A Extraordinária Ciência de Viciar em ‘Junk Food’.

Na noite de 08 de abril de 1999, uma longa fila de carrões ‘old fashion’ e táxis, voam para o quartel general da corporação Pillsbury (nt.: desde 2001 pertencente à gigante de alimentação General Mills), na cidade de Minneapolis/Minnesota, onde descarregam os 11 homens que controlavam as maiores companhia de alimentos das Américas. A Nestlé estava presente, bem como a Kraft e a Nabisco, da mesma forma a General Mills, a Procter & Gamble, a Coca-Cola e a Mars. Rivais até ontem, os executivos, os C.E.O.s e os presidentes das companhias chegam juntos para um raro e privativo encontro. Na pauta estava um só item: a epidemia emergente da e como lidar com ela. Dentro de um espírito de cordialidade, aqueles homens pareciam até bons amigos. No entanto, suas estaturas eram definidas por suas habilidades nas escaramuças de uns com os outros por aquilo que eles chamavam de “quota de estômago” — ou seja, a quantidade de espaço dos sistemas digestivos que cada companhia podia, em suas competições, abocanhar no mercado.

 

http://www.nytimes.com/2013/02/24/magazine/the-extraordinary-science-of-junk-food.html?pagewanted=all&_r=0

 

Grant Cornett for The New York Times
By MICHAEL MOSS
Published: February 20, 2013
Grant Cornett for The New York Times; Prop Stylist: Janine Iversen

James Behnke, um antigo executivo de 55 anos da Pillsbury, saudava os homens assim que eles iam chegando. Estava ansioso, mas também esperançoso sobre o plano que ele e outros poucos executivos destas companhias de alimentos, haviam arquitetado para engajar os C.E.O.s neste problema crescente de peso que grassava pelas Américas. “Nós estávamos muito preocupados, até porque legalmente a obesidade estava se tornando um grande problema”, lembra Behnke. “As pessoas estão começando a falar de impostos sobre o açúcar e há muita pressão sobre as companhias de alimentos”. Ficarem os chefes das companhias numa mesma sala para falar sobre qualquer coisa, ainda mais um tema sensível como esse, era um negócio complicado. Assim Behnke e seus parceiros que organizaram  o encontro, planejaram tudo meticulosamente  até ao aprimoramento da mensagem com aquilo que tinha de mais essencial. “Os CEOs das indústrias de alimentos são tipicamente pessoas que não são técnicas e por isso se sentem desconfortáveis quando vão a encontros onde as pessoas falam tecnicamente sobre temas, técnicos”, disse Behnke. “Eles não querem se sentir embaraçados, nem fazer declarações. Querem é manter sua indiferença e sua autonomia”.

Químico de formação com doutorado em ciências de alimentos, Behnke tornou-se chefe do departamento técnico da Pillsbury em 1979 e foi fundamental na criação de uma longa lista de produtos de sucesso, incluindo a pipoca de micro-ondas. Admirava profundamente sua empresa, mas em anos recentes vinha lhe crescendo um mal estar pelas fotos de crianças obesas sofrendo de diabetes, apresentado sinais precoces de hipertensão e doenças cardíacas. Nos meses que antecederam o encontro dos CEOs, envolveu-se em conversações com um grupo de especialistas da ciência de alimentos que vinha pintando um quadro cada vez mais sombrio da habilidade do público de enfrentar as formulações das indústrias  — desde os frágeis controles do organismo quanto a empanturrar-se aos poderes ocultos de certos alimentos processados a se tornarem ainda mais ávidas por eles. Era o tempo em que ele e um grupo de outros especialistas se inclinou a alertar os CEOs do que suas companhias podiam estar fazendo ao criarem e comercializarem produtos que podiam estar gerando imensas preocupações quanto à saúde das pessoas.

O encontro e a discussão tiveram lugar no auditório da companhia Pillsbury. O primeiro orador foi o vice presidente da Kraft chamado Michael Mudd. “Estou apreciando muito esta oportunidade para falar sobre a obesidade infantil e o desafio crescente que isso representa para todos nós”, começou Mudd. “Deixem-me dizer-lhes desde o início que este não é um assunto fácil. Não existem respostas fáceis — tanto para a comunidade ligada à saúde pública do que precisa fazer para colocar este problema sob controle como o que a indústria deve realizar em razão de lhe estar sendo imputada por muitos, como a responsável pelo que está acontecendo. Mas uma coisa está clara: para aqueles de nós que estão considerando difícil este tema, sejam os funcionários públicos de saúde sejam os especialistas de nossas próprias empresas, e estamos bem seguros de uma coisa, de que o que não podemos ficar mais é sem fazermos nada”.

Enquanto ele falava, ia clicando uma bateria de ‘slides’ — 114 ao todo — projetados sobre uma grande tela atrás dele. As imagens eram estarrecedoras. Mais da metade dos norte-americanos adultos estavam sendo agora considerados acima do peso, com quase um quarto da população adulta — 40 milhões de pessoas — clinicamente definidas como obesas. Entre as crianças, as taxas tinham aumentado mais do que o dobro desde 1980 e o número delas, consideradas obesas, tinha atingido mais do que 12 milhões. (Destaque-se de que isso estava acontecendo em 1999; as taxas nacionais de hoje subiram muitíssimo mais.) Os fabricantes de alimentos começam agora a ser responsabilizados por este problema através das informações dos slides — tanto pelas universidades e academia, como pelos Centers for Disease Control and Prevention/CDC, a Associação Norte-americana do Coração e a Sociedade Norte-americana do Câncer. O Ministro da Agricultura, sobre quem a indústria há muito tempo tem total domínio, chamou recentemente a obesidade como uma “epidemia nacional”.

Mudd fez então o inimaginável. Esboçou uma conexão com a última coisa no mundo que os C.E.O.s gostariam de ver ligada aos seus produtos: os cigarros. Primeiro veio uma citação de um professor da Universidade de Yale de Psicologia e Saúde Pública, Kelly Brownell, que era um defensor especial do ponto de vista de que a indústria de alimentos processados deve ser vista como uma ameaça à saúde pública: “Como cultura, nós já ficamos constrangidos pela propaganda das indústrias de fumo dirigida às crianças, e agora nós nos sentamos de braços cruzados enquanto as empresas de alimentos fazem a mesma coisa. E nós poderíamos demonstrar que o pedágio, cobrado da saúde pública por sua pobre dieta, rivaliza com aquele já cobrado pelo tabaco”.

“Se alguém na indústria de alimentos ainda duvidava de que há uma ladeira escorregadia lá fora,”, disse Mudd, “imagino que começaram a experimentar esta sensação especial exatamente neste momento”.

Mudd então apresentou o plano que ele e outros haviam planejado quanto ao problema da obesidade. Só terem os executivos reconhecido alguma culpabilidade já foi um primeiro passo importante, ele sabia, assim seu plano era começar com uma pequena mudança, mas crucial: a indústria deveria utilizar a experiência dos cientistas — tanto seus próprios como outros — para adquirir uma compreensão mais profunda do que levava os norte-americanos a comerem demais. Uma vez que isto fosse conseguido, o esforço poderia se desdobrar em várias frentes. Com certeza, não há como contornar o papel que as bebidas e os alimentos empacotados desempenham no excesso de consumo. Teriam que diminuir seu uso de sal, açúcar e gordura, talvez pela imposição de  limites. Mas não era apenas uma questão desses três ingredientes como também eram críticos os esquemas usados para anunciar e comercializar os seus produtos. Mudd propôs a criação de um “código para orientar os aspectos nutricionais dos alimentos, marketing, especialmente para as crianças.”

“Estamos dizendo que a indústria pode fazer um esforço sincero de ser parte da solução,” Mudd concluiu. “E fazendo-se assim, podemos auxiliar a desmantelar a crítica que está sendo construída contra nós.”

O que aconteceu depois não estava previsto. Mas de acordo com três participantes, quando Mudd parou de falar, aquele C.E.O. cujas façanhas recentes  no mundo dos supermercados haviam causado admiração ao resto do mercado, levantou-se para falar. Seu nome era Stephen Sanger, e ele era também a pessoa — como cabeça da General Mills — que teria mais a perder quando se fosse lidar com a questão da obesidade. Sob sua liderança, a General Mills suplantou não só nos corredores de cereais, como também em outros setores dos supermercados. A companhia da marca Yoplait transformou o tradicional café da manhã com iogurte sem açúcar numa verdadeira sobremesa. Ele agora tem duas vezes mais açúcar por porção do que o cereal com marshmallow da General Mills, marca Lucky Charms. E mais, em razão da imagem bem positiva do iogurte como uma saudável merenda, as vendas da Yoplait dispararam, com um ganho anual alcançando os $500 milhões de dólares. Encorajado pelo sucesso, o setor de desenvolvimento da empresa empurrou-a ainda mais para o topo, inventou uma variação de Yoplait que agora vem em um tubo de espremer — perfeito para crianças. Eles chamaram-na de Go-Gurt e implantaram nacionalmente semanas antes da reunião dos C.E.O.s  (Pelo final do ano, já teria alcançado US $100 milhões em vendas.)

De acordo com as fontes com quem conversei, Sanger começou relembrando de que o grupo dos consumidores é “instável”. (Sanger declinou ser entrevistado.) Algumas vezes eles se preocupam quanto ao açúcar, outras quanto à gordura. A General Mills, diz ele, age responsavelmente tanto para o público como para os acionistas ao oferecer produtos para satisfazerem consumidores que fazem dietas e outros tipos de compradores, como os que vão atrás de baixo açúcar adicionado aos grãos integrais. Mas a maioria da população muitas vezes, diz ele, compra o que lhe apraz e que tenha um bom paladar. “Não me falem sobre nutrição,” teria ele dito, falando com o timbre de um consumidor típico. “Fale-me sobre sabores e se este produto tem melhor sabor. Não fiquem na minha volta tentando me vender algo que não seja saboroso.”

Para reagir aos críticos, disse Sanger, poderia até prejudicar a virtude das receitas que tornaram seus produtos tão bem sucedidos. Porém, a General Mills não quer retroceder. Ele iria estimular seus companheiros da empresa a irem em frente e questionava seus pares ali mesmo que fizessem o mesmo. A resposta de Sanger definitivamente terminou com o encontro.

“O que eu posso dizer?” Perguntou-me James Behnke anos mais tarde. “Não funcionou. Essa gente não foi tão receptiva como imaginávamos que poderia ser.” Behnke escolheu deliberadamente suas palavras. Quis ser justo. “Sanger tentava dizer, ‘Olha, nós não vamos torcer aqui o parafuso com as joias da coroa de nossa companhia e mudarmos nossas formulações porque um punhado de caras de jaleco branco estão, por ai, preocupados com a obesidade.’ ”

O encontro foi extraordinário, em primeiro pela admissão interna de culpa. Mas eu também fiquei impressionado de como os organizadores desta reunião tiveram pressentimento sobre o futuro. Hoje, um em cada três adultos é considerado obeso, junto com um em cada cinco crianças, além de 24 milhões de norte-americanos serem afetados pelo diabetes tipo 2, muitas vezes causadas pela pobre dieta, contando ainda com outros 79 milhões de pessoas que apresentam uma pré-diabetes. Mesmo a gota, uma forma dolorosa de artrite agora conhecida como a “doença de pessoa rica” por sua associação com a gula, está afetando 8 milhões de norte-americanos.

O público e as companhias conheceram agora, — ou pelo menos desde este encontro — que, por décadas, se sabe que alimentos açucarados, salgados e gordurosos não são o melhor alimento para todos nós nas quantidades que os consumimos. Assim, por que os números de diabetes e obesidade, além de hipertensão, continuam espiralando ascendentemente fora de controle? Não é apenas uma questão de má vontade por parte do consumidor e uma atitude de ‘dar às pessoas o que elas querem’ por parte dos fabricantes de alimentos. O que eu achei, depois de mais de quatro anos de pesquisas e relatórios, foi de que há um esforço consciente — nos laboratórios e reuniões de marketing, muito além dos corredores de supermercado — de se levar as pessoas ao vício em alimentos que são acessíveis e baratos. Eu conversei com mais de 300 pessoas empregadas ou ex-empregadas das indústrias de alimentos processados, de cientistas a profissionais de marketing a serviço dos C.E.O.s. Alguns eram delatores convictos, enquanto outros eram relutantes quando eram apresentados a algumas das milhares de páginas de memorandos secretos que obtive de dentro das operações das indústrias de alimentos.

O que se segue é uma série de pequenos estudos de caso de um punhado de pessoas cujo trabalho pode então, em perspectiva e agora, lançar luzes sobre como os alimentos são gerados e vendidos a pessoas que, mesmo não sendo impotentes, são extremamente vulneráveis à intensidade dessas formulações industriais bem como a suas campanhas de marketing:

I. ‘Neste campo, eu sou o que viro o jogo.’

John Lennon não podia encontrar este produto na Inglaterra, assim ele precisava que caixas e caixas dele fossem despachados de New York para regar suas sessões de “Imagine”. Os ‘Beach Boys‘, os ‘ZZ Top‘ e a atriz Cher, estipulavam nos contratos de seus shows, adendos de que deveriam ter este produto disponível em seus camarins quando em turnês. Hillary Clinton perguntava por ele quando viajava como primeira dama e mesmo depois, as suítes dos hotéis onde se hospedava eram fartamente abarrotados com ele.

O que todos eles queriam, nada mais era do que a bebida ‘Dr Pepper‘, que até 2001 ocupou a confortável terceira posição na prateleira dos refrigerantes, depois da Coca-Cola e da Pepsi. Mas, em seguida, uma enxurrada de derivados dos dois gigantes dos refrigerantes surgiram nas prateleiras — bebidas flavorizadas de limão e lima, baunilha e café, framboesa e laranja, brancos e azuis além dos ‘clear‘ — o que no jargão da indústria de alimentos é conhecido como “extensões de linha”, e a bebida ‘Dr. Pepper‘ começou a perder a sua quota de mercado.

Respondendo a esta pressão, a empresa ‘Cadbury Schweppes‘ criou seu primeiro derivado ou -spin­off-, diferente de sua versão ‘diet’, em toda sua história de 115 anos. Era um refrigerante vermelho brilhante com a marca abaixo do nome ‘Dr Pepper‘: “Red Fusion“. “Se é para restabelecer o Dr Pepper em suas taxas de crescimento históricas, nós temos de acrescentar mais emoção,” disse o presidente companhia, Jack Kilduff. Um mercado particularmente promissor, apontado por Kilduff, foi o “rápido crescimento entre as comunidades hispânica e afro-americana.”

No entanto, os consumidores odiaram o ‘Red Fusion‘. “O ‘Dr Pepper’ é o meu refri favorito de toda hora, assim eu estava curiosa sobre o ‘Red Fusion’,” escreveu uma mãe californiana de três filhos, alertando para se afastarem deste outro “Pepper”. “É nojento. Engasga a gente. Nunca mais.”

Tocada pela rejeição, a ‘Cadbury Schweppes’ em 2004 voltou-se para a lenda da indústria de alimentação, chamado Howard Moskowitz. Ele havia estudado matemática e obteve seu Ph.D. em psicologia experimental em Harvardalém de dirigir uma firma de consultoria em White Plains/NY, onde por mais de três décadas “otimizou” uma variedade de produtos para a ‘Campbell Soup’, a ‘General Foods’, a ‘Kraft’ e para a ‘PepsiCo’. “Eu otimizei sopas,” Moskowitz contou-me. “Otimizei pizzas e molhos de salada e pickles. Neste campo, eu sou quem vira o jogo.”

No processo de otimização de produto, engenheiros de alimentos alteram uma série de variáveis com a única intenção de encontrar a versão mais perfeita (ou versões) de um produto. Consumidores comuns são pagos para passarem horas sentados em salas onde eles tocam, sentem, bebericam, cheiram, giram e provam qualquer produto que estiver em questão. Suas opiniões são colocadas num computador e os dados são catalogados e classificados através de um método estatístico chamado análise conjunta que determina quais características serão mais atraentes para os consumidores. Moskowitz gosta de imaginar que o seu computador é dividido em espaços como se fossem silos, onde cada uma das características é armazenada. Mas não é simplesmente uma questão de comparar o ‘Color 23‘ com o ‘Color 24‘. Nos projetos mais complicados, o ‘Color 23‘ deve ser combinado com o ‘Syrup 11‘ e o ‘Packaging 6‘, e mais e mais, em aparentemente infinitas combinações. Mesmo para serviços em que a única preocupação é sabor e as variáveis são limitadas aos ingredientes, gráficos e diagramas sem fim serão expelidos para fora do computador de Moskowitz. “O modelo matemático mapeia os ingredientes para as percepções sensoriais que esses ingredientes criam,” ele me disse, “e então eu posso ligá-los a um novo produto. Esta é a abordagem de engenharia.”

O trabalho de Moskowitz sobre o molho do espaguete Prego foi relembrado em 2004, pelo jornalista e escritor Malcolm Gladwell, junto a uma conferência do TED em Monterey, Califórnia: “Depois de . . . meses e meses, eu tinha um montão de dados sobre como a população norte-americana sente quanto ao molho de espaguete. . . . E com certeza, se você se sentar e analisar todos os dados sobre molho, você percebe que todos os norte-americanos caem em um dos três grupos. Há pessoas que gostam de seu molho puro. Outros gostam de molho picante. E há ainda os que gostam de extra espesso. E nesses três fatos, o terceiro foi o mais significativo, porque na época, no início de 80, se se fosse ao supermercado não se encontraria este tipo de molho. A Prego virou-se para Howard e eles disseram, ‘Estão me dizendo que um terço dos norte-americanos anseiam por molho de espaguete extra espesso e ninguém ainda está atendendo suas necessidades?’ E ele disse, ‘Sim’. E a Prego então retornou com seu molho completamente reformulado e saiu com uma linha de extra espesso que de imediato assumiu completamente o negócio de molho de espaguete neste país…. Este é o presente de Howard para o povo norte-americano…. Ele muda de maneira fundamental a forma como a indústria alimentar pensa em fazer você feliz.”

Bem, sim e não. Uma coisa Gladwell não mencionou é que a indústria de alimentos já sabia algumas coisas sobre como fazer o povo feliz — e isso começou com o açúcar. Muitos dos molhos da Prego — se com queijo, espesso ou ‘light’ — têm uma característica em comum: o ingrediente mais volumoso depois do tomate, é o açúcar. Uma mera meia xícara da sopa, a Prego Traditional por exemplo, tem o equivalente a mais do que duas colheres de chá de açúcar, tanto quanto mais do que dois ‘cookies’ da marca Oreo. E também libera um terço do sódio recomendado para a maioria dos adultos norte-americanos por um dia inteiro. Fazendo estes molhos, a Campbell abastecia com os ingredientes onde estavam o sal, o açúcar e, para algumas versões, a gordura, enquanto o técnico Moskowitz fornecia a otimização. “Mais, não é necessariamente o melhor,” escreveu Moskowitz em sua própria conta do projeto Prego. “À medida que aumenta a intensidade sensorial (digamos, de doçura), os consumidores primeiro dizem que eles gostam mais do produto, mas finalmente com um nível médio de doçura, eles gostam bem mais do produto (este é o seu ponto ótimo, ou de ‘êxtase’).”

Encontrei, primeiramente, Moskowitz em um dia frio na primavera de 2010 no Harvard Club, no centro da cidade em Manhattan. Enquanto conversávamos, ele deixou claro que já havia trabalhado em inúmeros projetos visando criar alimentos mais saudáveis, insistindo de que a indústria poderia estar fazendo muito mais para reduzir a obesidade. Diz que não tinha nenhum escrúpulo sobre seu próprio trabalho pioneiro em descobrir o que agora membros da indústria referem-se regularmente como sendo “o ponto de êxtase” ou sobre qualquer um dos outros sistemas que ajudou às indústrias de alimentos a gerarem maior ansiedade de ingestão por este tipo de alimentos nos consumidores. “Não há nenhuma questão moral para mim”, disse ele. “Eu fiz a melhor ciência que pude. Lutava para sobreviver e não tive o luxo de ser uma criatura moral. Como pesquisador, eu estava à frente do meu tempo.”

O caminho de Moskowitz para dominar o ponto de êxtase começou seriamente, não em Harvard, mas poucos meses depois da formatura, a 8 km de Cambridge, na cidade de Natick, onde o exército dos EUA o contratou para trabalhar em seus laboratórios de pesquisa. Os militares vêm tendo uma ligação peculiar no que se relaciona a alimentos: como fazer os soldados comerem mais rações quando estiverem em atividade. Eles sabem que, ao longo do tempo, os soldados gradualmente vão achando suas refeições prontas cada vez mais enjoativas que querem jogá-las longe, meio comidas, não obtendo todas as calorias que necessitam. Mas o que estava gerando este aborrecimento com esta comida de bandeja, era um mistério. “Então comecei perguntando aos soldados a frequência com que eles gostariam de comer isso ou aquilo, tentando descobrir quais os produtos que eles achariam chatos”, disse Moskowitz. As respostas que obteve eram inconsistentes. “Eles gostavam de alimentos saborosos como tetrazzini de peru, mas só no começo porque rapidamente se cansavam dele. Por outro lado, alimentos corriqueiros como pão branco nunca iriam deixá-los muito animados, mas poderiam comer toneladas e toneladas deles sem sentirem que tinha tido suficiente.”

Esta contradição é conhecida como “saciedade sensorial específica.” Em termos leigos, é a tendência para grandes e distintos sabores sobrecarregando o cérebro que responde pressionando seu desejo de ter mais. Saciedade sensorial específica também tornou-se um princípio orientador para a indústria de alimentos processados. Os maiores sucesso ou ‘hits’ – sejam eles Coca-Cola ou Doritos — devem seu êxito a fórmulas complexas que excitam as papilas gustativas bastante a ponto de seduzi-las, mas não têm um sabor prioritário e distinto que informe ao cérebro que deve parar de comer.

Trinta e dois anos depois de começar a experimentação com o ponto de êxtase, Moskowitz recebe um telefonema da Cadbury Schweppes pedindo-lhe para criar uma boa extensão de linha para Dr Pepper. Passei uma tarde em seus escritórios de White Plains, enquanto ele e seu vice-presidente de pesquisa, Michele Reisner, percorriam comigo os meandros da campanha da Dr Pepper. A Cadbury queria que seu novo sabor tivesse cereja e baunilha acima do gosto básico do Dr Pepper. Assim, havia três ingredientes principais para se brincar: um aroma doce de cereja, o doce da baunilha e o do xarope adocicado conhecido como “Sabor Dr Pepper”.

Encontrar o ponto de êxtase necessitou a preparação de 61 fórmulas sutilmente distintas — 31 para a versão convencional e 30 para a ‘diet’. As fórmulas foram então submetidas a 3.904 degustações organizadas em Los Angeles, Dallas, Chicago e Filadélfia. Os provadores de Dr Pepper começaram a trabalhar por meio de suas amostras, repousando por cinco minutos entre cada gole para restaurar suas papilas gustativas. Depois de cada amostra, deram respostas numericamente classificadas para um conjunto de questões: quanto eles gostaram de maneira geral? Quão forte é o sabor? Como eles se sentem quanto ao sabor? Como eles descreveriam a qualidade deste produto? Quais as possibilidades deles comprarem este produto?

Os dados de Moskowitz — compilados num relatório de 135 páginas para o fabricante — são tremendamente refinados, mostrando como diferentes pessoas e grupos sentem sobre o sabor forte de baunilha em relação ao suave, os vários aspectos do aroma e a poderosa força sensorial que os cientistas de alimentos chamam “sensação na boca.” Esta é a maneira como um produto interage com a boca, conforme definido mais especificamente por uma série de sensações relacionadas, de secura ao grudento à liberação de umidade. Estes são os termos mais familiares aos ‘sommeliers’ (nt.: provadores muito exclusivos de vinhos), mas a sensação na boca dos refrigerantes e de muitos outros itens alimentícios, especialmente daqueles ricos em gordura, está transferida apenas para o ponto de êxtase em sua habilidade de prever o quanto de desejo o produto irá induzir.

Agregados ao sabor, os consumidores também testavam em sua resposta à cor que provou ser altamente sensível. “Quando aumentávamos o nível do sabor Dr Pepper, ficava escuro e o gosto desaparecia,” disse Reisner. Estas preferências podem também ter suas referências cruzadas pela idade, sexo e raça.

Na página 83 do relatório, uma fina linha azul representa a quantidade de sabor Dr Pepper que é preciso para se alcançar o máximo apelo. A linha tem a forma de um U invertido, assim como a curva de ponto de êxtase que Moskowitz estudou 30 anos antes, em seu laboratório do exército. E na parte superior do arco, não um único ponto de doce, mas sim uma faixa de doçura, dentro da qual o “êxtase” era viável. Isso significava que a Cadbury poderia manejar com seu ingrediente chave, a calda açucarada do Dr. Pepper nesta faixa, sem cair fora do intervalo e perder o “êxtase”. Em vez de usar 2 mililitros do ingrediente básico, por exemplo, poderia usar 1,69 mililitros e conseguir o mesmo efeito. O potencial de poupança é apenas alguns pontos percentuais e isso não significa muito para os consumidores individuais que estão contando calorias ou gramas de açúcar. Mas para o Dr. Pepper, acrescenta-se uma economia colossal. “Isso se parece com nada,” disse Reisner. “Mas é um monte de dinheiro. Um monte de dinheiro. Milhões.”

A bebida que surgiu a partir de todas as variações do Moskowitz tornou-se conhecida como ‘Cherry Vanilla Dr Pepper’, e provou ser bem sucedida muito além de qualquer coisa que a Cadbury teria imaginado. Em 2008, a Cadbury dividiu seu setor de refrigerantes, onde estava também as bebidas Snapple e 7-Up. O ‘Dr Pepper Snapple Group‘ desde então foi avaliado em mais de US $11 bilhões.

II. ‘A Hora do Almoço é Toda Sua’.

Algumas vezes as inovações dentro da indústria de alimentos acontece nos laboratórios, com os cientistas buscando um ingrediente específico para alcançar o maior dos fascínios. E outras, como no caso da crise com a marca de carne embutida ‘Oscar Mayer Bologna‘, a inovação envolveu colocar os velhos produtos em novas embalagens.

Os anos 80 foram tempos duros para a marca Oscar Mayer. O consumo de carne vermelha caiu mais do que 10% em razão da gordura ter se tornado sinônimo de colesterol, entupimento de artérias, ataques de coração e derrames cerebrais. A ansiedade instalou-se na sede da companhia em Madison, Wis., onde os executivos preocupavam-se com seu futuro e a pressão que eles enfrentaram vinda dos novos patrões, a companhia de tabaco Philip Morris.

Bob Drane era o vice presidente da empresa para estratégias e desenvolvimento de novos negócios quando a empresa ‘Oscar Mayer‘ empurrou-o para tentar encontrar algum caminho para reposicionar a marca de carnes ‘Bologna’ além de outras marcas de carne com problemas que haviam caído em popularidade e vendas. Encontrei-me com Drane em sua casa em Madison e os registros que tinha guardado sobre o nascimento daquilo que viria a ser muito mais do que sua solução para o problema da carne da empresa. Em 1985, quando Drane começou a trabalhar no projeto, suas ordens eram para “descobrir como sincronizar o que temos.”

O primeiro movimento de Drane foi tentar zerar não só o que os norte-americanos pensavam sobre carne processada, mas o que eles pensavam sobre refeições. Ele organizou sessões com foco num grupo de pessoas realmente responsáveis pelas compras dos produtos da Bolonha — as mães —. E a forma como elas falaram, fez com que ele percebesse que o problema mais urgente para elas era o tempo. As mães trabalhadoras, esforçavam-se para fornecer alimentos saudáveis, é claro, mas elas falaram longamente e com verdadeira paixão, sobre a loucura de todas as manhãs, essa correria como num pesadelo para fazer o café da manhã, arrumar a mesa e ainda providenciar o lanche embrulhadinho para as crianças e logo tê-las fora da porta de casa. Ele resumiu as observações delas para mim da seguinte maneira: “É terrível. Eu estou lutando como uma barata tonta. Meus filhos me pedindo coisas. E eu tentando me arrumar para ir para o trabalho, ao mesmo tempo que embrulho seus lanches. Não sei mais o que fazer.” O que as mães lhe revelaram, Drane disse, foi “uma verdadeira mina de ouro de decepções e problemas”.

Ele montou uma equipe de cerca de 15 pessoas com habilidades variadas, do projetista da ciência de alimentos à pessoa ligada à publicidade, para criarem algo completamente novo — uma refeição pré-embalada adequadamente que teria como seu principal cerne a carne fatiada ‘Bolonha‘ da empresa e o presunto. Eles queriam adicionar pão, naturalmente, por que quem comeu o ‘Bolonha‘ sem ele? Mas nisso surgiu um problema: não havia maneira de o pão permanecer fresco por dois meses, tempo que seu produto precisa ser armazenado nos varejistas ou nos refrigeradores dos supermercados. Biscoitos, no entanto, poderiam — então eles acrescentaram um punhado de bolacha arredonda no pacote. Usar o queijo foi o próximo passo óbvio, em função do aumento de sua presença em alimentos processados. Mas que tipo de queijo iria funcionar? Começou com ‘cheddar’ natural, desintegrado e não cortado muito bem, então eles mudaram para variedades processadas que poderiam dobrar e ser cortadas além de poderem ficar armazenadas indefinidamente. Ou, por outro lado, poderiam economizar outros dois centavos por unidade, usando um produto ainda menor chamado de “chesse food (nt.: comida de queijo?)”, que teve menor pontuação do que queijo processado em testes de gosto. O dilema de custo foi resolvido quando a companhia ‘Oscar Mayer‘ fundiu-se com a transnacional ‘Kraft’ em 1989 e essa empresa não tinha queijaria, ficando todo o queijo como processado que viria de sua nova irmã e a preço de custo.

A equipe do Drane mudou-se para um hotel nas proximidades da empresa, onde eles partiram para encontrar a combinação certa de componentes bem como a embalagem. Eles se reuniram em volta de umas mesas onde tinham sacolas e sacolas cheias de carne, queijo e bolachas além de toda a sorte de materiais para embrulhar. Tudo estava ali disponível para deixar suas imaginações voarem. Depois de muitas voltas, e de fazerem e desfazerem, seu caminho através de uma série de falhas, foi a construção de um modelo que eles se apoiaram: o do jantar da tevê norte- americana — e depois de algum debate sobre nomes (Lunch Kits? Go-Packs? Fun Mealz?), os produtos ‘Lunchables‘ nasceram (nt.: produtos embalados com compartimentos onde estão os componentes separados prontos para serem montados para o lanche).

Depois de lançados, as bandejinhas, com os compartimentos, sumiam das prateleiras do supermercado. As vendas bateram o fenomenal número de US $218 milhões nos primeiros 12 meses, mais do que qualquer um estivesse preparado para tal. Fato que trouxe a próxima crise para Drane. Os custos de produção foram tão altos que eles estavam perdendo dinheiro com cada bandejinha que produziam. Então Drane voou para Nova York, onde se reuniu com funcionários da Philip Morris que prometeram dar-lhe o dinheiro que ele precisava para manter o processo. “A coisa difícil é descobrir algo que vai vender,” ele disse. “E descobrir como obter o custo certo.” Projetou-se uma perda de US $6 milhões em 1991, mas em vez disso, as bandejas voaram mesmo; no ano seguinte, ganharam US $8 milhões.

Com os custos de produção aparados e os lucros chegando, a pergunta seguinte era: como expandir a franquia?, e foi o que fizeram, moveram com uma das regras cardeais dos alimentos processados: em caso de dúvida, adicionar açúcar. “O produto ‘Lunchables’ com uma sobremesa é uma extensão lógica”, um funcionário da ‘Oscar Mayer‘ relatou aos executivos da Philip Morris no início de 1991. O “alvo” permanecia o mesmo, como foi para regular os ‘Lunchables’ — ou seja, “mães ocupadas” e “mulheres que trabalham”, em idades entre 25 e 49 — e o “sabor incrementado” atrairia os compradores que tinham crescido entediados com os produtos nas bandejinhas atuais. Um ano mais tarde, a sobremesa ‘Lunchable’ que se transformou num ‘Fun Pack‘ (nt.: tipo ‘lanche feliz’ da MacDonald), viria com uma barra de “Snickers“, um pacote de chocolate M&M ou um copinho com pasta de amendoim ‘Reese‘ bem como uma bebida açucarada. A equipe ‘Lunchables’ começou usando a ‘Kool-Aid’ e um refrigerante da linha ‘cola’  para, em seguida, colocar uma ‘Capri Sun‘ para depois a Philip Morris fixar esta bebida para estabilização de marcas.

Finalmente, uma linha de bandejas, apropriadamente chamada ‘Maxed Out‘, foi lançada. Tinha algo como nove gramas de gordura saturada ou quase o máximo recomendado por dia para crianças, com até dois terços da recomendação máxima para sódio e 13 colheres de chá de açúcar.

Quando eu perguntei a Geoffrey Bible, antigo C.E.O. da Philip Morris, sobre esta mudança para maior quantidades de sal, açúcar e gordura nas comidas dirigidas a crianças, ele sorriu e observou que mesmo na sua primeira implantação, o produto ‘Lunchables’ também suportou críticas. “Um artigo dizia algo como ‘Se formos desmontar o produto, o item mais saudável é o guardanapo’. ”

Bem, mas eles têm um boa quantidade de gorduras, investi. “Ai tu apostas”, diz ele. “Ou seja, mais bolachas.”

A atitude predominante entre os gestores das empresa de alimentos — durante a década de 90, pelo menos, antes que a obesidade se tornasse uma preocupação premente — foi com a lei da oferta e da procura. “As pessoas podiam apontar para esses produtos e dizer ‘eles têm muito açúcar, muito sal,’ ”  disse Bible. “Bem, mas isso é o que os consumidores querem, e não estamos colocando uma arma em sua cabeça para comê-lo. O que está ai é o que eles querem. Se lhe dermos menos, vão comprar menos e o concorrente tomará nosso mercado. Então estamos numa espécie de prisão.” (Bible mais tarde iria pressionar a Kraft para reconsiderar sua dependência de sal, açúcar e gordura).

Quando chegaram no produto ‘Lunchables’, eles tentaram adicionar ingredientes mais saudáveis. De volta ao início do processo, Drane experimentou com cenouras frescas, mas rapidamente desistiu, já que componentes frescos não podem ser operados dentro dos limites do sistema de alimentos processados. Normalmente são necessárias semanas ou meses de transporte e armazenamento antes do alimento chegar nas prateleiras do comércio varejista. Mais tarde, eles desenvolveram uma versão de bandeijinha com baixo teor de gordura, com carnes, queijo e biscoitos que foram formulados com menos gordura, mas demonstraram ter um sabor inferior, e daí vendeu mal e rapidamente foi abandonada.

Quando me encontrei com funcionários da Kraft em 2011 para discutirmos os seus produtos e políticas sobre nutrição, tinham deixado de lado a linha de produtos ‘Maxed Out’. Tentavam melhorar o perfil nutricional da linha ‘Lunchables’, incrementando através de pequenas mudanças pouco perceptíveis para os consumidores. Em toda a linha dos “Lunchables’, eles disseram ter reduzido o sal, o açúcar e a gordura em cerca de 10 por cento, e as novas versões, destacando fatias de tangerina e abacaxi, estavam em desenvolvimento. Estas seriam promovidas como versões mais saudáveis, com “fruta fresca”, mas sua lista de ingredientes — contendo acima de 70 itens, com sacarose, xarope de milho, xarope de milho rico em frutose e fruta concentrado tudo na mesma bandeijinha — foi intensamente criticada fora da indústria.

Uma das respostas da empresa às críticas é de que as crianças não comem o produto da linha ‘Lunchables’ todos os dias — e acima de tudo, quando eles tentaram alimentá-las com produtos mais saudáveis, as crianças elas mesmas foram reticentes quanto ao seu consumo. Quando seus pais embrulham como lanche cenouras frescas, maçãs e água, elas não são confiáveis para comê-lo. Uma vez na escola, muitas vezes destroem os alimentos saudáveis em seus sacos marrons de embrulho, indo direto aos produtos adocicados.

Essa ideia — de que as crianças estão no controle — tornou-se o conceito chave nas evoluções das campanhas de marketing para as bandejas. Naquela que provou ser sua maior realização, a equipe do ‘Lunchables’ iria mergulhar na psicologia do adolescente, para descobrir que não era a comida nas bandejas que empolgava as crianças; foi uma sensação de poder que ele trouxe às suas vidas. Como Bob Eckert, então o C.E.O da ‘Kraft’, definiu este produto em 1999: “O ‘Lunchables’ vai além do lanche. É algo que mostra que, na verdade, as crianças são capazes de optar por aquilo que querem comer, em qualquer hora e em qualquer lugar.”

O alvo primeiro da campanha da Kaft sobre este produto, era a mãe. Ela podia estar muito atordoada pelo trabalho de preparar o lanche, mas amaram suficiente seus filhos ao lhes oferecer este presente pré-embalado. No entanto, como o foco girou para as crianças, no sábado de manhã os desenhos animados, ‘cartoons’, começaram a trazer anúncios que ofereciam uma mensagem diferente: “Todo o dia, vocês têm que fazer o que eles mandam,” dizia a propaganda. “Mas a hora do lanche é toda de vocês.”

Com esta estratégia de marketing em ação e a pizza ‘Lunchables’ — a massa crocante em um compartimento, o queijo, a calabresa e o molho em outros — provando ser um sucesso espantoso, o mundo inteiro do ‘fast food‘ de repente se abriu para que a Kraft prosseguisse. Eles saíram com uma temática mexicana para o ‘Lunchables’ chamado ‘Beef Taco Wraps‘; um ‘Mini Hot Dog Lunchable‘; um ‘Mini Burger Lunchable‘, e também passou a criar uma via de forma que a ‘Oscar Mayer‘ vendesse suas salsichas. Lá por 1999, as panquecas — que incluía o xarope, o ‘glacê’, as balas doces ‘Lifesavers‘ e o suco Tang, uma enorme quantidade de 76 gramas de açúcar — além dos waffles, passaram a ser,  por um tempo, também parte da franquia Lunchables.

As vendas anuais se mantiveram em crescimento, passando de 500 para US $800 milhões de dólares. Na última contagem, incluem-se as vendas na Grã-Bretanha, eles estavam se aproximando da marca de US $1 bilhão. O produto ‘Lunchables’ foi mais do que um sucesso; agora era um tipo específico de produto. Finalmente, mais de 60 variedades de ‘Lunchables’ além de outras marcas de bandejinhas, apareceriam nas prateleiras dos supermercados. Em 2007, a Kraft até tentou criar um ‘Lunchables Júnior‘ dirigidos para criancinhas de 3 a 5 anos de idade.

Na coleção preciosa dos registros que documentou a ascensão do produto ‘Lunchables’ e a arrebatadora mudança que ele trouxe aos hábitos da hora do lanche,  deparei-me com uma foto da filha de Bob Drane, que ele tinha colocado para a apresentação do ‘Lunchables’ que mostrava para os projetistas de alimentos. A foto foi tirada no dia do casamento de Monica Drane em 1989, e ela estava de pé do lado de fora da casa de família em Madison. Era uma noiva linda, em um vestido branco, segurando uma das bandejas amarelas novinha em folha.

Durante a reportagem, finalmente tive a oportunidade de lhe perguntar sobre isso. Realmente ela era muito fã deste produto? “Acho que devia ter algum deles na geladeira,” ela me disse. “Eu devo ter provavelmente tirado um deles antes de irmos para a Igreja. Minha mãe até brincou de que ele realmente era como um outro de seus filhos, afinal meu pai investiu tanto tempo e energia nele.”

Monica Drane tinha três dos seus filhos no momento em que falamos, com idades de 10, 14 e 17. “Eu não acho que meus filhos já tenham comido um ‘Lunchable’,” disse-me elas. “Eles sabem que eles existem e que o seu avô Bob inventou-os. Mas nós os alimentamos de forma muito saudável.”

Bob Drane, fez uma breve pausa quando lhe perguntei se, olhando para trás, sentia-se orgulhoso de ter criado o sistema das bandejinhas. “Muitas coisas são compromissos”, disse ele. “E eu acredito que é fácil racionalizar qualquer coisa. No final, eu desejava que o perfil nutricional do produto pudesse ter sido melhor, mas eu não vejo o projeto inteiro como alguma coisa que não seja uma contribuição positiva para a vida das pessoas.”

Bob Drane ainda hoje conversa com as crianças sobre o que elas gostam de comer, mas sua abordagem foi alterada. Ele faz voluntariado com uma organização sem fins lucrativos que busca construir uma melhor comunicação entre as crianças em idade escolar e seus pais e o que é adequado na miscelânea de seus problemas. Ao lado das lutas acadêmicas, está a obesidade infantil. Drane também preparou um resumo do processo da  indústria de alimentos que ele apresentou aos estudantes de medicina da Universidade de Wisconsin. E enquanto ele não nomear o seu ‘Lunchables’ neste documento e citar numerosas causas para a epidemia de obesidade que está ai, mantém toda a indústria responsável. “O que fazer com o ensino da M.B.A. da Universidade de Wisconsin sobre como ter sucesso em ‘marketing’?” questiona em sua apresentação para os estudantes de medicina. “Descubra o que os consumidores querem comprar e dê-lhes a rodo. Vender mais, mantém o seu emprego! Como os comerciantes muitas vezes traduzem essas ‘regras’ na ação com os alimentos? Nosso cérebro límbico adora açúcar, gordura e sal…. Assim formule produtos para liberar estes ingredientes. Talvez acrescentar ingredientes de baixo custo para aumentar as margens de lucro. Assim, ‘superdimencione’ para vender mais…. E anuncie/promova para prender os ‘usuários persistentes’. Muita culpa acaba indo por ai!”

III. ‘Isso é chamado de Fuga da Densidade Calórica.’

Em um simpósio para cientistas de nutrição, em Los Angeles no dia 15 de fevereiro de 1985, o professor de farmacologia da Helsinki, chamado Heikki Karppanen, contou a história do notável esforço da Finlândia para tratar do seu hábito de ingestão de sal. No final da década de 70, os finlandeses consumiam grandes quantidades de sódio, ingerindo em média mais de duas colheres de chá de sal por dia. Como resultado, o país tinha desenvolvido problemas significativos com elevada hipertensão arterial e os homens na parte oriental da Finlândia apresentavam a maior taxa de doença fatal cardiovascular do mundo. A pesquisa mostrou que esta epidemia não era apenas uma particularidade genética ou um resultado de um estilo de vida sedentário — ele também era devido aos alimentos processados. Então quando as autoridades finlandesas mobilizaram-se para resolver o problema, eles foram direto aos fabricantes. (A resposta finlandesa funcionou. Cada item das prateleiras que estavam com grande quantidade de sal passou a ser marcado com destaque com o aviso de “Alto teor de sal.” Lá por 2007, o consumo da Finlândia de sal per capita tinha caído em um terço. E essa mudança — juntamente com a melhoria dos cuidados médicos —  foi acompanhada por um declínio de 75% a 80% no número de mortes por doenças cardíacas e acidentes vasculares cerebrais.).

A apresentação do professor Karppanen foi recebida com aplausos, mas um homem no meio da multidão parecia particularmente intrigado com este relato. Assim que Karppanen deixa o palco, o homem interceptou-lhe e perguntou se eles poderiam falar mais durante o jantar. A conversa mais tarde naquela noite não era nada daquilo que Karppanen estava esperando. Seu anfitrião na verdade tinha interesse em sal, mas com um ponto de vista bastante diferente. O nome do homem era Robert I-San Lin, e de 1974 a 1982, havia trabalhado como a cientista-chefe da corporação Frito-Lay, o fabricante de quase US $3 bilhões/ano de Lay, Doritos, Cheetos e Fritos.

O período em que Lin esteve na corporação ‘Frito-Lay’ coincidiu com os primeiros ataques feitos pelos defensores da nutrição aos alimentos salgados e os primeiros clamores para que os regulamentadores federais reclassificassem o sal como um aditivo alimentar de “risco” e que deveria estar submetido a controles severos. Nenhuma empresa tomou esta ameaça seriamente — ou mais pessoalmente — do que a ‘Frito-Lay‘, explicou Lin a Karppanen durante o seu jantar. Três anos depois que ele havia deixado a ‘Frito-Lay‘, ainda estava angustiado sobre sua incapacidade para efetivamente mudar as práticas e as receitas da empresa.

Por acaso, deparei com uma carta que Lin enviou a Karppanen, três semanas depois do jantar, perdida no meio dos arquivos que eu tinha tido acesso. Anexado à carta tinha um memorando escrito quando Lin ainda estava na Frito-Lay. Detalhava alguns dos esforços da empresa na defesa do sal. Rastreei Lin em Irvine, na Califórnia, onde passamos vários dias no meio dos memorandos internos da empresa, papéis com as estratégias de ação, documentos e anotações manuscritas que ele tinha guardado. Os documentos foram evidentes quanto à preocupação que Lin tinha tido em relação aos consumidores e da intenção da empresa de usar a ciência, não para resolver os problemas de saúde, mas para enganá-los. Enquanto esteve na ‘Frito-Lay‘, Lin e outros cientistas da empresa falaram abertamente sobre o consumo excessivo de sódio em todo o país e o fato de que, como Lin disse-me mais de uma vez, “as pessoas ficaram viciadas em sal.”

Quase nada havia mudado lá por 1986, exceto de que a Frito-Lay se encontrava em uma rara raia fria. A empresa apresentou uma série de produtos de alto nível que falharam miseravelmente. Toppels, um biscoito com cobertura de queijo; Stuffers, um escudo com uma variedade de recheios; Rumbles, um lanche de granola pequeno — todos iam e vinham num piscar de olhos, e a empresa abocanhou US $52 milhões. Ao mesmo tempo, a equipe de marketing foi acompanhado por Dwight Riskey, especialista em desejos que tinha sido um aprendiz no Monell Chemical Senses Center (nt.: Centro Monell de Sentidos Químicos) na Filadélfia. Ai fez parte de uma equipe de cientistas que detectou que as pessoas poderiam vencer seus hábitos de dependência ao sal simplesmente abstendo-se por um tempo que fosse suficiente para que suas papilas gustativas retornassem a um nível normal de sensibilidade a alimentos salgados. Ele também tinha feito um trabalho sobre o ponto de êxtase, mostrando como o fascínio a um produto é contextual, influenciado em parte por outros alimentos que uma pessoa esteja comendo, e que muda com a idade das pessoas. Isto pareceu ajudar a explicar por que a ‘Frito-Lay‘ estava tendo tanta dificuldade para vender lanches novos. O maior bloco único de clientes, os ‘baby boomers’ (nt.: como são chamados os norte-americanos que nasceram depois da 2ª guerra), tinha começado a bater a meia-idade. Segundo a pesquisa, isto sugere que seu gosto para lanches salgados — tanto na concentração de sal quanto no volume que comem, estavam definhando. Junto com o resto da indústria de alimentos dos salgadinhos, a ‘Frito-Lay‘ antecipou as mais baixas vendas em razão do envelhecimento da população, e planos de marketing foram ajustados para focar ainda mais atentamente os consumidores mais jovens.

Mesmo que as vendas de salgadinhos não tenha declinad0 como todo mundo tinha projetado, a ‘Frito-Lay‘ lança produtos que acabam sendo mal sucedidos. Debruçado sobre os dados, um dia no escritório de sua casa, Riskey, tentando entender exatamente quem estava consumindo todos os salgadinhos,  percebeu que ele e seus colegas tinham feito uma leitura equivocada ao longo de todo o processo. Eles tinham medindo os hábitos de comer salgadinhos em diferentes faixas etárias e assim estavam vendo o que eles esperaram previamente, de que os consumidores mais velhos comiam menos do que aqueles que tinham seus 20. Mas o que eles não estavam medindo, Riskey percebeu, é de como estes hábitos dos ‘boomers‘ podiam ser comparados a eles mesmos quando estavam lá na faixa dos 20 anos. Quando ele trouxe um novo conjunto de dados de vendas e realizou o que chamou de um estudo de coorte, seguindo um único grupo ao longo do tempo, uma imagem muito mais animadora — para a ‘Frito-Lay‘, enfim — emergiu. Os ‘baby boomers’ não estavam comendo menos salgadinhos, a medida que envelheciam. “Na verdade, assim que as pessoas vão envelhecendo, seu consumo de todos os segmentos — os cookies, os doces, os biscoitos, os chips — foram subindo,” disse Riskey. “Não só continuavam comendo o que já comiam quando eram mais jovens, como estavam comendo mais ainda destes mesmos produtos.” Na verdade, todas as pessoas nos EUA, em média, estavam comendo mais salgadinho do que costumavam há tempos atrás. A taxa de consumo foi se alongando para cima até cerca de 200 gramas a cada ano, com a ingestão média de salgadinhos como batata frita e biscoitos de queijo, indo para uns 6 quilos por ano.

Riskey tem uma teoria sobre o que causou este surto: comer comidas reais tornou-se uma coisa do passado. Os ‘baby boomers‘, especialmente, pareciam ter cortado definitivamente as refeições regulares. Eles eliminaram o café da manhã quando tinham reuniões de manhã cedo. Da mesma forma como pularam o almoço quando foi necessário então recuperar o atraso no trabalho por causa dessas reuniões. Como passaram por cima do jantar quando seus filhos estavam fora até tarde ou cresceram e foram embora de casa. E quando eles ignoraram estas refeições, substituíram por lanches. “Nós olhamos para esse comportamento e dissemos: ‘ Oh, meu Deus, as pessoas foram deixando estas refeições de um lado e de outro’,” disse-me Riskey. “Puxa! Foi incrível”. Isto levou à próxima realização, que os ‘baby boomers‘ não representavam “uma categoria madura e sem expansão. É uma categoria que tem enorme potencial de crescimento”.

Os técnicos em alimentos pararam de se preocupar sobre a invenção de novos produtos e em vez disso abraçaram o método mais confiável do setor para fazer com que os consumidores comprem mais: a extensão de linha. Ao clássico da ‘Lay‘, os chips de batata, juntou-se sal & vinagre, sal & pimenta e creme de leite & Cheddar. Eles eliminaram o sabor Chili-Cheese-flavored Fritos e o Cheetos foi transformado em 21 variedades. A ‘Frito-Lay‘ tinha um formidável complexo de pesquisa, perto de Dallas, onde cerca de 500 químicos, psicólogos e técnicos conduziam pesquisas que custavam acima de US $30 milhões por ano e o corpo da ciência estava focado com intensos montantes de recursos sobre questões como trituração, sensação de boca e aroma para cada um desses itens de pesquisa. Seu instrumental incluía um dispositivo de $40 mil dólares que simulava uma boca mastigando para testar e aperfeiçoar os ‘chips’, bem como descobrir coisas como o perfeito ponto de ruptura: as pessoas gostam de um ‘chip‘ que se rompa com cerca de quatro quilos de pressão por polegada quadrada (nt.: destaque é feito pela tradução. Ciência séria?).

Para ter uma sensação mais adequada sobre seu trabalho, liguei para Steven Witherly, cientista de alimentos, que escreveu um guia fascinante para membros da indústria intitulado, “Por que os seres humanos gostam de Junk Food (nt.: comida lixo)”. Eu lhe trouxe dois sacos cheios com uma variedade de ‘chips’ para provar. Ele foi direito ao Cheetos. “Este”, disse Witherly, “é um dos alimentos mais maravilhosamente construído no planeta, em termos de puro prazer”. Ele assinalou uma dúzia de atributos ao ‘Cheetos‘ que fazem com que o cérebro diga que quer mais. Mas o que ele focou bastante foi a incrível habilidade de misteriosamente inchar para se derreter na boca. “Isso é chamado de fuga da densidade calórica”, disse Witherly. “Se algo se derrete rapidamente, seu cérebro deduz que não há calorias nele… assim se pode objetivamente comê-los por tempo ilimitado”.

Quanto a seus problemas de marketing, os executivos da ‘Frito-Lay‘, numa reunião, em março de 2010, se apressaram a informar a seus investidores em Wall Street de que os 1,4 bilhões de ‘baby boomers‘  em todo o mundo, não estavam sendo negligenciados. Redobraram seus esforços para entenderem exatamente o que os ‘boomers‘ mais queriam em um ‘chip’. E que era basicamente tudo: grande gosto, máximo êxtase, mas mínima culpa quanto à saúde e mais maduresa do que inflar. “Eles lancham muito”, disse a diretora de marketing da ‘Frito-Lay‘, Ann Mukherjee, aos investidores. “Mas o que eles estão procurando é muito diferente. Eles estão procurando por novas experiências, experiências de comida de verdade”. A ‘Frito-Lay‘ adquiriu a Stacy’s Pita Chip Company, que foi iniciada por um casal de Massachusetts que fazia sanduíches num trailer e começou servindo ‘pita chips‘ para seus clientes em meados da década de 90. Nas mãos da ‘Frito-Lay‘, os ‘pita chips‘ tinham em média 270 miligramas de sódio — quase um quinto do máximo recomendado por dia para a maioria dos adultos norte-americanos — e foram um enorme sucesso entre os ‘baby boomers‘.

Os executivos da ‘Frito-Lay‘ também falaram sobre a atual procura da companhia de um “projeto sobre sódio”, que se esperava, em breve, que iria derrubar as cargas de sódio em 40%. O C.E.O. da empresa, Al Carey, assegurou aos seus investidores que não precisavam se preocupar em perda de vendas. Os ‘baby boomers‘ iriam ver menos sal como uma luz verde para fazerem seus lanches como nunca antes.

Há um paradoxo atuando aqui. Por um lado, a redução de sódio nos lanches é louvável. Por outro lado, essas alterações também poderiam resultar de que os consumidores comeriam mais. “A grande coisa que vai acontecer aqui é remover as barreiras para os ‘boomers‘, dando-lhes permissão para continuarem lanchando”, disse Carey. As perspectivas para produtos com doses inferiores de sal foram tão incríveis, acrescentou ele, que a empresa estabeleceu como sua mira quanto ao uso do projeto do sal para conquistar o mercado de lanches mais difícil de todos: as escolas. Ele citou, por exemplo, a iniciativa de escola e comida defendida por Bill Clinton e a American Heart Association, que procura melhorar a nutrição dos lanches das escolas, limitando sua carga de sal, açúcar e gordura. “Imaginem isso”, disse Carey. “Uma batata chip que tem excelente sabor e que se qualifica para esta aliança entre Clinton e a A.H.A., voltada para as escolas…. Pensamos que temos todas as condições para se fazer tudo isso com a batata chip. Agora imaginem ter esse produto nas escolas, onde as crianças poderão tê-lo e crescerem com ele, sentindo-se bem ao comê-lo”.

A citação de Carey lembrou-me algo que li na fase inicial da minha reportagem, um relatório de 24 páginas preparado para ‘Frito-Lay‘, em 1957, por um psicólogo chamado Ernest Dichter. As batatas chips da companhia, ele escreveu, não vendiam tão bem como poderiam, por uma razão simples: “enquanto as pessoas gostam e desfrutam das batatas chips, sentem-se culpadas por gostarem delas…. Inconscientemente, as pessoas esperam ser punidas por ‘se deixarem levar’ e apreciá-las.” Dichter listou sete “medos e resistências” para os ‘chips’: “você não pode parar de comer; eles estão lhe engordando; eles não são bons para você; eles são gordurosos e dúvidas quanto ao comer; eles são muito caros; é difícil de armazenar as sobras; e eles são ruins para as crianças”. Ele passou o resto de seu memorando estabelecendo suas prescrições, que iriam se tornar amplamente aplicadas não apenas pela ‘Frito-Lay‘, mas também por toda a indústria. Dichter sugeriu que a ‘Frito-Lay‘, evitasse empregar a palavra “frita”, quando se referisse a seu chips e adotasse, em vez disso, o termo que soasse mais saudável – “torrado”. Para contra atacar ao “medo de se deixar levar”, ele sugeriu a reembalagem dos chips em sacos menores. “Os consumidores mais ansiosos, aqueles que têm os medos mais profundos sobre sua capacidade de controlar seu apetite, tendem a perceber a função do novo pacote e selecioná-lo”, disse ele.

Dichter aconselhou a ‘Frito-Lay‘ a tirar seus chips para fora do reino dos lanches ‘entre refeições’ e transformá-los em um item sempre presente na dieta norte-americana. “O aumento da utilização da batata chips e de outros produtos da ‘Lay‘ como um item regular das refeições servidas por restaurantes, bares e sanduícherias deveria ser encorajada de forma bem objetiva”, disse Dichter, citando uma série de exemplos: “batata frita com sopa, com fruta ou aperitivos de suco vegetal; batatas chips servidas como um vegetal sobre o prato principal; batata frita com salada; batata frita com pratos de ovos no café da manhã; batata frita acompanhando o pedido de sanduíches”.

Em 2011, o New England Journal of Medicine publicou um estudo que lançava nova luz sobre o ganho de peso na América do Norte. Os sujeitos — 120.877 homens e mulheres — eram todos profissionais da área de saúde e provavelmente estariam mais consciente sobre nutrição, assim os resultados  poderiam subestimar a tendência global. Usando dados de 1986, os pesquisadores monitoram tudo o que os participantes comem, bem como sua atividade física e o tabagismo. Eles descobriram que, em quatro anos, os participantes se exercitaram menos, assistiram mais TV e ganharam uma média de 1,70 quilos. Os pesquisadores analisaram os dados quanto ao conteúdo calórico dos alimentos que estavam sendo comidos e detectaram ser os maiores contribuintes para o ganho de peso, incluindo carne vermelha e carnes processadas, as bebidas adoçadas com açúcar e as batatas, incluindo como purê e como fritas. Mas o alimento de maior peso de indução foi a batata chip. A camada de sal, o teor de gordura que recompensa o cérebro com sentimentos instantâneos de prazer, o açúcar que existe não como aditivo, mas no amido da batata mesma — tudo isto se combina para tornar o alimento perfeito e viciante. “O amido é facilmente absorvido”, disse-me Eric Rimm, professor associado de epidemiologia e nutrição da Harvard School of Public Health e um dos autores do estudo. “Mais rapidamente do que uma quantidade similar de açúcar. O amido, por seu turno, faz com que os níveis de glicose no sangue vão ao seu pico”— o que pode resultar numa ansiedade por comer mais e mais.

Se os norte-americanos lanchassem apenas ocasionalmente e em pequenas quantidades, isso não apresentaria o problema enorme que ele traz. Em razão das vultosas somas de dinheiro e esforços que foram investidos ao longo de décadas na engenharia destes produtos e depois inexoravelmente na venda deles, os efeitos que surgiram eram praticamente impossíveis de se prever. Mais de 30 anos se passaram desde que Robert Lin estava primeiramente envolvido com a ‘Frito-Lay‘ na determinação da empresa para lidar com a formulação de seus lanches. Mas assim que nós nos sentamos na mesa de sua sala de jantar, classificando seus registros, um sentimento de pesar ainda se estampou em seu rosto. Na sua opinião, três décadas foram perdidas, o tempo que ele e um monte de outros competentes cientistas passaram à procura de formas de aliviar a dependência de sal, açúcar e gordura. “Eu não pude fazer muito a respeito disso,” ele me disse. “Eu me sinto tão triste quanto ao público”.

IV. ‘Este Povo Precisa um Monte de Coisas, mas Não de uma Coke’.

A atenção crescente daquilo que os norte-americanos acabam pagando por colocarem em suas bocas, forçou uma nova e célere corrida das empresas de alimentos processados face as preocupações quanto à saúde. Pressionadas pela administração Obama e os consumidores, tanto a Kraft, como a Nestlé, a Pepsi, a Campbell e a General Mills, entre outras, começaram a cortar os volumes de sal, açúcar e gordura em muitos de seus produtos. E com os defensores dos consumidores pressionando com mais intervenções sobre o governo, a Coca-Cola produziu umas notícias como manchetes em janeiro quando liberou propagandas que promoviam sua água engarrafada e suas bebidas de baixas calorias como forma de conter a obesidade. Como se previa, os anúncios atrairam uma nova saraivada de escárnio de toda a crítica, que apontou a continuação da empresa em vender Coca-cola açucarada.

Um dos executivos com quem falei longamente foi Jeffrey Dunn, que, em 2001, aos 44 anos, estava dirigindo como presidente e diretor de operações mais da metade dos US $20 bilhões de dólares que a Coca-Cola girava em vendas anualmente, tanto da América do Norte como do Sul. Em um esforço para controlar tanto quanto possível sua fatia do mercado, a Coke estendeu seu marketing agressivo para áreas especialmente pobres ou vulneráveis dos Estados Unidos, como Nova Orleans — onde as pessoas estavam bebendo o dobro de Coca-Cola do que a média nacional — ou Rome, Geórgia, onde o consumo per capita foi de quase três Cokes por dia. Na sede da Coke em Atlanta, os maiores consumidores eram referidos como “heavy users (nt.: usuários compulsivos) “. “O outro modelo que utilizamos foi “bebidas e bebedores'”, disse Dunn. “Quantos bebedores tenho? E quanto de bebidas eles ingerem? Se você perdeu um desses usuários compulsivos, se alguém decidiu só parar de beber Coca-Cola, quantos bebedores você teria que obter, a baixa velocidade, para compensar esse usuário perdido? A resposta é: muito. É mais eficiente ter meus usuários existentes, bebendo muito mais”.

Um dos capitães de Dunn, Todd Putman, que trabalhou na Coca-Cola de 1997 a 2001, disse que o objetivo tornou-se muito maior do que simplesmente bater as marcas rivais. A Coca-Cola esforçou-se vender mais do que qualquer outra coisa do que daquilo que as pessoas bebiam normalmente, inclusive leite e água. Os esforços de marketing da divisão se resumia a uma pergunta, Putman disse: “Como podemos dirigir maiores quantidades de bebida em maior número de corpos e mais e mais vezes?” (Em resposta às observações do Putman, a Coca-Cola diz que seus objetivos mudaram e que agora se foca em fornecer aos consumidores produtos sem ou com baixa caloria).

Fazia parte de sua gestão freqüentes viagens ao Brasil, onde a empresa tinha começado recentemente um impulso para aumentar o consumo de Coca-Cola entre os muitos brasileiros que vivem em favelas. A estratégia da empresa foi reembalar a Coca-Cola em garrafas pequeninas, mais acessíveis, por apenas 20 centavos de dolar cada uma. A Coca-Cola não estava sozinho em ver o Brasil como um potencial benefício; a Nestlé iniciou a implantação com batalhões de mulheres nos pobres, a venda de alimentos processados no estilo norte-americano, de porta em porta. Mas a preocupação de Dunn era a Coca-Cola, e, em uma viagem, quando andava no meio de uma das áreas carentes, teve uma epifania. “Diz uma voz em minha cabeça: ‘Essas pessoas precisam de um monte de coisas, mas não de Coca-Cola’. Quase vomitei.”

Dunn retornou para Atlanta, determinado a fazer algumas mudanças. Ele não queria abandonar o negócio dos refrigerantes, mas queria tentar orientar a empresa de um modo mais saudável, e uma das coisas que ele fez, foi parar o marketing da Coke nas escolas públicas. As empresas independentes e concessionárias consideraram estes seus planos como reacionários. Um diretor de uma delas enviou uma carta à direção da Coca-Cola, pedindo a cabeça de Dunn. “Ele disse que o que eu tinha feito, havia sido a pior coisa que tinha visto em 50 anos no negócio,” falou Dunn. “Apenas para aplacar esses esquerdistas loucos dos distritos escolares que estavam tentando manter as pessoas longe da sua Coca-Cola. Disse que eu era uma vergonha para a empresa e que deveria ser demitido.” Em fevereiro de 2004, ele foi.

Dunn disse-me que falar hoje sobre os negócios na Coca-Cola não é nada fácil e, em razão de continuar trabalhando em empresa do sector alimentar, não é sem risco. “Você realmente não quer que eles tenham raiva de você”, ele disse. “E eu não quero dizer que, assim, eu vá terminar no fundo do mar. Mas eles não têm um bom senso de humor quando se trata deste tipo de assunto. Eles são uma empresa muito, muito agressiva.”

Quando me encontrei com Dunn, disse-me não apenas sobre seus anos na Coca-Cola, mas também sobre seu novo empreendimento de marketing. Em abril de 2010, ele se une a três executivos na  Madison Dearborn Partners, uma empresa de capital privado com sede em Chicago, com um amplo portfólio de investimentos. Eles recentemente contrataram Dunn para atuar numa das suas mais recentes aquisições — um produtor de alimentos no Vale de San Joaquin. Assim que eles se sentaram na sala de reuniões do hotel, os homens ouviram a apresentação de marketing de Dunn. Ele falou sobre se conferir ao produto uma personalidade que fosse ousada e irreverente, transmitindo a idéia de que este era um lanche de última geração. Ele entrou em detalhes sobre como ele atingiria um segmento especial dos 146 milhões de norte-americanos que são regulares consumidores de lanches — mães, crianças, jovens profissionais — pessoas, disse ele, que “mantêm seu ritual com petiscos frescos, tentando um novo produto alimentar, quando este lhe chama sua atenção”.

Ele explicou como iria implementar a narrativa estratégica da campanha da propaganda para este lanche, usando uma frase chave que tinha sido desenvolvida com muita perspicácia: “Comê-los como um ‘Junk Food'”.

Após 45 minutos, Dunn desligou o último slide e agradeceu aos homens por terem vindo. O portfólio da Madison continha a maior franquia do Burger King no mundo, a cadeia Ruth’s Chris Steak House e de um fabricante de alimentos processados, chamado AdvancePierre, cuja programação inclui o ‘Jamwich‘, uma invenção feita com pasta de amendoim e geléia que vem congelada, com uma massa crocante e quatro tipos de açúcares.

O lanche que Dunn propunha vender: cenouras. Simples cenouras frescas. Sem adição de açúcares. Nenhum tipo de molho nem mesmo cremoso. Sem sal. Apenas minicenouras, lavadas, ensacadas e, em seguida, vendidas em corredor convencionais e monótonos de supermercado.

“Agiremos como se fosse um lanche e não uma verdura”, ele disse aos investidores. “Vamos explorar as regras do junk food para incrementar as conversas sobre a mini-cenoura. Somos pelo comportamento de negócio do junk-food, mas contra a solução de alimento tipo junk-food“.

Os investidores estavam pensando apenas nas vendas. Já haviam negociado com um dos dois maiores produtores de fazenda de minicenouras no país, e tinham contratado Dunn para executar toda a operação. Agora, após sua apresentação, eles ficam aliviados. Dunn tinha descoberto que usando as próprias artimanhas de marketing da indústria, a proposta iria funcionar melhor do que qualquer outra coisa. Ele tirou de sua cartola truques que ele domina depois de seus 20 anos na Coca-Cola, onde aprendeu que uma das regras mais importantes em alimentos processados é: A venda de alimentos é tão importante quanto o próprio alimento.

Mais tarde, descrevendo sua nova linha de trabalho, Dunn disse-me que ele estava fazendo penitência por seus anos de Coca-Cola. “Eu estou pagando minha dívida cármica,” ele disse.

 

Este artigo é adaptado do material: “Salt Sugar Fat: How the Food Giants Hooked Us,” que esta sendo publicado no início deste ano pela Random House.

Michael Moss é um reporter investigativo para o The Times. Ganhou o Prêmio Pulitzer em 2010 por sua reportagem sobre as indústrias de carnes.

Editor: Joel Lovell.

 

Tradução livre de Luiz Jacques Saldanha, maio de 2013.