As pistas de pouso ilegais que trazem mineração tóxica para a Terra Indígena do Brasil

Este avião com um número de cauda riscado vem de uma mina de ouro ilegal.

https://www.nytimes.com/interactive/2022/08/02/world/americas/brazil-airstrips-illegal-mining.html

Manuela Andreoni , Blacki Migliozzi , Pablo Robles e Denise Lu; Fotografias de Victor Moriyama

02 De Agosto De 2022

O Times identificou centenas de pistas de pouso que levam operações criminosas de mineração aos cantos mais remotos da Amazônia.

A pista de pouso usada do governo foi apreendida por mineiros. Eles também construíram outras quatro pistas de pouso nas proximidades, todas ilegalmente. Vê-se o alojamento acima à esquerda, o rio Mucajaí, acima à direita, mineradores ilegais na pista e no centro abaixo, a mineração.

Centenas de pistas de pouso (nt.: círculos laranja) foram construídas em terras protegidas no Brasil, secretamente, para alimentarem a indústria de mineração ilegal. Uma investigação do Times descobriu, incluindo 61 neste território indígena Yanomami. O Times identificou mais de 1.200 pistas de pouso não registradas na brasileira – muitas delas parte de redes criminosas que estão destruindo terras indígenas e ameaçando seus povos.

BOA VISTA, Brasil – A 800 metros de altitude, a pista de pouso de terra é apenas uma rachadura em um oceano aparentemente interminável de floresta tropical, cercado por poços de mineração lamacentos que sangram produtos químicos tóxicos no leito do rio.

A pista de pouso é de propriedade do governo brasileiro – a única maneira de as autoridades de saúde chegarem aos indígenas na aldeia vizinha. Mas garimpeiros ilegais a tomaram, usando pequenos aviões para transportarem equipamentos e combustível para áreas onde não existem estradas. E quando um avião que os mineiros não reconhecem se aproxima, eles espalham latas de combustível ao longo da pista de pouso para impossibilitar o pouso.

A pista de pouso agora pertence aos mineiros”, disse Junior Hekurari, um oficial de saúde indígena.

‌Os garimpeiros ‌também construíram outras quatro pistas de pouso nas proximidades, todas ilegalmente, impulsionando uma expansão tão rápida da mineração ilegal nas terras supostamente protegidas do povo Yanomami que o crime cresceu fora de controle e os funcionários do governo estão com muito medo de retornar.

Mineiros ilegais espalham latas de combustível vazias ao longo de uma pista de pouso, impossibilitando o pouso.

Este é apenas um pequeno aglomerado de pistas de pouso clandestinas que empurram a mineração ilegal de ouro e estanho para os cantos mais remotos da floresta amazônica. Esculpidos na paisagem densa e exuberante, eles fazem parte de vastas redes criminosas que operam em grande parte sem controle devido à negligência ou ineficácia das agências reguladoras e de fiscalização no Brasil, incluindo os militares.

O New York Times identificou 1.269 pistas de pouso não registradas em toda a floresta amazônica brasileira no ano passado, muitas das quais abastecem uma próspera indústria ilícita que surgiu sob o presidente Jair Bolsonaro do Brasil (nt.: essa afirmação mostra como até num país que seria aliado do capitalismo está vendo o que esse governo venal vem fazendo ao seu próprio país. E dito por um periódico que não teria nada a ver com a visão ‘comunista‘ que sempre se atribui aos que defendem a integridade do Brasil e dos brasileiros. E vê-se que até no final do parágrafo anterior cita a inoperância dos próprios militares brasileiros que parecem comprometidos com esta ilegalidade).

Bolsonaro tem enfrentado constantes críticas globais por permitir que a Amazônia seja saqueada durante seu governo. Autoridades dizem que a rápida disseminação da mineração ilícita sob sua vigilância pode prejudicar milhões de pessoas cujos meios de subsistência dependem dos rios da Amazônia e acelerar a destruição da maior floresta tropical do mundo.

A Amazônia atua como uma esponja gigante, mantendo dezenas de bilhões de toneladas de dióxido de carbono fora da atmosfera. Mas está sob ataque implacável nos últimos anos – desde a extração de madeira, queimadas extensivas para agricultura, mineração e outras ameaças legais e ilegais.

Pesquisas recentes mostram que as mudanças climáticas e o desmatamento generalizado estão levando a floresta tropical a um ponto de inflexão que pode destruir sua capacidade de se recuperar de tais danos. Isso poderia, em última análise, enviar anos de emissões globais para a atmosfera e tornar mais difícil combater o aquecimento global.

Como funciona uma operação de mineração ilegal típica

Bombas movidas a diesel lançam água na lama para soltá-la. Outras bombas sugam a lama do leito do rio, para que ela possa ser separada do ouro. Aeronaves pousam em uma pista ilegal com combustível, alimentos, suprimentos e trabalhadores. Pequenos veículos off-road — transportados em partes — transportam suprimentos para o acampamento de mineração.

MINA DO LEITO DO RIO

Desde que assumiu o cargo em 2019, Bolsonaro defendeu indústrias que impulsionam a destruição da floresta tropical, levando a níveis recordes de desmatamento. Ele afrouxou as regulamentações para expandir a extração de madeira e a mineração na Amazônia e reduziu as proteções. Ele também cortou fundos federais e pessoal, enfraquecendo as agências que fazem cumprir as leis indígenas e ambientais.

O Sr. Bolsonaro há muito apoia a legalização da mineração em terras indígenas. Ele até visitou uma mina de ouro ilegal no que deveria ser território protegido, sinalizando publicamente seu apoio a atividades ilícitas na Amazônia brasileira (nt.: novamente mostra ao mundo que tipo de governante é esse que não só apoia como prestigia com seu cargo, esses atos ilegais., Como viver, no futuro, com essa ação ilegal?).

“Não é justo criminalizar garimpeiros selvagens”, disse Bolsonaro a apoiadores do lado de fora de sua casa em Brasília, a capital, no ano passado.

Somente nas terras Yanomami – cerca de 97.000 quilômetros quadrados ou aproximadamente o tamanho de Portugal – as autoridades policiais estimam que 30.000 mineiros estão trabalhando ilegalmente em território protegido pelo governo. No entanto, há pouca fiscalização. Nos últimos anos, seus números aumentaram, causando confrontos mortais, deslocamento de comunidades indígenas, rápido desmatamento e destruição de terras e rios, com níveis impressionantes de mercúrio tóxico agora encontrados na água (nt.: para quem não sabe, basta lembrar a tragédia de Minamata no Japão para se entender o essa ilegalidade está legando para o presente e o futuro do Brasil).

A mineração ilegal em terras Yanomami perto da fronteira do Brasil com a Venezuela é uma janela para o que está acontecendo na floresta amazônica, que cobre cerca de 60% do país.

Indígena da aldeia Boqueirão navegando pelo Rio Uraricoera, que está contaminado por mercúrio de mineração ilegal.

Muitas das 1.269 pistas de pouso não registradas identificadas pelo The New York Times permitiram que as aeronaves pousassem em áreas ricas em ouro e minério de estanho que de outra forma seriam quase impossíveis de alcançar por causa da densa floresta tropical e do terreno montanhoso. Embora o papel do tráfego aéreo na mineração ilegal tenha sido bem documentado, o The Times examinou milhares de imagens de satélite que datam de 2016 para verificar cada pista de pouso e compilar a imagem mais abrangente até agora da escala da indústria ilegal.

A análise do Times descobriu que pelo menos 362 – mais de um quarto – das pistas de pouso estão dentro de 2o quilômetros de áreas de mineração descontroladas, uma forma de mineração que depende fortemente de mercúrio altamente tóxico. Cerca de 60% dessas pistas de pouso estão em terras indígenas e protegidas, onde qualquer forma de mineração é proibida.

As centenas de outras pistas de pouso identificadas pelo The Times muitas vezes apoiam operações de mineração ilegais de grandes distâncias, ou são usadas por traficantes de drogas ou por agricultores para espalhar agrotóxicos. Além disso, os mineradores também usam ilegalmente ou apreenderam dezenas de pistas de pouso do governo nas quais as autoridades dependem para acessar comunidades remotas.

“Nossa percepção é que sem aviões não haveria mineração na terra Yanomami”, disse Matheus Bueno, procurador federal de Boa Vista, capital do estado de Roraima, onde fica parte da terra Yanomami.

De 2010 a 2020, a mineração ilegal em terras indígenas cresceu quase 500% e em terras de conservação em 300%, de acordo com uma análise do Mapbiomas, um coletivo de organizações sem fins lucrativos e instituições acadêmicas com sede no Brasil.

Como documentamos pistas de pouso ilegais

Os repórteres do Times coletaram as possíveis localizações de pistas de pouso ilegais colaborando com a Rainforest Investigations Network, um projeto de reportagem estabelecido pelo Pulitzer Center, uma organização sem fins lucrativos com sede em Washington, e com Hyury Potter, repórter do The Intercept Brasil e bolsista do Pulitzer. Outros foram coletados de bancos de dados crowdsourced (nt.: tradução livre: contribuição colaborativa), imagens de satélite e analistas geoespaciais.

Para confirmar esses locais e conectá-los à mineração ilícita, os repórteres do Times construíram uma ferramenta para ajudar a analisar milhares de imagens de satélite. Eles examinaram imagens históricas de satélite para determinar que 1.269 pistas de pouso não registradas ainda apareceram em uso ativo no ano passado. Eles documentaram sinais reveladores de mineração nas proximidades, como áreas de floresta tropical e piscinas que os mineradores usam para separar a sujeira do minério. E determinaram que centenas de pistas de pouso em áreas de mineração estão dentro de terras indígenas e protegidas, onde qualquer forma de mineração é contra a lei.

Os repórteres do Times e o Sr. Potter compartilharam análises de dados e documentos sobre investigações governamentais sobre mineração ilegal, e The TimesThe Intercept Brasil estão publicando simultaneamente artigos baseados nesta análise. As fontes para as possíveis localizações de pistas de pouso ilegais incluem Open Street Maps, um banco de dados geográfico de contribuição colaborativa; Earthrise Media, uma organização sem fins lucrativos especializada em análise geoespacial; Instituto Socioambiental, uma organização ambiental sem fins lucrativos; e Hutukara, uma organização sem fins lucrativos Yanomami que relatou dezenas de pistas de pouso que apoiam a mineração ilegal em suas terras.

Para o povo Yanomami, os efeitos do garimpo ilegal já foram devastadores.

Com uma população de quase 40.000 habitantes, os Yanomami, cujas terras atravessam o Brasil e a Venezuela, são o maior grupo indígena que vive em relativo isolamento na Amazônia. Um estudo recente da Hutukara, uma organização sem fins lucrativos Yanomami, estimou que mais da metade das pessoas que vivem no território Yanomami brasileiro foram prejudicadas pela mineração ilegal.

As consequências, de acordo com o relatório, incluem desnutrição por causa de colheitas destruídas ou abandonadas, e malária espalhada pela proliferação de mosquitos em minas a céu aberto e áreas desmatadas.

As operações também dividiram os grupos indígenas porque alguns trabalham com os garimpeiros, enquanto outros se opõem a eles. No início deste ano, uma briga eclodiu entre dois grupos, deixando dois homens mortos e outros cinco feridos.

Mas o que mais alarma as autoridades de saúde é o mercúrio usado para separar o pó de ouro da lama do leito do rio, que está envenenando a água e os peixes dos quais a comunidade depende (nt.: sempre lembrando Minamata com sua icônica imagem da Madona Japonesa).

O envenenamento por mercúrio pode prejudicar o desenvolvimento das crianças e atacar o sistema nervoso central, causando uma série de problemas de saúde, desde perda de visão até doenças cardiovasculares, de acordo com um relatório da Fiocruz, um instituto de pesquisa em saúde pública.

Uma análise recente do governo da água coletada de quatro rios Yanomami encontrou níveis de mercúrio 8.600% mais altos do que o que é considerado seguro para consumo humano (nt.: destaque em negrito dado pela tradução).

“A destruição em algumas comunidades é total”, disse Hekurari. “A mineração está em todos os lugares.”

Por décadas, dezenas de indígenas vivem nesta área protegida do território Yanomami. Nesta foto de fevereiro de 2019, suas casas comunais são visíveis, espalhadas perto de grandes áreas desmatadas.

Uma análise das rotas de voo obtidas pelo The Times mostra o tráfego aéreo ilegal aproveitando essas pistas clandestinas para entregar suprimentos de mineração. A maioria dos voos decola de Boa Vista.

Mais um voo que naves que ilegalmente transportam ouro de garimpo ilegal, podendo se ver a cratera e a devastação causada pela violência ilegal do garimpo prestigiado pelo governo federal e negligenciado pelas Forças Armadas do Brasil.

Importantíssimo ver-se esse GIF no último material acima para se ter noção do que vem acontecendo nos últimos três anos com o povo Yanomami. Pode-se ver que existem dentro de um raio de oito quilômetros três outras pistas de pouso ilegais, mostrada uma foto recente.

As fotos acima, sem terem o trabalho de identificação que aparece no GIF, feito pelo The Times, demonstra o quanto, mesmo nessa distância de satélite, o estrago e a agressão perpetrado pelo garimpo ilegal (nt.: temos que reconhecer que está sendo ‘legalizado’ pelo governo federal. O que é ilegal não é crime?).

Conforme vai-se observando no GIF e nas fotos sem identificações, o que vai ocorrendo nos últimos três anos, está descrito abaixo:

Por décadas, dezenas de indígenas vivem nesta área protegida do território Yanomami. Na foto do GIF de fevereiro de 2019, suas casas comunais são visíveis, espalhadas perto de grandes áreas desmatadas.

Menos de dois anos depois, uma pista de pouso ilegal é vista esculpida na floresta perto dessas casas indígenas.

No ano seguinte, a atividade de mineração começa a se desenvolver perto daquela pista de pouso.

Agora, vários poços de mineração cercam a pista de pouso e as casas indígenas vizinhas. Centenas de garimpeiros estão trabalhando nas minas, alimentando o conflito entre as comunidades Yanomami.

Uma análise deas rotas de voo obtidas pelo The Times mostram o tráfego aéreo ilegal aproveitando essas pistas de pouso clandestinas para entregar suprimentos de mineração. A maioria dos voos decola de Boa Vista.

As minas Wildcat (nt.: as minas também tratadas pelo presidente da república como ‘selvagem’) normalmente começam com um único homem caminhando pela floresta, carregando apenas uma pá, uma enxada, uma tigela de extração de ouro e um dispositivo GPS.

Os mineiros muitas vezes vêm de comunidades empobrecidas, procurando ganhar mais do que um salário mínimo. Seus chefes fazem parte de empresas criminosas fragmentadas (nt.: será que políticos como senadores da república, não pertenceriam a essas empresas?), mas politicamente poderosas, que capitalizaram nos últimos anos o mercado de trabalho barato e o aumento do preço do ouro e do estanho.

Uma vez que um lucrativo local de mineração é identificado, mais mineiros chegam carregando suprimentos para esculpir uma mina rudimentar. Bombas movidas a diesel lançam poderosos jatos de água na lama para soltá-la, enquanto outras bombas extraem a lama do leito do rio, criando enormes crateras que interrompem o fluxo dos rios. O mercúrio é então misturado com a lama extraída para separar as partículas de ouro. Traços de mercúrio permanecem na lama descartada e também evaporam no ar durante o processo de fundição.

As pistas de pouso são então construídas em áreas ricas o suficiente em minerais para suportar cadeias de suprimentos aéreas caras.

“É assim que eles ganham escala”, disse Gustavo Geiser, especialista forense da Polícia Federal brasileira que trabalhou em vários casos de mineração ilegal.

As minas Wildcat são fortemente dependentes do mercúrio, que é usado para separar o pó de ouro da lama dos leitos dos rios. Descartado nos rios, o elemento está envenenando a água e os peixes.

O ouro é então vendido a compradores, alguns deles sem licença, que o transferem para fundições no Brasil e no exterior para refinamento. Em seguida, muitas vezes acaba em bancos ao redor do mundo e em produtos, como telefones e joias.

A mineração selvagem pode ser legal, mas grande parte dela é realizada sem as licenças ambientais exigidas ou em áreas protegidas onde é proibida.

Como parte de uma ampla investigação no ano passado sobre mineração ilegal em terras Yanomami, o IBAMA e a Polícia Federal apreenderam dezenas de aviões e helicópteros e revelaram o funcionamento interno da logística que apoia essas operações.

A única distribuidora de combustível de aviação no estado de Roraima foi multada por vender para compradores não cadastrados que administravam postos de gasolina improvisados ​​e ainda está sob investigação criminal. O combustível era então transportado para pistas de pouso onde aviões e helicópteros estavam escondidos em clareiras nas florestas próximas.

Em maio, o The Times usou um drone para observar uma das pistas de pouso encontradas pelos agentes e viu dois aviões sendo carregados com carga desconhecida e várias caminhonetes com latas de combustível viajando em direção a ela – um exemplo de como as agências de fiscalização têm lutado para fechar efetivamente essas operações.

Modificações comuns de aeronaves

Nota: O desenho é um esquema de um modelo de avião típico usado para operações de mineração.

Os assentos são removidos para dar espaço para combustível e suprimentos.

Os números da cauda são frequentemente riscados ou modificados.

Tanque de combustível, onde alguns aviões usam gasolina quando o combustível de aviação não está disponível.

GPS

Os transponders são desligados para evitar a detecção e o equipamento GPS portátil é usado.

A recente expansão da mineração ilegal em todo o Brasil não é inédita: a corrida do ouro na década de 1980 criou uma crise muito parecida com a que existe hoje.

Em meio à pressão internacional, o governo sufocou a maior parte da mineração ilegal explodindo dezenas de pistas de pouso, prendendo e extraditando mineiros e fechando o espaço aéreo sobre as terras Yanomami por meses a fio, segundo reportagens da imprensa.

Muitos agentes da lei dizem que uma estratégia semelhante deve ser implantada para combater efetivamente a mineração ilegal de hoje. Mas sob Bolsonaro, as políticas de proteção foram enfraquecidas por um governo que os críticos dizem ter priorizado o desenvolvimento econômico não regulamentado sobre questões ambientais e indígenas.

Aeronaves que abastecem e apoiam a mineração ilegal na Amazônia fazem voos em baixa altitude para não serem detectadas por sistemas de radar, como este operado pelos militares brasileiros em Boa Vista.

Em 2018, Bolsonaro, um capitão aposentado do Exército, fez uma campanha eleitoral de extrema-direita para a presidência. Ele prometeu fortalecer o setor de agronegócio do país afrouxando as proteções ambientais, principalmente na Amazônia.

Mas enfrentando pressão internacional logo após assumir o cargo, ele encarregou os militares de coordenarem os esforços para proteger a Amazônia contra crimes ambientais, além de seu mandato de monitorar a fronteira e o espaço aéreo.

Todos os anos, os militares fazem prisões e confiscam armas, equipamentos de mineração e aviões. Ainda assim, promotores e policiais dizem que pouco fez para lidar com o aumento do tráfego aéreo ilegal.

Na terra Yanomami, o exército tem três bases de monitoramento da atividade fronteiriça, uma das quais às vezes é usada para combater o garimpo ilegal. O Times identificou pelo menos 35 pistas de pouso não registradas, provavelmente usadas por mineradores, em um raio de 80 quilômetros dessa base.

“O exército reconhece que a integridade da fronteira se apresenta como um desafio para o Estado brasileiro, em particular para as forças de segurança”, disse o exército do Brasil ao The Times por e-mail, acrescentando que o país compartilha mais de 16.000 quilômetros de fronteira com 10 países.

O plano de proteção de fronteiras do exército, disse, tem o “objetivo de reduzir os crimes transfronteiriços e ambientais, bem como a atividade do crime organizado”.

A Força Aérea Brasileira não respondeu a vários pedidos de comentários.

Avião usado por garimpeiros sobrevoando um garimpo ilegal de ouro dentro do território indígena Yanomami.

Investigar atividades ilegais em terras indígenas e reservas federais recai sobre a Polícia Federal brasileira, mas ela não tem recursos para coibir a atividade de mineração ilegal, segundo funcionários que falaram sob condição de anonimato por medo de retaliação.

A força tem um único helicóptero de transporte para todo o país. Os militares muitas vezes se recusam a apoiar as operações de contramina, a menos que agências com orçamentos muito menores paguem grandes somas para usarem suas aeronaves, segundo oficiais da polícia.

Investigações da polícia federal, agentes ambientais e promotores pintam um quadro de caos no espaço aéreo da Amazônia. Aviões e helicópteros com licenças revogadas voam implacáveis ​​para minas ilegais com seus transponders desligados, frequentemente cruzando a fronteira dentro e fora da Venezuela.

No ano passado, promotores federais alertaram um tribunal que um avião comercial que transportava centenas de passageiros quase atingiu um helicóptero que voava ilegalmente perto de um aeroporto internacional. Avisos semelhantes foram transmitidos aos militares, de acordo com um relatório do governo.

Aeronaves apreendidas pela polícia que serviam para garimpo ilegal em território Yanomami.

Mesmo quando os militares ou policiais fecham uma pista de pouso ilegal, as operações de mineração acabam sendo retomadas.

O comissário Paulo Teixeira, que supervisiona as investigações da Polícia Federal sobre crimes contra comunidades indígenas, disse que a polícia tinha pouco conhecimento de como os militares monitoram o tráfego aéreo ilegal.

As ações para controlar o espaço aéreo tornariam as coisas mais fáceis para nós”, disse ele.

Uma complicação potencial para as agências de fiscalização é uma nova lei que recentemente eliminou a exigência de autorização do governo antes que as pistas de pouso fossem construídas em terras desprotegidas. Eles ainda precisam ser registrados para operarem, mas os críticos dizem que a lei enfraquece ainda mais a aplicação do governo porque os inspetores não podem mais emitir multas simplesmente por sua existência; eles devem agora provar que as pistas de pouso não registradas estão sendo usadas.

Juliano Noman, chefe da Anac, agência de aviação civil do Brasil, encarregada de monitorar atividades ilegais de pistas de pouso, disse que a remoção da exigência agilizou o processo de registro e não alimentou mais atividades criminosas. Uma seção de terra limpa não pode ser confirmada como uma pista de pouso, a menos que o tráfego aéreo seja detectado, disse ele.

Sua agência, disse ele, ainda está impedindo com sucesso o tráfego aéreo ilegal.

“Não há nada na aviação que torne a mineração ilegal mais fácil ou escalável”, disse ele, acrescentando que os criminosos sempre encontrarão maneiras de transportar seus produtos, uma realidade que não é responsabilidade de sua agência combater.

Rodrigo Martins de Mello (nt.: paranaense, candidato a deputado federal e investigado pela polícia federal) participando de protesto realizado por garimpeiros em Boa Vista. Eles estão defendendo menos restrições ao seu trabalho.

Rodrigo Martins de Mello estava envolto em uma bandeira brasileira enquanto falava com algumas centenas de mineiros e seus apoiadores em cima de um caminhão de som em maio. Eles estavam em Boa Vista para protestar contra um grupo de senadores que veio à cidade para investigar abusos de direitos humanos ligados ao garimpo ilegal.

“O mais importante é se livrar da opressão do mineiro selvagem”, disse de Mello. “Estamos aqui buscando nossa liberdade, nossa tranquilidade para trabalhar.”

Piloto e empresário da aviação, o Sr. de Mello representa o crescente apoio à mineração selvagem em alguns cantos empobrecidos da Amazônia – e o impulso para expandir ainda mais as áreas protegidas.

Com participações em vários projetos legais de mineração, ele faz parte de uma poderosa rede de empresários capacitados por regulamentos enfraquecidos sob o governo Bolsonaro para desenvolver mineração, extração de madeira e outras indústrias na floresta tropical.

Ao mesmo tempo, ele também está sendo investigado por promotores federais por seu envolvimento em mineração ilegal.

Seis dos helicópteros do Sr. de Mello foram apreendidos como parte da Polícia Federal e da investigação de 2021 do IBAMA, que investigou seu papel na supervisão da logística de mineração ilícita em terras Yanomami.

Um tribunal rejeitou vários pedidos da Polícia Federal para ordenar a prisão do Sr. de Mello, que nega qualquer irregularidade. O caso contra ele está selado e nenhuma acusação foi tornada pública.

Com uma eleição nacional em outubro, de Mello se juntou ao partido político de Bolsonaro e lançou sua própria campanha no Congresso para representar os mineiros. Ele também é coordenador de um movimento no estado de Roraima para afrouxar as regulamentações sobre a mineração selvagem.

O Sr. de Mello disse que seu principal projeto é construir cooperativas de mineração em todo o estado para que os mineiros possam trabalhar legalmente e ajudar a economia local a crescer. “Eles acreditam em mim porque acham que posso viabilizar economicamente essas cooperativas”, disse.

Mas ele também apoia políticas que beneficiariam os mineradores ilegais, incluindo proibir a aplicação da lei de destruir equipamentos ligados a crimes ambientais.

Sua agenda rapidamente o tornou um líder em um estado onde os mineiros são uma grande força política. Críticos dizem que Mello está promovendo políticas que corroeriam ainda mais as proteções que já são mal aplicadas.

Sentada no recente protesto do Sr. de Mello, Christina Rocha lembrou-se do marido, Antônio José, que morreu no ano anterior quando o avião que o transportava para uma mina ilegal caiu. Seu corpo foi encontrado oito meses depois.

“Há tantos acidentes”, disse ela. “Se fosse legal, as pessoas não teriam que correr tanto risco.”

Os destroços de um avião acidentado usado por garimpeiros que operam ilegalmente na Terra Indígena Yanomami.

De volta às terras Yanomami, a comunidade indígena local vê o crescente poder político dos garimpeiros selvagens como um grande golpe. Hoje, a mineração ilegal transformou parte de um rio crucial em uma cratera de lama.

“A água é como areia”, disse Hércules Yanomami, um líder indígena local, em entrevista por telefone. “Só nos resta um pequeno riacho.”

O Sr. Hekurari, o oficial de saúde, diz que continuará denunciando e denunciando quaisquer crimes em sua comunidade na esperança de que o governo os investigue.

Ele luta contra a mineração desde criança, vendo seu avô e outros membros da família expulsarem o maior número possível de mineiros.

“Meu avô me ensinou, nunca fuja”, disse ele. “Você só estará ajudando seus inimigos.”

Pista de pouso ilegal em território indígena Yanomami.

André Spigariol contribuiu com reportagem de Brasília, Brasil, e Emily Costa de Boa Vista, Brasil.

Tradução livre, parcial, de Luiz Jacques Saldanha, setembro de 2022.