Maior siderúrgica da UE pode fechar por dano ambiental.

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A característica mais distintiva da cidade de Taranto, no sul da Itália, não é sua costa pitoresca, a catedral ou seu castelo. É o forte “gosto” de metal no ar, um cheiro marcante que deixa os visitantes desacostumados com uma pontada no fundo da garganta, resultado das fundições de aço da Ilva. De um lado da baia estendem-se cafeterias e calçadas bem cuidadas. Do outro, guindastes gigantes e uma floresta de chaminés expelindo fumaça.

 

http://www.ihu.unisinos.br/noticias/516530-maior-siderurgica-da-ue-pode-fechar-por-dano-ambiental

A reportagem é de Stephan Faris e publicada pela Bloomberg Businessweek e reproduzida no jornal Valor, 17-12-2012.

Ilva, a maior usina siderúrgica da Europa, desencadeou um conflito na cidade de 190 mil habitantes, entre os que estão preocupados com a sua saúde e os angustiados por manter seus empregos. Também colocou o governo em rota de colisão com o Poder Judiciário, que deseja ver a usina fechada.

Nos últimos dez anos, ambientalistas expuseram os níveis alarmantes de poluentes na área em torno à usina. Em 2008, cerca de 2 mil ovelhas tiveram de ser abatidas depois de terem sido encontrados níveis perigosos de dioxinas em seu leite e sua carne.

No bairro operário de Tamburi, do lado da baia onde fica a usina, as casas estão infiltradas com um pó negro, de resíduos de metais, que sai das chaminés. Grazia Parisi, pediatra que trabalhou na região, lembra-se de achar o pó em sua mesa e na maca de exames todas as manhãs. “Estava sempre lavando e lavando minhas mãos”, diz. “Parti porque estava ficando doente”.

Parisi diz que 90% dos bebês da área sofrem de ataques de asma em seu primeiro ano. Testes em 2010 mostraram que o solo de Tamburi contém altos níveis de berílio, chumbo e bifenilo policlorado. O prefeito baixou uma ordem proibindo as crianças de brincar em terrenos não pavimentados. Em fevereiro de 2011, outro alarme quanto a dioxinas e ao bifenilo policlorado levou a uma proibição à criação de ostras perto da usina.

A Ilva é responsável por 30% da produção de aço na Itália e emprega 12 mil pessoas numa cidade onde o desemprego é de 33%. A siderúrgica faz parte do Gruppo Riva, de capital fechado, e afirma que gera 74% do Produto Interno Bruto (PIB) da província de Taranto. O porto é quase totalmente dedicado a embarcar o aço da Ilva.

“Se fosse tão fácil encontrar oportunidades em outro lugar, você acha que ainda estaríamos aqui?”, pergunta Vito Bilotta, representante do UILM, sindicato que luta para manter a usina em funcionamento. O alcance da influência daIlva na cidade pode ser visto na igreja principal de Tamburi, onde um mosaico mostra um Jesus loiro com chaminés e guindastes ao fundo.

O conflito chegou ao ápice em julho, quando um juiz ordenou o fechamento de partes da usina. Oito gerentes e ex-gerentes, incluindo o proprietário Emilio Riva, foram colocados sob prisão domiciliar preventiva, enquanto eram investigados por suspeita de terem provocado, consciente e negligentemente, um desastre ambiental.

Desde então ocorreram protestos – de moradores que defendem o fechamento da usina e de operários que temem perder o emprego. Segundo Bilotta, o impasse está minando a confiança dos clientes da Ilva. Cerca de 800 trabalhadores estão em licença temporária devido às condições do mercado, e os bancos começaram a recusar crédito aos funcionários da Ilva.

Em outubro, o Serviço Nacional de Saúde italiano revelou que os habitantes de Taranto têm uma probabilidade 30% maior de desenvolver tumores que os das cidades vizinhas da província. O risco é o dobro de os homens contraírem de pulmão, e as mulheres, câncer de estômago. Uma de Taranto tem probabilidade 20% maior de morrer no primeiro ano de vida que uma criança de outra localidade da região. “É como um iceberg”, diz o médicoPatrizio Mazza, que há muito alerta para o perigo. “Estamos vendo só a ponta.”

Em 26 de novembro, o Ministério Público determinou a realização de mais uma investigação, desta vez para apurar denúncia de que diretores do Gruppo Riva pagaram propina a autoridades locais para que a unidade pudesse continuar poluindo. O órgão também apreendeu produtos de aço em um navio ancorado no porto. Em protesto, a empresa anunciou que suspenderia a produção. Milhares de trabalhadores acorreram aos portões, exigindo a volta ao trabalho.

O governo do primeiro-ministro Mario Monti baixou um decreto de emergência, em 30 de novembro, revertendo o fechamento de parte da fábrica que tinha sido determinado pelo tribunal. O decreto dizia ainda que a Ilva poderia continuar operando enquanto Roma supervisionava uma reformulação radical, a um custo de € 3 bilhões, que a habilitaria a cumprir os padrões da União Europeia (UE). Para os que defendem o fechamento da unidade, a medida de Monti foi um choque. “É como você ter uma pessoa doente na sua frente e, em vez de curá-la, você lhe dá um chute”, diz Grazia.

Com a siderurgia europeia enfrentando problemas, e a italiana fraca, o dinheiro para as melhorias poderá surgir apenas lentamente. A política poderá atrapalhar, também. No dia 8, Monti anunciou que deixaria o cargo para abrir caminho para a convocação de eleições antecipadas. A medida referente à fábrica é uma das muitas já anunciadas – mas ainda não sancionadas – pelo Parlamento. Taranto corre o risco de ser esquecida mais uma vez.

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