Resumo da História
- Mais de 20 pesquisas relacionaram o uso de talco, na zona genital, com câncer de ovário. O amido do milho é um substituto seguro que pode absorver a umidade;
- Em fevereiro de 2016, um juiz detectou que o talco da Johnson & Johnson contribuiu para o câncer de ovário em uma mulher de 62 anos, a quem lhe concedeu US$ 72 milhões de dólares para compensar os danos;
- Em maio de 2016, outra mulher foi recompensada com US$ 55 milhões de dólares para ressarcir os danos, assim que se descobriu que o talco incrustado em seus ovários havia contribuído para seu câncer.
By Dr. Mercola
Utiliza-se em cosméticos (cosmetics) quase 13 000 produtos químicos, dos quais se estima que somente 10% foi avaliado sobre as questões de segurança. Muitas pessoas não sabem que os cosméticos podem ser comercializados sem terem necessidade que se submeterem a processos de aprovação.
Os cosméticos são regulamentados pela FDA/Food and Drug Administration dos EUA (nt.: Administração de Alimentos e Medicamentos), mas não são aprovados por ela. Isto significa que só DEPOIS que um produto é considerado prejudicial, adulterado ou mal identificado, é que a FDA tomará medidas regulatórias.1 Os únicos ingredientes de cosméticos que requerem a aprovação da FDA antes de sua comercialização, são os corantes.
E então: quem é responsável por assegurar de que são confiáveis tanto os cosméticos como os produtos de cuidado pessoal?
A resposta é: as próprias empresas que fabricam e comercializam os produtos.
É o exemplo clássico da ‘raposa que cuida do galinheiro’. Ou seja, coloca a todos nós em um elevado risco.
As empresas não estão obrigadas a compartilhar com a FDA toda a informação de segurança que pudessem ter e as regulamentações delas tampouco exigem provas específicas para demonstrarem a segurança de seus produtos. Este fato levanta um evidente conflito de interesses e como demonstram os recentes litígios na Justiça, isso pode ter consequências graves em termos de saúde pública.
O Talco Para Nenê Aumenta o Risco de Câncer de Ovário
A Johnson & Johnson (J&J) é uma marca de confiança e bem conhecida como “amigável com os nenês”, e que produz uma série de produtos tanto para nenês como artigos para a higiene feminina.
Infelizmente, uma vez mais, falhou com a confiança pública. E a falta de regulamentações relativas aos cosméticos é o que tem ajudado a enterrar os perigos de um de seus produtos mais emblemáticos.
Em 2008, adverti às mulheres a deixarem de utilizar o talco (cease using talcum powder). Assinalei que haviam várias pesquisas que demonstravam que ao se aplicar talco na zona genital, as partículas do pó viajam através da vagina e se incrustam nos ovários, podendo elevar o risco de câncer de ovário.2
Como assinalou Robinson Calcagnie, Inc. — uma firma de advogados que representa as vítimas do talco — existem mais de 20 pesquisas deste tipo.3 Algumas remontam a 1971, quando os pesquisadores britânicos encontraram partículas de talco incrustadas na maioria dos tumores de ovário investigados.4
Ainda que o nível de risco varie de uma pesquisa a outra, os resultados sugerem que ao aplicar o talco nesta área,5 as mulheres poderiam aumentar o risco de tipo de câncer em 30 a 90%.
Uma pesquisa realizada em 2008 concluiu que utilizar talco ao menos uma vez por semana, eleva o risco de câncer de ovário em uns 36%. Os usuários habituais enfrentaram risco 4% maior.6
A Johnson & Johnson Enfrenta Desafios Legais Por Seu Talco Cancerígeno
De acordo com a Robinson Calcagnie, Inc.:
“A Agência Internacional para a Investigação do Câncer (nt.: IARC/International Agency for Resarch on Cancer), da Organização Mundial da Saúde designou que “o uso perineal [genitais] de pós corporais a base de talco, possivelmente seja cancerígeno para os seres humanos”.
Sem dúvida que os fabricantes de produtos que contêm talco, como [a J&J] — e seus produtos Shower to Shower e Baby Powder — se negaram a reconhecer o vínculo entre o talco e o câncer de ovário e falham por não advertirem os consumidores acerca destes riscos.
Na atualidade, mais de 1.000 mulheres em todo o país apresentaram ações judiciais contra [a J&J] e seu distribuidor de talco Imerys, clamando de que estas empresas sabiam da relação entre o uso de talco e o câncer de ovário e ainda assim não advertiram adequadamente os consumidores“.
Johnson & Johnson Paga US$ 72 Milhões em Perdas e Danos a Vítimas por Câncer de Ovário
Em fevereiro de 2016, um juiz detectou que o talco da J&J havia contribuído para o câncer de ovário da senhora Jacqueline Fox de 62 anos de idade, e determinou receber US$ 72 milhões como perdas e danos.7
Também concedeu US$10 milhões como compensação pelos danos; e por danos punitivos outros US$ 62 milhões a membros de sua família, quando Fox morreu no outono passado (nt.: primeiro semestre de 2016), ao sucumbir pela enfermidade, depois de haver sido diagnosticada com câncer de ovário há três anos.
O depoimento da sra. Fox foi entregue através de uma declaração pré gravada, na qual dizia que havia utilizado o talco corporal da J&J Shower to Shower durante 35 anos. Acreditava que, nos dias atuais, o resultado é que estes produtos resultaram ser os responsáveis por arrebatar-lhe a vida. Fox foi a primeira pessoa a receber uma compensação econômica.
Outras 1.200 mulheres encontram-se na expectativa de estar nos tribunais, que como foi com a sra Fox, reclamam que a J&J sabia dos riscos e ainda assim não advertiu sobre os perigos de seus produtos com talco.
Um escritório de advogados de Missouri foi contatado por 17.000 pessoas, após terem escutado sobre o caso de Fox, sendo provável que com o tempo o número de demandantes aumente exponencialmente.8
O segundo acusado no caso, Imerys Talc America, não foi considerado culpado. De acordo com a presidente do jurado, Krista Smith, os documentos internos da J&J mostraram claramente que a companhia havia ocultado de que conhecia os riscos dos produtos. “Todo o que tinham que fazer era por uma etiqueta de advertência no produto”, disse Bloomberg.9
Em um comunicado, a J&J respondeu a tal veredicto, dizendo que:10
“Não temos nenhuma responsabilidade exceto sobre a saúde e a segurança dos consumidores e estamos decepcionados com o resultado do julgamento. Solidarizamo-nos com a família do demandante, mas cremos firmemente que a segurança do talco cosmético é sustentada por décadas de evidência científica”.
A J&J Ocultou os Perigos do Talco Durante 40 Anos
Duas ações judiciais adicionais vincularam o talco da J&J com o câncer de ovário. Em 2 de maio de 2016, os membros do jurado outorgaram US$ 55 milhões de dólares à sra. Gloria Ristesund por perdas e danos. A sra. Ristesund, diagnosticada com câncer de ovário em 2011, havia utilizado o talco da J&J durante 40 anos.
Depois de sua histerectomia, os médicos detectaram efetivamente o talco no seu tecido ovariano. De acordo com o periódico Huffington Post, também neste caso, os documentos e notas internas foram decisivas no acordo dos membros do jurado, demonstrando que a companhia “tratou de encobrir e influenciar os órgão que regulamentam os cosméticos”.11
O talco é feito de um mineral trissilicato de magnésio. Nos anos 70, surgiram preocupações quando se percebeu que o talco continha asbesto cancerígeno.
Em 1973, elaborou-se uma lei a respeito de que todos os talcos deveriam estar livres de asbesto/amianto. Sem dúvida, de que a conexão com o câncer de ovário não está relacionada com o asbesto, sendo um fator de risco independente. Segundo informou Huffington Post:
“Em 1993, o Programa Nacional de Toxicologia (NTP/National Toxicology Program) dos Estados Unidos publicou uma pesquisa acerca da toxicidade do talco sem asbestiformes e detectou uma clara evidência de atividade cancerígena. Constatou-se ser o talco cancerígeno, com ou sem a presença de fibras similares ao asbesto.
Em resposta à pesquisa nacional do NTP, a Associação de Cosméticos, Artigos de Tocador e Fragrâncias formou o Talc Interested Party Task Force/TIPTF (Grupo de Trabalho Focada no Talco). A Johnson & Johnson era um membro do lobby comercial e foi o ator principal, além de colaborador do TIPTF. O propósito declarado do TIPTF era juntar os recursos financeiros destas empresas num esforço para defender coletivamente o uso do talco e evitar qualquer tipo de regulamentação sobre esta indústria“.
O Acobertamento do Talco
Curiosamente, a Johnson & Johnson é a proprietária do adoçante da marca Splenda (nt.: nome comercial da substância artificial ‘sucralose’). Antes de escrever meu livro ‘Sweet Deception‘ (nt.: https://www.amazon.com/Sweet-Deception-Splenda-NutraSweet-Hazardous/dp/078529693X), seus advogados, seus representantes legais em New York, escreveram-me uma carta com mais de vinte páginas, advertindo-me para não publicar o livro ou eles iriam me processar requerendo dezenas de milhares de dólares por perdas e danos. É claro que publiquei o livro e eles jamais me acionam porque tudo o que escrevi era verdade.
Da mesma forma de muitas outras indústrias perigosas, a TIPTF contratou pesquisadores para produzirem um estudo tendencioso que posteriormente seria utilizado para proporcionar aos consumidores uma falsa sensação de segurança.
Isso funcionou por várias décadas, mas em 2006 o governo canadense classificou o talco como uma substância D2A de acordo com seu Sistema de Informação Sobre Materiais Perigosos no Trabalho. As substâncias D2A são consideradas “muito tóxicas” e “cancerígenas”.
Neste mesmo ano, o fornecedor de talco da J&J, Imerys Talc, começou a agregar advertências para o talco vendido para a J&J, provendo-lhe com informações de segurança não só da IARC (nt.: International Agency for Resarch on Cancer/ONU), como também do governo canadense. A empresa J&J nunca levou estas advertências aos consumidores e ainda continuam sem fazê-lo, ao alegar que a evidência científica apoia sua segurança.
Ademais, a J&J continua “educando” os consumidores acerca da segurança do talco em seu website, sem mencionar que foi considerada culpável de negligência por dois jurados distintos, ou os 1.200 casos de imputação pendentes, por ter o talco contribuído para o câncer de ovário.
Alguns Talcos Podem Ainda Estar Contaminados com o Asbesto/Amianto
A empresa alemã BASF e seus advogados também enfrentam acusações de fraude relacionadas ao talco — neste caso o talco contaminado com asbesto/amianto. Uma demanda coletiva apresentada contra ela e eles alega que as partes “conspiraram por ocultar e/ou destruir as provas de exposição ao asbesto, com a finalidade de prevenir ações judiciais”.
No entanto resulta que, mesmo que o talco que contenha asbesto esteja proibido desde 1973, uma corporação chamada Engelhard obtinha o talco de uma mina em Vermont/EUA que continha asbesto. Posteriormente, a Engelhard foi adquirida pela BASF, herdando os passivos da empresa. De acordo com o escritório jurídico de Bergman, Draper, Ladenburg:12
“Três funcionários da Engelhard testemunharam nos depoimentos que de fato havia asbesto no talco e que os funcionários da companhia ocultaram este fato“.
A J&J Tem Uma Longa História de Malversação
É possível que se surpreenda ao saber que na realidade a J&J tem uma longa história de malversação corporativa. A empresa de orientação da Califórnia AllBusiness.com identifica a J&J como um dos 100 infratores corporativos principais dos anos 9013, por destruir deliberadamente documentos relacionados com uma investigação criminal de um de seus produtos.
Nos últimos três anos a empresa investiu mais de US$ 5 bilhões de dólares para pagar as ações judiciais relacionadas com seus produtos.
O ano de 2010 foi um ano particularmente negativo para a J&J. Em primeiro lugar, foi descoberto que a empresa ocultou problemas na fabricação de seus medicamentos (drug manufacturing problems) e em vez de retirá-los do mercado suas drágeas defeituosas Motrin, enviou agentes disfarçados de típicos compradores para comprar os produtos restantes.
Neste mesmo ano, o governo da Colúmbia Britânica do Canadá, apresentou um ação judicial contra a J&J, ao alegar que comercializavam agressivamente o emplastro anticoncepcional Ortho Evra, sem revelar os efeitos secundários graves, como coágulos sanguíneos, embolias pulmonares, derrames cerebrais, ataques cardíacos e trombose venosa profunda.
Ademais, o Departamento de Justiça (DOJ) dos Estados Unidos também acusou a empresa de pagar dezenas de milhares de dólares em subornos a Omnicare Inc. para comprar e recomendar os medicamentos da J&J.14
Assim mesmo, as pesquisas revelaram que o shampoo de nenê (baby shampoo) No More Tears da J&J continha dois produtos químicos potencialmente cancerígenos: quaternium-15 que libera formaldeído (conhecido cancerígeno e irritante cutâneo, ocular e do trato respiratório) e o 1,4-dioxano reconhecido por ser um possível cancerígeno.
Depois de vários anos pressionada pelos defensores dos consumidores, finalmente em 2014, a J&J eliminou estes ingredientes perigosos de seu shampoo para nenês.15
A Quantos Produtos Químicos a Rotina de Beleza Expõe a Cada Dia?
As mulheres norte americanas utilizam em média 12 produtos cosméticos e/ou de cuidado pessoal diários que contêm 168 diferentes produtos químicos (168 different chemicals), de acordo com a ONG norte americano EWG.
Mesmo que a maioria dos homens utilizem menos produtos, ainda estão expostos a, mais ou menos, 85 destes produtos químicos por dia, enquanto que os adolescentes, que utilizam uma média de 17 produtos de cuidado pessoal diariamente, estão expostos a uma quantidade ainda maior.16
É evidente que este tipo de exposição a produtos químicos não é insignificante, sobretudo quando é de maneira cotidiana e por toda a vida.
Quando a EWG realizou testes em adolescentes para saber que produtos químicos do grupo de cuidado pessoal encontravam-se presentes em seus corpos, foram detectados 16 diferentes produtos químicos que alteram os hormônios, incluindo parabenos e ftalatos.
Além disso, existem outros riscos químicos; no relatório “Heavy Metal Hazard: The Health Risks of Hidden Heavy Metals in Face Makeup“,17 a ONG canadense Environmental Defense analisou 49 distintos artigos de maquiagem, incluindo bases, corretores, pós, blushes, rímel, delineadores dos olhos, sombras de olhos, batom labial e glosses labiais.
Seus testes revelaram que praticamente todos seus produtos tinham uma severa contaminação por metais pesados:
- 96 % continha chumbo
- 90 % continha berílio
- 61 % continha tálio
- 51 % continha cádmio
- 20 % continha arsênico
Como Reduzir a Exposição aos Produtos Químicos
A ONG EWG dispõe de um grande banco de dados para ajudar os interessados a encontrarem os artigos de cuidado pessoal que estejam livres de produtos químicos potencialmente perigosos.18 Se desejar evitar ingredientes potencialmente tóxicos, os artigos que levam o selo norte americano “USDA 100% orgânico” são alguns dos mais seguros.
Considere que, ainda que os produtos exibam nos rótulos os dizeres “totalmente naturais”, ainda assim podem conter produtos químicos nocivos. Daí a importância que se deve dar na verificação da listagem completa de ingredientes.
Melhor ainda, simplificar a rotina e fazer-se seus próprios produtos. Por exemplo, pode-se evitar a utilização de uma grande quantidade de loções, elixires e tratamentos capilares (hair treatments), podendo-se eliminá-los só com um frasco de gordura de coco (coconut oil) ao qual, se assim o desejar, pode agregar um óleo essencial de alta qualidade (high-quality essential oil) para que tenha um perfume natural.
É importante recordar que a pele é o maior e o mais permeável dos órgãos do corpo. Praticamente quaisquer produtos que se ponha sobre ela, terminará na corrente sanguínea e se espalhará por todo o corpo. Uma vez que estes produtos químicos entrem no corpo, com o tempo, tenderão a se acumular, já que, em geral, ele carece das enzimas necessárias para decompô-los.
Em relação ao talco, minha recomendação é evitá-lo por completo. Além disso, recordar que as mulheres adultas não são as pessoas mais comumente expostas ao ele. A maioria dos pais o aplicam generosamente nos bumbum dos nenês a cada troca de fraldas.
O amido de milho é um substituto seguro que pode absorver a umidade. Em 1999, seguindo os informes dos perigos acerca do talco, a Sociedade Americana do Câncer (ACS/American Cancer Society) e a Coalizão Nacional do Câncer de Ovário (NOCC/National Ovarian Cancer Coalition) divulgaram a recomendação de utilizar produtos a base de amido de milho na zona genital, em vez de talco.19
Fontes e Referências
- 1 U.S. FDA, FDA Authority Over Cosmetics
- 2 American Cancer Society Talcum Powder and Cancer
- 3 Robinson Calcagnie, Inc., Talcum Powder Litigation
- 4 McGowan, Hood & Felder, LLC, Johnson & Johnson Talc Cover-Up
- 5, 11 Huffington Post May 4, 2016
- 6 Cancer Epidemiology Biomarkers & Prevention September 1, 2008, 17, 2436-2444
- 7 PW Parker Waichman LLP July 11, 2016
- 8 Forbes August 3, 2016
- 9, 10 Bloomberg February 22, 2016
- 12 Bergman, Draper, Ladenburg
- 13 Allbusiness.com Top 100 Corporate Criminals of the Decade
- 14 Reuters January 15, 2010
- 15 New York Times January 17, 2014
- 16 EWG Skin Deep Cosmetics Database, Exposures Add Up
- 17 EWG, Heavy Metal Hazard: The Health Risks of Hidden Heavy Metals in Face Makeup
- 18 EWG Skin Deep Cosmetics Database
- 19 PR Newswire July 7, 1999
Tradução livre de Luiz Jacques Saldanha, agosto de 2016.