Macron e o colonialismo

https://www.dw.com/pt-br/macron-condena-massacre-de-argelinos-em-1961-em-paris/a-59529328

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https://www.rfi.fr/pt/%C3%A1frica/20210527-macron-reconhece-em-ruanda-as-responsabilidades-da-fran%C3%A7a-no-genoc%C3%ADdio-de-1994

16.10.2021

27/05/2021

[NOTA DO WEBSITE: por que essas duas matérias sobre as ações da presidência da França, importam nosso trabalho? Simplesmente porque começamos a ter posições de governantes europeus que mostram ao mundo, principalmente para nós, os colonizados, o que a ideologia do colonialismo europeu causou às culturas onde ela atracou como no Brasil há mais de 500 anos! Acrescentar as declarações do presidente alemão em 23 de outubro pp, já publicado no site no link, quando conclama de que a Alemanha precisa se responsabilizar pela colonização, reforça esse rico momento. No entanto, mais do que os políticos e os governos europeus fazerem uma reavaliação de suas ações colonizadoras, muitas que se transformaram em crimes contra a humanidade, é nosso tempo de revermos e reavaliarmos o que estamos fazendo conosco mesmos. E isso, cada um dos povos que estão nos continentes colonizados precisam se perguntar o quanto essa ideologia excludente e arrogante não está impregnada em seus corações e suas mentes, em suas práticas do dia a dia.]

Crimes são “imperdoáveis”, diz presidente francês, primeiro chefe de Estado a participar de cerimônia em memória das vítimas. Há 60 anos, polícia parisiense reprimiu brutalmente protesto pela independência da Argélia.

O presidente da França, Emmanuel Macron, condenou veementemente neste sábado (16/10) o massacre policial de 1961 contra manifestantes argelinos que protestavam em Paris pela independência da Argélia, à época uma colônia francesa.

Em comunicado divulgado pela presidência logo após uma cerimônia para marcar os 60 anos do massacre, Macron “reconheceu os fatos: que os crimes cometidos naquela noite sob o comando de Maurice Papon [então chefe da polícia de Paris] são imperdoáveis para a República”. Foi uma repressão “brutal, violenta, sangrenta”, afirmou o governo.

Embora não configurem um pedido de desculpas formal, as palavras do líder francês foram mais longe que as de seu antecessor, o ex-presidente François Hollande, que em 2012 reconheceu apenas que os argelinos que protestavam foram “mortos em uma repressão sangrenta”.

Macron compareceu à cerimônia memorial em Paris, mas não fez um discurso no local. Ele foi o primeiro chefe de Estado francês a participar das solenidades do massacre, ao lado de sobreviventes, ativistas da sociedade civil e veteranos da luta pela independência da Argélia.

O presidente observou solenemente uma coroa de flores adornada com uma fita com as cores da bandeira da França sendo colocada à beira do rio Sena, na ponte Bezons.

Flores em memória das vítimas do massacre foram jogadas no rio por pessoas reunidas ali para marcar o aniversário – vários dos manifestantes que morreram no incidente de 1961 teriam se afogado. Após a cerimônia, Macron apertou as mãos e conversou com membros da comunidade.

Um dia sombrio na história da França

Os protestos de 17 de outubro de 1961 ocorreram no último ano do violento esforço da França para manter o controle sobre sua então colônia da Argélia.

As manifestações foram em resposta a um toque de recolher rígido imposto aos argelinos para evitar que o movimento clandestino de resistência Frente de Libertação Nacional (FLN) arrecadasse fundos após uma série de ataques mortais contra policiais franceses.

Mais de 25 mil pessoas se reuniram em protesto contra as ações francesas na Argélia, apesar do toque de recolher. Mas o protesto foi duramente reprimido pelas forças de segurança. Cerca de 12 mil argelinos foram detidos e levados a vários estádios.

Não se sabe quantos foram assassinados no protesto daquela noite de 1961, mas o consenso histórico é que o número de mortos chegou a pelo menos dezenas – apesar de a contagem oficial ser de apenas três vítimas.

Alguns ativistas temem, contudo, que várias centenas de pessoas possam ter morrido, incluindo manifestantes que a polícia lançou no rio Sena e se afogaram. Outros foram espancados até a morte ou assassinados a tiros pela polícia.

O massacre de 17 de outubro deu início a uma espiral de violência que durou semanas. Por décadas, as atrocidades foram encobertas. Muitos dos restos mortais das vítimas nunca foram encontrados.

Mais tarde revelou-se que Papon, o chefe da polícia de Paris à época, foi um colaborador do regime nazista na Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial, o que adicionou mais um ponto de vergonha aos acontecimentos sangrentos daquela noite em Paris.

Macron reconhece no Ruanda “as responsabilidades” da França no genocídio de 1994

27/05/2021

O Presidente francês Emmanuel Macron afirmou esta quinta-feira, 27 de Maio, no Ruanda que reconhece “as responsabilidades” da França no genocídio de 1994, em particular por ter optado durante “muito tempo pelo silêncio em vez da verdade”.

O Presidente francês está em visita ao Ruanda, presente esta manhã no Memorial do Genocídio Emmanuel Macron admitiu erros de Paris no decurso dos eventos em 1994 e afirmou esperar o perdão pelos mesmos.

O chefe de Estado do Ruanda, Paul Kagamé, por seu lado, afirmou que o discurso do seu homólogo foi de uma grande coragem e teve mais valor do que um pedido de desculpas. 

“Hoje aqui, com humildade respeito, venho reconhecer nossas responsabilidades”, afirmou Emmanuel Macron num discurso muito aguardado no Memorial do Genocídio em Kigali.

“Os assassinos que ensombraram as colinas, as igrejas não tinham o rosto da França. Ela não foi cúmplice. O sangue derramado não desonrou as armas nem as mãos dos seus soldados. Estes viram também com os próprios olhos perpetrar-se o indescritível, estancaram feridas e abafaram as suas lágrimas”, disse.

“A França tem um papel, uma história e uma responsabilidade política no Ruanda”, declarou o chefe de Estado francês que reconheceu “as nossas responsabilidades, reconhecer este passado é também e, sobretudo, prosseguir um trabalho de justiça”.

Emmanuel Macron é o primeiro Presidente francês desde 2010 a visitar o Ruanda, que durante muito tempo acusou a França de cumplicidade na morte de 800.000 ruandeses, a maioria Tutsi.

A França compromete-se “a que nenhuma pessoa suspeita de crimes de genocídio possa escapar ao trabalho dos juízes. Só os que atravessaram a noite podem, talvez, perdoar. E nos possam, então, brindar com a dádiva de nos perdoarem.”

O papel da França antes, durante e depois do genocídio de Ruanda é um tema sensível há anos, e chegou a provocar a ruptura das relações diplomáticas entre Paris e Kigali entre 2006 e 2009.

 Um relatório de historiadores publicado em Março e coordenado por Vincent Duclert concluiu que a França tinha “responsabilidades pesadas e avassaladoras” e que o então Presidente socialista François Mitterrand e os seus políticos “fecharam os olhos” pela deriva racista e genocida do governo hutu, então apoiado por Paris.

 A associação de sobreviventes do Ibuka lamentou a falta de um pedido de “desculpas” de Emmanuel Macron. No Memorial do Genocídio, repousam os restos mortais de 250.000 das mais de 800.000 vítimas de uma das tragédias mais sangrentas do século XX.

Com este discurso, o Presidente francês vai mais longe que seus antecessores, em particular Nicolas Sarkozy, o único Presidente francês a ter viajado para Kigali desde o genocídio de 1994. Nicolas Sarkozy reconheceu, na altura, “graves erros” e “uma forma de cegueira” das autoridades francesas, que tiveram consequências “absolutamente dramáticas”.

“Podemos seguir em frente”, afirmou Paul Kagame

Para o presidente de Ruanda, Paul Kagame, que liderou a rebelião tutsi que pôs fim ao genocídio, o relatório dos historiadores marcou uma mudança de rumo nas relações entre os dois países.

Durante visita à França na semana passada, Paul Kagame declarou que o informe abriu o caminho para que França e Ruanda tenham “uma boa relação”. “Posso viver com as conclusões do relatório”, disse Kagame em entrevista à RFI e France 24.

Para concretizar a normalização das relações bilaterais, os dois Presidentes chegaram a um acordo sobre o regresso de um embaixador francês a Kigali. O posto que está vago desde 2015.

Depois do Ruanda, Emmanuel Macron segue para a África do Sul, onde se reunirá com o Presidente Cyril Ramaphosa para abordar a luta contra a pandemia da Covid-19 e seu impacto na mundial.