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18 nov 2025
[Nota do Website: Realmente um texto didático, completo e extremamente importante que todos nós leiamos para conhecermos várias das facetas que envolvem a existência e o uso das resinas plásticas nos dias atuais. Aqui mostra como a doutrina do pós IIª Guerra que se transformou em ideologia, promovidas pelo inquestionavelmente supremacismo branco eurocêntrico, violentamente antropocêntrico, liderado pelos EUA, mostram ser suicidas e criminosas. E qual o seus fundamentos? Simplesmente o dinheiro como deus supremo de todas as vidas humanas, estejam onde estiverem. Como temos defendido, somente se a humanidade como um todo, optar por outras humanidades que estão aí, desprezadas e achincalhadas pelo supremacismo branco, onde a humildade e a simplicidade, embasadas na compreensão de que somos, acima de tudo, Seres Coletivos, em nossa individualidade, iremos reencontrar caminhos que são trilhados e foram vividos por todos, para termos futuro para os nossos descendentes. Que tragédia a herança que estamos legando para os que estão vindo depois de nós! Triste e cruel!].
Para manter os lucros em alta, as empresas de petróleo e gás querem transformar combustíveis fósseis em uma crescente quantidade de embalagens e outros produtos plásticos.
Em 2018, em um resort em Dubai, às margens das águas azul-esverdeadas do Golfo Pérsico, Amin Nasser, CEO da Saudi Aramco, discursou para uma plateia de centenas de executivos da indústria petroquímica, apresentando sua visão para o futuro da maior companhia petrolífera do mundo. Os objetivos que ele descreveu não se concentravam principalmente em energia. Em vez disso, anunciou planos para investir US$ 100 bilhões na expansão da produção de plástico e outros produtos petroquímicos.
Nasser previu que, com uma população global crescente e com maior poder de compra a cada ano, os produtos petroquímicos — compostos derivados do petróleo e de outros combustíveis fósseis, dos quais os plásticos e seus ingredientes representam até 80% — impulsionariam quase metade do crescimento da demanda por petróleo até meados do século. Cerca de 98% dos plásticos virgens são feitos a partir de combustíveis fósseis. Em setores como embalagens, automóveis e construção civil, ele afirmou: “o enorme crescimento da demanda por produtos químicos nos oferece uma fantástica janela de oportunidade”.
Nos anos que se seguiram ao discurso de Nasser em 2018, a Saudi Aramco, empresa estatal saudita, adquiriu uma participação majoritária no conglomerado petroquímico SABIC. Juntas, as empresas investiram em enormes projetos de plásticos na China e construíram plantas petroquímicas da Coreia do Sul à costa do Texas. A Aramco pretende transformar mais de um terço de seu petróleo bruto em produtos petroquímicos até a década de 2030 — um aumento de quase três vezes em 15 anos.
Embora a indústria tenha apresentado seus planos de transição para o plástico como uma resposta à demanda do consumidor por um material essencial à vida moderna, outro fator está claramente em jogo: à medida que os perigos iminentes das mudanças climáticas afastam o mundo dos combustíveis fósseis, a indústria aposta no plástico para proteger sua lucratividade. Aumentar a produção de plástico e petroquímica, segundo Nasser, “garantirá um destino confiável para a futura produção de petróleo da Saudi Aramco”. Como observou um analista do setor sobre a estratégia da empresa, “o imperativo geral é evitar ser forçado a deixar reservas de petróleo no subsolo à medida que a demanda por combustíveis para transporte diminui”.
Até mesmo a ExxonMobil reconheceu que a adoção generalizada de veículos elétricos provavelmente reduzirá a necessidade de petróleo para os carros. Em uma previsão de mercado, a empresa, já a maior produtora mundial de plásticos descartáveis, garantiu aos investidores que seus planos de aumentar a produção petroquímica em 80% até 2050 ajudarão a indústria a bombear e vender ainda mais petróleo em meados do século do que hoje.
Mas há uma crescente conscientização pública de que todo o plástico produzido para embalagens e produtos, dos mais absurdos aos mais essenciais, tem um custo elevado: os impactos na saúde causados pelos produtos químicos que contém, as emissões da sua produção, as montanhas de resíduos que se acumulam com o descarte e os microplásticos encontrados em todos os lugares, dos cantos mais remotos do planeta até nossos cérebros. Alguns governos começaram a promulgar leis, como a proibição de certos itens descartáveis, mas os esforços para promover mudanças mais abrangentes esbarraram com o colapso, em agosto, das negociações controversas sobre um tratado global de poluição plástica. Mais de 70 nações pressionaram por limites na quantidade de plástico produzido para reduzir o fluxo de resíduos para o meio ambiente. A indústria fez forte lobby contra esses limites, argumentando que a melhoria da gestão de resíduos e a reciclagem são a solução, embora apenas uma pequena porcentagem do plástico seja reciclada atualmente e muitos tipos não possam ser reciclados por meios convencionais.
As empresas “sabem que não podem ficar de braços cruzados” durante a transição energética, afirma Judith Enck, ex-funcionária da Agência de Proteção Ambiental dos EUA e presidente da Beyond Plastics, um grupo de defesa ambiental sediado no Bennington College. “Elas precisam encontrar um novo mercado gigantesco, e escolheram o plástico.”
A produção de plástico tem aumentado constantemente desde o fim da Segunda Guerra Mundial, quando as empresas investiram recursos na busca e promoção de usos pacíficos para um material cujas aplicações militares — de paraquedas de náilon a isolamento de polietileno para radares — haviam se mostrado inestimáveis. Os consumidores absorveram em massa a enxurrada de novos produtos e embalagens descartáveis, e a produção anual de plástico subiu de dois milhões de toneladas métricas em 1950 para mais de 500 milhões atualmente. Um total acumulado de 8,3 bilhões de toneladas métricas havia sido produzido até 2015, de acordo com um estudo pioneiro que foi o primeiro a quantificar a quantidade total de plástico gerado. Segundo Roland Geyer, ecologista industrial da Universidade da Califórnia, Santa Bárbara, coautor do estudo, o total já ultrapassou 10 bilhões de toneladas métricas. Cerca de três quartos de todo esse plástico se tornaram resíduos, relatou a equipe de Geyer: 9% foram reciclados, 12% foram incinerados e 79% foram parar em aterros sanitários ou no meio ambiente. Se as tendências atuais continuarem, 1,1 bilhão de toneladas métricas de plástico serão produzidas anualmente até 2050 — e o total acumulado será suficiente, diz Geyer, para cobrir os EUA com uma camada até a altura do tornozelo.
Hoje, metade de todo o plástico é destinado a itens de uso único, que muitas vezes são descartados quase imediatamente após serem adquiridos. Um milhão de garrafas plásticas são compradas a cada minuto, segundo a agência ambiental das Nações Unidas, e cinco trilhões de sacolas plásticas são utilizadas anualmente. Só em 2016, os americanos utilizaram mais de 560 bilhões de talheres plásticos e outros itens descartáveis para alimentação.

O plástico, claro, não está presente apenas em embalagens descartáveis. É uma parte essencial e inescapável da vida moderna, amplamente utilizado na construção civil, vestuário, produtos eletrônicos e automóveis. Desempenha um papel fundamental na área da saúde como componente de luvas, seringas, tubos e bolsas de soro, além de próteses articulares, membros e corações artificiais. E não se trata de um único material: existem milhares de tipos e subtipos, cada um com sua própria combinação de substâncias químicas que resulta nas propriedades desejadas — diferentes graus de dureza, rigidez, flexibilidade, opacidade ou transparência. Uma análise revelou que 16.000 substâncias químicas diferentes são utilizadas na fabricação de plásticos, incluindo aditivos como estabilizantes, plastificantes, corantes e retardadores de chama (nt.: destaque em negrito dado pela tradução para se ter uma noção do quanto de moléculas venenosas estão aí incluídas!). Mais de 4.000 dessas substâncias representam riscos à saúde ou ao meio ambiente, e informações de segurança eram insuficientes para outras 10.000, segundo estimativas dos pesquisadores.
Por natureza, o plástico não se decompõe facilmente. Em vez disso, fragmenta-se em pedaços cada vez menores — chegando à nanoescala — que foram encontrados em praticamente todos os lugares onde os cientistas investigaram. Eles estão presentes no ar que respiramos, na água que bebemos e nos alimentos que ingerimos. Foram detectados no sangue, no sêmen, no leite materno, na medula óssea e na placenta. Os cientistas estão apenas começando a explorar o que essa onipresença significa para a saúde humana e o meio ambiente, mas os sinais são preocupantes. Um estudo recente encontrou microplásticos em tecidos de rins, fígados e cérebros humanos, e um estudo com o cérebro de 12 pacientes com demência mostrou acúmulos maiores do que em pessoas sem a doença. Outra pesquisa encontrou as minúsculas partículas na placa da artéria cervical de quase 60% dos pacientes testados; três anos depois, as taxas de ataques cardíacos, derrames e mortes foram 4,5 vezes maiores entre as pessoas cujas amostras continham microplásticos.
O plástico também agrava a crise climática. A produção e o descarte de plásticos descartáveis, por si só, geram mais gases de efeito estufa do que o Reino Unido, segundo a Fundação Minderoo, um grupo de pesquisa australiano. Essa pegada inclui a extração do petróleo e do gás usados na fabricação do plástico, os processos de síntese que consomem muita energia e as emissões provenientes da queima de resíduos.
O plástico transformou a vida moderna, trazendo uma conveniência antes inimaginável e permeando todos os cantos da economia global. Mas as consequências do nosso boom do plástico, que já dura décadas, nem sempre são fáceis de discernir. Eu queria vê-las de perto, começando pelo impacto sobre aqueles que convivem com os perigos da produção de plástico.
O gigante da indústria global de plásticos é a China, o maior produtor mundial desse material. Ela produz cerca de um terço de todo o plástico fabricado atualmente e está em meio a uma expansão cuja escala, segundo a Agência Internacional de Energia, “supera qualquer precedente histórico”. Ao longo de cinco anos, de 2019 a 2024, a agência estima que a China adicionou tanta produção de etileno e propileno (dois componentes essenciais do plástico) quanto a Europa, o Japão e a Coreia juntos. Grande parte do plástico que a China produz e compra é transformada em mercadorias exportadas para o mundo todo por suas inúmeras fábricas. Impulsionada por essa produção, a voraz demanda do país por plásticos acabados e outros produtos petroquímicos — incluindo os precursores de mais plástico — tem mantido a demanda global por petróleo em alta, mesmo com a estagnação das vendas de combustíveis derivados do petróleo.
Mas, desde meados dos anos 2000, a revolução do fraturamento hidráulico, que transformou o panorama energético americano, também impulsionou um boom do plástico nos EUA. O etano, um componente do gás extraído por fraturamento hidráulico, normalmente não é usado para gerar energia ou calor. Assim, empresas de combustíveis fósseis e petroquímicas investiram mais de US$ 200 bilhões na construção e expansão de fábricas nos EUA para utilizá-lo, entre outros subprodutos do fraturamento hidráulico, na fabricação de plástico e outros produtos petroquímicos. Ao longo da década de 2010, essa onda de investimentos transformou os EUA em um ator dominante na indústria do plástico.
O coração da produção de plástico nos EUA encontra-se ao longo da Costa do Golfo, no Texas e na Louisiana, onde fábricas gigantescas, cobertas por emaranhados de tubulações, ficam ao lado de enormes tanques cilíndricos em complexos petroquímicos que se estendem por milhares de hectares. Dentro desses complexos, fornos a gás quebram as ligações moleculares do etano em um processo chamado craqueamento do etano, o primeiro passo na transformação do composto químico em plásticos.
Na próxima etapa de um processo complexo e multifásico, a alta pressão e o frio transformam essas cadeias fragmentadas de carbono e hidrogênio em etileno, um dos blocos de construção mais importantes da petroquímica. Catalisadores e mais calor, então, induzem o etileno a se combinar com outros hidrocarbonetos para formar o polietileno — o plástico mais utilizado no mundo. Uma fábrica típica de produção de polietileno pode fabricar centenas de bilhões de grânulos de plástico do tamanho de uma lentilha todos os dias. Carregados em navios, trens e caminhões, eles seguem para fabricantes que os transformam em brinquedos, sacolas, garrafas e muito, muito mais.
Cerca de 150 refinarias e plantas petroquímicas desse tipo se aglomeram ao longo dos sinuosos 137 quilômetros do rio Mississippi, entre Baton Rouge e Nova Orleans. Em uma área que antes era repleta de plantações de cana-de-açúcar e que ainda abriga descendentes das pessoas escravizadas ali, as fábricas ficam ao lado de vastos e planos campos de cana.
Numa tarde ensolarada de janeiro, visitei Sharon Lavigne na paróquia de St. James, bem em frente ao Mississippi. Sua casa era fácil de encontrar. Uma grande placa no jardim dizia: “A Formosa Plastics seria uma sentença de morte para St. James”, com as palavras desenhadas como se estivessem pingando sangue. Lavigne se lembra de pescar lagostins, colher amoras e nozes-pecã e comer os vegetais que seu pai cultivava quando ela era criança, nas décadas de 1950 e 1960.

Agora, seus netos ficam com erupções cutâneas por brincarem ao ar livre, e quando ela abre a porta da frente, às vezes é atingida por um cheiro “tão forte que quase a faz desmaiar”, diz ela. A partir da década de 1960, a região passou a abrigar um número crescente de instalações petroquímicas, incluindo aquelas que produzem plásticos como poliestireno e cloreto de polivinila (PVC). Elas também produzem ingredientes precursores, incluindo dicloreto de etileno, óxido de etileno, diisocianato de tolueno e metanol, que são usados em poliéster, poliuretanos e PVC. Suas emissões incluem substâncias cancerígenas como cloropreno, óxido de etileno e formaldeído.
Em 2018, John Bel Edwards, então governador da Louisiana, anunciou que o grupo taiwanês Formosa Plastics (FG) construiria um enorme complexo de US$ 9,4 bilhões a três quilômetros da casa de Lavigne — 12 fábricas separadas, incluindo duas unidades de craqueamento de etano e unidades de produção de polipropileno e vários tipos de polietileno. Lavigne se aposentou de seu emprego como professora de educação especial e fundou a RISE St. James para se opor ao novo empreendimento petroquímico devido aos riscos à saúde que ele representa para os moradores de um corredor que alguns chamam de “Corredor do Câncer”.
Uma análise da ProPublica revelou que a área ao redor do terreno da Formosa já apresenta níveis de poluição cancerígena superiores a 99,6% das áreas industriais dos EUA. A licença do projeto autorizaria a emissão de mais de 5.400 toneladas métricas de poluentes atmosféricos anualmente, incluindo os carcinógenos benzeno, formaldeído, óxido de etileno e 1,3-butadieno. A ProPublica estimou que a exposição a substâncias tóxicas poderia triplicar para alguns moradores. “Já estamos morrendo, e se a Formosa se instalar aqui, morreremos ainda mais rápido”, afirma Lavigne.
Formosa afirmou que, apesar da oposição de ativistas, o apoio local é forte para uma fábrica que criaria 1.200 empregos. “Qualquer alegação de que a FG aumentará significativamente as ’emissões tóxicas’ na região é uma deturpação e imprecisão”, afirma Janile Parks, porta-voz da FG LA, braço do conglomerado na Louisiana. Se construída, a fábrica cumprirá todas as normas, garante ela. “Proteger a saúde, a segurança e o meio ambiente é uma prioridade.” (nt.: imagina-se o que uma mulher que poderá ser mãe e avó estar dizendo e afirmando esse absurdo, é o mais estarrecedor!).
Embora o governo Biden tenha endurecido os limites para poluentes tóxicos como cloropreno e óxido de etileno, a fiscalização se mostrou de curta duração. Após nomear dois ex-executivos da indústria química para cargos de chefia na EPA logo após sua posse em 2025, o presidente Donald Trump assinou uma proclamação prometendo isenções para dezenas de fábricas de produtos químicos. Demissões em massa neste ano reduziram drasticamente a agência, que fechou seu escritório de Justiça Ambiental, criado para proteger aqueles desproporcionalmente afetados pela poluição — frequentemente comunidades de baixa renda e de minorias étnicas, como a de Lavigne. A EPA também anunciou planos para fechar um braço de pesquisa científica que analisa os perigos representados por produtos químicos tóxicos (nt.: que conclusão pode-se ter? Não chega às raias de ser um crime contra a humanidade? Por dinheiro?).
Rejeitando o apelido de “Corredor do Câncer”, a indústria — juntamente com alguns funcionários estaduais e locais da Louisiana — argumentou que as taxas médias de câncer nas paróquias ao longo do baixo Mississippi são próximas da média estadual. Mas dados censitários mais detalhados contam outra história, de acordo com um estudo realizado pela Clínica de Direito Ambiental da Faculdade de Direito de Tulane, que representa comunidades que lutam contra a poluição. Entre os bairros pobres e predominantemente negros, aqueles com maior poluição tóxica apresentaram taxas de câncer mais elevadas. Ao longo de uma década, a poluição tóxica contribuiu para 850 casos adicionais de câncer nesses bairros, estimaram os pesquisadores. “Essas fábricas emitem substâncias que são toxinas e carcinogênicos conhecidos”, afirma a pesquisadora Kimberly Terrell, ex-integrante da equipe de Tulane. A descoberta “corrobora o que os membros da comunidade vêm dizendo há tempos”.
Esse perigo é o motivo pelo qual Lavigne optou por se opor à expansão petroquímica no local onde cresceu, em vez de se mudar. Quando ouviu falar pela primeira vez dos planos da Formosa, ela sentou-se na varanda e “perguntou a Deus se deveria deixar a terra que Ele lhe deu. E foi então que Ele lhe disse: ‘Não’”, relembra. “Acho que meus ancestrais estão muito felizes por eu estar lutando.”
Grande parte do material produzido ao longo do Mississippi e em outras regiões produtoras de plástico acaba no Sul Global. Com os países ricos já saturados de produtos e embalagens plásticas, a indústria vê o mundo em desenvolvimento como seu novo mercado mais promissor. A Indonésia, onde o uso de embalagens descartáveis está crescendo rapidamente, está entre as nações que representam tanto as expectativas de crescimento da indústria quanto os perigos que ela representa. É também o destino de grande parte do plástico usado e lixo e por isso exportado por países ricos, supostamente para ser reciclado.
Para descobrir onde parte desse material realmente acaba, viajei até os arredores de Surabaya, a segunda maior cidade do arquipélago. Logo além dos limites da cidade fica Tropodo, uma vila charmosa com ruas estreitas em meio a campos verdejantes, conhecida por seus pequenos produtores de tofu. Em uma fábrica de tofu a céu aberto, atrás de uma casa verde-menta, pedaços de plástico triturado se acumulam contra as paredes. Quando o dono da fábrica, Muhammad Gufron, joga alguns deles em um grande forno, o som do estalo é audível. O plástico é combustível, gerando vapor para aquecer os recipientes com a mistura de soja, que os trabalhadores mexem e depois despejam em escorredores de madeira, onde se solidifica em blocos de tofu. “É bom e barato”, diz ele, e é o combustível para todas as fábricas de tofu de Tropodo.
Uma densa fumaça preta sobe das altas chaminés, quase certamente carregando dioxinas, furanos, mercúrio e outros produtos químicos perigosos provenientes da queima de plástico. Os ovos das galinhas que ciscam nas cinzas plásticas de Tropodo contêm substâncias químicas tóxicas e persistentes, como bifenilos policlorados (PCBs) e sulfonato de perfluorooctano (PFOA), além do segundo maior nível de dioxina já detectado em um ovo na Ásia (o maior foi registrado no Vietnã, em uma antiga base militar americana contaminada pelo desfolhante Agente Laranja, usado durante a guerra) (nt.: essas descrições são realmente aterradoras. As pessoas desinformadas e descrentes da poluição que a queima causa, ‘resolvem’ o destino final dos plásticos que são exportados por países, como os europeus, para os povos do terceiro mundo. Outro crime contra a humanidade, sem dúvida!).

A Indonésia enfrenta há muito tempo problemas com a poluição plástica. Muitas áreas não possuem coleta seletiva formal, obrigando as famílias a descartarem seu próprio lixo, e um estudo de 2020 constatou que o país era a maior fonte mundial de resíduos plásticos mal gerenciados. Mas uma parcela significativa do problema do plástico vem dos resíduos exportados por países ricos, incluindo os EUA, que geram mais resíduos plásticos do que qualquer outra nação.
Embora os americanos descartem muitas garrafas plásticas, potes de iogurte e outros produtos de plástico em lixeiras de reciclagem, apenas 5% a 6% do plástico do país é de fato reciclado. O processo geralmente envolve triturar o material separado e, em seguida, derretê-lo em grânulos que os fabricantes podem reutilizar. Mas diferentes tipos de plástico precisam ser processados separadamente, e aditivos como corantes e plastificantes (que afetam a maleabilidade do plástico) podem tornar a separação eficaz praticamente impossível. Mesmo uma pequena quantidade de material mal separado pode tornar um lote inutilizável. E, ao contrário do alumínio, do vidro ou do papelão, que podem ser reciclados repetidamente, a qualidade do plástico se deteriora rapidamente.
Mesmo os tipos mais fáceis de reciclar, como o tereftalato de polietileno/PET e o polietileno de alta densidade — normalmente usados em garrafas de bebidas e embalagens de leite, respectivamente — muitas vezes retornam ao mercado não como novas embalagens, mas como carpetes, roupas ou madeira artificial, materiais que não são recicláveis. Além disso, há poucos incentivos econômicos para a reciclagem de plástico. O plástico reciclado não consegue competir, em termos de preço ou qualidade, com o material virgem, barato e abundante — e o desequilíbrio só aumenta à medida que a indústria intensifica ainda mais a produção, tornando o plástico novo mais abundante e barato. É por isso que tanto lixo plástico acaba em aterros sanitários ou incineradores.
Ainda assim, os EUA exportam cerca de 400 mil toneladas métricas de plástico por ano, supostamente para reciclagem. A China costumava receber grande parte do lixo plástico mundial, mas parou de aceitá-lo em 2018 devido a preocupações com a poluição do ar e da água causada pelo descarte e queima desses resíduos. Assim, países do Sudeste Asiático, incluindo a Indonésia, foram inundados. “Vimos muitos novos lixões”, diz Daru Setyorini, bióloga e ativista indonésia. “Cada vez mais plástico.” Sacolas e embalagens estavam emaranhadas em galhos nas margens dos rios, empilhadas ao lado das estradas, amontoadas em terrenos baldios e queimadas em fornos como o da fábrica de tofu da Gufron. Esse lixo importado contribui para a avalanche de plástico que chega aos mares.
Mas a Indonésia também enfrenta uma crescente onda de resíduos plásticos domésticos. A quantidade de embalagens vendidas aos indonésios cresce de 4% a 6% ao ano, e as embalagens plásticas flexíveis — material macio e difícil de reciclar, usado em sachês, filmes plásticos, tubos de pasta de dente e sacolas para salgadinhos e outros itens de supermercado — estão aumentando ainda mais rapidamente, afirma Ariana Susanti, da Federação Indonésia de Embalagens, que representa empresas que fabricam e utilizam embalagens. Os sachês são particularmente comuns, pequenos pacotes usados em todo o Sul Global para porções individuais de diversos produtos, desde xampu e detergente até temperos. Uma análise estimou que pouco mais de um trilhão foram produzidos em 2023 e previu que a produção anual ultrapassaria 1,4 trilhão em uma década.
Setyorini acompanha essas mudanças há décadas. Quando era estudante, nas décadas de 1980 e 1990, ela e sua mãe compravam verduras embrulhadas em jornal e levavam suas próprias cestas, potes e galões para o mercado. Mesmo com a virada do milênio e a onipresença das embalagens plásticas, ela afirma: “Era ruim, mas não tão ruim quanto agora”. Desde então, a publicidade incessante que retrata produtos embalados em plástico como modernos, limpos e práticos mudou a percepção do público, enquanto as empresas eliminaram as alternativas, explica Setyorini. Agora, “as pessoas não têm escolha”, diz ela. “Elas têm que comprar plástico.”
Setyorini e seu marido, Prigi Arisandi, também biólogo, vêm medindo os impactos do plástico na saúde e no meio ambiente por meio de sua organização sem fins lucrativos de defesa ambiental e pesquisa, a Ecoton, que administram de um escritório situado entre bananeiras e tamarindeiros a 45 minutos de Surabaya. Eles encontraram microplásticos no rio Brantas, que fornece água para milhões de indonésios, e nos corpos de peixes, camarões e mexilhões. Ao analisarem amostras enviadas pelas pessoas, descobriram os minúsculos fragmentos em tudo, desde o solo até o leite materno.

A Indonésia tem endurecido suas regras sobre a importação de sucata plástica, culminando este ano com a proibição de resíduos plásticos estrangeiros, embora haja preocupações com o contrabando e falhas na fiscalização. Mesmo assim, Setyorini e outros ativistas concordam que a quantidade de material não reciclável que chega hoje — embora ainda significativa — é muito menor do que no pico de 2019. No Ministério do Meio Ambiente e Florestas em Jacarta, capital da Indonésia, Novrizal Tahar, ex-diretor de gestão de resíduos sólidos, afirma que o país pretende reduzir o volume de plástico que chega aos oceanos em 70% e já alcançou mais da metade dessa meta. “Isso é uma grande conquista”, diz ele.
Setyorini reconhece a importância de melhorar a gestão de resíduos, mas acredita que o governo indonésio tem se concentrado demais em lidar com o plástico após o descarte — por meio de métodos como reciclagem e processamento do plástico descartado para transformá-lo em combustível para fornos de cimento e usinas de energia — e não o suficiente em exigir que as empresas reduzam seu uso. Ela e Arisandi levaram manequins cobertos com sachês plásticos para manifestações, exigindo que as empresas parem de vender esses pequenos pacotes, e processaram empresas de alimentos e produtos de consumo por seu uso.
Fundamentalmente, qualquer coisa que não seja reverter a disseminação e o acúmulo desenfreados de plástico é, na opinião dela, uma solução falsa. “Precisamos voltar àquela época em que as pessoas levavam suas próprias sacolas para o mercado” e os vendedores reabasteciam os recipientes, ela me diz — “o jeito antigo de fazer compras” que ela se lembra de sua juventude.
As pessoas optam por plásticos descartáveis não apenas por conveniência, mas também por seu baixo custo. São baratos porque o preço pago pelos consumidores não reflete o custo real — as despesas com a gestão de resíduos, os danos ambientais causados pela poluição e a crescente lista de efeitos na saúde associados ao plástico e seus componentes químicos. O crescente número de pesquisas que detalham essas externalidades tem direcionado a atenção para a redução da quantidade de plástico que utilizamos, em vez de simplesmente para a gestão de resíduos. Com essa mudança de foco, alguns governos começaram a buscar maneiras de atingir esse objetivo.
A União Europeia proibiu itens plásticos descartáveis, como talheres, pratos, mexedores e canudos. Além disso, exigirá que, até 2030, 90% das garrafas plásticas sejam coletadas para reciclagem e que as novas sejam fabricadas com pelo menos um terço de material reciclado. Com um novo conjunto abrangente de regulamentações, a União Europeia proíbe restaurantes de fornecerem pratos e talheres plásticos descartáveis para clientes que consomem no local e exige que 40% das embalagens plásticas usadas para enviar mercadorias aos clientes ou entre empresas sejam reutilizáveis até 2030.
Nos Estados Unidos, governos locais e estaduais, de Washington, D.C., a Honolulu, aprovaram leis que proíbem certos plásticos descartáveis ou exigem que sejam recicláveis ou compostáveis. Quando bem elaboradas, essas leis podem fazer uma diferença real. O estado de Nova York implementou uma proibição estadual de sacolas plásticas em 2020, e na cidade de Nova York, o departamento de saneamento constatou que a presença dessas sacolas no fluxo de resíduos caiu 68% entre 2017 e 2023. Uma análise diferente, que examinou as proibições de sacolas plásticas em dois estados e três cidades, estimou que, juntas, elas evitaram o uso de seis bilhões de sacolas por ano.
Alguns estados, como Maine e Califórnia, adotaram uma abordagem diferente, aprovando leis de “responsabilidade estendida do produtor”. Essas leis exigem que os fabricantes ajudem a financiar programas de reciclagem, de modo que as empresas que lucram com plásticos baratos também arquem com parte dos custos do descarte. Essa legislação não só alivia o ônus dos contribuintes, como também pode levar as empresas a repensarem a quantidade e o tipo de embalagem que utilizam, dizem especialistas. A lei da Califórnia é a mais abrangente, dando às empresas uma década para reduzir em um quarto o uso de embalagens plásticas descartáveis. Ela também exige que as empresas paguem os custos de reciclagem dos municípios e contribuam para um fundo de US$ 5 bilhões destinado a combater os danos da poluição plástica à saúde e ao meio ambiente.

Em nível global, mais de 180 países — e, segundo relatos, mais de 200 lobistas de empresas petroquímicas — passaram três anos negociando um tratado da ONU com o objetivo de abordar a crise da poluição plástica. Após perder o prazo de 2024, as negociações se estenderam além do prazo previsto, mas fracassaram em agosto passado; não se sabe se serão retomadas. Um grupo de ambientalistas e as delegações nacionais que os apoiavam exigiram limites para a produção, mas as empresas se opuseram veementemente a tais restrições, concentrando-se, em vez disso, na gestão de resíduos e na reciclagem. Sessão após sessão, os produtores de plástico lutaram arduamente para excluir medidas rigorosas do tratado e obstruir o progresso com entraves processuais, afirma Carroll Muffett, ex-presidente do Centro de Direito Ambiental Internacional. “É a mesma estratégia que temos visto ser usada na questão climática há décadas.”
Sob a presidência de Joe Biden, os EUA haviam se juntado aos apelos para que o tratado limitasse a produção de plástico, mas em fevereiro de 2025 Trump publicou a frase “DE VOLTA AO PLÁSTICO” nas redes sociais, referindo-se à sua intenção de reverter um plano do governo para a adoção de canudos de papel. Nas negociações do tratado, os EUA propuseram excluir a linguagem que abordava os efeitos do ciclo de vida completo do plástico e se uniram a outras nações produtoras de petróleo e gás na oposição a quaisquer limites de produção. Em uma declaração enviada por e-mail, o Conselho Americano de Química, que representa os principais produtores de plástico, alertou que tais limites trariam “consequências não intencionais significativas. O mundo precisa de mais energia renovável, água potável segura, edifícios energeticamente eficientes e menos desperdício de alimentos, tudo isso viabilizado pelo plástico”. Além disso, acrescentou o conselho, tais limites seriam “ineficazes para lidar com o vazamento decorrente da gestão inadequada de resíduos”.
No ano passado, em uma conferência sobre plásticos em Dubai, organizada pela Associação de Petroquímicos e Químicos do Golfo — o mesmo grupo para o qual o CEO da Saudi Aramco apresentou os planos da empresa para o setor de plásticos, avaliados em US$ 100 bilhões, quase seis anos antes —, Salman Alajmi, vice-presidente da Equate, empresa petroquímica sediada no Kuwait, atualizou os executivos presentes sobre o andamento das negociações do tratado. O sentimento tem se tornado “muito emotivo em relação ao plástico”, disse ele. Algumas das propostas em discussão, alertou, poderiam abrir caminho para penalidades financeiras que “certamente prejudicariam a rentabilidade dos produtores” — em outras palavras, reduziriam os lucros.
Além disso, Alajmi disse à sua plateia que os críticos da indústria viam a reciclagem de plástico como parte do problema. Alajmi, que liderava uma coalizão de países produtores de plástico nas negociações, incentivou as empresas a se envolverem na tentativa de reformular o acordo. “Precisamos ser mais proativos”, disse ele, sugerindo que utilizassem seus especialistas jurídicos e produzissem estudos sobre os benefícios dos diferentes tipos de reciclagem, explicando “por que são seguros e por que os consideramos soluções”.
Durante dois dias de debates e apresentações em PowerPoint na conferência, palestrante após palestrante compartilhou visões sobre o papel do plástico em um futuro sustentável através da ideia de “economia circular” — na qual o material descartado é infinitamente recuperado e reciclado. Muitos falaram sobre simplificar as embalagens para torná-las mais recicláveis e ampliar uma abordagem conhecida como reciclagem química, que a indústria promove como uma forma de lidar com plásticos que não podem ser reprocessados por métodos mecânicos tradicionais. Geralmente realizada por meio de uma técnica chamada pirólise, essa reciclagem decompõe o plástico em seus componentes básicos, etileno e propileno.
Mas, devido à contaminação que inevitavelmente persiste nos plásticos reciclados, para serem reutilizados, eles precisam ser diluídos em uma mistura composta por 90% de ingredientes virgens derivados de combustíveis fósseis. O plástico produzido pode conter apenas 2% de material reciclado, segundo apurou a ProPublica (embora, com um método de contabilização conhecido como balanço de massa, possa apresentar rótulos indicando uma fração muito maior). A pirólise também pode emitir substâncias cancerígenas como benzeno e dioxinas, e o processo gera mais emissões de gases de efeito estufa do que a simples produção de plástico a partir do petróleo.
Para os críticos, o argumento da indústria petroquímica de que a reciclagem resolverá a crise do plástico nada mais é do que greenwashing — uma tentativa de acalmar as preocupações dos consumidores e obter a aceitação da produção cada vez maior. Foi o que Enck, presidente da Beyond Plastics e ex-funcionária da EPA, me disse enquanto conversávamos na varanda de sua casa, em uma área arborizada nos arredores de Albany, Nova York, em uma manhã escaldante de agosto. Os produtores “gastaram milhões de dólares mentindo para o público, tentando fazê-lo acreditar que basta reciclar o plástico e tudo ficará bem”, disse ela. O procurador-geral da Califórnia, Rob Bonta, alegou o mesmo em um processo contra a ExxonMobil, afirmando que a empresa, por décadas, “promoveu enganosamente a reciclagem como a solução definitiva para o lixo plástico”, apesar de saber que os métodos convencionais e químicos “nunca serão capazes de processar mais do que uma pequena fração”. (A ExxonMobil contra-atacou com um processo, acusando Bonta de “declarações falsas flagrantes” e defendendo a reciclagem química como “uma tecnologia comprovada” que pode impedir que o plástico vá para aterros sanitários.)
Para Geyer, o ecologista industrial que quantifica os níveis de produção, a conclusão é clara. A única maneira de gerenciar os impactos negativos do plástico é produzir e usar menos dele. “Precisamos conversar sobre ‘quanto'”, diz ele. “Para mim, neste momento, é extremamente óbvio.”
Mas, segundo Enck, uma indústria que lucra com a produção cada vez maior de plástico não tomará sozinha as medidas necessárias para nos tirar desse impasse. “A única maneira de mudar essa trajetória é com leis rigorosas”, afirma. Se essas medidas fizerem com que o preço do plástico reflita seu verdadeiro impacto, outros tipos de embalagens — e sistemas que permitam, por exemplo, o uso de recipientes reutilizáveis para comida para viagem — poderão competir economicamente.
Naquele dia de agosto, na varanda de sua casa, Enck tirou uma caixa com produtos e embalagens inteligentes que usa para mostrar aos visitantes como seria um mundo com menos plástico: saquinhos de papel para doces sem a camada plástica tradicional, totalmente recicláveis e que mantêm o conteúdo fresco; uma barra de xampu que dispensa o plástico da embalagem; um dispensador de sabonete líquido de vidro que pode ser reabastecido misturando pastilhas com água. “Não é nenhum bicho de sete cabeças”, disse ela. E os usos benéficos do plástico não justificam a continuidade de seus usos mais prejudiciais. “Podemos fazer muito melhor.”
Tradução livre, parcial, de Luiz Jacques Saldanha, novembro de 2025