Textos sobre o Tratado de Livre Comércio entre os Estados Unidos e a União Europeia ameaça a economia solidária.

Quatro textos sobre o TTIP = “Em um ‘livre’ mercado e com a desregulação prevista nestas formas de tratados, as cooperativas terão sempre bem menos vantagens para obter um contrato para pagar mais salários, impostos ou cuidar mais de critérios ambientais do que as grandes companhias que fazem “ofertas” mais ‘competitivas’”, escreve o jornalista Tom Kucharz, em artigo publicado pelo jornal Diagonal, 09-06-2015. A tradução é do Cepat.

 

http://www.ihu.unisinos.br/noticias/543464-o-tratado-de-livre-comercio-entre-os-estados-unidos-e-a-uniao-europeia-ameaca-a-economia-solidaria

 

Eis o artigo.

Fonte: https://goo.gl/x44rhd

A economia social e solidária permite unir pessoas que consomem, produzem e apostam em outros valores e formar circuitos curtos de produção e consumo que nos permitem a provisão de quase toda necessidade. Porém, o Acordo Transatlântico de Comércio e Investimento que, desde julho de 2013, é negociado entre a União Europeia e os Estados Unidos (mais conhecido por suas siglas em inglês TTIP), busca exatamente o contrário: é uma espécie de novo golpe de estado econômico e financeiro para instaurar uma constituição das corporações , com a finalidade de aprofundar e estender o controle das multinacionais sobre a política, os processos legislativos, os âmbitos da economia ainda não mercantilizados e a própria vida. O que está sendo gestado é um dos maiores ataques aos direitos sociais, trabalhistas e ambientais ainda existentes. Uma lição fundamental da crise financeira e econômica é que a separação da política macroeconômica das políticas comerciais e financeiras fragiliza a capacidade das e dos responsáveis políticos em enfrentar os complexos desafios de hoje em dia. Devemos reconhecer que o comércio capitalista e os problemas causados pelo sistema financeiro podem ter graves consequências para as políticas econômicas nacionais e locais, assim como ao emprego. A única via de escape é a desglobalização e a relocalização da economia. Justamente o contrário do que é perseguido pelo TTIP.

Enquanto a economia social e solidária demonstrou uma capacidade de criação de emprego como nenhum outro setor econômico, como se viu no caso de Euskal Herria, a política econômica, comercial e de investimento da União Europeia destruiu sistematicamente empregos e precarizou a vida. A maioria das avaliações de impacto que o TTIPterá assume o pleno emprego, negando assim desde o princípio um dos problemas mais prementes. Se eliminarmos esta suposição, os resultados mudam radicalmente em projeções que apontam a perda do PIB, maior desemprego, maior precariedade e maiores desigualdades. O TTIP acarretaria perdas de 600.000 a 1,2 milhões de postos de trabalho.

Uma das maiores ameaças para o emprego é a desregulamentação das políticas de “compra pública”. A União Europeia pretende utilizar o TTIP e outros tratados comerciais para proibir políticas de compra e licitações locais que assegurem que sejam contratados provedores locais – onde a economia social e solidária tem as propostas mais justas e próximas -. Em setembro de 2014, a Comissão Europeia anunciou as conclusões do tratado comercial entre a União Europeia e o Canadá (CETA, em inglês). O CETA, assim como o TTIP, promoveria a mudança de paradigma de compra e licitação pública com a finalidade de favorecer as grandes empresas. Desse modo, busca-se limitar e erodir a liberdade de organização municipal, por exemplo, no âmbito dos serviços de cuidados, cultura e esporte. Ao invés de contratar cooperativas para planos de igualdade ou participação, a tentativa é a de atribuir todas estas formas de contratos a multinacionais como Eulen ou ACS. Já estão ocorrendo casos muito preocupantes nos quais a gestão dos cuidados de idosos, escolas infantis e atividades extraescolares passam a ser geridos por grandes companhias, sem nenhum objetivo social, nem o de reverter os ingressos para o bem-estar da comunidade ou do município.

Caso o CETA seja aprovado sem cláusula social vinculante, não será possível obrigar a empresa contratada a respeitar convênios coletivos, salários mínimos, critérios de igualdade de gênero ou de proximidade. No CETA fica explicitamente proibido condicionar a compra e licitação pública a conteúdo local, ou seja, contratar pequenas empresas do âmbito local para trabalhos do município. Em um “livre” mercado e com a desregulação prevista nestas formas de tratados, as cooperativas terão sempre bem menos vantagens para obter um contrato para pagar mais salários, impostos ou cuidar mais de critérios ambientais do que as grandes companhias que fazem “ofertas” mais “competitivas”. O CETA e o TTIP também pretendem eliminar os subsídios públicos para o desenvolvimento de projetos socialmente justos e ambientalmente sustentáveis. A proteção de setores econômicos chaves para a economia de uma localidade ou região (alimentos, sapatos, móveis ou tecido) ou de critérios políticos – como respeitar a licença maternidade/paternidade ou a integração de pessoas com diversidade funcional – ficariam abolidos e causaria o fechamento de muitas iniciativas da economia social e solidária.

O CETA e o TTIP são uma ameaça para a construção de alternativas econômicas como as cooperativas, os mercados sociais e a economia feminista e ecológica. Por isso, devemos impedi-los de todas as formas.

Europa. O TTIP racha a Grande Coalizão

http://www.ihu.unisinos.br/noticias/543466-europa-o-ttip-racha-a-grande-coalizao

“Os acontecimentos destes últimos dias revelam até que ponto a oposição às negociações entre a União Europeia e os Estados Unidos cresceu no Parlamento Europeu. Sem dúvida, esta mudança é o resultado da pressão pública e da crescente mobilização cidadã contra o TTIP em todos os estados membros da União Europeia”, escreve Florent Marcellesi, membro de Os Verdes Europeus, em artigo publicado por Publico.es, 10-06-2015. A tradução é do Cepat.

Eis o artigo.

Sopram ventos de mudança no Parlamento Europeu. De rebelião para alguns, de pânico para outros. Os últimos acontecimentos relacionados ao TTIP (Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento) colocaram de pernas para o ar os equilíbrios de forças no Parlamento Europeu e estão evidenciando as profundas rachaduras daGrande Coalizão em geral e dos social-democratas em especial, diante de um tratado comercial que muitos de nós consideramos um perigo democrático, social e ecológico.

Resumamos o ocorrido. Há duas semanas, a Grande Coalizão (conservadores, social-democratas e liberais) pactuou na Comissão de Comércio Internacional, do Parlamento Europeu, seu apoio ao polêmico tribunal de arbitragem privado (chamado ISDS) do TTIP. Desde então, os social-democratas espanhóis e europeus estão buscando justificar o injustificável à imprensa de seus países e aos cidadãos em geral. Sacrificaram sua linha intransponível em favor dos interesses das multinacionais.

Diante da pressão social e política crescente destes últimos dias contra o ISDS, nem os social-democratas europeus, nem a Grande Coalizão aguentaram o baque. Seus acordos prévios arrebentaram em mil pedaços. O que nos leva a três claras conclusões:

– A Grande Coalizão – principalmente os dois grandes grupos conservadores e social-democratas – está dividida e é incapaz de acordar uma posição conjunta sobre o TTIP.

– No dia de hoje, já não há maioria clara no Parlamento Europeu a favor dos tribunais de arbitragem privados (ISDS) e, de um modo geral, da negociação do TTIP.

– Consequentemente, a Comissão Europeia ficará fortemente fragilizada em seu papel negociador com os Estados Unidos, já que não conta com nenhuma maioria política e social sólida para realizar seu mandato comercial com os Estados Unidos.

Diante desta difícil realidade, que significa uma bofetada em todos os promotores nacionais e europeus da Grande Coalizão, o presidente do Parlamento Europeu, o social-democrata Martin Schulz, utilizou uma artimanha legal – o artigo 175 do regulamento interno do Parlamento Europeu – para adiar a votação que estava prevista para esta quarta-feira (10-06), justificando que havia muitas emendas separadas ou nominais ao relatório. Dito de forma simples: a Grande Coalizão temia o resultado desta votação.

De fato, existia uma probabilidade real de que o Parlamento Europeu rejeitasse o ISDS e, inclusive, que não houvesse nenhuma resolução sobre o TTIP. Hoje, a apelação de Schulz ao regulamento é, de forma abusiva e autoritária, uma manifestação da fragilidade da frente pró-TTIP. E mais, a lógica da Grande Coalizão se vê questionada pela democracia europeia.

Contudo, a história não termina aqui. Já iniciada a noite de ontem, terça-feira (09-06), Schulz, novamente, informava que a pedido dos grupos políticos conservadores e liberais (e utilizando outra artimanha legal) também iria submeter à votação a supressão do debate sobre o TTIP, que estava previsto para esta manhã (de quarta-feira, 10-06).

Após um estuporado e acalorado debate, às oito da manhã, para saber se seria possível debater em sessão plenária ou não, uma fraca maioria – apenas por 2 votos e com a abstenção do PSOE e os votos a favor de UPyD, Cidadãos ePNV – conseguiu, enfim, adiar o debate.

Com este retorcido uso do regulamento, o que é temido pela Grande Coalizão? Que se torne público que grande parte dos eurodeputados não confia ou não quer apoiar o que, até o momento, foi negociado no TTIP?

Contudo, tanto a anulação da votação ontem, como a do debate de hoje, não apenas demonstra a ruptura do acordo sobre o TTIP, no seio da Grande Coalizão, como também a evolução da correlação de forças na Europa. Há apenas um ano, só existia uma voz para esse tratado: uma ampla maioria, unânime, a favor do TTIP (e de suas polêmicas ferramentas como o ISDS). Hoje, não há acordo, nem sequer se deve ser debatido em sessão plenária ou não.

Sendo assim, os acontecimentos destes últimos dias revelam até que ponto a oposição às negociações entre a União Europeia e os Estados Unidos cresceu no Parlamento Europeu. Sem dúvida, esta mudança é o resultado da pressão pública e da crescente mobilização cidadã contra o TTIP em todos os estados membros da União Europeia. Os dois milhões de assinaturas conquistadas pela plataforma europeia contrária ao TTIP, as manifestações europeias de outubro de 2014 e abril de 2015, a forte participação no processo de consulta aberto (e ignorado) pela Comissão Europeia, no ano passado, contra o ISDS, as milhares de correspondências de cidadãos para seus eurodeputados, o trabalho incansável de “Os Verdes Europeus” e da “Esquerda Unitária”, etc., estão tendo forte impacto.

Nestes dias, estamos colhendo as primeiras vitórias contra o TTIP, que não são mais do que o símbolo de nossa luta contra a imposição da lei da selva promovida em favor das multinacionais, do crescimento ilimitado, em um planeta finito, e da impetuosa e desigual.

Hoje, a alegria nos invade, e com razão, mas a batalha não acaba aqui, nenhum pouco. Agora, a resolução doParlamento Europeu voltará à Comissão de Comércio Internacional e não resta dúvida de que os pró-TTIP e seus lobbies voltarão com força. Além disso, também batem à porta do Parlamento Europeu os tratados TISA e CETA. No entanto, a rachadura no seio da Grande Coalizão e do Parlamento está feita. #StopTTIP já não é um sonho remoto, é uma probabilidade real e ao nosso alcance.

 

Com o TTIP, “todos os poderes emanam das empresas”

 http://www.ihu.unisinos.br/noticias/543428-com-o-ttip-todos-os-poderes-emanam-das-empresas

A Europa terá que escolher entre “uma sociedade onde os interesses das multinacionais escrevam as leis de todas e todos ou uma sociedade onde esteja em primeiro lugar a justiça, a sustentabilidade e a democracia”, escrevem Lola Sánchez e Florent Marcellesi, a respeito do Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP), que está em debate e votação no Parlamento Europeu, nesses últimos dias. O artigo é publicado por Rebelión, 11-06-2015. A tradução é do Cepat.

Eis o artigo.

Um fantasma percorre a Europa: chama-se TTIP. Por trás destas siglas se esconde o polêmico Tratado de Livre Comércio que atualmente é negociado pelos Estados Unidos e a União Europeia. Para além de questões ideológicas, teríamos que fazer uma pergunta muito simples: este projeto beneficia os cidadãos?  Vejamos.

Por um lado, ameaça a nossa democracia. Além de ser negociado de forma obscura e de costas para os cidadãos (mas, não aos lobbies corporativos, os principais agentes consultados durante todo o processo), o TTIP quer colocar em marcha mecanismos que reforçam o poder das multinacionais, frente à soberania dos Estados e da União Europeia.

Primeiro, propõe criar um tribunal de arbitragem privado para resolver desencontros entre empresas e Estados, o chamado ISDS, em suas siglas em inglês (Investor-State Dispute Settlement). Este cavalo de Troia das multinacionais permitiria, por exemplo, que um Estado tenha que indenizar potencialmente uma empresa por desejar aumentar o salário mínimo (como aconteceu no Egito), por proibir o fracking em seu território (como em Quebec) ou por querer defender a saúde pública contra as multinacionais do tabaco (como na Austrália).

Além disso, pretende criar o mecanismo de Cooperação Reguladora, cuja finalidade é conduzir o processo de harmonização legislativa entre Estados Unidos e União Europeia, de forma que, pouco a pouco, as duas regulações se ajustem.

Segundo o rascunho de negociação de 23 de dezembro, os Estados Unidos e a União Europeia deveriam oferecer “uma oportunidade razoável para que qualquer pessoa física ou jurídica, nacional ou estrangeira, que potencialmente possa ser afetada” por uma nova normativa possa “proporcionar informação através de um processo de consulta pública”. Ou seja, esta ferramenta permitirá às empresas multinacionais pressionar os governos e a própria União Europeia durante a elaboração de qualquer lei que lhes afete. É a institucionalização do lobby.

Sendo assim, enquanto o ISDS poderia servir para invalidar leis já existentes, consideradas contrárias aos interesses econômicos das grandes corporações, a Cooperação Reguladora funcionaria de maneira prévia ao processo legislativo, com a possibilidade de obstaculizar o direito dos Estados e da União Europeia em legislar. Trata-se de uma peça pré e pós-legislativa perfeita.

Por outro lado, o TTIP ameaça gravemente o atual modelo social, os serviços públicos, a agricultura, o meio ambiente, a propriedade intelectual e o bem-estar animal, pois busca suprimir as barreiras comerciais não alfandegárias. Ou seja, harmonizar as normativas e regulações dos dois lados do Atlântico. Por (mal) experiência prévia com tratados deste tipo (como o NAFTA entre Estados Unidos, Canadá e México), conhecemos as dinâmicas reais que implicaria:

– Em caso de existir uma convergência normativa no TTIP, na Europa, esta será efetuada jogando para baixo as políticas e regulações em matéria de direitos sociais, trabalhistas, ambientais, etc., já que é muito difícil imaginar que os Estados Unidos adequem as suas às europeias.

– Em caso de aprovação do TTIP sem convergência, haverá um dumping social, trabalhista, ambiental, etc.: as empresas transnacionais tentarão baratear seus custos, levando sua produção para lugares com menor proteção.

Dito de outro modo, caso aprovado, o TTIP acarretaria, entre muitos exemplos, a possibilidade de comercialização de alimentos, transgênicos, cosméticos e produtos químicos que hoje são proibidos na Europa por ser considerados nocivos para a saúde, o meio ambiente e a proteção animal.

Além disso, tal e como reconhece a própria Comissão Europeia, e apesar de ter este ano em Paris uma cúpula decisiva para lutar contra a mudança climática, ao fomentar o transporte transatlântico, o TTIP suporá um aumento das emissões de CO2.

Mas não é só isso, segundo um estudo da Universidade de Tufts, em Boston, o único realizado sob um modelo econômico das Nações Unidas que considera as variáveis como desemprego e desigualdade – no entanto, ausentes dos estudos da Comissão Europeia -, o TTIP suporia a perda de 600.000 empregos em toda a Europa.

Sendo assim, voltamos a nos perguntar: a quem o TTIP beneficia? Sem a menor dúvida, traria mais poder (e benefícios) às multinacionais e aos seus sócios na política, em detrimento dos direitos das pessoas da rua, das gerações futuras e do meio ambiente. Estamos diante de uma tentativa de rompimento do contrato social, nascido após a Revolução Francesa, onde “todos os poderes emanam do povo”, por um em que “todos os poderes emanam das empresas”. As multinacionais estão redigindo sua própria Constituição.

Desse modo, muita coisa está em jogo na votação – não vinculante e não definitiva, mas altamente simbólica – doParlamento Europeu sobre o TTIP, do dia 10 de junho, em Estrasburgo. Por variarem, os socialistas espanhóis e europeus terão sobre seus ombros uma responsabilidade enorme: decidir se estão do lado do benefício econômico (de uns poucos) ou do bem comum (para a maioria e para a Terra, hoje e amanhã).

Os socialistas colocam em jogo sua credibilidade, hoje em questão. Primeiro, porque conceberam a rejeição ao ISDScomo uma linha vermelha, e depois deram um giro de 180 graus para votar finalmente a favor na Comissão de Comércio Internacional, no último dia 28 de maio, junto com os conservadores e os liberais. Segundo, porque não seria compreensível que um partido que reivindica a tradição social-democrata terminasse cedendo seus poderes legislativos às grandes companhias transnacionais.

Felizmente, os cidadãos estão cada vez mais informados sobre o perigo deste tratado, como sinaliza as mobilizações crescentes em toda a Europa e nos Estados Unidos contra o TTIP. Muita coisa está em jogo: uma sociedade onde os interesses das multinacionais escrevam as leis de todas e todos ou uma sociedade onde esteja em primeiro lugar a justiça, a sustentabilidade e a democracia.

PARA LER MAIS:

  • 11/06/2015 – “O TTIP é a Constituição das multinacionais”, afirma eurodeputada do Podemos
  • 10/06/2015 – “Estados Unidos controlarão 60% do PIB mundial, se for assinado o TTIP e o acordo do Pacífico”
  • 16/01/2015 – TTIP, tirem as mãos da comida!

    “O TTIP é a Constituição das multinacionais”, afirma eurodeputada do Podemos

    http://www.ihu.unisinos.br/noticias/543400-o-ttip-e-a-constituicao-das-multinacionais-afirma-eurodeputada-do-podemos

    Às 17h45 da tarde de terça-feira, dia 9 de junho, o Parlamento Europeu decidiu prorrogar a votação sobre o relatório do TTIP [Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento], que aconteceria no dia 10 de junho. A explicação dada pelo presidente da câmara, Martín Schulz, considerou as divisões entre as duas forças majoritárias noParlamento: os socialistas e os populares europeus. Fontes de Bruxelas afirmaram ao jornal Diagonal que a paralisação na votação teria sido motivada pelo medo de que o “não” vencesse. Segundo destacam, além de ‘Os Verdes‘ e ‘A Esquerda Europeia‘, parte dos membros do grupo socialista estava calculando votar contra o tratado.

    Fonte: https://goo.gl/aRhUfP

    O que estava em discussão era um relatório de cem páginas sobre o TTIP que deve marcar o roteiro da comissária do Comércio, Cecília Malmström, na negociação do Tratado com os Estados Unidos. Algumas horas antes que o Parlamento adiasse a votação, Lola Sánchez (na foto, ao centro), eurodeputada do Podemose do grupo da esquerda europeia GUE/NGL, atendeu a ligação do jornal Diagonal para explicar o que iria ser discutido em Estrasburgo e que consequências oAcordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento teria para as sociedades europeias.

    A entrevista é de Pablo Elorduy, publicada pelo jornalDiagonal, 09-06-2015. A tradução é do Cepat.

    Eis a entrevista.

    Amanhã, o que será discutido no Parlamento?

    Amanhã, votaremos um relatório do Parlamento Europeu que expressará nossa postura sobre o TTIP. Não sabemos o que acontecerá, está tudo no ar. Isto demonstra a pouca confluência que existe a respeito do TTIP e como as posturas estão disputadas. Muitas coisas podem acontecer, e pode acontecer o caso do relatório não ser aprovado por razões que são diferentes em cada grupo parlamentar. Por razões altamente conflitantes.

    Para você, quais são as razões pelas quais não deve ir adiante?

    Uma das partes mais polêmicas do TTIP é a cláusula ISDS, que é a cláusula para resolver problemas entre corporações e Estados. De modo que quando uma corporação financeira considerar que uma lei nacional, regional ou local impeça a obtenção dos benefícios que espera, poderá demandar esse Estado e então será criada uma corte privada formada por três árbitros que irão decidir se o Estado tem que indenizar com dinheiro público essa empresa privada. Este assunto é muito discutível e é aqui onde está a raiz do problema do TTIP.

    No dia 24 de maio, os socialistas surpreenderam a opinião pública quando aceitaram a cláusula que reintroduz o ISDS no relatório do Parlamento. Esclareceram sua postura e a manterão na votação de amanhã?

    Desde aquela votação, desatou-se uma batalha dialética. Tentaram explicar a razão dessa mudança repentina de postura, sendo que haviam marcado o ISDS como linha vermelha, que nunca iriam ultrapassar e que nunca iriam aprovar. Todos nós tivemos uma surpresa. Contudo, agora, eles próprios apresentaram emendas que rebatem totalmente a inclusão do ISDS dentro do TTIP. Estas emendas serão votadas amanhã. É de esperar que o grupo socialista volte a mudar sua opinião em um giro de 180 graus e excluam o ISDS do TTIP. Se isto acontecer, se finalmente não houver ISDS, o grupo popular afirma que votaria contra o relatório em sua totalidade. De modo que, caso chegue a este ponto, o grupo popular votaria contra, a esquerda europeia votaria contra, os verdes e outros partidos votariam contra, sendo assim, podemos chegar à situação de que o relatório não siga adiante.

    Então, no Parlamento Europeu ficaria claro que não há uma opinião comum. Não é um cenário ruim porque representa a realidade. É que o TTIP é tão controvertido que não podemos concordar, porque as posturas são totalmente opostas.

    Quais outros caminhos existem para barrar o TTIP?

    Há muitas maneiras de barrá-lo. A votação de amanhã é chave para demonstrar como o tratado é controverso. É uma mensagem que lançamos não só à Comissão Europeia, mas também para toda a sociedade civil. A mobilização da sociedade civil é tremendamente importante. Além disso, já deu resultados: a mobilização social enfraqueceu muito as negociações, por exemplo, durante muitos meses, o ISDS foi excluído da mesa de negociações porque a comissão recebeu uma resposta categórica com aquela consulta pública em que 97% dos consultados se opuseram categoricamente ao ISDS. Vemos que está funcionando: é preciso continuar e aumentar a mobilização e o conhecimento por parte das pessoas. Também é muito importante que os meios de comunicação agora estejam falando sobre isto, para que as pessoas saibam o que está sendo tramado.

    Partidos como o Syriza são a esperança para detê-lo, caso a Comissão não ceda no empenho de levá-lo adiante?

    Sim, também temos o Conselho Europeu. É muito importante a posição que tanto o governo do Syriza como o Governo da Espanha irão tomar – que esperamos que mude de cor – e de outros Estados europeus que terão eleições gerais em fins deste ano e inícios do próximo.

    Há muitos pequenos passos pelos quais poderemos ir freando-o. Esperamos que, por fim, se convençam porque este é um tratado que pouquíssimas pessoas desejam. O que acontece é que as pessoas que o desejam são muito poderosas, são as grandes companhias, os fundos de investimento, os bancos, etc. No entanto, são apenas eles, os cidadãos não querem, muitíssimos partidos não querem e estou convencida de que muitos partidos que defendem oTTIP, se verdadeiramente perguntarem aos seus eleitores, verão que seus eleitores o rejeitam.

    Dizia Susan George que caso se aprove o tratado, qualquer Governo de mudança ficaria muito limitado. Como está repassando para companheiros seus, que estão entrando em governos locais e regionais, as limitações à soberania trazidas pelo TTIP?

    Não só às pessoas de dentro do Podemos, que são mais conscientes, mas também para alguém que não esteja muito por dentro politicamente ou que não está dentro de um partido ou de um movimento social e que acompanha pelos meios de comunicação de massas ou apenas pela TV. Estas são as pessoas que não possuem informação. O que é preciso explicar é que não apenas terá influência sobre os Governos nacionais, mas que influenciará até o menor município da região mais perdida da Espanha e de Portugal ou de qualquer lugar. Isto atingirá todos os níveis de Governo, atará as nossas mãos em relação à soberania legislativa. Mudará a forma como legislamos, desenvolvemos leis para nos proteger e para ampliar direitos e liberdades.

    É necessário pará-lo antes que continue avançando e, é claro, nunca permitir que isto seja aprovado, porque isto é um golpe de Estado. É a Constituição das multinacionais.

    Também é necessário explicar que aquilo que estão fazendo é um processo desconstituinte. Nem a Comissão Europeia, nem sequer o Parlamento Europeu – eleito democraticamente – possuem, nesse momento, um mandato dado pelos cidadãos que nos permita desconstruir toda a base legal e o aparato jurídico e legislativo que temos. Por isso, exigimos que seja feito um referendo em todos os Estados.

    Este referendo está sobre a mesa?

    Não, esta é a linha vermelha da grande coalizão europeia: do grupo socialista, do grupo popular e dos liberais. É uma linha que não atravessam. Significa muito que o grupo socialista introduza uma emenda que será votada amanhã para que o tratado seja misto, isto significa que terá que ser aprovado por cada um dos Estados membros. Coisa que até agora estava em suspense, algo que é bastante indignante.

    Nesse caso, caberia a cada Governo a decisão de convocar um referendo?

    Sim, mas caso ficasse reconhecido que este é um processo desconstituinte não teriam mais remédio a não ser submetê-lo ao referendo, assim como a falida Constituição Europeia, que teve que ser votada por referendo, obrigatoriamente, porque se reconhecia que era uma Constituição. Isto, eles não reconhecem como umaConstituição, mas para todos os efeitos é.

    Como afetam outros tratados como o TISA [Tratado sobre o Comércio de Serviços]? Que tipo de relações globais configura este impulso dos tratados que a União Europeia está levando adiante?

    O que vemos é que é um ataque das políticas neoliberais que vem de muitas frentes. Não é apenas o TTIP, existe oCETA [Acordo Integral de Economia e Comércio], um acordo muito parecido com o Canadá, que ainda não foi aprovado, mas que já foi redigido. Existe o TISA, que conhecemos há muito tempo, mas que é um tratado que segue mais devagar, porque são 50 países os que estão negociando em uma mesma mesa, e essas negociações vão levar muito mais tempo.

    O que vemos é que se trata da mesma política. É uma estratégia de acabar com os foros multilaterais. O que querem é impor, antes que cheguem outros ou antes de se sentarem em uma mesa com todos os países do mundo, um modelo econômico e de comércio que atinge todos os aspectos de nossa vida diária. É uma imposição de forma unilateral de um modelo para o restante do mundo, que não foi debatido em nível mundial… existindo foros para isso.

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