Agrotóxicos: ANSES emite alerta importante após revisão de efeitos de agrotóxicos ainda autorizados

XAVIER LISSILLOUR

https://www.lemonde.fr/planete/article/2025/04/24/pesticides-l-anses-lance-une-alerte-d-ampleur-apres-un-examen-des-effets-de-produits-toujours-autorises_6599349_3244.html

Stéphane Foucart

23 abr 2025

[NOTA DO WEBSITE: É realmente assustador como os ‘adultos’, meritocratas, supremacistas brancos eurocêntricos, antropocentristas, e mais e mais adjetivações negativas, são irresponsáveis e ladinos. Será que todas as informações que a própria ciência eurocêntrica vem trazendo, diuturnamente, sobre os efeitos maléficos das moléculas sintéticas, aqui na forma de agrotóxicos, não conseguem sensibilizá-los de que é sobre as gerações que nos seguem que estamos todos, definitivamente, comprometendo? Como conseguimos conviver com esse crime sobre a humanidade de hoje e de amanhã?].

Especialistas da Agência Nacional de Segurança Alimentar estão chamando a atenção para uma variedade de doenças relacionadas a essas substâncias. Eles estão preocupados principalmente com seus efeitos no neurodesenvolvimento e na ocorrência de distúrbios comportamentais em crianças.

Linfomas, leucemias, sarcomas, transtornos do neurodesenvolvimento e do espectro autista em crianças, impacto nas faculdades cognitivas… Dado o número e a diversidade de eventos de saúde registrados e a quantidade de substâncias envolvidas, este é um alerta de magnitude sem precedentes que o regulador francês de agrotóxicos está emitindo. Uma grande preocupação são os riscos dos inseticidas piretróides para o desenvolvimento do cérebro e os distúrbios comportamentais associados quando as crianças são expostas no útero.

A Agência Francesa de Segurança Alimentar, Ambiental e de Saúde Ocupacional (ANSES/Agence nationale de sécurité sanitaire) publicou duas notas de monitoramento na quinta-feira, 24 de abril, detalhando vários “alertas” e “sinais validados” relacionados ao uso comum de agrotóxicos, tanto entre profissionais expostos quanto entre a população em geral. Este trabalho, iniciado há vários anos, faz parte da sua missão de “fitofarmacovigilância”.

Para a ANSES, esta tarefa é extremamente delicada e paradoxal: envolve avaliar, a posteriori, os efeitos inaceitáveis ​​para a saúde de substâncias que foram consideradas seguras após seu exame por agências reguladoras europeias, incluindo… a ANSES (nt.: aqui podemos ver a humildade e a tragédia convivendo juntas. Por um lado reconhece seus equívocos e sua ‘submissão, mesmo que não externada, ao ‘agribusiness’ francês e global. E ao mesmo tempo, retrocede porque está vendo os efeitos maléficos sobre a população e principalmente sobre as crianças por sua ‘displicência’ ao analisar efetivamente venenos!)

Glifosato associado a câncer linfático

Um exemplo marcante é o glifosato. Classificado como “provável cancerígeno” em 2015 pela Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer, considerado não cancerígeno pelo sistema regulatório europeu em 2023 e, portanto, reautorizado por dez anos, o famoso herbicida foi objeto de um “sinal validado” dois anos depois pela ANSES por sua ligação com cânceres linfáticos em profissionais expostos.

“A fitofarmacovigilância é o aspecto cientificamente humilde da nossa atividade“, resume Matthieu Schuler, vice gerente geral da agência Maisons-Alfort (Val-de-Marne). Embora seja supervisionada pela agência, esta missão é realizada por um grupo ad hoc de especialistas, composto por cerca de dez cientistas do mundo acadêmico, de diversas disciplinas.

Para realizar seu trabalho, o grupo de trabalho contou com a expertise coletiva “Agrotóxicos e saúde”, produzida em junho de 2021 pelo Instituto Nacional Francês de Saúde e Pesquisa Médica (INSERM/Institut National de la Santé et de la Recherche Médicale). “Nós não ‘repetimos o jogo‘”, disse Schuler. Não repetimos o trabalho de análise da literatura científica realizado pelo INSERM; confiamos em suas conclusões para estimar sua relevância no contexto regulatório e nacional.»

De fato, a literatura coletada pelo INSERM em 2021 diz respeito a trabalhos realizados ao redor do mundo, sem que sempre sejam aplicáveis ​​à situação francesa. Assim, os especialistas reunidos pela ANSES limitaram seu trabalho às substâncias ainda aprovadas na União Europeia, consideraram os usos autorizados na França, mas também, para avaliar situações realmente críticas, compararam essas informações com os dados sobre a impregnação da população francesa, coletados pela Saúde Pública da França.

Quatro alertas

No total, a ANSES está emitindo quatro “alertas”, ou seja, situações de “ameaça à saúde humana (…) que exigem uma resposta adequada para preveni-la”. Distúrbios comportamentais como ansiedade ou depressão em crianças, ligados à exposição pré-natal aos piretróides (nt. moléculas sintéticas, que formam a família dos piretroides, surgidas a partir dos anos 80 que são uma caricatura da molécula natural piretro/piretrina. Com fórmula química ‘semelhante’ só que anexadas umas o cloro e outras o bromo. Já sabemos o que esses elementos químicos fazem com o iodo da tiroxina materna no desenvolvimento do sistema nervoso central/cérebro dos embriões. Só isso já basta!) constituem o principal alerta lançado pela agência; acompanhar a “alteração das funções motoras, cognitivas e sensoriais em crianças”, ligada à exposição pré-natal a inseticidas organofosforados, bem como, para profissionais expostos a essa mesma família de produtos, distúrbios cognitivos e linfomas não-Hodgkin – cânceres do sistema linfático. No entanto, a ANSES observa que os organofosforados são agora muito pouco utilizados na Europa.

A agência também identifica vários “sinais validados” que não constituem alertas sanitários propriamente ditos, mas sim situações “que podem exigir medidas de gestão [para] prevenir a ocorrência de situações de risco sanitário a longo prazo”, segundo a terminologia cautelosa da ANSES. Linfomas não-Hodgkin em trabalhadores expostos a glifosato, 2,4-D, triazinas, leucemias associadas à exposição à deltametrina (nt.: piretróide), comportamentos sugestivos de transtornos do espectro autista associados à exposição pré-natal a organofosforados, danos aos espermatozoides na população em geral associados à exposição a piretróides, etc.

Em anexo específico, os especialistas chamam atenção especial para essa família de inseticidas, principalmente pelos danos causados ​​ao cérebro do feto ou do bebê. E por um bom motivo: essas substâncias ainda são amplamente utilizadas, não apenas na agricultura, mas também em inseticidas para uso doméstico, tratamentos antiparasitários para animais e em aplicações em têxteis e materiais de construção. Como resultado, os dados sobre a exposição a esses produtos “destacam frequências de detecção significativas” na população francesa, sendo estas “maiores em crianças do que em adultos”, observam os especialistas.

Impacto na aquisição da linguagem

Para refinar sua avaliação, eles não se basearam apenas nas conclusões do relatório especializado do INSERM de junho de 2021. Eles revisaram a literatura científica, buscando novos estudos sobre o assunto, e identificaram seis, publicados desde 2021, sobre os efeitos dos piretróides no neurodesenvolvimento. Cinco deles destacam efeitos nocivos: aumento do risco de atraso na linguagem e distúrbios de atenção durante a exposição na primeira infância, e distúrbios comportamentais ou do espectro autista após exposição pré-natal a essas substâncias.

Um desses estudos, publicado em 2022, envolveu mulheres chinesas que foram monitoradas durante a gravidez e cujos filhos foram avaliados com 1 ano de idade por meio de testes padronizados. O resultado relatado pelos autores é, dependendo do trimestre de exposição, um impacto dos piretróides nos escores de aquisição da linguagem, faculdades cognitivas, comportamentos adaptativos, etc. Resultados que, quando comparados com os níveis de exposição encontrados na França, “reforçam o alerta sobre os efeitos da exposição aos piretróides durante a gravidez e a primeira infância no neurodesenvolvimento das crianças“, concluem os pesquisadores.

Estes últimos, acompanhados pela ANSES, recomendam a rápida implementação de trabalhos para identificar as principais fontes de exposição da população a estes produtos, nomeadamente através de “materiais presentes em ambientes interiores (construção, mobiliário, têxteis) e bens de consumo”. Recomenda-se também a implementação de ações de informação e sensibilização do pessoal médico e da população em geral para limitar a utilização destes produtos em locais frequentados por crianças pequenas ou mulheres grávidas.

Por fim, a ANSES recomenda que, em geral, “seja possível o acesso aos dados sobre o uso de produtos fitofarmacêuticos”, pois sem acesso a esses dados os estudos epidemiológicos são complexos ou impossíveis de serem implementados. Tal disposição foi planejada dentro da estrutura do regulamento europeu sobre o uso sustentável de agrotóxicos, mas este último acabou não sendo votado.

Tradução livre, parcial, de Luiz Jacques Saldanha, abril de 2025

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