Ibama indefere, por unanimidade, pedido de licença prévia para hidrelétrica Pai Querê.

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis () indeferiu o pedido de licença prévia para a construção da Hidrelétrica Pai Querê, no rio Pelotas, na divisa dos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. A área afetada pelo projeto da usina possui profundos vales abrigando fragmentos de Mata Atlântica e araucárias, com dezenas de espécies de fauna e flora ameaçadas.

 

 

http://www.ihu.unisinos.br/noticias/523910-ibama-indefere-por-unanimidade-pedido-de-licenca-previa-para-hidreletrica-pai-quere

 

O rio Pelotas fica localizado na fronteira entre o Rio Grande do Sul e Santa Catarina, em uma área marcada por vales com fragmentos de Mata Atlântica e araucárias.

A reportagem foi publicada no site RS Urgente, 18-09-2013.

O Relatório do Processo de Licenciamento, do Ibama, aponta que nesta área foram identificadas mais de 70 espécies de faunas integrantes de listas oficiais, com diferentes níveis de ameaça. Além disso, foram registradas 39 espécies ameaçadas de flora, muitas das quais raras ou com baixa abundância.

Segundo parecer do Ibama e do Ministério do Meio Ambiente, a região em questão é da maior importância para a conservação da biodiversidade nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. “Ainda que a paisagem local se apresente fragmentada, essa região abriga grande diversidade faunística e florística, com elevado número de espécies ameaçadas”, diz o Ibama. Além disso, acrescenta, “muitas dessas espécies possuem ocorrências restritas ao Alto Uruguai e são extremamente exigentes quanto ao habitat, merecendo atenção redobrada quanto às estratégias de conservação”.

O Estudo de Impacto Ambiental do projeto da hidrelétrica de Pai Querê concluiu, em 2011, pela viabilidade ambiental do empreendimento. Nos meses de março e abril de 2012, foram realizadas quatro audiências públicas, nos municípios de Lajes, São Joaquim, Bom Jesus e Porto Alegre, para discutir esse EIA-RIMA. O Ibama, em parecer técnico, avaliou que esse estudo havia abordado os principais impactos relacionados aos meios físico e socioeconômico, mas que não apresentava elementos suficientes para atestar a viabilidade ambiental do empreendimento.

Área de alagamento de Pai Querê. Ibama apontou presença de dezenas de espécies de fauna e flora ameaçadas, além da situação de fragilidade da biodiversidade da região.

O parecer do Ibama contestou os argumentos do EIA-RIMA, assinalando que “não foram conduzidos estudos de uso de habitat, nem coletados dados de densidade ou abundância que pudessem embasar as afirmações do EIA a respeito da inviabilidade das populações de espécies ameaçadas na área”. Além dessas fragilidades, o Ibama apontou ainda que “a cumulatividade de impactos na bacia do rio Uruguai, ocasionada não apenas pelos aproveitamentos hidrelétricos instalados a jusante do AHE Pai Querê, como também pelo histórico de ocupação da bacia por outras atividades, terminou por fragmentar e fragilizar os ecossistemas da região”.

Essa fragmentação, por sua vez, provoca um “alto grau de incerteza quanto à viabilidade das espécies ameaçadas”. Em outras palavras, conclui o Ibama, “não fica afastada a possibilidade de que a implantação do empreendimento venha a acelerar o processo de perda da diversidade biológica.

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) também se manifestou contrário à emissão da licença prévia para Pai Querê, apontando “carência de informações, inconsistência técnica do EIA-RIMA e presença de impactos significativos no Passo de Santa Vitória”.

Após analisar o Relatório do Processo de Licenciamento, a Comissão de Avaliação e Aprovação de Licenças Ambientais do Ibama aprovou, por unanimidade, o indeferimento do pedido de licença prévia de Pai Querê. O Consórcio Empresarial Pai Querê-Cepaq já foi informado da decisão pelo presidente do Ibama, Volney Zanardi Junior, que comunicou também a abertura de prazo para um eventual recurso administrativo. O consórcio é composto pelas empresas Votorantim, Alcoa e DME Energética.

 

Licenciamento de hidrelétricas no Ibama: dois pesos, duas medidas

 

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Foto: http://bit.ly/1gTHsqJ

“Por que será que a condução desses processos de licenciamento das hidrelétricas em rios amazônicos, pelo mesmo Ibama, levam à concessão das licenças ambientais, um tratamento completamente diferenciado da UHE Pai Querê?”, pergutna Telma Monteiro, em artigo publicado no seu blog, 23-09-2013.

Eis o artigo.

No dia 10 de setembro de 2013 o Ibama indeferiu a Licença Prévia da hidrelétrica Pai Querê, que seria construída no rio Pelotas, RS. O processo de licenciamento estava correndo no Ibama desde 2001. Como tem acontecido em outros processos de licenciamento de hidrelétricas, foram constatadas muitas falhas no Estudo de Impacto Ambiental e Respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) de Pai Querê.

A Engevix era então a responsável pela elaboração dos estudos ambientais. Foi um longo caminho trilhado até agora e que acabou bem para o meio ambiente: indeferida a licença ambiental. Vitória da resistência da sociedade civil e da participação do ministério público que empreenderam um trabalho consistente de reforçar os impactos mal dimensionados, lacunas e insuficiências no EIA/RIMA.

Nesse processo que saiu vitorioso nada diferiu dos demais processos de licenciamentos de hidrelétricas na Amazônia. Ao analisar os documentos de praxe da UHE Pai Querê, como pareceres técnicos dos analistas do Ibama, chamou-me a atenção a similaridade com outros pareceres nos processos da UHE Belo Monte, no rio Xingu, UHE Teles Pires, UHE São Manoel, no rio Teles Pires e UHE Santo Antônio e UHE Jirau, no rio Madeira, que apontaram as mesmas deficiências nos estudos.

Então, a que se deve o fato de se conceder licença em todos os outros casos e não conceder para o projeto de Pai Querê? Que fique bem claro: foi muito acertada a decisão do Ibama em não conceder a licença ambiental diante dos graves impactos previstos nos estudos, como a usência de alternativas locacionais; as peculiaridades dos ecossistemas da área afetada com alto grau de endemismos e populações de espécies ameaçadas que colocam a região como de extrema importância e prioritária para a conservação da biodiversidade; a qualidade da biota que torna a área afetada insubstituível; impactos cumulativos e sinérgicos de outros empreendimentos previstos na bacia. Só para citar alguns.

Até as complementações pedidas no EIA/RIMA foram similares às das demais hidrelétricas em processo de licenciamento na Amazônia.

Curioso como, em síntese, os problemas detectados são os mesmos apontados nas hidrelétricas Belo Monte e Teles Pires, em construção e São Manoel e Foz do Apiacás, ainda em processo de licenciamento.

Essas contam, ainda, com outros agravantes que por si só deveriam pesar no indeferimento da Licença Prévia, como a proximidade de terras indígenas, a presença de índios isolados e que afetam diretamente unidades de conservação.

Por que será que a condução desses processos de licenciamento das hidrelétricas em rios amazônicos, pelo mesmo Ibama, levam à concessão das licenças ambientais, um tratamento completamente diferenciado da UHE Pai Querê?