Legislação ambiental precisa acabar com ideia de que natureza é recurso, alerta membra da ONU

Floresta Não Recurso

Devastação na Amazônia acontece historicamente no país, mesmo com legislação ambiental exemplar – Alberto César Araújo/Amazônia Real)

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Redação

17 de Julho de 2023

Doutora em Diretos da Natureza, Vanessa Hasson considera lei criada para proteger rio Laje (RO) como exemplar.

Embora a legislação ambiental brasileira seja considerada avançada, ela está fundada em um entendimento já ultrapassado que coloca o ser humano à parte da natureza.

Na avaliação da Vanessa Hasson, doutora em Direitos da Natureza e membra do programa da ONU (Organização das Nações Unidas)  Harmony with Nature, “tudo é considerado recurso, até os humanos, que são chamados de recursos humanos nas corporações”, lembra.

Neste sentido, o reconhecimento do rio Laje em Guajará-Mirim (RO) como um ente vivo, por meio de uma lei municipal, foi algo “maravilhoso”, celebra a especialista que conversou com o programa Bem Viver desta segunda-feira (17).

“O texto da lei trata de nutrir relações e interrelações com todos seres que interagem com o Rio, considero ele um sujeito de direito”, explica Hasson, fundadora da Mapas, organização internacional,  criada em 2004, que promove caminhos para o Bem Viver e para o reconhecimento dos Direitos da Natureza.

O projeto de lei de Rondônia garante a existência do Rio e de todos os outros corpos e seres que vivem em suas águas. A lei é considerada pioneira em alguns aspectos, defendem ambientalistas.

Um ponto é, por exemplo, estabelecer que o rio Laje possui o direito de “manter seu curso inalterado”, de “prover e receber nutrição” e “coexistir com condições físico-químicas que garantam seu equilíbrio ecológico”, define a lei.

“Os direitos da natureza vêm ultrapassando o entendimento presente na legislação ambiental brasileira e, ao mesmo tempo, resgatando um entendimento ancestral ligado às relação com a natureza. Ligando todos nós a uma mesma unidade, que nós convencionamos de chamar de natureza, mas é a própria vida”, continua a especialista.


O rio Laje foi reconhecido como um ente vivo e sujeito de direito / wikiCommons

Equador 

Em 2008, a constituição do Equador trouxe um elemento que é considerado exemplar para diversos ambientalistas. A carta magna do país tem inserido o conceito de pachamama, palavra da língua indígena quechua, utilizada por povos originários presentes no Equador. 

“A natureza ou Pachamama onde se reproduz e se realiza a vida, tem direito a que se respeite integralmente sua existência e a manutenção e regeneração de seus ciclos vitais, estrutura, funções e processos evolutivos”, afirma texto.

Hasson concorda que a Constituição deve servir de exemplo, ao mesmo tempo, indica que caminhos podem ser aprimorados.

“O Equador tem usado muito do recurso judicial, usando a constituição para fortalecer as demandas judiciais. Eu particularmente eu não acredito que processo judiciais podem causar mudanças radicais em termos de solução no que diz respeito a essa crise ecológica que vivemos”, explica a especialista.

Para ela, a lei do rio Laje é um exemplo melhor a ser seguido por conta do tom pedagógico que traz o texto. Hasson argumenta que o entendimento da ONU, em diversos fóruns, é de apontar as ações para a base, ou seja, agindo de baixo para ir crescendo de instâncias.

Para isso, a especialista aposta nas leis orgânicas estabelecidas pelos próprios municípios.

“O direito da natureza está muito mais alinhado a uma orientação, a uma resgate da vida em harmonia com a natureza. E não será algo institucionalizado, como é o paradigma antropocêntrico ou o próprio Direito, que não dão conta de mudar radicalmente como são esses processos de desconexão com a natureza”, finaliza Hasson.