Mulheres do Nepal vivem com terror do clima.

A nepalesa Suntali Shrestha, de 45 anos, esfrega as mãos com gesto nervoso ao lembrar as noites que passa insone, com medo de que soe o alarme de inundação enquanto dorme e fique debaixo d’água. “As sirenes estão sempre na minha cabeça, não me deixam em paz”, grita Suntali perante uma multidão reunida nesta pequena cidade do nordeste do Nepal para descrever as penúrias que passam por causa da mudança climática.

 

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11/11/2011

 

por Sudeshna Sarkar, da IPS

1110 Mulheres do Nepal vivem com terror do clima Mulheres do distrito de Dolakha, en Nepal, relatan cómo es vivir con terror a quedar sumergidas por el desborde de un lago glaciar. Foto: Sudeshna Sarkar/IPS.

 

Charikog, Nepal, 11/11/2011 – A maioria é mulher. Algumas tiveram que caminhar várias horas para participar deste tribunal sobre mulheres e mudança climática, com a esperança de serem ouvidas pelas autoridades, e, talvez, também pela 17ª Conferência das Partes da (COP 17) Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, que começará no dia 28 na cidade sul-africana de Durban.

O tribunal foi organizado no dia 30 de outubro pela Jagaran Nepal, uma entidade sem fins lucrativos com sede em Katmandu que se dedica a promover os direitos femininos, a paz e a governança, e pelo Mahila Utthan Kendra (Centro para a Elevação das Mulheres), com apoio da equipe de trabalho feminista do Chamado Mundial à Ação Contra a Pobreza (CGAP).

A reunião se concentrou em algumas aldeias de Dolakha, um distrito montanhoso 135 quilômetros a nordeste da capital, que está em risco de ficar submerso pelas águas. Nagdaha, a aldeia de Suntali, está à sombra do Tsho Rolpa, o maior lago glacial do Nepal, e agora o mais perigoso.

A 4.580 metros acima do nível do mar, no sopé do monte Gauri Shankar, de 7.146 metros, na Cordilheira do Himalaia, o Tsho Rolpa se formou e cresceu pelo derretimento da geleira Trakarding. Rodeado pela represa natural formada pelo barro e pelas pedras acumulados, o lago de 1,76 quilômetros quadrados cresce na medida em que o Trakarding derrete por causa do aquecimento global.

A temperatura média do Nepal aumenta 0,06 grau por ano, mas nas montanhas chega a 0,14 grau. Assim, diminuem as geleiras e aumentam a superfície e a quantidade de lagos na região do Himalaia. O Trakarding diminui 66 metros por ano e gera frequentes avalanches, que aumentam a pressão sobre a represa natural de Tsho Rolpa.

Desde a década de 1960, 17 lagos glaciais transbordaram no Nepal, causando morte e destruição. Numerosos estudos previram, em 1997, que o Tsho Rolpa sofrerá uma brutal cheia. Se a represa romper, um fluxo de 80 metros cúbicos de água colocaria em risco seis mil pessoas e uma central hidrelétrica de 60 megawatts.

A população local afirma que, no pior dos casos, o transbordamento do Tsho Rolpa também alteraria o Rio Tamakosi, tributário do caudaloso Kosi que flui por Tibete, Nepal e China e costuma causar inundações na temporada de monções neste país e na Índia. Um derretimento glacial só potencializaria seu poder devastador.

As autoridades instalaram 17 estações de alerta de inundações com sirenes, mas a população local afirma que algumas foram arruinadas pela guerra civil entre rebeldes maoístas durante dez anos. Além disso, as pessoas que viviam nas áreas mais perigosas e se deslocaram em 1997, retornaram já que o transbordamento não acontecia.

Os cartazes com indicações de alerta colocados pelas autoridades não têm significado para pessoas como Suntali, que não sabem ler nem escrever. “Não há escola em Nagdaha”, disse no tribunal Kamala Shrestha, de 24 anos que cria aves em sua granja. “A mais próxima está em Charikot, a duas horas de carro, por isso só duas ou três mulheres da aldeia sabem ler e escrever”, contou.

“Mesmo para comprar um analgésico temos de ir a Charikot”, acrescenta Kamala. “Além disso, o caminho não está apto para o tráfego de veículos, por isso tampouco podemos chegar ao mercado. Desejamos que o tribunal consiga que o governo construa uma escola, um centro de saúde e uma estrada.

A presidente da Jagaran Nepal, Sharmila Karki, diz que o informe do tribunal será enviado à COP 17. “Queremos que algum integrante de nossa comunidade apresente o assunto em Durban, mas está difícil”. O Nepal é um dos países mais vulneráveis à mudança climática, mas poucos têm consciência dos perigos. Além disso, as políticas têm uma grande ausência de perspectiva de gênero”, ressaltou Karki.

Quando uma primeira audiência aconteceu em Katmandu, em 2009, uma mulher denunciou que a mudança climática lhe causara prolapso de útero. “Ela contou que os riachos de sua aldeia estavam secando e por isso tinha de caminhar quase cinco horas para conseguir água”, recorda Karki. “Os médicos disseram que carregar muito peso por períodos prolongados pode causar prolapso de útero. Mas, muitos na audiência, ignorando isso, deram risadas”, acrescenta.

Segundo Karki, a situação piorou desde 2009. Na época as mulheres mencionavam as dificuldades do deslocamento pelas inundações, a insegurança alimentar e problemas de saúde. Agora também se queixam de estresse. O governo adotou no ano passado políticas para prevenir a violência doméstica, mas não há medidas para ajudar as mulheres a obterem justiça climática.

“Viver em um ambiente de terror psicológico também é uma violação dos direitos femininos”, alertou Karki. “As mulheres chefes de família estão submetidas a um enorme estresse, especialmente por não haver políticas para garantir seu acesso a recursos naturais, como água, nem a cuidados médicos ou educação, que precisam para lidar com as mudanças”, acrescentou.

(IPS)

 

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