com as gorduras trans quanto com as misturas interesterificadas, mas o verdadeiro problema ocorreu nos níveis de glicose e insulina. Os níveis de insulina caíram 10 por cento na dieta com óleo de soja parcialmente hidrogenado, porém caíram mais que o dobro no regime com gordura interesterificada, causando uma alarmante elevação de 20% nos níveis de açúcar do sangue. Então, parece que essas misturas interesterificadas afetaram a produção de insulina pelo pâncreas, em vez de afetar os receptores de insulina nas células.[] 3

INFERNIZANDO A CONCORRÊNCIA
O alvoroço em torno das gorduras trans apresenta uma oportunidade perfeita para trazer as gorduras saturadas naturais de volta à nossa dieta alimentar, porém a indústria de óleos vegetais vem trabalhando dia e noite atrás dos bastidores para garantir que isso não aconteça. A indústria contratou empresas de relações públicas para divulgar artigos em publicações especializadas e na mídia popular, alertando o público sobre os malefícios das gorduras saturadas. Este é um exemplo, publicado no site <www.healthscience.org>: “Mas o azeite de dendê (óleo de palma) é uma alternativa horrível… todos esses óleos tropicais são gorduras altamente saturadas. Assim como a manteiga, o queijo e a carne, os óleos tropicais elevam o colesterol LDL e entopem as artérias com placas, aumentando o risco de ataque cardíaco… Estaremos apenas trocando um entupidor de artérias por outro?”.
Outra vítima é a manteiga, que contém uma pequena quantidade de gordura trans, mas que não é perigosa. Na verdade, o nosso organismo transforma parte da gordura trans natural da manteiga em CLA (ácido conjugado linoléico), um composto com propriedades anticancerígenas.
Na Europa, os órgãos governamentais têm tido o cuidado de fazer distinção entre gorduras trans naturais da manteiga e da carne, e as gorduras trans artificiais dos óleos vegetais parcialmente hidrogenados. As gorduras trans naturais não têm sofrido rotulagem pejorativa. Mas, de acordo com a Food and Drug Administration (órgão que regula alimentos e medicamentos nos EUA), não existe diferença entre gorduras trans naturais e artificiais. Como resultado, a Starbucks (rede multinacional de cafés) está eliminando a manteiga dos seus pães, bolos e confeitos, para poder dizer que esses produtos são “100% livres de trans”. Então, mais uma vez, as gorduras naturais estão sendo manchadas pela má fama das suas substitutas artificiais.

OUTRAS SOLUÇÕES

MISTURAS COM SEBO BOVINO – Uma empresa chamada Source Food Technologies, com sede na Carolina do Norte (EUA) está produzindo uma mistura patenteada de óleo de milho com sebo bovino. Admitindo tacitamente as virtudes do sebo bovino, a empresa observa que a mistura reduz o colesterol (é verdade, o ácido graxo principal do sebo reduz mesmo o colesterol), apresenta baixos níveis de gorduras trans (sugerindo que pelo menos uma parte do óleo de milho foi parcialmente hidrogenado), e resulta em menor absorção de óleo nos alimentos fritos. Isso nos leva a questionar o uso de uma mistura, que é basicamente composta por sebo!

SÓLIDOS DE XAROPE DE ARROZ – A empresa California Natural Products desenvolveu um “sólido de xarope de arroz totalmente natural, que propicia a funcionalidade das gorduras trans e pode substituir em 100% as gorduras para fritura nos produtos de panificação”, bem como nos sorvetes. O produto é similar em tamanho aos glóbulos de gordura e contém “estruturas exclusivas de carboidratos, devido à estrutura das moléculas de amido do arroz. Portanto, é um carboidrato que age como gordura.”

ÓLEOS COM BAIXO TEOR LINOLÉICO – Empresas de biotecnologia começaram a comercializar soja com baixo teor linoléico (soja com baixos teores desses instáveis ácidos graxos tipo ômega-3), produzidos por modificação genética ou por cultivo convencional, com a finalidade de reduzir ou mesmo eliminar as gorduras trans do óleo de soja processado. (Durante o processamento, são os ácidos graxos ômega-3 que são preferencialmente convertidos em gorduras trans.)

ÓLEOS TROPICAIS – Na Europa, as empresas estão usando mais os óleos tropicais, como o azeite de dendê (óleo de palma), os quais “propiciam consistência e textura aos produtos, de tal forma que nenhuma modificação adicional no óleo se torna necessária, resultando numa opção natural e sem trans.” Infelizmente, nos Estados Unidos essa sensata providência tem encontrado vigorosa resistência por parte da indústria da soja e seus agentes, como o Center for Science in the PublicInterest.

Fonte: Todd Runestad – “How to live without trans fats” (Como viver sem gorduras trans), da Functional Foods & Neutraceuticals, dezembro/2004. 4

BOAS RAZÕES PARA SE EVITAR BATATAS CHIPS …… seja o óleo em que elas são fritas o líquido, parcialmente hidrogenado ou interesterificado.

A seguinte carta, de Dennis Meizys, da Maryland Green Power Co., foi publicada no site do Dr Joseph Mercola, em <www.mercola.com/2007/feb/10/more-reasons-to-avoid-potato-chips.htm>: “Minha empresa está pesquisando a produção de biodiesel a partir de óleos vegetais usados e entrou em contato com fabricantes que imaginamos seriam os maiores geradores de óleo descartável. O que nos vem à mente neste caso? Bem, batatinhas fritas bem oleosas (basta olhar para seus dedos depois de comê-las!) e rosquinhas fritas vieram à mente, após pensar em algo óbvio como o McDonald’s. Mas ao contrário do esperado, parece que quem mais abusa do óleo vegetal não é o McDonald’s, mas sim os fabricantes de batatas chips e de bolos doces em forma de rosquinhas fritas (donuts). Um fabricante respondeu à minha oferta de comprar seu óleo usado com a explicação de que eles raramente tinham sobra de óleo após o processamento. Dezenas de milhares de litros chegam, poucas centenas de litros saem. A razão? Esse fabricante recicla o óleo até que ele seja totalmente absorvido pelos alimentos. Todo esse óleo sujo eventualmente acaba nas próprias batatas chips!
Um dos problemas que ocorre após o reaproveitamento dos óleos vegetais é que os FFAs (ácidos graxos livres) ficam concentrados. O fabricante falou sobre esse fato espontaneamente e observou que a solução adotada por eles é tratar o óleo quimicamente para reduzir os FFAs, após o que ele é mandado de volta para produzir batatas chips. Hmmm – óleo vegetal reaproveitado tratado com produtos químicos pra reduzir ácidos graxos livres!
Acontece que esses óleos são tão ruins que os fabricantes de biodiesel os evitam! Em outras palavras, é difícil de catalisá-los para metil-ésteres (biodiesel) e os produtores relutam em usá- los como combustível para motores. Mesmo assim, as pessoas ainda comem batatas chips!
Isso me lembra a última vez que comi um donut, aqueles lindamente coloridos e doces bolinhos em forma de rosquinhas fritas. Se você visse os resíduos! Minha oferta de apanhar de graça o óleo usado na fábrica de donuts foi recebida com entusiasmo por parte da gerência, dizendo que eu poderia pegar um tonel de 200 litros a cada 6 meses. Alguma vez você já entrou numa fábrica de donuts e viu a quantidade de óleo que eles têm naqueles tanques? Agora considere o fato de que eles descartam somente 200 litros a cada 6 meses!
Uma fábrica que fechou me pediu para apanhar o tonel de óleo vegetal usado no seu estacionamento, pois o óleo estava vazando e causando um dano ambiental. Eu até tentei drenar o óleo, mas ele estava tão grosso e tão cheio de borra que entupiu a minha bomba. Cheguei a considerar a utilização de uma bomba reforçada, do tipo usado em esgoto, mas resolvi não fazer isso porque o conteúdo denso e malcheiroso daquele tonel não poderia ser usado como ingrediente para combustível, e refiná-lo sairia muito caro. O material tinha uma estranha semelhança com esgoto. Eu sabia que não era isso pela única razão de que ele tinha um odor adocicado, cheirando à rosquinha frita, porém totalmente desagradável.
Fatos científicos, como conhecer o conteúdo cancerígeno desse ‘alimentos’ são interessantes, mas se você quiser ter uma motivação real para evitar comer ‘porcarídeos’, vá até os fundos do ‘restaurante’, onde eles descartam seus subprodutos (que prejudicam o meio ambiente), e dê uma olhada. Você pode também perguntar por que eles têm de manter o material em tonéis e esperar por um caro serviço de recolhimento, em vez de simplesmente jogar no esgoto? A razão é esta – a Agência de Proteção do Meio Ambiente não permite que isso seja feito!”

Fonte: Wise Traditions, Vol. 8, No. 2.

The Weston A. Price Foundation