Comparação entre volumes de plástico e plâncton
no “olho” do remanso
central do Pacífico Norte
Marine Pollution Bulletin, v.42, n.12, Dec01
Charles J. Moore 1 , Shelly L. Moore,
Molly K. Leecaster 2 , and
Stephen B. Weisberg
1Algalita Marine
Research Foundation, 345 Bay Shore Ave., Long Beach CA
908031956, [email protected]
2Present address: INEEL, Bechtel WBXT, Idaho, LLC P.O.
Box 1635, Idaho calls, 1D 83415-3779
O
potencial de ingestão de partículas por organismos que se alimentam
por filtragem foi avaliado medindo-se abundância e massa relativas
de plástico neustônico (nt.: materiais que ficam nas
camadas superiores do mar)
e zooplâncton nas proximidades da área central de alta pressão
do “olho” do remanso localizado no Oceano Pacífico Norte. Amostras
de “neuston” (nt.: organismos marinhos que
vivem nas camadas marinhas superiores) foram colhidas em 11 locais aleatórios, utilizando-se
uma rede com malha de 333 u mesh.
A abundância e a massa de plástico neustônico
foram as maiores já registradas nessa área: 334.271 peças/km'
e 5,114 g/km2
, respectivamente. A abundância de plâncton foi, aproximadamente,
5 vezes mais alta do que a de plástico, mas a massa de plástico
foi em torno de 6 vezes maior que a de plástico. Os tipos das resinas
plásticas identificáveis e mais freqüentemente coletadas foram:
plástico filme e polipropileno/ linha de monofilamento,
os tipos não-identificáveis mais freqüentes foram fragmentos de
plásticos. Cumulativamente, esses três tipos foram responsáveis
por 98% do total de pedaços de plástico.
INTRODUÇÃO
O
entulho marinho é a expressão visível do impacto que a espécie humana
está causando aos ecossistemas dos Oceanos. Ele é muito mais do
que um problema só estético. Coloca em risco organismos marinhos
que o ingerem e/ou neles ficam enredados
(Day, 1980; Balazs,
1985; Fowler, 1987; Ryan,
1987; Robards, 1993; Bjorndal
et al., 1994, Laist,
1997). O número de mamíferos marinhos mortos a cada ano, devido
à ingestão e por enredamento, aproxima-se dos 100.000, somente no
Oceano Pacífico Norte (Wallace, 1985). Em todo o mundo, 82 de 144
pássaros examinados continham pequenos fragmentos destes resíduos
em seus estômagos sendo que, em muitas espécies, a incidência de
ingestão era superior a 80% dos indivíduos (Ryan,
1990).
Muitos
estudos focaram a ingestão de pequenas partículas por pássaros,
já que os cientistas podem fazer com que eles regurgitem o conteúdo
de seus estômagos, sem lhes causar danos. Menos aprofundadas são
as avaliações dos efeitos destas partículas ingeridas por peixes,
sendo que não há nenhum estudo em espécies marinhas que
se alimentam por filtragem, cujos mecanismos
de alimentação não lhes permitam distinguir lixo do plâncton que
os nutrem. Destacadamente, nenhum estudo comparou a quantidade de
entulho neustônico à de plâncton a fim de avaliar seus efeitos potenciais
sobre os organismos que se alimentam por filtragem.
A
preocupação em relação aos efeitos deste entulho neustônico
no ambiente marinho é maior em convergências oceanográficas e em
redemoinhos, onde fragmentos destes resíduos vão se acumulando naturalmente
(Shaw e Mapes,
1979; Day, 1986; Day
e Shaw, 1987). O “olho” deste remanso central do Pacífico Norte,
área de alta pressão com corrente oceânica de sentido horário, é
uma destas áreas de convergência que empurram o entulho para um
local central de pouco vento e influência de correntes. O presente
estudo compara a abundância e a massa de entulho neustônico
com a quantidade de zooplâncton nesta área.
MÉTODOS
FIGURA 1. Localização da área de amostragem no “olho” do
remanso central do Oceano Pacífico Norte.
|
Onze
amostras de neustons foram coletadas entre
23 e 26 de agosto de 1999 numa área próxima à célula de pressão
central de alta subtropical do Pacífico Norte (Figura 1). Os locais
de amostra localizavam-se ao longo de duas transecções:
uma a Oeste de 35o 45.8'N, 1380 307O a 36o 04.9'N, 1420 04.6'O;
e outra ao Sul 36° 04.9'N, 142° 04.6'O a 34° 40.0'N. O local ao
longo da transecção e o tempo de permanência
da rede foram escolhidos aleatoriamente. As amostras foram coletadas
utilizando-se uma rede em forma de cone com uma abertura retangular
de 0.9 m x 0.15 m, 3.5 m de comprimento, malha de rede de 333 u
mesh com uma bolsa coletora de 30 cm x 10 cm. A rede foi
içada da superfície, fora da área de ondulação formada pelo movimento
do barco (da popa do barco) a uma velocidade nominal de 1m/s. A
velocidade real, medida com um sensor B&G
de hélice, variou entre 0.5 e 1.5m/s.
Cada rede foi conduzida por uma distância aleatória que variou de
5 a 19 km. As amostras foram coletadas a medida que o barco se movia
através da transecção em períodos igualmente
divididos entre o dia e a noite.
As
amostras foram conservadas em formol a 5%, mergulhadas depois em
água fresca e transferidas para álcool isopropil
a 50%. Para separar o plástico de tecidos vivos, as amostras eram
escorridas e colocadas em água do mar, a qual faz boiar o plástico
na superfície, deixando os tecidos vivos ao fundo. As porções da
superfície e do fundo foram observadas ao microscópio de dissecção.
O plástico que estava misturado foi removido da porção dos tecidos e, os tecidos, removidos da porção
dos plásticos sendo, então, acondicionados apropriadamente. O plâncton
foi contado e identificado quanto à classe.
O
plástico e o plâncton foram secos no forno a uma temperatura de
65°C durante 24 horas e
então pesados. Os plásticos foram separados através de enxágüe em
peneiras Tyler de 4.76 mm, 2.80 mm, 1.00 mm, 0.71 mm, 0.50 mm e 0.35
mm. Pedaços individuais de plástico foram identificados em categorias
padrão de acordo com o tipo (fragmento, fragmento de estiropor
– ou isopor –, glóbulos/grânulos, polipropileno/
fragmentos de linha de monofilamento,
plástico filme fino) e em uma categoria não-plástico,
formada por alcatrão. Só então os fragmentos foram contados.
RESULTADOS
Um
total de 27.698 pequenos pedaços de plástico, pesando 424 g deram
o valor de abundância de 334.271 pedaços/km'
e o valor de massa de 5,114 g/km2.
A abundância variou de 31.982 pedaços/km'
a 969.777 pedaços/km', e a massa variou de 64 a 30,169 g/km2.
Um
total de 152.244 organismos planctônicos, pesando aproximadamente
70 g foram coletados da superfície da água no “olho” do remanso
com o valor de abundância de 1.837.342 organismos/ km' e valor de
massa de 841 g/km2 (peso
seco). As abundâncias variaram de 54.003 organismos/km'
a 5.076.403 organismos/ km', e os pesos variaram de 74 a 1,618 g/km2.
A
maioria do material coletado na categoria “menor tamanho” (Tabela1)
era de fragmentos de plásticos. Plásticos filme fino, do tipo usado
para embalar sanduíches,
FIGURA 2. Abundância e massa de plâncton e plástico em amostras
noturnas versus amostras diurnas.
|
foram os responsáveis por aproximadamente metade da abundância
na segunda maior categoria por tamanho, e pedaços de linha (polipropileno
e monofilamento) constituíram a maior fração do material coletado
na categoria “maior tamanho”.
A abundância de plâncton
foi mais alta do que a abundância de plástico
em 8 de 11 amostras, com a diferença sendo muito mais alta à noite
(Figura 2). Em contraste, a massa de plástico foi maior do que a
massa de plâncton em 6 de 11 amostras. A relação de massa plástico-
plâncton foi maior durante o dia do que durante a noite,
embora muito da diferença durante o dia tenha ocorrido devido a
uma garrafa plástica ter sido pega em uma amostragem
durante o dia e 1 m de polilinha ter sido pega no outro.
DISCUSSÃO
Os
valores de abundância e peso de pedaços de plásticos calculados
no presente estudo são os maiores já observados no Oceano Pacífico
Norte. Estudos anteriores haviam estimado valores de abundância
que variavam de 3.370 a 96.100 pedaços/km'
e valores de peso que variavam de 46 a 1,210 g/km2
(Day and Shaw,
1987). A amostra
de maior abundância e peso anteriormente registrada no Oceano Pacífico Norte é de 316.800 pedaços/km' e 3.492 g/km2 (Day et al., 1990), três e sete vezes menor, respectivamente, do
que os mais altos valores registrados neste estudo.
Várias
são as causas possíveis da alta abundância encontrada neste estudo.
A primeira delas é a localização da nossa área de estudo, próxima
à célula de pressão central da alta sub-tropical
do Pacífico Norte. Estudos anteriores conduzidos no Pacífico Norte
foram realizados sem referência à célula de pressão central (Day et al., 1990), o que poderia
funcionar como um sistema natural de redemoinho concentrador de
material neustônico, inclusive plásticos. No entanto, enquanto estudos
anteriores não focalizaram no “olho” do remanso, muitos estudos
foram realizados como transecções que
passaram através dele (Day et al., 1986; Day, 1988; Day et al., 1990) Dessa forma, não é provável que a localização,
por si só, tenha sido a causa das densidades mais altas que observamos.
Uma
hipótese alternativa é a de que a quantidade de material plástico
no oceano vem aumentando com o passar do tempo, o que Day
and Shaw (1987) sugeriram anteriormente
com base numa revisão histórica de estudos. Os plásticos degradam-se
lentamente no oceano (Day and Shaw, 1987). Enquanto alguns
dos pedaços maiores podem acumular em sua superfície outros organismos
que os fazem afundar, os pedaços menores mantêm-se livres de tais
organismos, permanecendo na superfície. Assim, novos plásticos adicionados
ao oceano podem não deixar o sistema, uma vez tenham sido nele introduzidos,
a não ser que venham a dar nas praias
devido às correntes marítimas. Embora vários estudos
tenham mostrado serem as ilhas o depósito do entulho marinho, (Lucas,
1992; Corbin and Singh,
1993; Walker et al., 1997), o Oceano Pacífico
Norte possui poucas ilhas
e as correntes de redemoinhos dominantes funcionam
como um mecanismo de retenção que impede os plásticos de irem em
direção ao continente.
TABELA 1. Abundância (pedaços/km2) por tipo
e tamanho de pedaços de plástico e outros resíduos (alcatrão) encontrados
no “olho” do remanso do Oceano Pacífico Norte.
Tamanho da malha Fragmentos Pedaços Pequenos Polipropileno/ Filme plástico Misc./
(mm) de isopor pedaços Monofilamento fino Alcatrão Unid. Total
>4.760 1,931 84 36 16,811 5,322 217 350 24,764 4.759-2.800 4,502 121 471 4,839 9,631 97 36 19,696
2.799-1.000 61,187 1,593 12 9,969 40,622 833 72 114,288
0.999-0.710 55,780 591 0 2,933 26,273 278 48 85,903
0.709-0.500 45,196 567 12 1,460 10,572 121 0 57,928
0.499-0.355 26,888 338 0 845 3,222 169 229 31,692
Total 195,484 3,295 531 36,857 95,642 1,714 736 334,270
A
alta proporção de plástico em relação ao plâncton encontrada neste
estudo tem o potencial de afetar muitos tipos de biota. Os mais
suscetíveis são os pássaros e os organismos que se alimentam por
filtragem, os quais obtém seus alimentos na parte superior da coluna
de água. O estômago de muitos pássaros examinados continha pequenos pedaços
de entulho, como resultado de sua incapacidade de distinguir o plástico
do alimento. (Day et al. 1985, Fry et al. 1987, Ainley
et al. 1990, Ogi 1990, Ryan 1990, Laist 1997). Dois organismos que se alimentam por filtragem (Thetys vagina) coletados neste estudo continham
fragmentos de plásticos e polipropileno/ linha de monofilamento
firmemente incrustadas em seus tecidos. Organismos que se alimentam
em toda a extensão da coluna de água, como as baleias, têm uma probabilidade
menor de serem diretamente afetados. Embora nosso estudo tenha tido como foco os
neustons, amostras também foram coletadas de duas colunas
oblíquas, situadas a 10 m de profundidade. Observamos que a densidade
dos plásticos nessas áreas era menos da metade daquela das águas
da superfície e encontrava-se primariamente limitada a monofilamentos
que foram adsorvidos por diátomos e micro-algas
que haviam reduzido, assim, sua capacidade de flutuação. As partículas
menores que têm alto potencial de afetar os animais que se alimentam
por filtragem reduziam-se cada vez mais em direção à profundidade
o que poderia ser esperado em razão de sua capacidade de flutuação.
Vários
fatores restringem nossa possibilidade de extrapolar, para outras
áreas do oceano, nossas descobertas sobre a alta proporção de plástico
em relação ao plâncton no “olho” do remanso central do Pacífico
Norte. O Oceano Pacífico Norte é uma área de baixo suprimento biológico,
as populações de plâncton são muitas vezes maiores em áreas costeiras
do Pacífico oriental, onde há extração de combustíveis (McGowan
et al., 1996). Além disso, os efeitos
de redemoinho do “olho” do remanso provavelmente funcionam de modo
a reter os plásticos, ao passo que, em outras regiões, os plásticos
possam dar nas praias em maior quantidade. Por outro lado, áreas
mais próximas às praias têm uma probabilidade maior de receber dejetos
produzidos em terra e em atividades de carga e descarga de navios,
ao passo que grande parte do material observado no presente estudo
parece ser resquício de atividades relacionadas à pesca marítima
e ao tráfego de navios.
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AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem
à Algalita Marine Research Foundation pelo uso do
navio de pesquisa oceanográfico, ALGUITA. Agradecemos ao
Dr. Curtis Ebbesmeyer (the Beachcombers'
and Oceanographers' International Association), Dr. James Ingraham
(U.S. National Oceanic and Atmospheric Administration), and Chuck
Mitchell (MBC Applied Environmental Sciences) por
sua orientação no projeto e interpretação do estudo. Agradecemos também
as seguintes pessoas pela colaboração na coleta de dados: Mike Baker,
John Barth, Robb Hamilton e Steve
McCloud.
FONTE:
ftp://ftp.sccwrp.org/pub/download/PDFs/1999ANNUALREPORT/10_ar11.pdf
17jun01
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