Filha sendo orientada pelo pai para comer algo mais saudável (?) : cereais e suco de laranja
Analysis by Dr. Joseph Mercola
August 06, 2019
RESUMO DA HISTÓRIA
- Glifosato, o princípio ativo do produto comercial da Monsanto/Bayer – Roundup -, pode estar se acumulando em crianças em níveis mais altos do que seus pais, conforme estudo de biomonitoramento feito pela ONG Center for Environmental Health/CEH 1;
- Nove de 12 pares de pais de crianças testados, os corpo das crianças tinham concentrações de glifosato mais altos do que os adultos;
- As crianças consomem mais alimentos e líquidos por quilo de peso corporal quando comparadas com os adultos, tornando suas exposições aos agrotóxicos maiores, relativamente falando;
- Alimentos à base de aveia, como aveia em flocos, cereais e pães, são comumente ingeridos como desjejum por crianças. No entanto, muitos destes produtos contêm resíduos de glifosato;
- Em análises feitas pela ONG Friends of the Earth, 100% de amostras de aveia deram positivas para resíduos de glifosato.
O glifosato ganhou as manchetes dos principais processos judiciais, nos quais os demandantes receberam bilhões de dólares em indenização depois que os jurados concordaram que o produto químico era responsável por seu diagnóstico de câncer. O glifosato é frequentemente associado a plantios transgênicos (geneticamente modificados/GM), pois as culturas transgênicas Roundup Ready são projetadas para sobreviver à aplicação direta do herbicida Roundup.
Este é o maior emprego para esta substância química, mas esta não é a única via de aplicação que a população está exposta. O glifosato também vem sendo detectado em quantidades inacreditáveis de plantios não transgênicos, como o uso na forma de dessecante ou como agente de secagem para acelerar a colheita pela homogenização de grãos e leguminosas não transgênicos.
Como resultado, alimentos populares entre as crianças, como cereais do desjejum e aveia em flocos, podem estar entre os alimentos mais contaminados (glyphosate-contaminated foods) no mercado e podem estar aumentando a contaminação nesta população vulnerável.
Crianças são mais expostas ao glifosato do que os adultos
O estudo da ONG CEH envolveu 11 famílias que viviam na Califórnia, em Michigan, em North Carolina, no Texas e em Vermont. Amostras de urina dos pais e das crianças foram testadas para glifosato e o ácido aminometilfosfônico (AMPA), o metabólito principal do glifosato, para revelar as exposições mais recentes a este produto.
Somente duas pessoas no estudo (um pai e uma criança) estavam livres de glifosato, enquanto o restante — 91% — tinham quantidades mensuráveis. Resultados para o AMPA forem similares.
Quando o nível de glifosato foi levado em conta, em nove dos 12 pares pai-filho, o corpo da criança apresentou concentrações mais altas de glifosato do que o adulto. Segundo o CEH: “acabamos concluindo que com um pequeno estudo para nos ajudar a responder a uma pergunta importante: seriam as crianças mais expostas ao glifosato do que os adultos? Com base em nossos resultados, a resposta a esta pergunta é: sim”.2
Um carcinogênico humano e um disruptor endócrino
É uma constatação preocupante já que em 2015, a World Health Organization/WHO (nt.: Organização Mundial da Saúde/OMS/ONU), através de sua International Agency for Research on Cancer/IARC (nt.: Agência Internacional de Pesquisa em Câncer) categorizou o glifosato como um “provável carcinogênico humano”. Além disso, evidência sugere que os agrotóxicos (pesticides) estão associados a situações crônicas de saúde, incluindo problemas de neurodesenvolvimento ou comportamentais, defeitos congênitos, asma e câncer, em crianças.3
O glifosato também é um disruptor endócrino, podendo “afetar nosso organismo em níveis extremamente baixos”, disse Sue Chaing, a diretora de prevenção da poluição junto ao CEH, em comunicado à imprensa.4 Em relatório de 2018, o CEH explana as três razões chaves porque as propriedades de disruptor endócrino do glifosato são especialmente perigosas para as crianças:5
“Primeiro, os agrotóxicos interferem com os processos e os sinais dos hormônios corporais, de uma maneira que podem acarretar o câncer, a diabetes, derrames e problemas reprodutivos. Ainda mais alarmante é o que os disruptores endócrinos (EDCs – endocrine-disrupting chemicals] podem causar: problemas de saúde que se transmitem para as futuras gerações.
A terceira razão chave da exposição aos EDCs é tão preocupante já que muitas destas substâncias químicas parecem ser mais danosas quando a exposição é baixa e por longo tempo, num tipo de dose que pode ser vivida pela ingestão de alimentos que contenham quantidades traço, ou seja, pequeninas de glifosato.
Nenês e crianças são especialmente vulneráveis à contaminação dos EDCs já que eles estão entrando em contato com estes químicos precisamente quando seus organismos em crescimento estão passando por processos fundamentais em seus desenvolvimento mediante a ação de hormônios.”
E mais ainda, como observou o periódico Pediatrics, “[Os] comportamentos únicos de crianças e a taxa metabólica muitas vezes as colocam num risco para aborção de doses mais altas de ambientes contaminados quando comparadas com adultos.”6
Crianças, por exemplo, consomem mais alimentos e líquidos por quilo de peso corpóreo comparadas com adultos, tornando suas contaminações maiores, relativamente falando. Também podem colocar suas mãos e suas bocas mais comumente em contato com os pisos, gastando mais tempo onde pode ocorrer maior contaminação via a poeira doméstica e pelo contato mais próximo com os carpetes.7
No entanto, em crianças, é possível o maior consumo de alimentos contaminados com glifosato que são dirigidos à infância, podendo ser os culpados prioritários na elevação de seus níveis ao serem comparadas com os adultos.
Muitos dos cereais contaminados com glifosato são dirigidos às crianças
Alimentos baseados em aveia, tais como flocos de aveia, cereais e pães, são alimentos comuns no desjejum de crianças, no entanto muitos contêm resíduos de glifosato. Em análises feitos pela ONG Friends of the Earth (FOE), 100% das amostras de cereais de aveia demonstraram ser positivas para resíduos de glifosato. 8
Para o estudo, 132 amostras de marcas usadas nas residências foram testadas, de mais de 30 lojas dos EUA e em 15 estados. Foram detectados resíduos tanto de glifosato como de outros agrotóxicos— neonicotinóides (neonicotinoids) e organofosforados —.
O nível médio de glifosato em amostras de cereais foi de 360 partes por bilhão (ppb), que a FOE observou, sendo mais do que duas vezes o nível estabelecido pelo cientistas da ONG Environmental Working Group (EWG) para o risco de câncer ao longo da vida das crianças. Algumas das amostras de cereais continham resíduos acima de 931 ppb.
A ONG EWG, da mesma forma, encomendou análises de glifosato em cereais feitos com aveia e também de ‘snacks‘, tendo detectado o herbicida, em todos os 21 produtos testados. Todos, exceto quatro deles, foram superiores ao valor referência do EWG quanto ao risco de câncer ao longo da vida de crianças.9
Em análises anteriores feitas pelo EWG, 43 dos 45 produtos alimentares feitos com aveia cultivada, convencionalmente, mostraram ser positivas para a presença de glifosato, 31 das quais tinham níveis maiores do que os cientistas do EWG acreditam ser protetivos para a saúde das crianças.10
Exemplos de alimentos com resíduos de glifosato incluem marcas como Honey Nut Cheerios Medley Crunch (833 ppb), Chocolate Peanut Butter Cheerios (400 ppb) e Nature Valley Crunchy Granola Bars (de 312 a 566 ppb).11 Na primeira rodada dos testes do EWG, o maior nível de glifosato — 2.837 ppb — foi detectado no cereal de dejejum Quaker Oatmeal Squares.12
Bares escolares fornecem alimentos contaminados com glifosato
A ONG CEH investigou quanto de glifosato poderia ser detectado em alimentos de dejejum feitos com aveia, servidos em escolas de ensino fundamental em todo os EUA. Testados produtos comumente oferecidos como lanche nas escolas, foi detectado glifosato em 70% deles, em níveis preocupantes.
“Os itens que contêm níveis mais altos do herbicida tóxico estão nos produtos: Quaker Maple Brown Sugar Instant Oatmeal e Quaker Old-Fashioned Oats. O CEH não detectou resíduos de glifosato em quaisquer cereais orgânicos certificados que testamos”, escreveu a ONG. 13 A última parte é digna de nota, como a pesquisa mostra, de que alimentos orgânicos levam a níveis menores de agrotóxicos em nossos corpos.
Um estudo publicado no organismo público norte americano Environmental Health Perspectives, analisou as dietas de quase 4.500 pessoas que vivem em seis cidades dos EUA, avaliando os níveis de exposição aos organofosforados (OPs), que estão entre os inseticidas mais usados em fazendas nos EUA. Aqueles que ingeriram produtos cultivados convencionalmente apresentaram altas concentrações de metabólitos destes venenos agrícolas (os OPs), enquanto aqueles que ingeriram produtos orgânicos apresentaram níveis significativamente mais baixos.14
Comer orgânico é uma das melhores maneiras de evitar alimentos com resíduos de glifosato, mas mesmo assim podemos estar expostos por outras fontes, pois o glifosato é o agrotóxicos mais amplamente utilizado na Terra. 15 Os dados sobre a quantidade de glifosato pulverizado nos EUA é incompreensível e soma mais de 1,6 bilhão de quilos aplicados desde 1974.
Isso representa 19% do glifosato usado globalmente durante este tempo e a maioria (dois terços do glifosato aplicado de 1974 até 2014) foi aplicado nos últimos 10 anos.16
Porque comer alimentos de aveia orgânica é importante
O produto comercial Roundup (Roundup) é “aplicado como um dessecante para a maioria dos grãos pequenos convencionais – não transgênicos” (nt.: importante compreender o que significa este processo de dessecagem. É aplicado o veneno sobre a cultura, poucos dias antes de colher. Todas as plantas morrem e assim a colheita fica mais uniforme e feita de uma vez só). Por isso, nas culturas transgênicas e grãos convencionais – não transgênicos -, onde o glifosato é aplicado com esta tecnologia agrícola, ele “é encontrado quando se dá a colheita”. 17 Assim ficam resíduos do herbicida nos grãos colhidos e a EPA tem aumentado o nível permitido de resíduo de glifosato nos alimentos, mesmo quando as preocupações com a saúde (health concerns) continuam aumentando. De acordo com o EWG: 18
“O limite legal da EPA sobre os resíduos de glifosato é de 30 partes por milhão ou ppm. A petição feita conjuntamente por 18 líderes industriais, pede que a agência de proteção ambiental dos EUA/EPA estabeleça um padrão mais protetivo de 0,1 ppm. Este já foi o limite legal em 1993. Nos últimos 25 anos, a agência aumentou a quantidade de resíduos permitidos de glifosato em aveia, em 300 vezes.
O primeiro aumento, para 20 ppm, foi concedido em resposta a uma petição de 1997 feita pela Monsanto, quando produtores rurais, ao redor do mundo, começaram primeiramente a empregar este herbicida amplamente como um agente de secagem pouco antes do final da cultura.
Depois foi aumentado para o atual nível de 30 ppm em 2008. Desde então, os cientistas vêm ligando o glifosato ao câncer e os pesquisadores, em torno do mundo, vêm requisitando por limites mais estritos quanto à exposição ao glifosato.”
Um estudo no Meio Oeste detectou o herbicida em mais do que 93% das mães grávidas 19 e aparecendo praticamente em todos espaços — como no leite materno ( breastmilk), na água,20 em fraldas descartáveis 21 e mesmo no mel (honey). Aqui está do porquê precisamos escolher alimentos orgânicos o quanto for possível, especialmente se nossas crianças comem alimentos que tenham por base a aveia.
O mesmo é verdade para o feijão carioquinha. Neste feijão, os níveis de glifosato foram detectados acima de 1.128 ppb, embora os níveis médios do herbicida fossem 509 ppb — 4,5 vezes mais altos do que o valor de referência do EWG. 22
Se quisermos evitar o glifosato em nossos alimentos, escolher alimentos orgânicos ou biodinamicamente cultivados (organic or biodynamically grown foods), que não são geneticamente modificados nem pulverizados com glifosato como dessecante. Podemos ajudar a solicitar mudanças, contatando as empresas que fabricam alimentos. Dizer a eles que preferimos alimentos sem resíduos de glifosato – e que estamos preparados para trocarmos de marca, se necessário, para encontrá-los.
O CEH também recomenda que os pais contactem as escolas de seus filhos para requererem que os alimentos postos para eles sejam orgânicos e que também eliminem o emprego de herbicidas com glifosato nos pátios da escola.23 De acordo com o CEH:24
“As escolas de todo o país estão comprando mais alimentos orgânicos e acabando com o uso de glifosato nas dependências da escola. Perguntar à escola se eles estão interessados nestas novas maneiras de agir! Cidades e bairros também estão eliminando o uso de glifosato e outros agrotóxicos em parques e áreas de lazer infantil (playgrounds). Demandar dos vereadores ou outro funcionário escolhido nas administrações, se eles querem se juntar a esse movimento crescente.”
Podemos averiguar o quanto de glifosato temos em nossos corpos
Se estivermos curiosos de quanto glifosato temos em nossos corpos, o Health Research Institute (HRI) em Iowa desenvolveu um conjunto de testes de urina para glifosato (glyphosate urine test kit), que nos permitirá determinar nossa própria exposição a este herbicida tóxico.
A solicitação deste material automaticamente permite que participemos do estudo e ajudamos o HRI a entender melhor a extensão da exposição e contaminação por glifosato. Em algumas semanas, receber-se-á os resultados, juntamente com informações sobre como os resultados podem ser comparados com outros e o que fazer para ajudar a redução de nossa exposição.
Providenciamos estes conjuntos sem nenhum ônus para que se participe neste estudo ambiental. O HRI está também em processo de fazer um teste com cabelo para glifosato que é melhor para exposição em longo prazo.
Fontes e Referências
- 1, 4, 23 Center for Environmental Health July 25, 2019
- 2 Center for Environmental Healthy July 2019 Fact Sheet
- 3, 6, 7 Pediatrics. 2012 Dec;130(6):e1765-88.
- 5, 13, 15, 24 Center for Environmental Health December 2018
- 8, 22 Friends of the Earth, Toxic Secret
- 9, 11 Environmental Working Group June 12, 2019
- 10, 12 EWG August 15, 2018
- 14 Environmental Health Perspectives DOI:10.1289/ehp.1408197
- 16 Environmental Sciences Europe Bridging Science and Regulation at the Regional and European Level 201628:3
- 17 JAMA. 2017;318(16):1610-1611.
- 18 Environmental Working Group May 3, 2019
- 19 Environmental Health 2018, 17;23
- 20 Analytical and Bioanalytical Chemistry November 20, 2011
- 21 The Guardian January 23, 2019
Tradução livre de Luiz Jacques Saldanha, outubro de 2019.