Cerca de 30 lideranças Munduruku do estado do Pará participaram de audiência nesta sexta-feira (30) no Palácio do Planalto com o ministro Miguel Rossetto, da Secretaria-Geral da Presidência da República. Os indígenas apresentaram o “Protocolo de Consulta Munduruku”, documento elaborado pelo povo sistematizando a maneira com que desejam ser consultados sobre o complexo hidrelétrico do Tapajós.
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A reportagem é de Carolina Fasolo e publicada pelo portal do Cimi, 30-01-2015.
Os Munduruku esperavam também a presença do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e do presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Flávio Chiarelli, que não compareceram. “É um desrespeito com nosso povo. Viajamos quatro dias para vir entregar nosso Protocolo e eles não aparecem. Isso mostra que o governo vai continuar ignorando os direitos indígenas”, disse a liderança Ademir Munduruku, do Alto Tapajós.
O documento faz referência à demarcação da Terra Indígena (TI) Sawré Muybu, região do Médio Tapajós que abrange os municípios de Itaituba e Trairão, no Pará. Conforme entrevista concedida pela ex-presidente da Funai, Maria Augusta Assirati para a Agência Pública, o relatório de identificação e delimitação da TI, pronto e aprovado desde 2013, não foi publicado por conta dos interesses governamentais para a construção de empreendimentos hidrelétricos na região, especialmente a usina São Luiz do Tapajós. “Sabemos que o relatório está pronto. Temos vídeo da Presidência da Funai admitindo que a demarcação não ocorre por conta da hidrelétrica. O governo não está agindo com a boa fé que exige a consulta”, aponta o Protocolo.
“Parece até engraçado dizer que viemos pra cobrar os nossos direitos, se o direito está garantido na Constituição Federal e assegurado por acordos internacionais” disse Ademir Munduruku a Miguel Rossetto. “Essa consulta não pode ser apenas para legitimar a construção desses empreendimentos na nossa terra. Queremos que seja respeitada a nossa decisão, e em hipótese alguma queremos a usina São Luiz do Tapajós, porque a construção desse empreendimento significa a morte, tanto para os Munduruku quanto para os ribeirinhos que habitam essa região”.
O projeto da usina, com orçamento inicial de R$ 30 bilhões, provocaria a remoção dos indígenas de Sawré Muybu, que seria alagada com a construção da barragem. A remoção de indígenas de suas aldeias é vedada pela Constituição Federal, por isso a Funai recomendou, em setembro de 2014, a suspensão do licenciamento da usina por meio de parecer interno que aponta ao menos 14 impactos às comunidades, “sendo todos negativos e 6 deles irreversíveis, mesmo pressupondo a adequada implementação de medidas mitigadoras e compensatórias”.
“A Funai tem que publicar os estudos que existem, porque mostram a inviabilidade do empreendimento dessa usina dentro do Tapajós ”, disse Ademir Munduruku, que também reforçou a urgência da publicação do relatório que identifica Sawré Muybu. Juarez Munduruku, cacique da comunidade, disse ao ministro que deixar a aldeia não é uma opção “Se um dia a São Luiz do Tapajós vier a ser construída e alagar minha terra eu não vou sair, vou morrer lá”.
A garantia da terra é a garantia da existência
Os Munduruku, em breve explicação ao ministro Miguel Rossetto, expuseram o “valor maior” do acesso aos territórios tradicionais. “A terra pra nós significa a garantia da nossa existência enquanto seres humanos, enquanto indígenas. Pra nós a terra não é vista apenas como um instrumento para enriquecimento. Nós queremos a terra pra sobreviver, pra existir enquanto seres humanos. Queremos que respeitem nosso modo de vida, porque muitas vezes o poder econômico não entende dessa forma, entende que nós somos apenas um entrave para o desenvolvimento econômico do Brasil. Muitas vezes já foi alegado que a construção de hidrelétricas é algo necessário porque o Brasil precisa de energia. E quer dizer então que nossas vidas enquanto seres humanos não tem significado?”, finalizou a liderançaAdemir.