A Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina (ALESC) deve votar até o final da sessão desta quarta-feira novas alterações ao Código Ambiental. Joares Ponticelli (PP), presidente da Casa, informou a um jornal local que as alterações visam à adequação da lei às mudanças aprovadas no Código Florestal em 2012 (Lei 12.651).
por Fernanda B. Müller, do CarbonoBrasil
Ocupação em área de Restinga, Praia do Santinho (Florianópolis, SC). Foto: Fabricio Basilio
Após forte polêmica causada em 2009 com a aprovação de alterações que vieram a ecoar na lei federal, Santa Catarina novamente transforma a sua legislação ambiental de forma controversa
Porém, o Projeto de Lei 305/2013, de autoria de Romildo Titon (PMDB) e outros parlamentares, vai muito mais longe do que apenas abraçar a legislação federal. Um dos pontos que mais preocupam são as mudanças pretendidas para áreas urbanas.
Titon alega que a legislação federal não deixou claras as regras para construções consolidadas em áreas de preservação permanente (APPs) em zonas urbanas.
O PL, de modo bastante abrangente, conceitua como área urbana consolidada: “parcela da área urbana com malha viária implantada e que tenha, no mínimo, 2 (dois) dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana implantados: a) drenagem de águas pluviais urbanas; b) esgotamento sanitário; c) abastecimento de água potável; d) distribuição de energia elétrica; ou e) limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos”.
O texto também “inovou” ao trazer em seu Artigo 124-A que “os municípios poderão, através do Plano Diretor ou de legislação específica, delimitar as áreas urbanas consolidadas em seus respectivos territórios, disciplinando os requisitos para o uso e ocupação do solo em tais locais que não atendam aos parâmetros de Área de Preservação Permanente a serem observados em tais locais”.
Na prática, as alterações propostas possibilitam que os municípios deixem de observar os limites e parâmetros assegurados pelo Código Florestal nas áreas urbanas.
“Serve de grave alerta para o que se pretende alterar em nível federal, que certamente será o próximo passo. Se não denunciarmos a irresponsabilidade que pretendem de conferir aos municípios o poder discricionário de estabelecerem limites e parâmetros para uso e definição de APP, o próximo passo será o uso e ocupação até mesmo em áreas de risco”, denunciou Fernando Coelho Correia, advogado ambientalista catarinense.
Outro artigo preocupante é o nº 118-A, que possibilita que “em áreas de inclinação entre 25° e 45°, serão permitidos o manejo florestal sustentável e o exercício de atividades agrossilvipastoris, bem como a manutenção da infraestrutura física associada ao desenvolvimento das atividades, observadas boas práticas agronômicas, sendo vedada a conversão de novas áreas, excetuadas as hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto”.
Sabendo que o estado é notório pelos episódios de desastres ambientais em regiões montanhosas, este artigo pode se provar um grande problema para os agricultores em áreas de risco, especialmente de deslizamento.
Morro do Baú (SC). Foto: WWF Brasil
Laboratório
Apesar de a questão ser extremamente polêmica, não houve Audiências Públicas suficientes, e sequer a comunidade científica foi ouvida. A tramitação do PL foi realizada de forma impressionantemente rápida. Segundo informações do portal da ALESC, o PL passou apenas pela Comissão de Constituição e Justiça e Comissão de Finanças e Tributação.
Infelizmente, a ALESC tem um histórico conturbado em se tratando de mudanças na legislação ambiental. Foi em Santa Catarina que as alterações ao Código Florestal, legislação federal, tiveram o seu ‘laboratório’.
Em 2009, a ALESC aprovou o Código Ambiental catarinense, Lei 14.675/2009, já conhecido como antiambiental, sob forte protesto de entidades ambientalistas e especialistas em uso e ocupação do solo.
Na época, a Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (Apremavi), reconhecida ONG da região, denunciou que a legislação “atende exclusivamente aos interesses do governador e de alguns parlamentares catarinenses que estão a serviço do lobby da especulação imobiliária e de ruralistas, principalmente aqueles que têm passivos ambientais, e querem desmantelar a legislação que protege as APPs e a Reserva Legal, visando justamente à ampliação de ocupações em áreas de risco, sob discursos sem nenhuma consistência científica”.
Para a Apremavi, não havia necessidade de se estabelecer um Código Ambiental em Santa Catarina, pois o estado já tinha legislações federais e estaduais eficientes nessa área. O que estava faltando era a aplicação efetiva dessa legislação, enfatizou a ONG.
Antônio Fernando Barros e Silva de Souza, procurador geral da república, chegou a protocolar no dia 17 de junho de 2009, no Supremo Tribunal Federal (STF), Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) contra o Código Ambiental de Santa Catarina, alegando que a lei estaria em desacordo com a Constituição Federal. Souza considerou a lei inconstitucional, atendendo às representações do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) e do Ministério Público Federal (MPF). Porém, até hoje a ação não foi julgada.
* Publicado originalmente no site CarbonoBrasil.