Resumo da história
- O glúten é uma proteína composta de moléculas de glutenina e gliadina que, na presença da água, formam uma ligação elástica. O glúten é encontrado principalmente no trigo, centeio e cevada, mas também outros grãos poderão contê-lo;
- Uma alimentação livre de glúten é vital para aqueles que padecem da doença celíaca, que é uma severa reação gastrointestinal ao glúten. Mas muitos têm algum grau de intolerância ao glúten ou sensibilidade, sendo melhor digerem uma alimentação livre dele;
- Além do glúten, outros fatores que contribuem a uma maior intolerância a ele, com sintomas similares, estão: a hibridação feita com o trigo para uma elevação na quantidade de glúten; outros componentes presentes neste cereal; o processo de moagem ou panificação; e possível contaminação do herbicida glifosato quando de seu cultivo.
https://www.youtube.com/watch?v=6594RIPXRcs
By Dr. Mercola
O vídeo acima – “Gluten: A Gut Feeling” (nt.: ‘Glúten: a emoção dos intestinos’), investiga os problema de saúde relacionados com o glúten.
Nos últimos anos, os benefícios de uma alimentação livre de glúten vem sendo amplamente reconhecidos, e sua popularidade foi incrementada pelo apoio de celebridades além do crescente número de bibliografia a respeito.
Isso inclui o ‘best seller‘, conforme o periódico New York Times, “Grain Brain” escrito pelo neurologista Dr. David Perlmutter, onde revela como os grãos processados podem provocar uma disfunção neurológica, piorando a demência (nt.: sugerimos a leitura do livro ‘Barriga de trigo’ de William Davis – http://lelivros.xyz/book/baixar-livro-barriga-de-trigo-william-davis-em-pdf-epub-e-mobi/) .
Meu próprio livro sobre este tema, “The No-Grain Diet” (Dieta Livre de Grãos), foi publicado no ano de 2003, há 13 anos. Minha recomendação clínica incluia eliminar o glúten como a primeira linha de intervenção antes de implementar um ajuste na alimentação de um paciente.
Uma alimentação livre de glúten é vital para aqueles que têm a doença celíaca – reação gastrointestinal (GI, sigla em inglês) grave ao glúten. Paralelamente, também os médicos começam a reconhecer que muitos dos pacientes têm um certo grau de intolerância ao glúten ou mesmo sensibilidade, suportando melhor uma alimentação livre dele, mesmo para os que não têm a doença celíaca.
O Que É o Glúten?
É uma proteína composta de moléculas de glutenina e gliadina que, na presença de água, formam uma ligação elástica. O glúten encontra-se mais comumente no trigo, centeio e cevada.
Sem dúvida, outros cereais como a aveia e trigo vermelho (oats and spelt) também contêm glúten e ele pode estar presente em um sem número de alimentos processados sem ser catalogado como tal. Por exemplo, o glúten pode se esconder sob uma variedade de denominações, incluindo as seguintes:
- Maltes;
- Amidos;
- Proteínas vegetais hidrolisadas (HVP, sigla em inglês) (nt.: ver de onde e como se produz: http://www.engetecno.com.br/port/legislacao/geral_prot_hidrol_vegetal.htm);
- Proteínas vegetais texturizadas (TVP, sigla em inglês) (nt.: http://www.buhlergroup.com/southamerica/pt/solucoes-industriais/alimentos/ingredientes/proteinas-vegetais-texturizadas.htm#.V4oyEaKnzy4);
- Aromatizantes naturais (nt.: http://brasilescola.uol.com.br/quimica/aromatizantes.htm).
(O site celiac.com tem uma longa lista de denominações de ingredientes que em geral contêm o glúten oculto).1
Como o Glúten Pode Danificar Sua Saúde
A palavra “glúten” provêm da palavra latina para pegamento e suas propriedades adesivas são as que mantêm agregados e fofos o pão e o bolo. Como se observa no vídeo, é possível que os fabricantes de pães também adicionem glúten extra com a finalidade de criarem uma textura mais fofa.
Mas estas mesmas propriedades de “aglutinamento” também interferem com a metabolização e absorção de nutrientes, incluindo aqueles de outros ingredientes postos no mesmo alimento. O resultado pode ser comparado a uma massa que causa constipação no intestino, o que pode dificultar uma digestão apropriada.
O glúten sem ser digerido, como consequência, faz com que seu sistema imunológico ataque o revestimento do intestino delgado, podendo causar sintomas como diarreia ou constipação (constipation), náuseas e dor abdominal.
Com o tempo, seu intestino delgado fica danificado e inflama-se cada vez mais. Isso pode ocasionar uma má absorção de nutrientes e deficiências nutricionais, podendo acarretar anemia, osteoporose e outros problemas de saúde.
Além disso essa enfermidade pode gerar uma ampla variedade de outros sintomas que não são de natureza gastrointestinal, incluindo até problemas neurológicos ou psicológicos (psychological problems), relacionados com a pele, o fígado, articulações, sistema nervoso e muitos outros.
A doença celíaca está relacionada à auto imunidade. Se o diagnóstico à ela se dá depois da idade de 20 anos, suas probabilidades de desenvolver uma enfermidade auto imune aumentam numa média de 3,5% a 34%. A doença celíaca não diagnosticada também está relacionada com um risco quase quadruplicado de mortes prematuras.2
O Trigo Foi Alterado Drasticamente
O trigo é um das plantas alimentícias mais semeadas no mundo ocidental. Mas o trigo atual é muito diferente daquele com que nossos antepassados cresceram e se nutriam. Esta é provavelmente parte da explicação do porquê a doença celíaca e a intolerância ao glúten aumentaram quatro vezes mais, desde a década de 50 (nt.: lembrar que a chamada ‘Revolução Verde’ do pós guerra incluía a adequação do trigo, batata andina, arroz e outras culturas à modernização da agricultura com seus agrotóxicos, para cumprir o slogan de ‘acabar com a fome no mundo’ – ver: https://nossofuturoroubado.com.br/o-veneno-esta-na-mesa/).
Alguns creem que um maior número de pessoas percebidas com estes sintomas não é nada mais do que um sinal de melhoria nos diagnósticos. No entanto, a pesquisa traz de que esta elevada prevalência é real e as mudanças drásticas na alimentação desempenham um papel destacado.3
A proporção de proteína do glúten no trigo aumentou enormemente como resultado de sua manipulação e hibridação (nt.: ressalta-se que foi esta manipulação pelo ‘melhoramento genético’ com seus híbridos, a porta de entrada para os transgênicos). Até o século XIX, o trigo usualmente era mesclado a outros grãos, cereais, sementes e frutos secos. Somente nos últimos 200 anos, a farinha pura de trigo foi levada ao moinho para se transformar em farinha branca refinada.
A alimentação resultante de grãos refinados e o alto conteúdo de glúten, que a maioria das pessoas vem consumindo desde a infância, simplesmente não era parte da alimentação das gerações anteriores.
Como o Glúten Desencadeia o Intestino Permeável
De acordo com alguns especialistas entrevistados no vídeo acima, entre eles o Dr. Alessio Fasano, Diretor do Centro de Pesquisa Celíaca em Massachusetts, a humanidade não evoluiu para consumir glúten e por isso não pode digeri-lo corretamente.
A pesquisa sugere que o intestino humano percebe o glúten como um invasor estranho que está contra ele, por isso deve criar uma resposta imunológica. Fasano crê que isso se passa com todas as pessoas.
Sem dúvida que não significa que todas as pessoas devam evitar o glúten. A maioria pode controlá-lo sem consequências clínicas. Outras não têm tanta sorte, particularmente aquelas com transtornos autoimunes, apresentando um risco de terem complicações.
Fazem dezesseis anos que Fasano e sua equipe descobriram que o glúten pode estimular uma molécula em seu intestino chamada zonulina — uma proteína que provoca a abertura das ligações entre as células no revestimento intestinal.
Na realidade, faz com que o intestino se torne mais permeável, permitindo que as partículas dos alimentos entrem na corrente sanguínea, causando inflamações, reações imunes e maior risco de vários transtornos autoimunes. Isso se conhece como síndrome do intestino permeável e não necessariamente tem que estar associada às doença celíaca para sofrer as consequências do intestino permeável.
O Trigo Tratado com o Herbicida Glifosato Promove a Enfermidade Celíaca, Reações Imunológicas e Outras
Ainda que a questão de ser ou não o glúten evitado por todo o mundo, é um tema controverso. Agora está bastante claro que o trigo atual é muito mais perigoso do que o trigo de outros tempos e que causa problemas de saúde a muitas pessoas.
Stephanie Seneff, Ph.D., uma das principais pesquisadoras do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, sigla em inglês), crê que a recente e grande incidência de doença celíaca está relacionada com o uso do glifosato. Seneff, juntamente com Anthony Samsel, Ph.D., publicaram uma pesquisa sobre esta fascinante conexão.4,5
O glifosato (Glyphosate) — um dos herbicidas mais utilizados no mundo e ingrediente ativo principal do produto comercial da Monsanto ‘Roundup‘ — vem demonstrado danificar gravemente a flora intestinal e causar enfermidades crônicas arraigadas na disfunção intestinal. Ele está, de fato, patenteado como um antibiótico.
Em março de 2015, a Agência Internacional para a Pesquisa do Câncer (IARC, sigla em inglês), que representa o braço de pesquisa da Organização Mundial da Saúde (WHO, sigla em inglês), classificou o glifosato como sendo um “possível cancerígeno” (“probable carcinogen”) (Classe 2A). Esta determinação se baseou em “evidência limitada”, ao mostrar que pode causar linfoma não-Hodgkin e câncer pulmonar nos seres humanos, junto com “evidência convincente” de que pode ocasionar câncer em animais.
Especificamente, o uso de glifosato nos cultivos de trigo aumentou paralelamente a uma maior incidência da doença celíaca. De fato, de acordo com Seneff e Samsel, correlaciona-se a um maior grau em comparação ao uso de glifosato em milho e na soja.
É possível que não nos tenhamos apercebido disso, mas faz aproximadamente 15 anos que se tornou popular secar6 com glifosato o trigo não orgânico, no período pouco antes da colheita. Quando o trigo maduro está exposto a um produto químico tóxico como o glifosato, ele libera mais sementes. Isso ocasiona um rendimento ligeiramente maior e esta é a razão porquê da maioria dos produtores de trigo o fazerem.
Mas também significa que a maior parte do trigo não orgânico — e todos os alimentos processados que o contém — está contaminada com glifosato. E agora sabemos que este processo pode ter consequências graves à saúde.
O glifosato não só afeta gravemente às vilosidades no intestino, como também inibe um processo que normalmente ajuda o corpo a digerir as proteínas de trigo. A gliadina do glúten é difícil de decompor e ser digerida. Usualmente produz-se uma reação que cria ligações entre as diferentes proteínas do trigo.
O glifosato parece ligar-se à gliadina como consequência de uma reação química e ao interferir com as ligações das proteínas ele torna o trigo extremamente indigesto — muito mais do que já era — e é mais provável que cause uma reação imunológica e disbiose intestinal (nt.: estado onde há maiores concentrações de bactérias nocivas em detrimento das benéficas no intestino, boca ou no trato gastrointestinal).
Outros Tipos de Intolerância Podem Mimetizar a Sensibilidade ao Glúten
Os pesquisadores também estudaram outros ingredientes no trigo e descobriram que há um sem número de outras proteínas e compostos que podem causar sensibilidade. Assim. se alguém se sentir melhor com uma alimentação livre de glúten, inclusive se eliminou a doença celíaca, poderá ser sensível a alguns outros ingredientes do trigo.
Estão incluídas proteínas como os inibidores de albuminas, globulinas e amilase tripsina, e o fructano dos carboidratos, um tipo de oligo, di, monossacáridos e polióis fermentáveis (FODMAPs, sigla em inglês).7
Os FODMAPs (que também incluem a frutose, lactose, galactanos e polióis) são açúcares que são absorvidos deficientemente no intestino delgado ou totalmente indigeríveis. Podem ocasionar sintomas muito similares aos da sensibilidade ao glúten e os FODMAPs, muitas vezes se encontram nos alimentos que contém glúten.
Apesar dos FODMAPs serem benéficos para a flora intestinal, naquelas pessoas que são sensíveis a eles, como os que padecem a síndrome do intestino irritável (IBS, sigla em inglês), os FODMAPs podem causar um grave mal-estar gastrointestinal.
A dieta Paleo é baixa em FODMAPs, a qual provavelmente é uma das muitas razões porque as pessoas tendem a se sentir melhor quando alteram para este tipo de alimentação.
A Panificação e a Moagem do Trigo – Outros Condenáveis
A parte da contaminação por glifosato, que não se aborda completamente neste vídeo, têm outras duas explicações acerca dos níveis elevados da doença celíaca e da intolerância ao glúten que estão relacionadas de como, na atualidade, se mói e panifica o pão de trigo. A forma com que moemos o trigo mudou significativamente com o advento da moderna elaboração de alimentos.
O endosperma e o amido se mói com rolos, mas todos os demais ingredientes primeiro são extraídos e depois agregados novamente, em diferentes proporções, em função dos requisitos do produto final. Obtém-se uma farinha de trigo altamente refinada que é muito provavelmente a causa de problemas gastrointestinais.
A farinha de grão integral se elabora ao moê-lo inteiro com um moinho de pedra. Nada se tira ou se agrega, o produto final contém o grão em sua totalidade, daí vindo o termo “grão integral”. O processo é muito mais simples e menos prejudicial para o conteúdo nutricional do grão.
Ainda que o pão de grão integral ainda contenha glúten, se não se tem a doença celíaca, é provável que não gere nada tão grave. De fato, alguns creem que os problemas atribuídos ao glúten poderiam estar relacionados ainda mais aos produtos químicos utilizados durante a elaboração da farinha de trigo refinada, que ao glúten.
A “Panificação”, processo no qual se transforma, pelo calor, vários ingredientes em pão, também sofreu mudanças dramáticas. No passado, a farinha se mesclava com água e levedura, para posteriormente, deixado durante a noite, propiciar que a massa aumentasse. Este processo permitia que as enzimas da levedura descompusessem o glúten. O corpo humano carecendo destas enzimas, não pode replicar este processo de transformação.
Na atualidade, os fabricantes de pão já não deixam que a massa ‘descanse e trabalhe’ por 18 horas. Agregando diversos produtos químicos, diminuíram o processo a, aproximadamente, duas horas. Tempo insuficiente para que o glúten possa ser digerido. Por isso, na atualidade, a maioria dos pães contém glúten muito mais indigesto do que o de épocas passadas.
Como Abordar a Intolerância ao Glúten e a Doença Celíaca
O tratamento para a doença celíaca e à intolerância ao glúten é via uma alimentação livre de glúten, o que significa abster-se de qualquer alimento que contenha glúten. Em agosto de 2013, a Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA (FDA, sigla em inglês) emitiu uma deliberação para a rotulagem dos produtos livres de glúten (gluten-free labeling).
De acordo com esta norma, para que um alimento leve este rótulo “livre de glúten” deve ser:
- Naturalmente sem glúten. Os grãos naturalmente livres de glúten incluem o arroz, o milho, quínoa, sorgo, linhaça e sementes de amaranto.
- Qualquer grão que contenha glúten deve ter sido refinado com o fim de eliminar o glúten. É possível que o produto final não contenha mais do que 20 partes por milhão (ppm) de glúten.
Uma análise sanguínea pode verificar se na realidade se tem ou não a doença celíaca. Se se constatar sua existência, ter-se-á que estar muito alerta, já que se expor ao glúten pode adoecê-lo gravemente e, a longo prazo, por em risco saúde e longevidade. Se se for intolerante ao glúten, não se necessita ser tão restritivo com a alimentação, e é possível que finalmente descubra seu próprio nível de tolerância a ele.
Por exemplo, um pedaço de pão pode não causar nenhum incômodo, mas dois, por dois dias seguidos, poderão causar. Geralmente, evitar o glúten durante uma semana ou duas é suficiente para se observar uma melhora significativa.
Ao se considerar os possíveis responsáveis que estão em jogo, aí aparecem: a hibridação feita com o trigo; o glúten ou outras proteínas dele; os fructanos; o processo de moagem ou de assar; e mesmo a contaminação por glifosato. Assim, não é de se estranhar que o trigo (e outros grãos) provoque este tipo de problemas a muitas pessoas.
Em minha experiência de médico, quase todas as pessoas se beneficiam ao evitarem os grãos, incluindo os completamente germinados, e mesmo se existe ou não, intolerância ao glúten. Isso é porque os grãos têm carboidratos puros em alta quantidade. Desta forma, ao evitá-los se ajudará a melhorar a função mitocondrial de todos os consumidores.
Alterar a função mitocondrial pode exacerbar problemas de saúde relacionados com a resistência à insulina, tais como sobrepeso, pressão arterial alta, diabetes tipo 2 (type 2 diabetes) e a problemas mais graves, como como as doenças cardíacas e o câncer.
Fontes e Referências
Tradução livre de Luiz Jacques Saldanha, julho de 2016.