Comunidade de povos originários convivendo harmonicamente com a floresta em pé.
https://www.oneearth.org/reimagining-redd-for-indigenous-led-solutions
Agosto de 2024
[NOTA DO WEBSITE: Infelizmente esta interessante proposta de alteração dos conceitos de como se reconhecer a importância da floresta em pé, que somente poderá ser concretizada pelos povos originários que vêm há séculos e séculos convivendo harmoniosamente com a vida, pode estar chegando tarde. Os abutres que seguem a doutrina da colonialidade, nas ex-colônias, que se funda na ideologia do supremacismo branco eurocêntrico, que se nutre do capitalismo indigno e cruel, já contaminou, através das ditaduras militares em todos os espaços onde os europeus invadiram, os avanços sobre todas as florestas tropicais do planeta. É como se os descendentes dos brancos invasores, de ontem e de hoje, estivessem temerosos pela destruição do atual estágio da humanidade, agora veem que somente os povos originários, com todas as suas visões de mundo, tangível e não-tangível, poderão salvá-los de si mesmos].
A floresta amazônica está se aproximando de um ponto crítico, onde o desmatamento contínuo pode desencadear um colapso irreversível do ecossistema e perturbações climáticas globais significativas.
A REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal) foi concebida como uma solução baseada no mercado para conter o desmatamento e reduzir as emissões de carbono. Embora tenha havido alguns sucessos na entrega de financiamento REDD+ para Povos Indígenas e Comunidades Locais (IPLCs), após mais de 15 anos de implementação, o programa falhou amplamente em atingir seus objetivos e, em alguns casos, causou danos. Com base em uma colaboração de vários anos com líderes indígenas na região da Amazônia, este artigo propõe uma estrutura de justiça climática que centraliza a liderança indígena e a defesa territorial, oferecendo um caminho alternativo para a conservação florestal que aborda as causas raízes do desmatamento e prioriza a equidade.
As deficiências da REDD+
A REDD+ foi projetada para canalizar recursos financeiros de países industrializados para regiões de florestas tropicais, compensando proprietários de terras e governos pela redução do desmatamento. No entanto, a REDD+ tem como alvo pequenos proprietários e comunidades indígenas, muitas vezes restringindo seu acesso a recursos, ignorando as indústrias extrativas e a agricultura em larga escala que impulsionam o desmatamento. Além disso, os projetos REDD+ replicaram padrões coloniais ao minar as estruturas de governança indígena, levando a conflitos, deslocamentos e compensação desigual pelos esforços de proteção florestal. Como resultado, a REDD+ tem sido amplamente criticada por organizações indígenas por não apoiar sua autodeterminação e defesa territorial.
Vista aérea do Rio Amazonas. Crédito da imagem: Vlad Hilitanu via Unsplash
Um Marco de Justiça Climática para a Amazônia
Em resposta às deficiências da REDD+, este artigo descreve doze princípios para uma abordagem mais justa e eficaz para a conservação florestal na Amazônia. Esses princípios oferecem uma estrutura abrangente para reimaginar a REDD+ e outros esforços de mitigação climática para melhor se alinharem com as necessidades e direitos dos Povos Indígenas.
1. Atacar os principais impulsionadores do desmatamento
A ação climática eficaz deve priorizar a prevenção da expansão de indústrias extrativas — como mineração, desenvolvimento de petróleo e agricultura industrial — os principais impulsionadores do desmatamento na Amazônia. Comunidades indígenas devem ser apoiadas para lidar com essas ameaças externas aos seus territórios, em vez de serem responsabilizadas por atividades de uso da terra em pequena escala.
2. Reconhecer e compensar a administração indígena
Os povos indígenas protegem florestas há gerações, mas seus esforços têm sido subvalorizados. Uma abordagem de justiça climática deve reconhecer essa administração de longo prazo e fornecer compensação adequada pelo trabalho de proteção florestal, incluindo reparações por perdas territoriais passadas.
3. Defender os direitos da natureza
Estruturas legais que reconhecem a personalidade e os direitos da natureza — como a constituição do Equador — devem ser integradas aos esforços de conservação florestal. Esses instrumentos se alinham com as visões de mundo indígenas que veem a natureza como uma entidade viva com direitos intrínsecos, e podem ser ferramentas poderosas para defender territórios de atividades extrativas.
4. Priorizar a liderança e a autodeterminação indígenas
Iniciativas lideradas por indígenas devem estar no centro de qualquer estratégia de mitigação das mudanças climáticas. A autodeterminação, que inclui o direito de definir e gerenciar territórios de acordo com os sistemas de governança indígenas, é crítica para garantir que as iniciativas climáticas respeitem os direitos indígenas e promovam a vitalidade territorial de longo prazo.
5. Defender os conhecimentos e as visões de mundo indígenas
Os sistemas de conhecimento e visões de mundo indígenas têm sido essenciais para a manutenção dos ecossistemas florestais. As iniciativas climáticas devem integrar essas perspectivas, indo além das estruturas científicas ocidentais e valorizando as dimensões espiritual, cultural e ecológica das florestas.
6. Promover os direitos e a liderança das mulheres indígenas
As mulheres indígenas detêm conhecimento específico e desempenham papéis cruciais no manejo florestal. Uma abordagem de justiça climática deve garantir que as vozes das mulheres indígenas sejam incluídas em todos os níveis de tomada de decisão e que a equidade de gênero seja um componente central das estratégias de conservação florestal.
7. Garantir a participação indígena na tomada de decisões sobre o clima
Os povos indígenas devem ser reconhecidos como detentores de direitos com um papel legítimo nas negociações climáticas internacionais. Sua participação deve ser apoiada por meio de processos robustos de Consentimento Livre, Prévio e Informado (FPIC) que respeitem os protocolos de governança indígena e as estruturas de tomada de decisão.
8. Fortalecer a posse de terras indígenas e os direitos aos recursos
A posse segura da terra é fundamental para a conservação florestal eficaz. As iniciativas climáticas devem priorizar o reconhecimento e a proteção dos direitos indígenas à terra e aos recursos, garantindo que os direitos de carbono estejam vinculados aos direitos territoriais indígenas.
9. Promover a construção de capacidades conjuntas e a competência técnica indígena
As comunidades indígenas devem ser capacitadas para participar plenamente das iniciativas climáticas, desenvolvendo sua capacidade técnica e, ao mesmo tempo, garantindo que os colaboradores externos sejam treinados em processos de design e gestão liderados por indígenas.
10. Preencher a lacuna do financiamento climático através de financiamento combinado
Lidar com o desmatamento requer significativamente mais recursos financeiros do que os atualmente fornecidos. Uma abordagem de justiça climática deve alavancar modelos de financiamento combinados, incluindo trocas de dívida por natureza, subsídios e parcerias público-privadas, evitando ao mesmo tempo a imposição de encargos de dívida aos países do Sul Global.
11. Incorporar mercados de carbono e desenvolver mecanismos não mercantis
Os mercados de carbono devem ser reformados para entregar resultados equitativos ao refletir o verdadeiro valor das florestas e apoiar a posse de terras indígenas. Ao mesmo tempo, mecanismos não mercantis — como contribuições climáticas que não dependem de compensação — devem ser ampliados para direcionar financiamento para iniciativas lideradas por indígenas.
12. Financiamento direto aos povos indígenas
As comunidades indígenas recebem menos de 1% do financiamento climático global, apesar de seu papel crítico na proteção florestal. As iniciativas climáticas devem garantir que os benefícios financeiros sejam compartilhados equitativamente, com pagamentos diretos aos povos indígenas que apoiam suas metas de desenvolvimento autodeterminadas.
As comunidades indígenas são os administradores mais eficazes da Amazônia. Crédito da imagem: © Mitch Anderson, Amazon Frontlines
Lições dos novos padrões: TFM e HiFor
O surgimento de novas estruturas como o padrão Tropical Forest Metric (TFM) e o padrão HiFor/High Integrity Forest Investment Initiative da WCS/Wildlife Conservation Society destacam o crescente reconhecimento da necessidade de abordagens mais inclusivas e equitativas. O padrão TFM enfatiza a integridade do ecossistema e o bem-estar da comunidade, alinhando-se estreitamente com os princípios da justiça climática. Enquanto isso, o padrão HiFor incorpora salvaguardas sociais rigorosas e garante a participação indígena ativa. Esses padrões demonstram como o financiamento climático e os esforços de conservação podem ser reestruturados para priorizar os resultados ecológicos e a equidade social, oferecendo lições importantes para o futuro da REDD+ e outras iniciativas.
Reiniciando a REDD+ e escalando novos mecanismos de financiamento
Para atingir as metas climáticas globais, a REDD+ deve ser reimaginada dentro de uma estrutura de justiça climática mais ampla. Isso envolve estabelecer preços de carbono mais altos que reflitam o valor real das florestas, desenvolver mecanismos de mercado e não mercado mais equitativos e priorizar a liderança dos povos indígenas na tomada de decisões. Ao incorporar esses princípios em estratégias de conservação florestal, podemos reiniciar os mercados REDD+ enquanto escalamos novos mecanismos financeiros que canalizam recursos diretamente para as comunidades que há muito tempo protegem esses ecossistemas vitais.
O caminho a seguir requer uma mudança fundamental em direção ao reconhecimento dos direitos e liderança indígenas como centrais para uma ação climática eficaz. Ao integrar esses doze princípios tanto na política quanto na prática, podemos avançar em direção a um modelo mais justo e sustentável para a conservação florestal na Amazônia e muito além.
Tradução livre, parcial, de Luiz Jacques Saldanha, setembro de 2024