A Reserva da Biosfera Maia, uma das maravilhas naturais e arqueológicas do mundo, está ameaçada por narcotráfico, tráfico de pessoas, invasões de terras pecuária e desmatamento.
por Danilo Valladares*
Templo das máscaras no complexo arqueológico do Parque Nacional de Tikal, parte da Reserva da Biosfera Maia. Foto: Mike Vondran CC BY 2.0
Cidade da Guatemala, Guatemala, 28 de maio de 2012 (Terramérica).- O ambicioso projeto Cuatro Balam, para manejar e conservar a Reserva da Biosfera Maia no departamento de Petén, no norte da Guatemala, fico congelado após a mudança de governo no país, afirmam ecologistas e organizações sociais. “Parece que o novo governo não quer retomar” o projeto, disse à IPS o ativista Javier Márquez, da organização ambientalista Defensores da Natureza. “Era uma iniciativa muito boa porque se começava a planejar o que fazer com as áreas protegidas do país”, destacou.
Em várias línguas maias “b’alam” significa jaguar. O nome Cuatro Balam se refere a outros tantos personagens centrais do Popol Vuh – recompilação de lendas do povo k’iche – vinculados aos quatro pontos cardeais. Lançado em 2008 pelo então presidente Álvaro Colom, que governou até janeiro deste ano, o projeto pretendia intensificar o ecoturismo na Reserva da Biosfera Maia, uma extensão com mais de 21 mil quilômetros quadrados, que compreende parques naturais e complexos arqueológicos como El Mirador, Tikal, Uaxactún e Piedras Negras. Em 1990, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) declarou essa área reserva da biosfera.
O projeto Cuatro Balam prometia desenvolver atividades de pesquisa e conservação no período 2008-2023, dando um papel ativo às comunidades por meio de investimentos público-privados. O turismo deveria aumentar para 1,5 milhão de visitantes por ano e seriam feitas obras de infraestrutura, como um trem elétrico e silencioso com vista panorâmica que viajaria pela selva à velocidade de 16 quilômetros por hora. Também estava contemplada a criação da Universidade da Biodiversidade, focada no estudo do entorno, na classificação e no registro genético de espécies, e ainda o Centro de Estudos Maias, dedicado à pesquisa sobre o passado desses povos originários.
“Envolveu-se a sociedade civil, os setores privado e comunitário, no fortalecimento do desenvolvimento sustentável com o grande objetivo de garantir o departamento como polo turístico”, explicou Javier. “Havia projetos grandes de infraestrutura que poderiam alterar a biodiversidade da reserva da biosfera, como estradas e grandes hotéis, mas não se concretizaram”, acrescentou.
A Reserva da Biosfera Maia é uma extensa floresta tropical em uma área limítrofe com México e Belize, que abriga milhares de espécies animais e vegetais e inumeráveis sítios arqueológicos de milhares de anos de antiguidade. Lugares como Tikal e o menos explorado El Mirador são grandes cidades, ou conjunto delas, com milhares de edificações, templos e monumentos. Esta joia natural e humana está ameaçada por atividades como narcotráfico, tráfico de pessoas e espécies, invasões de terra, pecuária, incêndios florestais e desmatamento.
No entanto, com a posse em janeiro de Otto Pérez Molina, que governará até 2016, o plano está congelado. O Terramérica não encontrou nenhuma referência a ele no site do Conselho Nacional de Áreas Protegidas, nem conseguiu respostas de fontes governamentais até o fechamento desta edição. “Não houve mais movimento”, lamentou Carlos Kurzel, da não governamental Associação de Comunidades Florestais de Petén, que reúne 23 organizações camponesas e indígenas para o manejo de florestas como meio de subsistência em ecoturismo e outras atividades.
No período anterior houve “muita abertura ao diálogo com as comunidades, e esta foi uma das grandes bondades do Cuatro Balam. Além disso, conseguiu-se aumentar consideravelmente a segurança”, contou Carlos ao Terramérica. Mediante coordenação entre exército, polícia e outras instituições estatais relacionadas com o meio ambiente e a sociedade civil, as autoridades tentaram melhorar a governabilidade em Petén. Um resultado foi a recuperação, em setembro de 2011, de 138 mil hectares de florestas naturais ocupadas ilegalmente, segundo a oficial Agência Guatemalteca de Notícias.
“Também se falou muito do desenvolvimento turístico de El Mirador, da construção de infraestrutura e de promover o turismo, embora nossa participação tenha sido muito cautelosa porque a nós interessa que o desenvolvimento econômico beneficie diretamente as comunidades”, afirmou Carlos. Além do Cuatro Balam, outras iniciativas buscam gerar oportunidades em Petén. O Projeto Mirador tem a finalidade de impulsionar o desenvolvimento turístico nesse complexo arqueológico que data do ano 1000 antes de Cristo, correspondente ao período maia pré-clássico, no ano 250 desta era.
No parque se encontra a pirâmide La Danta, considerada a maior construída pelos maias e a mais volumosa do mundo, com 300 metros de comprimento por 600 metros de largura e altura de 72 metros, ainda coberta em grande parte pela selva. Hilda Morales, coordenadora do projeto, informou ao Terramérica que até agora foram capacitadas 480 pessoas em gestão de qualidade, cultura maia, inglês básico, cozinha e outras habilidades, e também foram redigidos regulamentos para o manejo de concessões florestais e criada a marca Reino Kan.
O projeto é executado desde 2009 pela Fundação para o Desenvolvimento da Guatemala, com financiamento de US$ 1,3 bilhão, 70% entregues pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o restante pelo próprio país. Segundo Hilda, a iniciativa era independente do Cuatro Balam, embora o uso turístico de El Mirador fosse um dos pilares do projeto governamental. “Infelizmente, quando mudam governos, muitas iniciativas são deixadas de lado. A Biosfera Maia é a maior área protegida do país, abrigando uma riqueza inestimável, e os desafios que enfrenta são grandes”, lamentou.
Uma equipe de arqueólogos conduzido pelo norte-americano Richard Hansen e pelo governamental Instituto de Arqueologia e História da Guatemala escavam desde 1987 em El Mirador. Seu trabalho, conhecido como Bacia El Mirador, estuda as origens dinâmicas e o desaparecimento da civilização maia no norte da Guatemala. Cuatro Balam, em consenso com as comunidades, “permitiu harmonizar o investimento público com o investimento internacional para fortalecer a governabilidade e o desenvolvimento econômico na reserva”, afirmou Byron Castellanos, da não governamental Associação Balam. Essas ações “devem continuar e não há necessidade de inventar novas iniciativas”, enfatizou ao Terramérica.
* O autor é correspondente da IPS.