Família austríaca disse não ao uso de plástico.

Seria possível viver na sociedade moderna sem usar plástico? Uma família austríaca, preocupada com os perigos para o meio ambiente e a saúde provocados por esse material, decidiu descobrir a resposta. Aquilo que deveria ter durado apenas um mês acabou se tornando um novo estilo de vida para ela.

 

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A reportagem é de Krisaten Allen, publicada no Der Spiegel e reproduzida pelo Portal Uol, 28-06-2012.

Tente imaginar como seria viver um único dia sem plástico. Nada de computador, telefone celular, carro e, sem dúvida, comidas pré-embaladas. A vida moderna, caracterizada pela onipresença do plástico, faz com que seja quase impossível evitar essa substância sintética. Mas, preocupada com a quantidade crescente de problemas de saúde e ambientais derivados do contato constante com o plástico, uma família austríaca decidiu tentar viver sem essa substância.

Em um novo livro publicado em alemão, intitulado “Plastikfreie Zone“, ou “Zona sem Plástico“, Sandra Krautwaschl explica como ela e a sua família se livraram de vários dos seus objetos de plástico e, hoje em dia, raramente compram produtos fabricados com esse material derivado do petróleo.

Tudo começou como uma experiência com a duração de um mês, mas desde então isso se transformou em um estilo de vida, diz Krautwaschl. Durante uma viagem de férias à Croácia, em 2009, essa fisioterapeuta de 40 anos de idade ficou impressionada com a frequência com que os seus três filhos lhe perguntavam de onde vinha todo o lixo encontrado na praia. Essa experiência a levou a refletir sobre a sua própria responsabilidade em relação ao problema.

“Embora nós façamos reciclagem na Áustria, isso não funciona no mundo inteiro. O fato de nós ainda estarmos comprando esse tipo de coisa contribui para a continuidade da produção de plástico”, disse ela a “Spiegel Online”.

Pouco após as férias da família, Krautwaschl assistiu também ao filme “Planeta Plástico“, de 2009, um documentário do cineasta austríaco Werner Boote que mostra como a quantidade enorme de plástico produzida no mundo inteiro é tóxica para o meio ambiente.

Segundo o filme, embora sejam necessários centenas de anos para que o plástico se decomponha, cerca de 240 milhões de toneladas dessa substância continuam sendo produzidas todos os anos, abarrotando aterros sanitários, poluindo o oceano e espalhando compostos carcinogênicos e outras substâncias perigosas para a saúde humana. A maioria do plástico é feita de petróleo – um recurso não renovável –, com métodos de produção que utilizam energia de forma intensiva e que prejudicam ainda mais o meio ambiente.

“Aquilo foi a gota d’água, e eu fiquei de fato indignada”, conta Krautwaschl. “Eu concluí que não poderia continuar agindo daquela forma”.

Um difícil começo
Uma das primeiras coisas que a família fez foi tentar remover todos os objetos feitos de plástico da sua casa. A foto na capa do livro mostra os integrantes da família sentados diante de uma montanha incrível de plástico, uma imagem que demonstra como o uso desse material se tornou parte da vida moderna. O próximo passo foi começar a encontrar alternativas: escovas de dente com cabo de madeira, recipientes de leite metálicos e embalagens feitas de vidro, papel ou metal.

Além disso, havia a questão do papel higiênico. Na tentativa de encontrar um substituto que não viesse em uma embalagem plástica, os filhos dela a princípio sugeriram que a família utilizasse jornais. Mas a tinta de impressão acabou se mostrando problemática, e o filho mais velho sugeriu a utilização de folhas de árvores, o que também estava longe de ser ideal. Eles acabaram descobrindo que as toalhas de papel reciclado usadas por vários restaurantes e banheiros públicos eram um bom substituto para o papel higiênico. Além de serem embaladas com papel, elas podem ser compradas em grande quantidade, o que possibilita uma de dinheiro.

Krautwaschl diz que o segredo para que a iniciativa funcione é não levar esse estilo de vida ao extremo. Ela admite que no começo foi difícil encontrar soluções, e que isso exigiu muita pesquisa.
“Algumas pessoas acreditam que nós estamos vivendo como pessoas da Idade da Pedra, mas essa é uma falsa impressão”, diz ela. “A vida tornou-se um pouco mais simples, tranquila e confortável”.

Os Krautwaschl-Rabensteiner, que moram próximo à cidade de Graz, no sul da Áustria, no vilarejo de Eisbach, que tem 3.000 habitantes, ainda usam equipamentos eletrônicos e outros produtos feitos de plástico como capacetes de bicicleta, mas eles dividem um carro com outra família e procuram comprar produtos usados sempre que possível.

Aprendendo a ser realista
O fato de aprender a pensar com mais cuidado sobre os materiais que eles usam diariamente alterou fundamentalmente a abordagem da família em relação às compras. “Isso modificou completamente o nosso comportamento como consumidores”, explica Krautwaschl.

Os membros da família aprenderam a parar e refletir para determinarem se necessitam de fato de um produto antes de adquiri-lo. Eles também aprenderam a ser realistas em relação ao objetivo de viver sem usar plástico.

“Nós tivemos que entender que isso não é 100% possível”, diz Krautwaschl. Por exemplo, até mesmo potes de vidro e metal trazem frequentemente pequenos pedaços de plástico dentro das tampas. Mesmo assim, com o tempo eles aprenderam a reduzir os resíduos plásticos a “quase zero”, e isso fez com que aumentasse a sensação de bem-estar da família, especialmente no que se refere à nutrição.

Parte do motivo para isso é o fato de os alimentos que não vêm em embalagens plásticas serem necessariamente mais frescos e muitas vezes também orgânicos. “Devido a isso, nós passamos a dar mais valor aos nossos alimentos”, diz Krautwaschl. “Hoje em dia praticamente nada dá errado quanto à nossa alimentação, e nós sempre usamos alimentos frescos”.

Naturalmente, isso significa que os alimentos passaram a representar uma fatia maior do orçamento familiar, que ela descreve como “médio”. Mas isso foi compensado pelos custos em outras áreas, especialmente no que se refere a um consumo médio menor. Ela diz que, de forma geral, eles atualmente gastam menos dinheiro.

No mundo anglófono, algumas famílias ou indivíduos já haviam se engajado nos últimos anos em experiências similares no sentido de viverem sem usar produtos de plástico. Na Europa, porém, a ideia é relativamente nova, diz Krautwaschl. Mesmo assim, amigos e conhecidos foram “contaminados” pela iniciativa da família de tirar o plástico da sua vida, e Krautwaschl espera que outros também sejam inspirados por isso, ainda que estes indivíduos venham apenas a reduzir um pouco o uso de plástico.

“Pessoas prósperas como nós podem se dar ao luxo de pensar nesse tipo de iniciativa, e muitas vezes elas são capazes de fazer uma mudança em seus estilos de vida”, conclui Krautwaschl.