BBC News

28 de setembro de 2005.

 

O gelo do Ártico 'desaparece rapidamente'

By Richard Black
Environment Correspondent, BBC News website

 

A área coberta pelo gelo no Mar Ártico se retrai pelo quarto ano consecutivo, de acordo com novos dados liberados pelos cientistas norte-americanos.

Gelo do Ártico em retração

- Quadro branco: margem mínima atual do gelo do mar;

- Quadro cinza: a média da margem de gelo entre 1979 e 2000.

“Parte do que nós estamos observando é o aumento do efeito estufa e aposto todas as minhas fichas nisto”,
Mark Serreze, NSIDC.

 

 

Eles dizem que assistem neste mês a mais baixa extensão de gelo de cobertura neste último século.

Naturalmente o clima ártico varia, mas os pesquisadores concluem que o aquecimento global induzido pela humanidade é, pelo menos, parcialmente responsável por isso.

Prevêem que esta contração da cobertura de gelo pode levar a um derretimento cada vez mais rápido nos próximos anos. “Setembro de 2005 marcará um novo recorde quanto ao mínimo de cobertura de gelo no meio do mar ártico,” diz Mark Serreze, do National Snow and Ice Data Center/NSIDC (nt.: Centro Nacional de Controle de Dados sobre a Neve e o Gelo), Boulder, Colorado.

“Foi o menor camada de gelo do mar que vimos pelos dados do satélite. E continua este padrão de extensão das baixas extremas do gelo do mar que agora estamos percebendo durante estes últimos quatro anos”, disse ele à BBC News.

 

 

A retração de setembro

 

ARCTIC SEA ICE EXTENT - SEPTEMBER TREND, 1978-2005

 

Graph showing ice decline (NSIDC)

 

Setembro, normalmente, é o mês que o Ártico tinge seu menor tamanho.

Os novos dados mostram que em 19 de setembro, a área coberta pelo gelo caiu a 5.35 milhões de km2 (2.01 milhões de milhas quadradas). A mais baixa já catalogada desde 1978, quando os registros tomados pelo satélite tornaram-se disponíveis. Agora está 20% menor do que a média entre 1978-2000.

Eles calcularam que a média corrente da retração vem sendo 8% por década; nesta média poderá não haver mais gelo durante o verão de 2060.

As análises dos dados históricos do NSIDC também sugerem que a cobertura de gelo é menor este ano do que os períodos de baixa dos anos trinta e quarenta.

Mark Serreze acredita que estas descobertas evidenciam as mudanças climáticas induzidas pelas atividades humanas.

“Ainda é um fato controvertido e sempre há alguma incerteza em razão do sistema climático ter uma grande variabilidade natural, especialmente no Ártico”, diz ele.

“Mas penso que a evidência está cada vez mais sólida de que parte do que estamos observando é um incremento do efeito estufa. Se me colocares em cheque, direi que aposto todas as fichas de que é isto que está acontecendo”.

 

Movimento que confunde

 

Uma das limitações destes registros é que eles medem somente a área do gelo mais do que seu volume.

“Um dos outros fatores pode ser os movimentos do mar de gelo”, diz Liz Morris, do Observatório Inglês da Antártida, atualmente trabalhando junto ao Instituto Scott de Pesquisa Polar, Cambridge, Reino Unido.

“Se todo o aumento se der em um só lugar, pode-se ter o mesmo volume total de gelo”, diz ela à BBC News website, “e há alguma evidência de que o gelo está se avolumando ao longo da costa norte canadense, guiado pelas alterações no padrão dos ventos e talvez pelas correntes marítimas.”

A maioria dos dados da camada de gelo do mar vem dos registros dos submarinos militares que regularmente exploravam passagens sob a capa do ártico durante os tempos da Guerra Fria.

Submarinos podem atravessar o Oceano Ártico ao longo de “trilhas” feitas décadas atrás e anotam as diferenças na camada de gelo acima. No entanto isto pode ser insignificante se o gelo ele próprio se moveu.

A professora Morris está envolvida no novo satélite europeu, Cryosat, que é capaz de fornecer medidas definitivas da camada de gelo tanto quanto de sua extensão, seu lançamento está marcado para 08 de outubro (nt.: por um problema no lançamento, o mesmo foi abortado).

No entanto ela também acredita nos dados do NSIDC que sugerem um impacto do efeito estufa intensificado pela humanidade

"Todos os dados se explicitam através de ciclos e por isso deve-se ser cauteloso”, diz ela. “No entanto também é verdade dizer que nós não podemos esperar ter quatro anos de uma retração bem concatenada. Isto, combinado com a elevação das temperaturas no Ártico, sugerem um impacto humano. E eu também aposto todas as minhas ficha nisto, porque se alteramos o processo de absorção da radiação da atmosfera (pelo crescimento da produção de gases de estufa) teremos daí, sem dúvida, mais calor na baixa atmosfera, e, cedo ou tarde, haverá derretimento das camadas de gelo.”

 

O Ártico esquenta mais rápido

 

Apesar de haver significantes variações na região, o Ártico está se aquecendo duas vezes mais rápido que o resto do planeta, de acordo com a maioria dos registros liberados no último ano.

O Conselho de Peritos sobre o Impacto do Clima Ártico, um estudo de quatro anos envolvendo centenas de cientistas, projetou um crescimento adicional na temperatura de 4-7 C até 2100.

Se a atual tendência pode ser relacionada em parte à mudança climática induzida pelos humanos, Mark Serreze constata maiores razões para preocupação.

“O que estamos percebendo é um processo no qual nós começamos a perder a cobertura de gelo durante o verão”, ele disse, “deixando áreas que formalmente teriam gelo que agora estão como mar aberto e que são escuras. E esta cor escura absorve um grande volume de energia do sol e o que acontece então é que o oceano começa a se aquecer e isto dificulta a formação de gelo durante os outono e inverno seguintes. E é isto exatamente o que nós estamos observando – um efeito de retro-alimentação positiva –, um ‘tipping-point’ (nt.: mais ou menos um ‘ponto de inflexão’)

A idéia que está por trás do ‘tipping point’ é que em algum estágio a velocidade do aquecimento global pode acelerar, e enquanto se eleva, como a temperatura se elevando pode haver a ruptura da possibilidade natural de contenção da mesma forma pode interligar alterações ambientais que redundem na liberação de quantidades adicionais de gases de efeito estufa.

Possibilidades de serem incluídos nos ‘tipping-points’:

·        O desaparecimento das camadas de gelo do mar, conduzindo a uma maior absorção da radiação solar;

·        uma alteração nas florestas, deixando de ser grandes absorvedoras de dióxido de carbono, tornando produtoras;   e

·        o derretimento dos gelos eternos, liberando o metano enclausurado.

Este estudo é o mais recente a indicar que tais mecanismos de retro-alimentação positiva podem estar em operação, apesar da prova definitiva quanto a suas influências sobre o futuro do clima da terra, estar ainda difícil de ser determinada.

 

Tradução livre de Luiz Jacques Saldanha, dezembro de 2005.