Nairobi, Quênia, 23/11/2011 – Quando os projetos de hortas financiados por doadores internacionais fracassaram na aldeia de Kalacha, perto do deserto de Chalbi, no Quênia, a população local propôs suas próprias ideias, que posteriormente mostraram ser a solução do problema.
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por Isaiah Esipisu*
Residentes de Kalacha propuseram que a água de um manancial no deserto fosse usado para irrigar o pasto autóctone, que poderia ser usado como forragem. Foto: Isaiah Esipisu/IPS
“Quando a horticultura foi introduzida por várias organizações não governamentais há cinco anos, realmente nos entusiasmamos, porque seria uma alternativa para nosso estilo de vida pastoril, que já estava ameaçado pelas mutantes condições climáticas”, disse Abdi Tuya, morador de Kalacha. “Contudo, muito tempo antes descobrimos que tudo era inútil, porque macacos e outros animais comiam as colheitas”, acrescentou.
Depois de consultas com membros da comunidade, o Programa de Pesquisa de Terras Áridas e Semiáridas (Kasal), do Instituto de Pesquisa Agrícola do Quênia, descobriu que a comunidade tinha uma ideia melhor. “Insistiram que queriam usar a água e a terra para cultivar pasto e assim alimentar suas cabras e seus camelos desnutridos, especialmente durante a seca”, disse à IPS o diretor do Kasal, David Miano.
A Província Nordeste sempre foi uma zona árida, e a mudança climática deixou as chuvas mais erráticas. O governo estima que mais de 50 milhões de animais domésticos na região correm risco de morrer, enquanto mais de 1,4 milhão de pessoas precisam urgentemente de ajuda alimentar por causa da seca. Diante disso, os moradores de Kalacha propuseram que a água de um manancial encontrado no deserto fosse usada para irrigar pasto autóctone, que poderia ser empregado como forragem.
“Isto obrigou nossos cientistas a iniciarem uma nova pesquisa para identificar os diferentes tipos de pastos autóctones que fossem tolerantes às secas e com maior valor nutricional, suficiente para alimentar os animais”, explicou Miano. E agora, dois anos depois, os agricultores se orgulham de terem salvo milhares de animais que teriam sucumbido pela última seca no Chifre da África. “O cultivo de pasto é a melhor coisa que me aconteceu. Todos os animais desnutridos são levados para as pastagens a fim de engordar. No ano passado, pude salvar 80 cabras que estavam sucumbindo pela seca”, contou Tuya, dono de 450 destes animais e de 15 camelos. Antes, a única opção teria sido sacrificar os animais.
Histórias de sucesso como a de Kalacha convencem os especialistas de que a África deveria buscar suas próprias soluções para se adaptar ao aquecimento global. Isto ganha maior relevância com a aproximação da 17ª Conferência das Partes (COP 17) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, que acontecerá entre 28 deste mês e 9 de dezembro na cidade sul-africana de Durban.
“Devemos aceitar a realidade de que o sucesso de um projeto em uma área não significa que pode ser aplicado em outra, mesmo que as características climáticas e geográficas forem as mesmas”, disse Rajendra Kumar Pachauri, presidente do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (IPCC). “Por exemplo, projetos com grande impacto na Mongólia podem não ter êxito na África”, ponderou Pachauri à IPS. O funcionário afirmou que as instituições de pesquisa deveriam se concentrar em soluções autóctones. “A pesquisa deve ser relevante para as necessidades locais, deve ser mais prática e estratégica”, destacou Pachauri.
Os especialistas chegaram a essa conclusão depois que vários projetos de adaptação na África demonstraram ser irrelevantes para os problemas locais. Um exemplo foi a introdução da algarobeira (Prosopis julifrora), arbusto nativo do México, da América do Sul e do Caribe, para que cobrisse várias áreas secas e que acabou sendo daninho para os moradores. Na Etiópia, estudos indicam que o arbusto teve impacto negativo na segurança alimentar da população, particularmente na região de Afar, onde se espalhou para terras aráveis.
“Embora a árvore seja usada para combustível, para fabricar cercas, na construção e para fazer carvão, ficaríamos felizes se alguém nos ensinasse a erradicar o Woyane hara (nome local da algarobeira)”, disse à IPS Ato Kebele, morador de Afar que trabalha em Addis Abeba, capital do país. “Gostaríamos de cultivar árvores autóctones em lugar deste inimigo”, afirmou.
No Quênia, os moradores do condado de Baringo, na região do Vale do Rift, apresentaram uma demanda, em 2007, contra a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). Os moradores disseram que, após esta agência ter introduzido o arbusto, este se propagou em suas fazendas e afetou os dentes de suas cabras. Como evidência apresentaram os animais desdentados. A justiça declarou a árvore nociva e ordenou ao governo destruir e criar uma comissão para avaliar os danos e compensar a comunidade.
No entanto, Alexander Alusa, conselheiro sobre mudança climática no governo queniano, alertou que, mesmo buscando soluções caseiras para os problemas da África, são necessárias políticas coerentes e unificadas para que sejam efetivas. “No Quênia, por exemplo, o governo que concedeu às populações locais partes na floresta de Mau, por intermédio do Ministério de Terras, é o mesmo que luta para proteger as zonas florestais por meio do Ministério do Meio Ambiente. Se as políticas estivessem harmonizadas não haveria confusão”, disse à IPS. Envolverde/IPS
* Este artigo é parte de uma série apoiada pela Aliança Clima e Desenvolvimento (CDKN).