Uma árvore solitária interrompe o infinito padrão de linhas formado pelos brotos de soja, em Nova Mutum, no Mato Grosso. Ali não há mais lugar para a floresta. (© Bruno Kelly / Greenpeace)
12 de dezembro de 2024
[NOTA DO WEBSITE: Parece mentira que a ganância e a estupidez de certos ‘brasileiros’ efetivos, ou seja, aqueles que o apodo dado aos portugueses que ‘faziam o pau-brasil’, como marceneiros e padeiros, é absolutamente adequado e justo. Seguindo a doutrina da colonialidade, permanecem roubando o patrimônio que vai além do Brasil e da América do Sul, para ser do planeta, continuam no seu afã de cumprirem seu malfado destino: devastar e destruir tudo para alguns somente. E esse é o caso].
Acordo que ajudou a reduzir o desmatamento na Amazônia vem sofrendo ataques coordenados, com propostas legislativas para prejudicar quem age pela natureza.
Vivemos uma crise climática que já tem afetado vidas no mundo todo, e a perda de biodiversidade segue em um ritmo tão acelerado, que cientistas já falam de uma 6º extinção em massa. Em um cenário tão brutal, espera-se que todos os setores políticos, econômicos e sociais estejam preocupados em colocar ações em prática para frear o fim do mundo como conhecemos. Mas não é o que se passa na cabeça dos ruralistas brasileiros, que iniciaram ataques vorazes para implodir o mais bem sucedido acordo de mercado para evitar o desmatamento em cadeia produtiva, a Moratória da Soja. O que pode colocar o Brasil, e todo o mundo, à caminho do precipício.
O setor mais retrógrado do agronegócio brasileiro tem advogado pelo fim da Moratória, defendendo que quem faz mais do que exigido pelo Código Florestal para proteger o meio ambiente deve ser prejudicado, deixando de receber incentivos fiscais direcionados ao setor. O que, na prática, significa premiar quem destrói a Amazônia. É o maior ataque ao acordo em seus 18 anos de existência.
Movimentações na Câmara dos Deputados e nas Assembleias legislativas dos estados vêm promovendo projetos de lei para penalizar os produtores que participam da moratória. Mato Grosso e Rondônia já aprovaram leis nesse sentido (Lei 12709-MT e Lei 5837-RO) e existem projetos semelhantes em outros estados, como o PL 1041 GO e o PL 419-PA, bem como um Projeto de Lei no Congresso Nacional (PL 3927).
“A aprovação desses projetos de leis pelas assembleias legislativas e executivo estaduais, com o objetivo de desconstruir esse instrumento fundamental para a redução do desmatamento, é uma manifesta falta de comprometimento com a crise climática”, afirma Alice Thuault, Diretora Executiva do Instituto Centro de Vida (ICV).
Para denunciar este grave ataque ao acordo e à natureza em si, mais de 70 organizações da sociedade civil já assinaram o Manifesto em Defesa da Moratória, (atualização em 20/12 e versão inglês aqui), já que seu fim representa uma grave ameaça às metas climáticas do Brasil e à biodiversidade. É um sinal verde para destruir a floresta, com o restabelecimento do incentivo ao desmatamento. Cenário que pode ser visto atualmente em biomas como o Cerrado brasileiro e o Gran Chaco sul-americano, que não são alcançados pelo acordo e enfrentam um processo de desmatamento acelerado por causa da rápida expansão das plantações de soja.
“Tais iniciativas visam a retirada de incentivos fiscais para empresas que adotem critérios de compra adicionais ao Código Florestal, alinhados com exigências de mercado. Isso significa penalizar empresas comprometidas com o fim do desmatamento, promovendo a continuidade da expansão do agronegócio sobre áreas de floresta Amazônica, criar subsídios ao desmatamento, e discriminar a concessão de incentivos fiscais com base em compromisso ambiental das empresas. Logo, quem tem mais ambição na proteção ambiental perde o incentivo”, detalha o Manifesto.
Além disso, o próprio mercado da soja sairá prejudicado, já que isso aumenta os riscos reputacionais para as empresas, que terão menos evidências e robustez para se defenderem de acusações de compra de áreas recém desmatadas, e para a produção agrícola brasileira como um todo.
“Há pouco tempo nossa preocupação ambiental aqui no Acre era com o desmatamento para transformar a floresta em pasto de boi, mas nos últimos anos a soja vem dominando a paisagem. Isso não pode continuar acontecendo, o poder público não consegue combater esses problemas de forma estrutural e o único instrumento que se tem para tratar essa situação com cuidado e atenção é a Moratória da Soja, mas as forças do agronegócio estão num esforço de destruir esse mecanismo e não podemos permitir de jeito nenhum que isso aconteça, aí sim, o fim da Amazônia estará decretado de vez”, afirma Angela Mendes, Presidente Executiva do Comitê Chico Mendes.
“Existe uma forte pressão vinda das alas mais retrógradas do agronegócio para eliminar toda e qualquer restrição à agricultura predatória. A Moratória da Soja é a bola da vez e o ataque não vai cessar. Demandamos que as empresas participantes não se curvem a essas pressões e joguem fora 18 anos de resultados da Moratória que elas ajudaram a construir”, defende Cristiane Mazzetti, coordenadora da frente de Florestas do Greenpeace Brasil.
Moratória da Soja: 18 anos de sucesso em conter o desmatamento na Amazônia
Em 2004/2005, a situação na Amazônia brasileira era alarmante, com a segunda maior taxa de desmatamento anual já registrada. Embora a principal inimiga da floresta fosse a pecuária – o que segue sendo uma realidade – a abertura de uma nova fronteira para a soja em locais como Santarém e Belterra, distantes do tradicional “arco do desmatamento” que devastou Rondônia, Mato Grosso e regiões do sul e leste do Pará, havia acendido o sinal vermelho. Precisava ser contida antes que fosse tarde demais.
Em abril de 2006, o Greenpeace lançou o relatório “Eating up the Amazon”, que mostrava o quanto a cadeia da soja amazônica estava contaminada pelo desmatamento. Após muitas rodadas de negociações, nascia a Moratória da Soja, fruto de uma campanha bem-sucedida e da pressão exercida por consumidores ao redor do mundo.
O que era visto como uma “afronta” para o mercado acabou se tornando um grande trunfo comercial ao longo dos anos. Afinal, produzir soja livre de desmatamento abriu as portas de mais mercados para o produto brasileiro em tempos de reflexões sobre a origem do produto, consumo sustentável e emergência climática.
Antes da moratória, o desmatamento e a devastação absoluta eram os caminhos definitivos para a Floresta Amazônica!
A demonstração de que o desmatamento e a devastação são crimes contra a humanidade e todos os seres vivos planetários.
A violência e a raiva dos ‘ogronegocistas’ e ‘agronecrotas’
Ativistas do Greenpeace UK protestam em frente à loja do McDonald’s em Londres, em 2006. (© Jiri Rezac/Greenpeace)
Ao longo desses 18 anos, a Moratória da Soja se tornou mundialmente reconhecida como um instrumento importante para reduzir o avanço do desmatamento na Amazônia e propiciar melhores condições de mercado para a exportação da soja brasileira frente às exigências dos mercados consumidores.
Enquanto os municípios monitorados pela Moratória tiveram uma redução de 69% no desmatamento (entre 2009 e 2022), a área plantada de soja no bioma Amazônia cresceu 344%.
Desse crescimento, 95,6% ocorreu em áreas já desmatadas/abertas antes de 2008, principalmente para pastagens. Neste mesmo período, o Brasil se tornou o maior produtor de soja no mundo, sendo responsável por mais de um terço do grão produzido globalmente. O que prova que é possível expandir a produção, fazendo melhor uso na terra agricultável, sem precisar grilar terras, desmatar, queimar e destruir a biodiversidade.
Para Mauricio Voivodic, diretor-executivo do WWF-Brasil, a Moratória da Soja tem se provado uma iniciativa muito bem-sucedida, pois não impediu a expansão da soja no bioma, mas sim o desmatamento provocado por sua expansão, consolidando-se como uma ferramenta fundamental para combater as mudanças climáticas.
“A preservação da Amazônia deveria estar no topo das prioridades dos produtores rurais, que já sentem os efeitos da mudança do clima e da alteração no regime de chuvas que o desmatamento do bioma já provoca. A ciência já provou a importância da Amazônia para o clima mundial e para o regime de chuvas no centro-sul da América do Sul, do qual dependem a segurança elétrica e hídrica das milhões de pessoas que vivem na região. Nesse sentido, Embora firmado há quase duas décadas, é um acerto multissetorial em linha com acordos globais de clima, biodiversidade e até comerciais, como o recente pacto entre a União Europeia e o Mercosul, que prevê salvaguardas ambientais”, afirma Maurício.
Por todos esses motivos, os signatários do Manifesto em Defesa da Moratória defendem ações contundentes do setor público e do setor privado que levem à rápida e necessária redução do desmatamento. Demandamos que as empresas ligadas à cadeia da soja mantenham o compromisso com o desmatamento zero e a participação na Moratória da Soja.
Qualquer tentativa de flexibilização da Moratória para atender a essas novas legislações e a sanha por destruição e lucro de ruralistas, representa um retrocesso inaceitável, limitando significativamente a capacidade de se evitar a comercialização de produtos associados à destruição da Amazônia. É fundamental que este mecanismo, que já demonstrou resultados ambientais importantes, continue fazendo o seu trabalho.