Canoada vai se despedir da Volta Grande do Xingu.

A Volta Grande, um trecho de 100 km de um dos mais belos e importantes rios brasileiros, o Rio Xingu, será barrada para abastecer a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. Para despedir-se de uma paisagem que será definitivamente transformada quando Belo Monte entrar em operação, o ISA e a Associação Indígena Miratu Yudjá Xingu (Aimyx) programaram a canoada Bye Bye Xingu. Sem fins lucrativos, a canoada é ativista e irá reunir entre os dias 7 e 11 de setembro indígenas, pescadores, ribeirinhos e ativistas de várias regiões do Brasil. Promoverá assim, um encontro de pessoas com modos de vida distintos e que acreditam na importância da valorização da diversidade socioambiental do Brasil.

 

 

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por Leticia Leite, do ISA

Canoada Bye Bye Xingu irá percorrer trecho impactado por Belo Monte e promover diálogos sobre o futuro da Amazônia. Serão mais de 100 km em canoas tradicionais guiadas por indígenas e ribeirinhos

corredeira Canoada vai se despedir da Volta Grande do Xingu

Corredeira na Volta Grande do Rio Xingu

Instalada em uma região da Amazônia praticamente à margem do Estado, Belo Monte tem se tornado símbolo de inadimplência socioambiental. A canoada busca chamar a atenção para os problemas que os povos e comunidades do Xingu enfrentam há mais de 30 anos, quando a possibilidade de construção de uma usina na região foi anunciada. A proposta é promover um diálogo diferente com quem se dispuser a vir para Altamira e seguir em uma viagem pela cultura local e impactos da construção da terceira maior hidrelétrica do mundo.

O percurso

A preparação começa dia 7 de setembro, no Centro de Formação Bethânia, um espaço que pertence a Prelazia do Xingu e fica a 7 km do centro de Altamira. É lá que os participantes receberão as primeiras instruções dos guias locais e organizadores da expedição.

A largada será na manhã do dia 8 de setembro. A partir das 6h30 os participantes estarão reunidos no porto de Altamira. Serão três dias de remada, 112 km percorridos em canoas tradicionais da região, guiadas por indígenas, ribeirinhos e pescadores experientes na navegação no Xingu.

As canoas irão passar em frente a barragem principal do rio e ao sítio Pimental, canteiro de obra onde está sendo erguida a casa de força secundária da usina e ao lado do mecanismo de transposição terrestre de barcos, que tem sido avaliada como um transtorno para as comunidades afetadas.

A expedição vai beirar a TI Paquiçamba, território do povo Juruna e passará pela região da cachoeira Jeriquá, um dos mais belos trechos da Volta Grande, formado por cachoeiras, pedrais, bancos de areia e ilhas. Confira no mapa abaixo.

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Rodas de conversa sobre impactos da hidrelétrica em Terras Indígenas, alternativas energéticas e o futuro da Amazônia vão acontecer todas as noites durante a expedição. A primeira delas vai contar com a presença do ambientalista do Greenpeace Ricardo Baitelo.

Os participantes da canoada

As pessoas que se interessaram em participar da canoada vêm de várias regiões do Brasil, preocupadas com o rio e os povos do Xingu, e com as decisões políticas que envolvem o futuro da Amazônia.

Para poderem participar, fizeram uma pré-inscrição no site do evento, que foi submetida à avaliação dos organizadores.

Cada participante pagou uma taxa de inscrição para cobrir os custos logísticos da atividade como locação e transporte das canoas, fabricação de remos, alimentação e hospedagem. Vale lembrar mais uma vez que a canoada não tem fins lucrativos.

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Saiba mais

Quem são os Juruna

Juruna é o nome pelo qual o povo Yudjá da Volta Grande ficou conhecido nos contatos com os brancos. Os Yudjá, conhecidos por serem exímios navegadores, canoeiros, são também chamados de “os donos do rio”, pelo fato de, no passado, terem cruzado da foz as cabeceiras do Rio Xingu. Ao lado dos Arara da Volta Grande, são os grupos indígenas que vivem mais próximos dos canteiros de obras. Além de já conviverem com os impactos da obra há pouco mais de 10 km de suas terras, também terão de conviver com cerca de 80% de redução do fluxo de água após o barramento do rio. Será um grande teste de resistência da biodiversidade e dos povos que vivem neste trecho da Amazônia.

História

Imaginem um povo cuja população era de 2 mil pessoas em 1842 e em 2010 soma 348. Uma história marcada por aprisionamento, escravização, guerra e deslocamentos progressivos por conta das frentes de expansão econômica que marcam o processo de colonização da Amazônia.

Os Yudjá que hoje habitam o norte do Parque Indígena do Xingu (PIX) são descendentes dos índios que fugiram desta invasão. Os Juruna da Volta Grande do Xingu são o povo que resistiu, que permaneceu em seu território, mas foi absorvido pelo ciclo da borracha na região a partir do final do século XIX. Resistiram também aos mais diversos impactos da construção da rodovia Transamazônica e as pressões ao longo das últimas décadas devido a intensa grilagem e roubo de madeira em suas terras.
Com Belo Monte, os Juruna se veem, mais uma vez, ameaçados. As famílias dependem da pesca artesanal e ornamental para alimentação e geração de renda. Os estudos de impacto ambiental da Volta Grande do Xingu são inconclusivos. Nem os cientistas e nem os indígenas sabem, neste momento, as dimensões do impacto que a usina poderá causar no rio, com a possível extinção de espécies endêmicas, que só existem nesta região do planeta.

Sobre o ISA e Belo Monte

Hoje, Belo Monte é uma obra sub judice, e mais de 20 ações sem decisão final tramitam no Judiciário a respeito de violações às populações da região afetadas pela usina.

O ISA denuncia permanentemente as irregularidades do processo de Belo Monte desde que o governo autorizou o leilão da usina, em 2010. E publicou análises de todos os pareceres do Ibama sobre as condicionantes da usina. (Clique para ver o infográfico que mostra condicionantes não cumpridas).

As denúncias apontam que as mais graves inadimplências estão relacionadas aos povos indígenas. Os programas de prevenção ou diminuição dos impactos relacionados à saúde indígena e à proteção territorial e dos recursos naturais dos índios, por exemplo, só saíram do papel mais de dois anos após o início da instalação da usina. O resultado já se reflete na saúde destes povos. Em 2012, nove em cada 10 crianças das aldeias atingidas por Belo Monte apresentaram diarreia aguda por mais de uma vez.

* Publicado originalmente no site Instituto Socioambiental